28 fevereiro 2017

Segunda escolha de Jesus Abandonado

            No brusco despertar de nos encontrarmos – por assim dizer – outra vez na terra, só uma pessoa nos deu forças para continuar vivendo: Jesus Abandonado, presente no mundo que devíamos amar, esse mundo que assim é, justamente porque não é Céu.
            Numa segunda escolha, mais consciente, mais lúcida, d’Aquele que nos chamara para segui-lo, brotou de minha alma a notória decisão:

            Tenho um só Esposo na terra:  Jesus  Abandonado.  Não tenho outro Deus
além  d’Ele.  N’Ele está todo o paraíso com a Trindade e toda a terra com a
humanidade.
Por isso, o seu é meu e nada mais.
Sua é a Dor universal e, portanto, minha.
Irei pelo mundo à sua procura em cada instante da minha vida.
O que me faz sofrer é meu.
Minha, a dor que me perpassa no presente. Minha, a dor de quem está ao
Meu lado  (ela é o meu Jesus).  Meu,  tudo  aquilo  que  não é paz, gáudio,
belo, amável, sereno...  Numa palavra: aquilo que não é paraíso.   Pois eu
também tenho o meu paraíso,  mas ele está no coração do meu Esposo.
Outros paraísos não conheço. Assim será pelos anos que me restam:
sedenta de dores, de angustias, de desesperos, de melancolias, de
desapegos, de exílio, de abandonos, de dilacerações, de...  tudo aquilo que
é Ele, e Ele, é o Pecado, o Inferno.
Assim, dessecarei a água da tribulação em muitos corações próximos e  –
pela comunhão com meu Esposo onipotente – distantes.
Passarei como fogo que devora tudo o que há de ruir e deixar em pé só a
Verdade.
Mas é preciso ser como Ele, ser Ele no momento presente da vida.
Escrevi que “Ele é o Pecado, o Inferno”[1].
Pavel Evdokimov diz: “O Espírito Santo não une mais o Filho ao Pai, e o Filho constata o rompimento, o abandono; é a solidão no âmago da Trindade, o sofrimento de Deus. O inferno de Deus... “ (Evdokimov, 1969, p. 109).
Para Hans Urs von Balthasar, Jesus Abandonado é e não é o inferno:

A treva do estado pecaminoso é certamente experimentada por Jesus de
um modo que não pode ser idêntico à que os pecadores (que odeiam Deus)
 teriam de experimentar [...], no entanto, é mais profundo e mais obscura do
que esta, porque se passa internamente na profundidade da relação das
hipóstases divinas, inimaginável a toda criatura.
Portanto, pode-se igualmente bem afirmar que o abandono de Deus em
Jesus é o contrario do Inferno, e que é exatamente o inferno (cf. Lutero,
Calvino), até mesmo a sua extrema intensidade. (Balthasar, 1986, p.313)





[1]  O teólogo ortodoxo Olivier Clément também escreve: “Através de suas humilhação, de sua Paixão, de sua morte de maldito, o Cristo deixa entrar em si todo o inferno, toda a morte da condição decaída, até a acusação decaída, até a acusação terrível do ateísmo: ¢Deus meu, Deus meu porque me abandonaste?¢” (Clément, 1990, p. 147). 

27 fevereiro 2017

COMO ANJOS


            A virgem e um absurdo para o mundo, um enigma para os cristãos indiferentes, uma obra-prima sobrenatural, na realidade.
            A virgem é virgem, se sua vida é unicamente Deus; e só Deus explica a virgem.
Os verdadeiros virgens são imagens de Jesus e Maria, pessoas “divinas”, em que a mulher possui toda a força em si e não pede o apoio do homem, e o homem, toda a completeza em si mesmo... «como os anjos no Céu» (ML 22,30).
            No bar, num clima de intimidade, um casal conversa. E sábado. As famílias saem para a alegria do fim de semana.
            No avião, três amigos trocam impressões e comentários. Todos vivem para aquele momento de voltar para casa, ou de ir para o sítio.
            E a esposa de Deus? A consagrada ao Senhor? Trabalha o dia todo para servi-lo nos outros, mas o adora e o ama, na hora da oração, quando, comunicando-se com Ele, encontra conforto e vigor para atingir os cumes da santidade.
    Quando criaturas eleitas entram para a clausura, parece que estão abandonando alguma coisa no mundo. A verdade é que vão encontrar aquilo que é, e deixam aquilo que não é.
            Todo o vazio está na pompa que elas deixam.
            As virgens!
            Não desposam um homem, mas Deus. Não têm poucos filhos, mas muitos, todos aqueles que o Senhor colocou em seu caminho; filhos a quem elas, como e mais do que a mãe natural, protegem, estimulam, ajudam, aconselham, apóiam, se estão próximos; e sempre aguardam, se distantes; tudo esperando com a caridade que lhes é própria, com a oração junto ao seu Esposo onipotente e onipresente.
            Se, ser virgem exime da maternidade física, sempre implica uma maternidade espiritual, ampla tanto quanto o tecido social beneficiado realmente com seu amor pessoal por Cristo. Ser virgem significa colocar-se no meio de uma multidão, apontando-lhe o Céu com uma das mãos e, com a outra, sustentando-a na provação da vida.

            Ser virgem significa, sem retórica, fazer a parte de Maria, a Mãe de todos, de modo real, concreto, silencioso e sobrenatural, aqui na terra, no seu canto de mundo; porque, se Jesus ficou na terra nos sacerdotes, nos quais, como Sacerdote e vítima, continua a se oferecer ao Pai, pela humanidade inteira, de modo misterioso e divino, Maria ficou na terra nas virgens, que continuam a sua missão de maternidade, de serviço a humanidade, de cooperação com o sacrifício.

26 fevereiro 2017

Como num sonho


Unidade: palavra divina.

Se, a um dado momento, ela fosse pronunciada pelo Onipotente e os homens a pusessem em prática na suas mais variadas aplicações, veríamos o mundo de repente parar em sua andança geral, como em uma brincadeira de filme, e retomar a corrida da vida na direção oposta.
Inúmeras pessoas retrocederiam no caminho largo da perdição e se converteriam a Deus, entretanto pelo estreito… Veríamos famílias desmembradas por discórdias, arrefecidas pelas incompreensões, pelo ódio se recomporem.
As crianças nascerem em um clima de amor humano e divino, e se forjarem homens novos para um amanhã mais cristão.
As fábricas, ajuntamentos muitas vezes de "escravos" do trabalho, em um clima de tédio, senão de blasfêmia, tornarem-se um lugar de paz, onde cada um faz a sua parte para o bem de todos.
As escolas ultrapassarem a breve ciência, colocando conhecimentos de toda espécie a serviço das contemplações eternas, aprendidas nos bancos escolares como em um desvendar-se cotidiano de mistérios, intuídos a partir de pequenas fórmulas, de simples leis, até mesmo dos números…
Os Parlamentos se transformarem em um lugar de encontro de homens a quem interessa mais o bem de todos do que a parte que cada um defende, sem enganar irmãos ou pátrias.
Em suma, veríamos o mundo tornar-se melhor e o Céu descer como por encanto sobre a terra e a harmonia da criação servir de moldura à concórdia dos corações.
Veríamos… É um sonho! Parece um sonho!

Contudo, Tu não pediste menos quando rezaste “Seja feita a tua vontade na terra como no Céu”. 

