28 fevereiro 2021

Como entendê-lo um pouco

É um mistério, portanto, este abandono, mistério do qual pode ter certa compreensão quem vive a Espiritualidade da Unidade fundamentada justamente tanto no abandono de Jesus, como na unidade, que Ele pede ao Pai na sua oração-testamento: que “todos sejam uma coisa só” (cf. Jo 17,21).

Quem vive assim sabe que, depois que a unidade se realiza entre alguns, eles se distinguem, para se unirem posteriormente em uma unidade nova, mais plena.

Por exemplo, para resolver um problema num encontro qualquer do Movimento, reunimo-nos, estabelecendo, antes de tudo, a presença de Jesus em meio a todos, a fim de encontrar a solução, com o Seu auxílio. Depois nos deixamos e cada um, enriquecido por aquela comunhão, parte para pôr em prática o que foi visto. Em outra ocasião, haveremos de nos reunir novamente, com uma união que sentiremos mais plena, para nos separarmos mais tarde, e assim sempre.

Este é — parece-nos — um modo de viver entre os homens aqui na terra, segundo a Santíssima Trindade.

O que o Pai faz com Jesus-Deus é, portanto, distinção, uma ação de amor.

Para Jesus-Homem ela se revela divisão, e é dor porque é ação de justiça. Como Ele se fez um com a humanidade pecadora, sente na sua humanidade a distância de Deus.

Chardon escreve:

Deus, o Pai celeste, serve-se dos algozes e dos demônios para o martírio exterior de seu Filho, enquanto se reserva ser a causa imediata de sua paixão interior […].

Quando Ele mesmo [o Pai], sem o intermédio de suas criaturas…, quais instrumentos adequados para fazê-lo sofrer, aplica-se em ser não tanto o princípio de cruz, mas a própria cruz de seu Filho, […] Ele lhe esconde a sua qualidade de Pai, mas também a de Deus, no aspecto em que faz as torrentes das doçuras de sua bondade fluírem, então Jesus não mais o chama de seu Pai, mas de seu Deus. (Chardon, 1895, pp. 256-257)

27 fevereiro 2021

Jesus, modelo para os cristãos

 Desde aquele tempo feliz em que Cristo viveu, morreu e ressuscitou, Ele tornou-se o Caminho, o modelo para cada um de nós3.

Como Jesus, o cristão deve amar o Pai e, por isso, fazer a sua vontade, a Ele submeter-se. E a vontade de Deus para o cristão é que ele também chegue à glória, à felicidade, pelo caminho da cruz, como Jesus.

Ele mesmo é quem nos ensina como segui-lo. De fato, diz a todos: “Se alguém quer vir após mim, renuncie a si mesmo, tome a sua cruz cada dia e siga-me” (Lc 9,23).

Seguir Jesus é, antes de mais nada, uma renúncia. É o renunciar a si mesmo, que não queremos entender no mundo de hoje, na ilusão de existir um cristianismo sem dificuldades. Mas a doutrina de Jesus é clara e forte: não é de modo algum a falta de freios morais! Paulo diz: “Mortificai, pois, os vossos membros terrenos: fornicação, impureza, paixão, desejos maus e a cupidez, que é idolatria” (Cl 3,5), porque aspirar às coisas ter-renas é conduzir-se como “inimigos da cruz de Cristo” (Fl 3,18).

Seguir Jesus quer dizer também tomar a própria cruz cada dia.

Jesus alude a cada dor de cada dia: que sejam aceitos todos os pequenos sofrimentos diários. Mas ao nos exortar a tomar a nossa cruz, deu sentido e valor também ao nosso padecer.

Lembro quão grande foi a minha impressão em Jerusalém, ao nos mostrarem no Calvário o furo onde foi plantada a cruz de Jesus. Joelhos por terra, aniquilada quase em adorador reconhecimento, só uma idéia me veio à mente: se não tivesse havido esta cruz, todas as nossas dores, as dores de todos os homens não teriam tido um nome.

Mas, “Cristo não mostra apenas a dignidade da dor”, diz Paulo VI. “Ele lança a vocação para a dor… convoca a dor (inclusive a nossa) para sair da sua desesperada inutilidade e, se unida à sua, tornar-se fonte positiva de bem” (Paulo VI, 1964, p. 212).

26 fevereiro 2021

Jesus crucificado!