25 fevereiro 2017

UMA MIRÍADE DE PÉROLAS ESPLÊNDIDAS


Imagino uma cidade de ouro, onde o divino está em relevo, rutilante de luz, e o humano serve de fundo, pondo-se na sombra para dar maior realce ao esplendor. Cada igreja, cada tabernáculo reluz mais do que o Sol, porque lá ficou o Amor dos amores.
Na alma de quem representa a Igreja, na Hierarquia, que estrutura a divina sociedade, descida do Céu à terra, encontro uma miríade de pérolas esplêndidas:
são as graças derramadas por Deus, pelas mãos da Virgem, naquele canal, que outro escopo não tem senão inundar-me de luz, nutrir-me do mel celeste, mais do que mãe celestial que nutre seu filho.
E se, recolhida em Deus, abro o livro da vida e leio as Palavras eternas, sinto cantar em minha alma uma harmonia luminosa e o Espírito de Deus irradiar em mim os seus dons.
Ao contato com um qualquer, nobre ou maltrapilho, vislumbro cada semblante transfigurado no Rosto belíssimo do Verbo encarnado, Luz da Luz.
Entrando na casa de irmãos que se amam, de famílias unidas em Cristo, vejo um reflexo divino da Trindade, ouço, expressa pela comunidade, a Palavra que é Vida:
Deus.
Deus é o ouro da minha cidade, diante do qual o sol se adumbra, o céu se encolhe, toda a beleza e a majestade da natureza se retiram felizes para formar coroa, para servir, qual moldura.

Esta cidade existe em cada cidade e todos podem vê-la, contanto que se apague em Deus, olvidando, nossa alma, e nela se acenda o fogo do amor divino.

24 fevereiro 2017

Vida trinitária


      No Movimento, desde os primórdios tínhamos entendido que a fidelidade ao amor mútuo, vivido segundo o modelo de Jesus crucificado e abandonado (eis aí o “como”!), desembocaria na unidade segundo a vida da Santíssima Trindade.

      “Sabe até que ponto nos devemos amar?” — perguntamo-nos um dia, sem que, até então, tivéssemos conhecido o Testamento de Jesus — “Até nos consumarmos em um.” Como Deus, que, sendo Amor, é Trino e Uno.

      É exatamente “a lei do Céu” — escrevi eu então — “que Jesus trouxe à terra. É a vida da Santíssima Trindade que nós devemos procurar imitar, amando-nos entre nós, com a graça de Deus, como as pessoas da Santíssima Trindade se amam entre si”.

      E o dinamismo da vida intratrinitária é o mútuo e incondicional dom de si, é a total e eterna comunhão (“Tudo o que é meu é teu e tudo o que é teu é meu” [Jo 17,10]) entre Pai e Filho no Espírito.

      Portanto, percebemos que Deus imprimira no relacionamento entre os homens uma realidade análoga. “Senti” — escrevíamos ainda — “que fui criada como um dom para quem me estava próximo e quem me estava próximo foi criado por Deus como um dom para mim. Como o Pai na Trindade está todo para o Filho e o Filho está todo para o Pai.” E “a relação entre nós é o Espírito Santo, a mesma relação que existe entre as Pessoas da Trindade”.


23 fevereiro 2017

Vigilância


Para amar a Deus é necessário cumprir a sua vontade.
Mas a sua vontade mostra-se momento por momento.
Pode exprimir-se por circunstâncias alheias, pelas próprias obrigações, pelos conselhos de pessoas sensatas ou que nos representam Deus.
Ou mesmo por um imprevisto doloroso, ou alegre, ou desagradável, ou indiferente.
Quem a compreende é o espírito atento, a alma vigilante.
Não é à toa que o Evangelho fala com tanta freqüência em vigilância.
E é justamente o Evangelho que concentra o homem no presente quando manda pedir ao Pai o pão só para "hoje", não querendo que ele se preocupe com o futuro, quando convida a carregar a cruz de "hoje" e lembra que basta o afã de "cada dia". É ainda o Evangelho que adverte: "Quem põe a mão no arado e olha para trás não é apto para o Reino de Deus" ( Lc 9,62). Para nos habituarmos a viver bem o momento presente, nós cristãos devemos saber esquecer o passado e não nos preocupar com o futuro.
Isto é sabedoria elementar, já que o passado não mais existe, e o futuro existirá quando se tornar presente.
Catarina dizia: "A fadiga que passou não mais a temos, pois que o tempo se foi; a que está por vir não a temos, pois não estamos certos de ter o tempo".
Os grandes e os santos conhecem esta norma.
Acostumam-se a discernir a voz de Deus entre as diversas vozes interiores.
E, neste exercício contínuo, o discernimento torna-se cada vez mais fácil, porque a voz se robustece e se amplifica.
No começo, talvez não seja tão fácil.
Então, com perfeito abandono em Deus, é preciso acreditar em seu amor e cumprir com decisão aquela que acreditamos ser a sua vontade e com a confiança de que, se não for, Ele nos colocará de volta no trilho certo.
E também, no caso de à vontade de Deus se mostrar clara, como quando ela convoca a um trabalho que deve durar horas, sempre há a tentação a vencer, um escrúpulo a banir, uma preocupação a se colocar no coração de Deus, pensamentos estranhos a afastar e anseios diversos para renunciar.
Viver o presente é uma idéia e uma praxe extraordinariamente rica.
Viver o presente insere a nossa vida terrena no curso da vida eterna, já desde agora.


22 fevereiro 2017

Viver a vida

O cristão é chamado a viver a vida, a nadar na luz, a abismar-se nas cruzes, mas não a enlanguescer. Nossa vida, ao contrário, às vezes é apagada; a inteligência, obscurecida; à vontade, indecisa. É que, educados neste mundo, fomos acostumados a viver uma vida individualista, que está em contradição com a vida cristã.
Cristo é amor e o cristão não pode deixar de sê-lo. E o amor gera a comunhão, a comunhão como base da vida cristã e como vértice.
Nesta comunhão, o homem não vai mais sozinho até Deus, mas caminha para Ele em companhia. Isto é um fato de incomparável beleza, que faz ressoar dentro da alma o versículo da Escritura: <Como é bom, como é agradável habitar todos juntos, como irmãos! (Sl 133[132],1).
A comunhão fraterna é uma conquista perene, com o resultado contínuo não só de manter esta comunhão, como de propagá-la entre muitos, porque a comunhão é amor, é caridade, e a caridade é difusível por natureza.
Quantas vezes, entre irmãos que decidiram caminhar unidos para Deus, a unidade enlanguesce, uma poeira se interpõe entre alma e alma, e cai o encanto, porque a luz que surgira entre todos lentamente se apaga!
Esta poeira é um pensamento ou um apego do coração a si mesmo ou aos outros; é amar a si mesmo por si mesmo e não por Deus; ou ao irmão ou aos irmãos por si mesmo e não por Deus; outras vezes, é o retrair a alma que se lançara pelos outros; é concentrar-se no próprio eu, na própria vontade, e não em Deus, no irmão por Deus, na vontade de Deus.
É amiúde um juízo incorreto sobre quem vive conosco.
Havíamos dito que queríamos ver somente Jesus no irmão, que trataríamos com Jesus no irmão, que amaríamos a Jesus no irmão, mas agora vem à mente a lembrança de que aquele irmão tem este ou aquele defeito, tem esta ou aquela imperfeição.
O nosso olhar se complica e o nosso ser não está mais iluminado. Conseqüentemente, rompemos a unidade, errando.
Talvez aquele irmão, como todos nós, tenha cometido erros; mas como Deus o vê? Qual é, na realidade, a sua condição, a verdade do seu estado? Se está em ordem diante de Deus, Deus não se lembra de mais nada, já cancelou tudo com o seu sangue. E nós, por que lembramos?
Quem está errado naquele momento? Eu, que julgo, ou o irmão? Eu.
Devo, pois, dispor-me a ver as coisas na perspectiva de Deus, na verdade, e tratar de igual modo com o irmão, pois, se por infelicidade, ele ainda não se tivesse reconciliado com o Senhor, o calor de meu amor, que é Cristo em mim, poderia induzi-lo ao arrependimento, assim como o sol absorve e cicatriza tantas chagas.
A caridade mantém-se com a verdade e a verdade é misericórdia pura com a qual devemos estar revestidos dos pés à cabeça, para podermos nos dizer cristãos.
O meu irmão retorna?

Devo vê-lo novo, como se nada houvesse acontecido e reiniciar a vida junto com ele, na unidade de Cristo, como da primeira vez, porque nada mais existe. Esta confiança o salvaguardará de outras quedas. E eu também, se com ele tiver usado tal medida, poderei ter esperança de ser, um dia, por Deus assim julgado.

21 fevereiro 2017

VIVER DENTRO


Queremos converter‑nos Senhor. Até hoje, vivemos "fora", doravante, devemos viver "dentro", como Maria.

Porque, mesmo o viver "fora", voltado para o próximo ou para as obras ‑ ainda que seja por amor a Deus se não for corrigido por uma força espiritual que atrai a alma continuamente para o seu íntimo, pode tornar-se motivo de divagação, com muito tagarelar inútil, com "coisas santas" dadas aos "cães".

Viver "dentro", crescer interiormente, desapegar‑se de tudo, não para permanecer suspenso entre o céu e a terra, mas "enraizado" no Céu, fixo no coração de Cristo, através do Coração de Maria, numa vivência trinitária, prenúncio da vida que virá.

Viver "dentro" e oferecer ao próximo unicamente a seiva que jorra do Céu dentro de nós, a fim de o servirmos realmente e não o escandalizarmos com a nossa tão pouca santidade.

Viver "dentro", como Maria, a inigualável, a Mãe amada, a Rainha, a Guia que vence Satanás ancorada em Deus e não através de atitudes exteriores tão distantes dela como a terra do céu.

Viver "'dentro", pregados na cruz por nossas próprias mãos, para que Cristo continue, também através de nós, a obra de reunificação de um mundo volúvel que sofre, que espera, que quer esquecer, que tem medo, e do qual se compadece hoje o nosso coração como ontem se compadeceu das multidões o de Jesus.

Viver "dentro", para arrastar o mundo que vive apenas "fora", aos abismos dos mistérios do espírito, onde nos elevamos, repousamos, recebemos conforto, ganhamos novas forças e reencontramos alento para voltar à terra e continuar a batalha cristã até a morte.

Às vezes, levamos muito tempo para nos desprendermos dos negócios, do mundo e das coisas, para
nos recolhermos e nos concentrarmos em Deus; contudo, logo que o fazemos, não mais desejamos voltar atrás, tão suave é para a alma a união com Deus.
                       
            Deus está dentro de nós em solidão e não é possível encontrá‑lo sem que enfrentemos corajosamente, tam­bém nós, a solidão.
                                   
            Se Deus mostrasse a uma alma todas as dores que lhe reservou durante a vida, ela morreria no impacto. 0 mesmo aconteceria, se Deus mostrasse todas as ale­grias que a alma experimentará na vida.
                       
            Deus sabe e dosa. A alma não sabe, mas abandona‑se nas mãos de Deus, que a ama.
                       
            Se o silêncio do cimo das montanhas, se a imensa e solitária amplidão do mar, se uma excursão entre o céu azul e a branca rocha, se uma viagem de avião a dez mil metros, exercem uma real atração nas pessoas espirituais porque as levam ao recolhimento espontâ­neo e à oração, como se sentirão envolvidos pela oni­presença de Deus aqueles que, com a fé no coração, puderem afastar‑se desta terra e correr entre os espa­ços!                    
Deus!  Primeiramente 0 escolhes como o Tudo da tua vida, excluindo todo o resto que descobres fátuo e vão. Depois, contemplas com os Seus olhos os homens e as coisas, o mundo e a história, os acontecimentos grandes e pequenos... e 0 amas, presente na natureza e nos séculos.
Finalmente 0 "sentes" no fundo do teu coração. E Aquele, cuja existência aceitavas pela fé, manifestar-se‑á de um modo real, por mística e tangível demonstração. E acreditas que Ele existe, porque Ele está realmente no fundo da tua alma.

Caminhemos pelo mundo, encouraçados em nossa interioridade onde vive Deus. Saiamos somente para servi‑Lo no irmão ou no trabalho, tendo nas atitudes e no olhar a paz -  haurida no silêncio amoroso e infini­to da Santíssima Trindade que habita em nós ‑ e a luz ‑ que jorra como água inesgotável da Sabedoria eterna ‑ densa de alegria puríssima. Testemunhemos assim a
futilidade do mundo que nos circunda, para afirmar­mos, com os fatos, a existência de um outro mundo de maior valor, de maior importância e que há de rei­nar.

É necessário que a nossa alma se recolha e se encontre com Deus. Se não estiver fixada neste único centro é como um pião que corre desgovernado, batendo de um lado e de outro. Centrada em Deus, cada uma das suas ações adquire significado, cada uma de suas atitudes para com os homens e as coisas se situa num plano sobrenatural. Caso contrário, tudo se esvai e não se percebe mais o motivo da existência.

            Não é verdade Senhor, que toda a nossa vida seja dor.

Não é verdade, Senhor, que a sombra da cruz amargure todos os dias de nossa existência. É muito mais verdadeiro dizer que, para os que te amam, a dor representa uma grande parte, insubstituível; mas não é a única coisa que encontramos ao seguir‑te, pois vemos sobretudo a Ti, que és Amor, e transformas cada dor em encantamento. Assim a vida é vivida com centuplicado ardor.

Quando o homem se inclina, adorando a Deus presente no seu coração, não tem a sensação de estar se retraindo sobre si mesmo ou diminuindo‑se, mas abre‑se para horizontes mais vastos do que os contemplados pelos que voam pelo céu, mais amplos do que aqueles entre as miríades de estrelas.

É a dimensão do espírito que supera qualquer limite e mergulha a alma em abismos de amor, onde freqüentemente se desfaz em lágrimas porque o contato com Deus, a quem inadequadamente serve, lhe é mais íntimo do que ela própria.

Se amares a Deus por longo tempo, e Ele te escavar a alma com abismos como só Ele é capaz, sentirás que não é mais possível perdê‑Lo. Se por acaso, a fim de servi‑Lo, tu deixas este colóquio direto, no primeiro instante em que te encontrares só, Ele voltará e Tu lhe falarás e saberás que Ele está presente, pois todo o teu ser clama por Ele só e, sem Ele, és como um nada sem sentido.

Sem dúvida, Senhor, deves dominar o mais íntimo da alma dos teus servos, pois que muitas vezes, quando eles se recolhem para trabalhar, Tu os atrai para o mais íntimo do seu ser a fim de que retifiquem a intenção, segundo a tua vontade e te ofereçam, qual incenso, tudo o que fizerem.

Quando reencontramos na solidão o contato contigo, reencontramos o contato com os homens e com as coisas, não como escravos mas como filhos de Deus.