O que dizer? Como falar d’Ele de modo apropriado?

É homem como nós, e sabemos disso. Mas é também Deus. E é amor. Veio entre nós por uma obra que a todos nós diz respeito, que toca cada um pessoalmente. Ele nos criou, no entanto arruinamos o dom que nos deu e que deturpamos continuamente. Com a vida, herdamos as lágrimas, o sofrimento e, ao final dela, a morte, a anulação aparente de tanta experiência feita.

Mas eis que Ele entende a situação dos homens, conhece as lamentáveis vicissitudes de sua história, tem compaixão deles e desce à terra, carregando sobre si tudo o que o homem devia suportar. “Deus não quer que o homem se perca” (cf. Jo 6,39) e o salva. Portanto, Jesus sofre e morre pelo homem.

Com o homem, conosco, e como nós morre e depois… ressurge.

“Era necessário” (cf. Mc 8,31), diz Jesus quando se aproxima a hora do padecimento. Mas era necessário o quê? E para quem?

Ele assumira ser necessário encarnar-se, sofrer e morrer por nós, porque é amor!

Eis a vocação extraordinária do Homem-Deus, totalmente diferente, o oposto daquela a que os homens em geral aspiram.

Veio para “dar a sua vida em resgate por muitos” (Mt 20,28).

Tudo fora predisposto pelo Pai. Jesus se sujeita. Mas, como diz Isaías sobre o Servo do Senhor que se ofereceu porque quis, Jesus quer a vontade do Pai. Ele a quer porque antes de tudo ama o Pai.

E a este amor o Pai corresponde com o seu poder e realiza um ato, que jamais realizara depois da Criação, isto é, a “Nova Criação”: a ressurreição.

Por meio dela, também o corpo de Jesus, “fraco” e passível de dor e de morte, transfigura-se, glorifica-se (cf. 2Cor 13,4), pronto para subir à direita do Pai.

Assim, o Homem-Deus abre a porta da Trindade para os homens redimidos.

25 fevereiro 2021

Sobre a caridade

Ás focolarinas sobre a caridade

Rocca di Papa, 5 de dezembro de 1970


A caridade, o amor ao próximo, não é de origem humana, é de natureza divina.

E isso é grandioso! E pode ter consequências impensadas, e uma incidência, e uma influência, incomparáveis na humanidade, pela diferença entre a caridade e qualquer outro amor humano.

De fato, os cristãos são gerados por Deus e amam com o próprio amor de Deus: são filhos de Deus. […]

E agora, perguntemo-nos: O que é que a caridade ama, quem tem ela por objeto?

A caridade tem por objeto Deus e o próximo.

A caridade, que é Deus em nós, ama Deus e ama o próximo.

A caridade é semelhante a uma semente que Deus depositou em nossa alma; se encontra o terreno adequado, faz como a semente: lança a raizinha e a plantinha. Assim é com a caridade, que se revela de duas maneiras na alma que lhe corresponde: em amor a Deus (a raizinha) e em amor ao próximo (a plantinha).

Logo percebemos que a raizinha é mais importante do que a plantinha. Enquanto ela existir, pode-se esperar a plantinha. Mas não o contrário. Ainda que a planta, ao contato com o Sol, com o oxigênio do ar e por outros motivos diversos, contribua para o desenvolvimento do conjunto.

Sendo assim, sabemos que é o amor a Deus que nos impele a amar o próximo. Já desde o início da nossa nova vida, queríamos apenas Deus como ideal; mas Ele nos explicou o que isso exigia.

E sabemos que o amor ao próximo aumenta em nós o amor a Deus.

24 fevereiro 2021

Nas provações espirituais

De uma resposta aos focolarinos da cidadezinha de testemunho de Loppiano nos arredores de Florença

Lá pelo ano de 1952, em Roma, Chiara vivenciou uma provação sobre a caridade, narrada por ela diversas vezes com vivos detalhes. Assim revela Giulia “Eli” Folonari – que, em seguida, iria tornar-se sua secretária pessoal – por tê-lo ouvido diretamente de Chiara: “O demônio, com sua lógica, lhe sugeria algo parecido com: ‘Você criou para si um mundo que não existe. ‘É uma total ilusão sua esse Deus amor, o amor aos irmãos, o amor mútuo. Você criou um castelo nas nuvens. Veja a realidade, o mundo. A vida é bem outra’”.