Alegrias e dores, consolações e angústias, arrependimentos e ressurreições, permissões de Deus e luminosas vontades suas, conquistas e perdas dolorosas, aprovação dos homens e difamações, lenta edificação de obras para a glória de Deus e florescer de conversões, tudo, ainda que no meio do joio de Satanás, semeado por toda parte, tem sempre, se amamos a Deus, um só destino, um único motivo: levar‑nos à união com Deus.

Que sempre resplandeça no íntimo de nosso coração e tudo viva em função de Ti, em torno de Ti. Depois, não importa onde, como, se ou mas...

Senhor, faze com que vivamos e voltemos com freqüência, durante o dia escuro desta vida, ao outro Reino que está acima de nós, dentro de nós e que existirá depois de nós: o Reino onde o teu Nome é santificado, o Reino cujo advento, não será mais necessário pedir, após a chegada de todos.


Ali vivem os Santos, os Bem‑aventurados, com a Virgem e o teu divino Filho na Trindade. E lá podemos de vez em quando nos retirar, a fim de trazermos para este mundo fátuo e vazio, órfão e solitário, triste e cheio de melancolia, aquele amor indefinível e suavíssimo que tudo anima, tudo penetra.

Senhor, toma a nossa vida de tal forma imbuída de sobrenatural que, quando estivermos sós, caminhando, trabalhando ou estudando, quem passar ao nosso lado sinta o teu perfume. E quando juntos, quem nos encontrar sinta‑se fortemente atraído, a mergulhar no Reino de Deus, presente no meio de nós.
           
            Quando a hélice de um avião gira vertiginosamente, não se consegue mais vê‑Ia. Quando uma alma
ama com intensidade, perde o seu peso humano e toma‑se transparente.
           
            Se, todavia, a hélice em movimento é tocada pelo sol, reluz em todo o seu esplendor. Do mesmo modo a alma que "vive". Em cada encontro com Deus transborda de Luz e canta com Maria: “A minha alma glorifica o Senhor"'.

            Às vezes, Senhor, existe algo no íntimo dos corações dos teus filhos, que atrai mais fortemente que inúmeras preferências naturais ou espirituais; algo mais puro que o ar do alto das montanhas algo mais vivo que qualquer outra vida, mesmo plena, pois ela parece loucura ou distração, diante da voz imperiosa que se ouve interiormente com grande ressonância.

            "Jamais colherei uma flor," diz S. João da Cruz, para nos ensinar a não pararmos nas consolações terrenas... Sim, "jamais colherei uma flor" Te repetem estas almas, porque a flor das flores nasceu no fundo do pântano dos seus corações, como um milagre divino.

            Aqueles que Te amam com sinceridade, não raro Te sentem, Senhor, no silêncio do seu quarto, no profundo do seu coração, e esta sensação comove a alma como se cada vez atingisse o seu íntimo.
E Te agradecem por estares tão próximos deles, por seres tão plenamente o seu Tudo: aquele que dá sentido ao viver e ao morrer.
           
            Agradecem‑Te, mas muitas vezes não sabem fazê‑lo nem dizê‑lo. Sabem apenas que Tu os amas e que eles Te amam e que não existe algo mais suave aqui na terra que de longe ao menos lhe possa ser comparável. 0 que sentem na alma, quando Tu apareces, é Paraíso e "se o Paraíso é assim ‑dizem ‑ oh! como é esplêndido!”

            Agradecem‑Te, Senhor, pela vida inteira, por conduzi­-los até aqui. E se exteriormente ainda existem nuvens que poderiam ofuscar o seu paraíso antecipado, quan­do Tu Te manifestas, tudo se toma remoto e distante: nada existe. Tu existes. Assim é.
Se não fecharmos as janelas da nossa alma com o recolhimento, Tu não poderás, Senhor, entreter‑Te conosco, como o teu amor, às vezes, desejaria.

Nós somos tão mesquinhos que, muitas vezes, para não fazermos o menor esforço, reduzimos a nossa alma a uma praça, onde todas as coisas do mundo surgem, entram e conversam. Deste modo, Tu, que nos ensinaste que não é bom dar as coisas santas aos cães, Tu que és o Santo, não Te podes dar a nós, embora muitas vezes o queiras, embora o nosso esforço, por pouco que seja, fosse imensamente recompensado pelo teu amor. Pois ele nos confortaria e sustentaria, dando‑nos a força para viver uma vida mais real no meio do permanente outono do mundo.

Pode‑se chegar a um ponto em que uma palavra diz à alma todo um conteúdo divino, tão pleno, tão novo, que basta a própria palavra para exprimi‑lo, embora se perceba que ela não é suficiente para comunicá‑lo aos outros. Por exemplo: "Jesus", "Maria".

O grão de trigo desenvolve a sua vida debaixo da terra, coberto por uma camada de neve. De maneira análoga, a alma amadurece a sua união com Deus, isolada por uma camada de abandono.

20 fevereiro 2017

O CÓDIGO DA REVOLUÇÃO CRISTÃ


O EVANGELHO não é um livro como os outros. Onde ele finca raízes, provoca a revolução cristã, porque dita leis não só para a união da alma com Deus, mas das pessoas entre si, sejam elas amigas ou inimigas. E pede, qual imperativo supremo, a unidade de todos, o Testamento de Jesus realizado, pelo menos naquela porção da sociedade em que os cristãos que vivem a Palavra estão inseridos. E, em todos os lugares onde um deles vive, até o deserto floresce.
      O EVANGELHO é portador da vida mais fascinante, acende a luz no mundo, dá sabor à nossa existência, guarda em si o princípio da resolução de todos os problemas.
      SÓ É POSSÍVEL conceber uma sociedade seriamente renovada se se formarem “homens novos”, renovados pelo Evangelho. Cada um deles, então, em seu ambiente, externará a própria fé cumprindo seus deveres, e as estruturas eficazes já existentes adquirirão novo valor, as ineficientes cairão e as que faltam germinarão.
      NÃO É PRECISO ir muito longe para encontrar remédio e solução para as fumaças que empestam a atmosfera do mundo. O Evangelho é a saúde eterna, e quem até morre, em nome dele e por ele, desaparecendo, ignorado talvez por todos, inclusive em nossos dias, vive. Ele, porque amou, e perdoou, e defendeu, e não cedeu, é um vitorioso e, como tal, é acolhido nos páramos eternos.
      Mas o Evangelho não há de ser apenas a norma da nossa morte. Ele deve ser o pão cotidiano da nossa vida.
      O MUNDO é monótono e apagado, inclusive porque, ávido de novidades, se afoga nas notícias veiculadas todos os dias nos jornais que seduzem e decepcionam.
      Talvez, se alimentássemos mais frequentemente a alma com Palavras eternas que venceram o mundo e a ele resistiram com sabedoria e ciência, nós a mergulharíamos em águas salutares, retirando-a depois, mais feliz e mais ela mesma, porque marcada de imortalidade.
      É INÚTIL não admitir. Não somos cristãos como Jesus gostaria que fôssemos, a não ser em casos raros.
      Se observássemos, por exemplo, as bem-aventuranças, não encontraríamos edifícios de sofrimento, mas casas onde se alçam – na medida do possível – hinos de agradecimento ao Senhor. Não encontraríamos suportação, mas “paz” nos corações e mansidão nos filhos de Deus na conquista da terra. Não encontraríamos pessoas emaranhadas nas sujeiras do mundo, mas olhos que, mesmo estando no mundo, veem a luz de Deus. Não encontraríamos pobreza, mãe de miséria espiritual, mas riqueza de Reino de Deus. Não encontraríamos ira, ódio, vingança, falta de perdão, porque todos os relacionamentos humanos seriam temperados pela misericórdia.
      Mas, ao contrário, o mundo é uma melancolia perene e são esquecimento os locais do choro, choro perene, e os locais dos mortos, embora vivos para a verdadeira vida.
      O mundo – embora cristão – continua o que é porque os cristãos não se amam. Eles, não se amando, não põem Cristo entre eles, e Jesus não pode sussurrar às suas almas os verdadeiros valores do Evangelho, e onde não existe comunhão existe pouco cristianismo.

19 fevereiro 2017

Coração da humanidade

            Narra a Escritura que bastaram à Serpente poucas palavras para induzir a mulher ao pecado e a ele arrastar, atrás dela, o gênero humano.
            “Não, não morrereis! Mas Deus sabe que, no dia em que dele comerdes, vossos olhos se abrirão e vós sereis como deuses, versados no bem e no mal” (Gn 3,4-5). E ela acreditou.
            O fenômeno de então repete-se de quando em quando com tonalidade diversas, mas, de qualquer modo, tem em comum o lisonjear e transferir o gênio feminino – sempre dedicado e, portanto mais propenso às coisas grandes, até mesmo no erro – para um plano diferente do seu.
            Também hoje, na balbúrdia de mil vozes que exaltam ora uma, ora outra deformação do pensamento, uma tendência infiltrou-se e avançou muito: conceber e fazer a mulher entender – tendo na base o dolo – que “serás como o homem”.
            Procura-se exaltá-la para depois precipitá-la no abismo do absurdo, após tê-la defraudado daquilo que realmente constituía a sua beleza.
            A mulher não precisa dar ouvido a essas vozes desafinadas para cantar aquilo que o criador nela imprimiu e que é insubstituível.
            Houve uma vez respeitabilíssima, a do papa Pio XII, o qual, além dos sobrenaturais, aliava em si a idade do sábio e um entendimento secreto e profundo com Nossa Senhora. Ele, lapidarmente, definiu a mulher – e creio que ninguém no mundo jamais tenha chegado a tanto – como “obra-prima da criação”.
            Basta isto para dizer o amor de Deus para com o sexo feminino.
            Mas a mulher será uma obra-prima se realmente for mulher.
            Em seu ser - mulher está a certeza de cada atributo seu.
             A mulher é meiga, a mulher tem o coração palpitante de religiosidade, talvez porque, mais do que o homem tem o sentido e a constância no sacrifício, na dor, na qual, em última análise, o Evangelho se concentra como último passo para o amor.    
            Como mãe, e mãe santa, ela é o instrumento primeiro, benéfico, insubstituível, não só de ensinamento retos, mas de união entre os corações dos filhos que, para compor uma sociedade eficaz e produtiva, sã e saneadora, amanhã, de nada melhor precisarão do que perpetuar nela a união fraterna, base de toda paz duradoura. 
            A mulher deve ladear o marido em uma posição aparentemente secundária, mas é como a sombra de uma escultura que lhe confere relevo e vida. Através dela, se for realmente mulher, depois esposa, e depois mãe, o homem conhecerá o seu limite ao lado de um anjo que lhe mostrará com a maternidade o que sabe operar o Senhor, o Criador, o Dispensador de todo bem.
            Em tempos como os atuais, saturados de ateísmo e de aniquilamento do espírito, a mulher, com o seu natural instinto para Deus, com sua perene vocação para o amor, com sua perspicácia nas coisas e nos fatos, pela qual dá àquelas e a estes sabor e sentido, tem uma missão de primeira grandeza na renovação e recuperação da sociedade.
            E por realiza-la. Homens e mulheres, quando crianças, são criados e instruídos em seu regaço.
            Dela muito se espera hoje para a renovação da sociedade. Esta carência de Deus, este descaso que d’Ele se faz, esta luta aberta contra Ela, pode transformar-se amanhã numa expectativa, permitida pelo Céu, de uma grande época, triunfo de Deus, onde Ele, Majestade infinita, estará na boca de todos, no coração de todos, inspirador das mais belas artes, mentor nas mais altas descobertas, veia de poesia eterna, acorde de um canto novo.
            Após o temporal vem a bonança e quiçá o arco-íris.
            Esta aridez forçada, este ter privado o homem do elemento vital e vivificador, faz esperar e talvez prever um tempo não longínquo, em que a glória de Deus haverá de fulgir e os homens dirão uns aos outros com consolação e no pranto: “Onde estão os tempos em que Deus era esquecido ou até mesmo era proibido falar d’Ele?” E acrescentar-se-á: “Tinha razão Pio XII quando, olhando para o futuro, previa uma nova primavera”.
            Se as mulheres tiverem feito sua parte, poderão dizer: “Quando a mulher é outra Maria, quer dizer, virgem, mãe, esposa, pranto, paraíso, mas sobretudo “portadora de Deus”, pode fazer muito por todos, porque a mulher, se é mulher, é o coração da humanidade”.


18 fevereiro 2017

V – COM OS IRMÃOS DE IDEAL, MANTER Jesus NO MEIO, O RESSUSCITADO

“Fazer-se um com os irmãos de Ideal para não obscurecer NUNCA a presença de Jesus no meio, mas para mantê-La sempre vivíssima”.
“Jesus quer que nos amemos até o ponto de morrer um pelo outro. Ele não quer que nos amemos esperando morrer amanhã, ou depois de amanhã, ou no próximo ano, quer que morramos AGORA. Quer que vivamos mortos, mortos a nós mesmos, porque estamos vivos para o Amor. Então quando encontram-se duas pessoas que se amam desse modo, eis que acontece um fato extraordinário... “Onde dois ou mais estão unidos no meu nome – disse Jesus – (que quer dizer: neste Amor) Eu estou no meio deles” (que quer dizer: Neles).
Dois ou mais que se amam desta maneira, levam no mundo, geram no mundo uma nova chama: o próprio Jesus, o mesmo, o mesmo Jesus. É FABULOSO!!!
“Veio-me muitíssimo em relevo a importância deste modo de viver para manter em nós a Igreja viva, para levar conosco o Ressuscitado, como verdadeiros ‘Cristóforos’. Nós devemos ter continuamente esta tensão pacífica de fazer-se um com os outros, sem nenhuma outra preocupação além daquela de ‘viver o outro’. Para poder, sempre na nossa a vida, imitar de certo modo, Maria, que deu Jesus ao mundo... EE esta é a única obra útil que podemos realizar na vida”.
“Para chegarmos a isto é preciso a plena comunhão de alma, de idéias, de bens, etc. sabendo, no entanto, que isto pode significar perder, recomeçar, sofrer algo errado, para salvar a unidade dos espíritos: ‘É melhor o menos perfeito na unidade, que o mais perfeito na desunidade’”.
“Este ano entendemos que Ele queria ser encontrado pelos membros do nosso Movimento num lugar: EM MEIO A ELES. É isto o que Ele quer, é isto o que deseja. Podemos, de fato, pensar que um dos objetivos que Ele tinha em mente quando suscitou a nossa Obra, era justamente o de poder se estabelecer em todas as apartes, também fora das igrejas (construções), no meio das pessoas, nos lugares onde elas vivem, onde se encontram.
Então, abramos espaço para Ele no nosso meio, sobretudo entre as a pessoas do nosso ‘cacho’. De lá, Ele poderá irradiar amor e luz entre as muitas outras pessoas no mundo. Reavivando o nosso dever de serviço, fazendo-nos um reciprocamente, entre nós, tornamos possível a Sua Vida entre nós, facilitamos a Sua Vida entre nós”.