Loppiano, 16 de maio de 1987

Eu estava sob uma provação terrível, realmente a escuridão mais negra, provações, incertezas, essas coisas todas que me atormentavam enormemente e me faziam até chorar com frequência. Lembro que havia também o demônio, que me dizia: “não ame, não ame, porque se você amar, enxerga”. Pois eu sabia que enxergo amando. Como o farol da bicicleta: se você pedala, o farol se acende e você enxerga.

“Mas é tudo ilusão; a realidade é ficar parado”, dizia-me ele.

E lembro que tinha a impressão de que o demônio estava aqui, […] e me convencia. Convencia-me como uma luz: “Se você ama, enxerga; se enxerga, faz e segue em frente, e fica na ilusão”. Como digo: os astros do céu vivem porque se movimentam; se parassem, cairiam no nada. E o amor é o concentrado do cristianismo.

Lembro que do meu lado estava Natalia, que […] me dizia: “Você vai ver, Chiara, tenhamos Jesus no meio”.

E entre os dois, eu disse: “por amor a essa focolarina, eu amo assim mesmo, ainda que não [seja] verdade”. Vocês entendem? Comecei novamente a amar, a amar as focolarinas e o “outro” sumiu. […]

Era uma provação quanto à caridade.

23 fevereiro 2021

Nexo entre amor de Deus e amor ao irmão

De um escrito de 6 de setembro de 1949

Temos uma vida íntima e uma vida exterior. Uma da outra é floração, uma é da outra raiz; uma é da outra copa da árvore de nossa vida.

A vida íntima é alimentada pela vida exterior. O quanto penetro na alma do irmão, o tanto penetro em Deus dentro de mim; o quanto quanto penetro em Deus dentro de mim, o tanto penetro no irmão…

22 fevereiro 2021

O homem, “sacramento” do amor de Deus

6 de setembro de 1949


Deus-eu-o irmão: é todo um mundo, todo um reino e o eu, cada eu, é mediador entre Deus e irmão e, pelo irmão, é sacramento de Deus.

Trento, 1º de setembro de 1949

Senhor, dá-me todos os que estão sós…

Senti em meu coração a paixão que invade o teu, por todo o abandono em que o mundo inteiro mergulha.

Amo todo ser doente e só: até as plantas sem viço me causam dó…, até os animais solitários.

Quem consola o seu pranto?

Quem tem pena de sua morte lenta?

E quem estreita ao próprio coração o coração desesperado?

Meu Deus, faz que eu seja no mundo o sacramento tangível do teu Amor, do teu ser Amor: que eu seja os braços teus que estreitam a si e consomem no amor toda a solidão do mundo.

21 fevereiro 2021

Como o Deus Uno e Trino, viver “por”

6 de setembro de 1949

Pai, Jesus, Maria, nós.

O Pai abandonou Jesus e Maria por nós.

Jesus aceitou o abandono do Pai e abandonou a Mãe por nós.

Maria aceitou o abandono do Pai (dividindo o do Filho) e do Filho por nós.

Portanto, fomos colocados em primeiro plano. É o amor que faz essas loucuras.

Assim, nós, pelo irmão, devemos deixar tanto o Pai, como o Filho, e a Mãe: o irmão é o nosso Céu aqui na terra.

20 fevereiro 2021

Os pobres, o primeiro objetivo da nova vida

Por isso, os necessitados, os pobres tornaram-se o primeiro objeto, o primeiro objetivo de nossa nova vida.

E como os ajudávamos?

Isso também era o Evangelho que nos dizia: “Dai e vos será dado; será derramada no vosso regaço uma boa medida, calcada, sacudida, transbordante” (Lc 6,38).

“Pedi e vos será dado; buscai e achareis; batei e vos será aberto; pois todo o que pede recebe; o que busca acha e ao que bate se lhe abrirá” (Mt 7,7).

Lembro em plena guerra o corredor comprido de minha casa, cheio de sacos de farinha, de batatas, de lenha, de leite em pó e de tudo o mais, que se esvaziava e se enchia, se esvaziava e se enchia…

Sempre prontas, todo dia, as primeiras focolarinas levavam bolsas de mantimentos aos bairros mais pobres da cidade.