17 fevereiro 2017

IV – FAZER-SE UM

“A alma que quiser levar a Unidade, deve manter-se, constantemente, num total abismo de humildade ao ponto de perder até mesmo a sua alma em favor do próximo e a serviço de Deus nele”.
“Naturalmente é preciso servir com inteligência. Eis o porquê da quarta idéia que devemos ter em mente: como se faz para servir bem, para servir com inteligência?
São duas palavras ‘mágicas’, também isto é cristianismo: FAZER-SE UM COM O OUTRO. O outro sofre? Devemos sentir com ele suas dores; o outro está contente? Devemos sentir as suas alegrias; o outro tem uma preocupação? Devemos sentir a sua preocupação. FAZER-SE UM com o outro.
Em resumo: devemos dissolver este coração  que é de pedra e ter um coração de carne para amar os outros, para sentir com os outros, para viver os outros, isto é importante, isto é servir”.
“Fazer-se um em tudo, em tudo, exceto no pecado. Você poderia dizer: ‘Mas que perda de tempo, olhar aquilo na televisão, que perda de tempo dar um passeio...’. Não, o tempo não é perdido, é todo amor, é tudo tempo ganho, porque é preciso fazer-se um por amor. Se hoje todos nós levássemos estas palavras: FAZER-SE UM POR AMOR, isto é, DESINTERESSADAMENTE, seríamos bastante felizes. Fazer-se Um por Amor, não para ganhá-los a Cristo, nem mesmo por um interesse sobrenatural. Nada! Fazer-se Um. Fazer-se Um. Além do mais constatei que com pessoas que talvez não queiram saber nada de Jesus Cristo, o que sucede? Aquelas pessoas retornam, porque se sentem livres.

Este fazer-se um exige a morte de nós mesmos, porque não podemos mais viver por nós mesmos, mas para os outros. Mas, esta nossa morte é vida em nós, é Cristo em nós. E então, se é Cristo em nós, sobre a nossa morte, todos, pouco a pouco, cedo ou tarde, são atraídos por Cristo. Jesus disse: “Quando eu for levantado sobre a cruz, atrairei TODOS A MIM.” E então, também a Cruz, isto é, o matarmos para deixarmos com que Cristo viva em nós, pouco a pouco todos são conquistados. Esta é a grande experiência do Movimento dos Focolari.”

16 fevereiro 2017

III – O SERVIÇO

“Quem quer realizar a unidade deve ter um único direito: Servir a todos, porque em todos serve a Deus”.
“A Unidade... com Deus... pressupõe o anulamento total, a humildade mais heróica... A Unidade com os outros é alcançada ainda através da humildade: ASPIRAR constantemente ao PRIMADO, colocando-se o mais possível a serviço do próximo”.
“Poderia dizer: Mas devo realmente dar-lhe uma camisa quando ele está sem camisa? devo realmente levar-lhe o prato à mesa?”. Olhe, o serviço que Jesus pede, não é um serviço ideal, não é um sentimento de serviço. Se vocês estudarem bem o Evangelho, verão que Jesus falava de um serviço concreto: com os músculos, com as pernas, com a cabeça... É preciso realmente servir”.
“Toda a Sabedoria do cristianismo encontra-se numa única palavra, e também toda a sua revolução, e esta palavra é: SERVIR. No mundo procura-se estar em evidência, oprimir os outros, mandar; Jesus disse-nos justamente o contrário e deu-nos o exemplo com o lava-pés, ele que era o ‘Mestre e Senhor’. Ele quer que nós sirvamos a todos”.
“Façamos tudo o que devemos fazer com espírito de serviço, tanto se o nosso trabalho é dirigido à expansão do reino de Deus, quanto se é realizado entre as paredes domésticas, ou voltado ao bem da comunidade civíl.
Se virmos Cristo em cada próximo com que tratamos: dependentes, superiores, iguais (Ele considera feito a si tudo aquilo que fazemos aos outros, em particular aos mais necessitados), será mais fácil termos este comportamento.
Sirvamos sempre, sirvamos a todos, sirvamos bem.
Que Deus nos conceda a graça de deixar pasmado o mundo, repleto de soberba, faminto de domínio, com o nosso comportamento cristão desinteressado, de serviço a todos”.



15 fevereiro 2017

II – QUEM É O PRÓXIMO?

“O importante é termos uma única idéia a respeito do próximo. O próximo é o irmão que passa ao nosso lado no momento presente da vida”.
“Portanto, o Amor não deve ser abstrato, Ideal, mas um Amor concreto: o meu próximo é este que está ao meu lado, é este que senta atrás de mim na escola... É preciso amar não de um modo ideal (abstrato) e futuro, mas de um modo concreto e presente, AGORA. É preciso amar, é preciso Amar.”
“Aquilo que mais nos impressionou, olhando uma destas biografias, foi de que o novo Santo (Pe. Maximiliano Kolbe), ...diante de um prisioneiro, destinado a morrer de fome no Bunker da morte, desconhecido dele, mas que se tornou, num momento presente da sua vida, seu próximo, esqueceu-se de imediato toda a grande obra (que estava realizando não por interesse próprio, mas em favor do Reino de Deus), toda a vasta atividade cultural, as suas cidadelas da Imaculada, os seus filhos espirituais, os seus escritos, para tomar o lugar de um outro.
Pe. Maximiliano Kolbe não podia pensar que, com aquela obra, que tinha feito com que surgisse na Igreja, podia glorificar a Deus mais vivo do que morto?

Ele, pelo contrário, não hesitou e ofereceu a sua vida para salvar a de um pai de família”.

14 fevereiro 2017

I – TODOS OS HOMENS SÃO CANDIDATOS À UNIDADE


 “Dirigir sempre o olhar ao único Pai de muitos filhos, e depois, olhar todas as criaturas, como sendo filhas do único Pai. Ultrapassar sempre, com o pensamento e com o coração, todo limite colocado por causa da natureza humana e tender constantemente e por hábito adquirido à FRATERNIDADE UNIVERSAL, num único Pai: Deus!”
“Eis a primeira idéia, que pode desde já revolucionar a nossa alma se formos sensíveis ao sobrenatural: A FRATERNIDADE UNIVERSAL, que liberta-nos da escravidão. Somos de fato escravos das divisões entre pobres e ricos, entre pais e filhos, entre raças, entre nacionalidades, até mesmo entre bairros; nos criticamos, existem obstáculos, barreiras...”
aquilo que devemos fazer é desligarmo-nos de todas estas escravidões e ver  em todos os homens, candidatos à Unidade. “’Também meu filho? – poderia perguntar a mãe.’, ‘Também aquela mulher tagarela?’, ‘Também aquele velho?’, ‘E aquela pobrezinha?’;  ...Será possível? SIM, em todos devemos ver possíveis candidatos à Unidade com Deus e à Unidade entre nós. É preciso escancarar o coração, romper com todas as amarras e colocar no coração a fraternidade Universal e dizer: EU VIVO PELA FRATERNIDADE UNIVERSAL”.
“Nós somos chamados a colaborar para realizar o “Ut Omnes” (Que todos sejam um) e então, antes de tudo, reavivemos a nossa fé de que cada homem é chamado à Unidade, porque Deus ama a todos. E não coloquemos desculpas dizendo: aquele nunca entenderá... aquele é muito pequeno para compreender... Não. Coloquemos de lado todos estes juízos. Deus Ama a todos, Deus espera por todos”.


13 fevereiro 2017

Imagem poema


TRABALHAR COM PERFEIÇÃO E AMOR[i]

Devemos procurar crescer e melhorar a maneira como realizamos o nosso trabalho. O Trabalho que, como sabemos, é um outro aspecto da nossa vida, não só da vida humana, mas da “ideal” também. Melhorar o nosso trabalho porque através dele – seja de que natureza ele for – servimos à comunidade e, também desta maneira, “damos a César o que é de César”.
Como melhorar, então, o trabalho, os nossos pequenos trabalhos diários? Lembrando-nos de que por trás daqueles trabalhos que muitas vezes nós, sozinhos, elaboramos numa escrivaninha, por trás daquele duro trabalho no campo que somos obrigados a fazer, por trás da lição que preparamos, por trás daquelas roupas que devemos costurar ou daquelas palestras ou programas que devemos preparar, estão os irmãos, ou melhor, está Jesus, que considera que tudo o que fazemos pela comunidade ou a cada pessoa individualmente, foi feito para Ele, que nos diz: “Dai a César o que César”.
Então, se é assim, como realizar o nosso trabalho?
Não há dúvida que ele deve ser feito com perfeição e com amor. Aliás, nós já o sabemos: devemos possuir um elevadíssimo conceito do trabalho, por isso devemos fazê-lo com perfeição.
Mas, hoje, eu quero frisar que o trabalho deve ser realizado, principalmente, com amor.
Com amor. Com amor para com Jesus ou aqueles pequenos Jesus para os quais trabalhamos.
Será, então, necessário considerar estes vários Jesus que vivem nos nossos irmãos, que esperam, muitas vezes ansiosamente, aqueles documentos que a burocracia, lenta, tantas vezes, demora em fazer chegar às suas mãos, que esperam o pão que nascerá do campo que cultivamos, a instruções que o nosso ensinamento lhes proporcionará, a roupa que lhes servirá, a comida que os alimentará, a palavra ardente que os manterá vivos e inflamados para trabalhar pelo Reino de Deus. Fazer cada coisa de modo que tudo seja útil e agradável para eles.
Portanto, devemos trabalhar “fazendo-nos um” com cada pessoa e com a coletividade que devemos servir.
“Fazer-se um”- uma expressão que sempre ilumina a tudo. “Fazer-se um” como Deus, que por amor não só se “fez um” conosco, mas também tornou-se carpinteiro para servir aos outros, de homem para homem e dar a César o que é de César.
“Fazer-se um”, isto , descer – se podemos dizer “descer” – ao nível dos nossos irmãos necessitados, “fazer-se um” com as suas exigências, com as suas preferências. Ser um deles.
Certa vez Charles de Foucauld, ao falar do amor que devemos ter para com os outros, disse: “... quando amamos alguém, nós nos transferimos para ele, estamos nele com o amor, vivemos nele com amor, não vivemos mais em nós mesmos, uma vez que não é mais a nós mesmos que nos “apegamos”. Estamos “desapegados” de nós, “fora de nós mesmos”; não vivemos mais em nós mesmos, estamos naquele que amamos, vivemos sua própria vida... Assim como o Pai vive no Filho pelo amor que dirige a ele, assim devemos nós viver em todos, mediante o amor que temos por eles. E devemos amar a todos até este ponto.”[ii]
Então, durante estes quinze dias, façamos tudo perfeitamente. Diz a imitação de Cristo: “Muito faz quem muito ama, muito faz quem faz bem uma coisa”.
Que toda obra saída de nossas mãos seja uma obra-prima. Mas é preciso fazê-la também com amor. Que ela seja esculpida pelo amor que vem do nosso coração, que é controlado pela voz da consciência, que por sua vez é iluminada pelo Espírito Santo, que nunca nos deixa de repreender cada vez que não fazemos bem as coisas, ou de aprovar-nos, consolando-nos, quando tudo vai bem. 



[i] (Coligação – Rocca di Papa, 04 de outubro de 1984 – Livro Companheiro de Viagem – Pág. 46)

[ii] Cf. Charles de Foucauld, in Santi, vol. VII, pág. 100, Città Nuova, Roma.

12 fevereiro 2017

Estava enfermo


      Vi um homem numa enfermaria de hospital, engessado. Tinha o tórax e um braço, o direito, imobilizados. Com o esquerdo, defendia-se para fazer tudo… como podia. O gesso era uma tortura, mas o braço esquerdo, embora mais cansado à noite, fortalecia-se trabalhando por dois.

      Nós somos membros uns dos outros e o serviço recíproco é nosso dever. Jesus não só nos aconselhou isso, Ele mandou.

      Quando servimos alguém pela caridade, não pensemos que somos santos. Se o próximo está sem ação, devemos ajudá-lo, e ajudá-lo como ele mesmo se ajudaria, se pudesse. Do contrário, que cristãos somos nós?

      Se mais tarde, chegada a nossa vez, precisarmos da caridade do irmão, não nos sintamos humilhados.

      No dia do juízo final ouviremos Jesus repetir: “Estava doente e me visitaste” (Mt 25,36), estava preso, estava nu, estava com fome… Jesus gosta de se esconder justamente no sofredor, no necessitado.

      Portanto, sintamos também naquela hora a nossa dignidade e agradeçamos de todo o coração a quem nos ajuda; mas, reservemos o agradecimento mais profundo a Deus, que criou o coração humano caridoso; a Cristo que, proclamando com seu sangue a Boa Nova, sobretudo o “seu” mandamento, levou um número sem fim de corações a se desdobrarem em ajuda mútua.

      Com este mandamento, Jesus distinguiu os cristãos de todos os séculos daqueles que não entraram ainda em sua Igreja. Se nós, cristãos, não manifestamos essa característica, somos confundidos com o mundo e perdemos a honra de ser considerados “filhos de Deus”. E — como insensatos — deixamos de usar a arma, talvez mais forte, para testemunhar Deus em nosso ambiente, gélido em razão do ateísmo, paganizador, indiferente e supersticioso. Que o mundo, atônito, possa contemplar um espetáculo de concórdia fraterna e diga de nós — como dos que gloriosamente nos precederam: “Vede como se amam”.



11 fevereiro 2017

Deus


O Movimento começou com este grande nome que resumiu toda a sua vida: Deus!
Deus – a Trindade – mostrou-me como o sol no alvorecer de um mundo que reencontrava a paz depois do fragor da guerra; e ofereceu a nós, seus filhos, uma vida mais divina do que aquela que já levávamos, mais cristãmente coerente, mais íntegra.
Outras jovens tinham sido chamadas, em lugares, tempos e circunstâncias diversas ao mesmo ideal. Entre estas recordávamos com freqüência Clara de Assis.
“ Filha, o que desejas?”  - perguntou-lhe Francisco quando ela, aos dezoito anos, fugira de casa para seguir o Senhor. “Deus!”  - respondeu.
Deus, esta única, infinita realidade, devia resumir também para nós, sob o impulso da graça, todas as nossas aspirações, num desejo ardente de sermos fiéis a ele por toda a vida, como foram os santos.
Deus, portanto, e nada mais, pois qualquer outra pessoa ou coisa teria diminuído o encantamento do chamado divino.
Deus, que para nós foi logo, desde o primeiro instante, sinônimo de amor: o Amor!
Assim o apresenta a Escritura: “Deus é Amor”.
Deus, tudo para nós. Deus Amor. Foi uma grande novidade  para a nossa rotineira vida espiritual, uma novidade tão grande que operou uma verdadeira conversão.
Antes, de fato, embora procurássemos ser boas cristãs e estar na graça de Deus, vivíamos como órfãs, como pessoas que tinham pai e mãe, mas... somente terrenos. Depois, tendo conhecido de um modo novo Deus Amor, sentimo-nos mais conscientemente filhas do Pai que está nos céus. E duma certa maneira pudemos repetir com Francisco de Assis: “ Não mais pai Bernardone, mas Pai nosso que estais nos céus”.
Ia-se delineando para nós uma relação entre céu e terra, um novo acorde entre filhos e Pai. Foi o desenvolver-se de uma nova fé. Não se tratava somente da fé no seu amor; por isso, nada nos parecia mais adequado para a vida que estávamos iniciando do que a frase: “E nós acreditamos no Amor”.  Esta fé no amor de Deus por nós, cada um de nós, por todos, pela humanidade inteira, iluminou toda a nossa futura existência.
Deus nos amava! Ele era o nosso criador. Era quem nos sustentava momento por momento. Ele o tudo!... Nós não teríamos nenhum sentido no mundo se não fôssemos uma pequena chama desta Chama infinita – amor que responde ao Amor.
E pareceu-nos tão sublime a dignidade a que nos elevara, tão alta e imerecida a possibilidade de ama-lo que repetíamos: “Não se trata de dizer: Devemos amar a Deus; mas: “Oh! Poder-te amar, Senhor... poder-te amar com este pequeno coração!”.
E nos esforçamos para ser coerentes. Com o passa dos dias, das semanas, dos anos, pareceu-nos que ele não quisesse deixar-se vencer em generosidade.
De fato, talvez porque, como afirma a Escritura,  “ a quem me ama, manifestar-me-ei”, aos poucos Deus foi-nos revelando os tesouros semeados por ele próprio aqui na terra, por amor a nós, e a sua presença única e multíplice neste lugar de exílio à espera do céu, presença que nos esclareceu sempre mais como é infinito o seu amor e como são inumeráveis os recursos da sua paternidade. Indicou-nos onde encontrá-lo, para nos assemelharmos a ele e de que maneira possuí-lo; em suma, indicou-nos de que modo e com que meios poderia nascer ou amadurecer a união das nossas almas com ele e dele com as nossas almas.
E não nos chamou para viver num mosteiro, nem em clausura, mas onde mais reina o príncipe do mundo e dominam as trevas: “Pai, não peço que os tires do mundo, mas que os preserves do mal”.
Descobrimos, então, como crianças ao abrir os olhos, que a vinda de Deus sobre a terra por nosso amor mudara radicalmente o mundo: ele tinha ficado.
Caminhando ou viajando, não éramos atraídas pelo que acontecia ao nosso redor embora bonito e interessante. A própria Roma, por exemplo, não nos atraía só por seus maravilhosos monumentos e pelas preciosas relíquias. Os eles que ligavam o nosso caminhar por ele no mundo eram Jesus nos tabernáculos que encontrávamos.
De tal forma que cada Igreja que víamos da janela de um trem se tornava “casa” para a nossa alma.
E quando tínhamos a possibilidade de visitar algum santuário, ou a Terra Santa, que viu nascer e morrer o Salvador – lugares estes que desejávamos nunca mais deixar – quem dava alento ao nosso caminhar era Jesus na Eucaristia, presente me todas as partes do mundo, presente da mesma maneira tanto na capela de uma aldeia como na majestosa catedral duma importante cidade: ele, luz aqui e ali acendida pelo seu amor; conforto para jovens, pobres e ricos, cultos e ignorantes: Irmão universal, o mesmo para todos, que enxugava as lágrimas, que revigorava os corações, que dava o seu Espírito aos que vivessem segundo a sua lei.
Não era, portanto, tão mau assim o mundo! Jesus Eucaristia tornava-o um enorme convento e se oferecia à fome de divino que pode surgir em cada um de nós.
            E ainda mais: cada irmão – a colega de classe, o mendigo, a mulher da feira, o deputado, a criança, o doente – sob a ação da graça, mudemos a reconhecer e amar em cada próximo um membro do Corpo místico, Cristo nele. E aconteceu então que todo aquele que podia impedir o caminho rumo a Deus se tornava uma porta para encontrá-lo.
Os livros santos tinham prometido: “ Passamos da morte à vida porque amamos os irmãos”. E quanto mais se amava Cristo em todos, com o despojamento de si mesmo, mais o coração se plenificava de divino; mais facilmente, à noite, durante a oração, o Senhor nos fazia senti a sua doce presença na alma. Esta foi uma experiência que nos fez entender o quanto é agradável a Deus a caridade e como o amor fraterno é a flor do Evangelho.
Havia também irmãos nos quais Deus não devia se apenas amado, mas também obedecido. Tratava-se de pessoas que de um modo especial  o representavam: os nossos superiores eclesiásticos, os bispos, os assistentes, escolhidos com mão amorosa pela Igreja. Eram os pastores e nós as ovelhas.
E o efeito nas nossas almas e em toda a Obra, produzido por este esforço de viver como filhos de Deus na Igreja, esposa de Cristo, como ramos junto à videira, foi este: com o tempo, pareceu-nos que a própria Igreja palpitasse nos nossos corações, capazes somente de sentir com ela e de participar das suas lutas e vitórias, desejosos até mesmo de derrama o próprio sangue, unicamente pelo triunfo da Igreja.
E depois: Deus no nosso meio. Durante os primeiros dias, quando nos esforçávamos por atua as palavras de Jesus: “Onde dois ou três estão unidos no meu nome, aí estou eu no meio deles”, parecia que  o céu nos envolvesse, que o paraíso estivesse no nosso meio. Jesus retornava espiritualmente entre nós, irmãos nele, e, como Emaús, acendia os corações com uma chama que o mundo não conhecia, fazendo empalidecer homens e coisas, pondo em evidência somente o que é grande, belo e bom perante Deus.
Jesus entre os cristãos nos parecia um templo que podia erguer as colunas – os corações dos seus filhos – em toda parte, e oferecer o bálsamo de um tabernáculo espiritual, tanto numa rua barulhenta como nas terras pagãs supersticiosas ou num cárcere de perseguição.
Jesus é sempre vida e plenitude, alegria e paraíso, guia e mestre – o nosso amor recíproco podia ser a poderosa causa que o O tornava presente. Dizíamos entre nós: ! Se colocarmos vários pedaços de madeira entrecruzados e os acendermos no cimo de um monte, aquele fogo será visto de noite por todos os habitantes do vale e resplandecerá como uma estrela caída na terra; mas se dispusermos os nossos corações em unidade, amando-nos como ele nos amou, teremos o próprio Fogo, o Amor entre nós, e poderemos ser instrumentos de Deus para muitas almas”.
Deus, portanto encontrado na Eucaristia, amado no irmão, obedecido nos superiores, Deus espiritualmente presente no meio de nós. E Deus, infinito, que habita pela graça no nosso coração finito. Era necessário ajudá-lo a reinar com a sua majestade, a destruir o nosso eu e a transformar-nos nele.
E, ainda, Deus nas Escrituras, colhido e meditado sob ação do Espírito e a orientação da Igreja: a Escritura, fonte inesgotável da qual hauriram e hão de haurir a vida, até o fim do mundo, todos aqueles que o querem amar; a Escritura, que também Maria Santíssima, a nossa mãe, meditava. Desejávamos imitar Maria, que ficou no mundo, e como ela tornar-nos portadores de Deus aos irmãos, portadores de Deus no mundo.
Deus, Deus, Deus em qualquer lugar e sempre, a preencher o vazio deixado pelo pecado e superabundantemente  plenificado pelo sangue de Jesus. Deus que é Amor: este Ideal é o objetivo e finalidade da nossa vida de focolarinos.