Assaltam-me à mente episódios muito bonitos, em que o Pai nos dava justamente o que se pedia para Jesus no pobre: um par de sapatos nº 42, um paletó…

Lembro-me dos pobres à nossa mesa no primeiro focolare: uma focolarina e um pobre, uma focolarina e um pobre… E a melhor toalha para eles, e os melhores talheres, e as melhores comidas!


19 fevereiro 2021

A família é o futuro

[…] Jesus disse: «Onde dois ou três estão unidos no meu nome – ou seja, no meu amor –, eu estou no meio deles» É uma esplêndida possibilidade oferecida também à família: tornar-se lugar da presença de Deus.

Para uma família que vive assim, nada é indiferente, daquilo que acontece ao seu redor. Sendo simplesmente aquilo que é, ela tem a capacidade de testemunhar, anunciar, sanar o tecido social ao seu redor, porque a vida fala e opera por si só. Sei por experiência que a família sabe abrir casa e coração para as urgências e os as urgências e as urgências e os ddramas que invadem a sociedade, e amenizar a sua solidão e marginalização. Ela sabe até mesmo concretizar e organizar a solidariedade em vasta escala, com ações eficazes que influenciam as instituições; impedir a aprovação de leis e disposições errôneas, orientar os políticos. Pela presença ativa dos seus membros nos vários setores da sociedade, a família abre um diálogo com as instituições, sabe encontrar os meios para atender às necessidades concretas, criar a consciência e as condições para adequadas políticas familiares e para formar correntes de opiniões fundadas sobre valores.

Creio que para o mundo não existe nada mais lindo do que uma família assim. Por quê, perguntemo-nos, o que a humanidade busca? A felicidade. E onde a procura? No amor, na beleza. E para obtê-la está disposta a qualquer coisa. Lá, naquelas famílias, existe a plenitude do amor humano e a beleza do amor sobrenatural.

Eu conheço famílias assim e são realmente maravilhosas! Elas exercem uma grande atração sobre todos. Aparentemente parecem famílias como as outras, mas escondem um segredo, um segredo de amor. A dor amada as une a Cristo que mora nos seus lares, atraído pelo amor mútuo e, com estas famílias, ele está transformando o mundo.

Quis partilhar com vocês estas reflexões que tirei do profundo do meu coração e da experiência de muitas famílias. Gostaria de despertar em todos nós um compromisso concreto de ação em todas as formas e de todos os modos possíveis para o verdadeiro bem da família. É extremamente importante a saúde da primeira célula da sociedade para o destino de toda a humanidade.

“Salvar a família – escreveu o grande escritor católico, Igino Giordani – é salvar a civilização. O Estado é feito de famílias; se estas decaem, também aquele vacila”. E disse ainda: «Os esposos se tornam colaboradores de Deus dando à humanidade vida e amor. […] Amor que da família se expande para a profissão, para a cidade, para a nação, para a humanidade. É uma distribuição em círculos como uma onda que se propaga até o infinito. Há vinte séculos arde uma inquietude revolucionária, acesa pelo Evangelho, e requer amor”.

18 fevereiro 2021

Recolher-se sempre

 6 de novembro de 1949

Deus, que em mim reside, que a minha alma plasmou, que nela repousa como Trindade (com os santos e com os anjos), também reside no coração dos irmãos.

Portanto, não é razoável que eu o ame só em mim. Se assim fizesse, meu amor ainda manteria um quê de pes­soal, de egoísta: amaria Deus em mim e não Deus em Deus, porquanto a perfeição é: Deus em Deus (que é Unidade e Trindade).

Por conseguinte, a minha cela (como diriam as almas íntimas a Deus) é nós: o meu Céu está em mim e, do mesmo modo que está em mim, está na alma dos irmãos.

E, como o amo em mim, ao recolher-me nesse meu Céu – quando estou só –, amo-o no irmão quando ele está junto a mim.

Então, não amarei o silêncio, amo a palavra (expressa ou tácita), ou seja, a comunicação do Deus em mim com o Deus no irmão. Se os dois Céus se encontram, existe aí uma única Trindade, em que os dois estão como Pai e Filho e, entre eles, está o Espírito Santo.

É necessário, sim, recolher-se sempre, inclusive na presença do irmão sem, contudo, esquivar a criatura – mas recolhendo-a no próprio Céu e recolhendo-se no Céu dela.

17 fevereiro 2021

AMAI OS VOSSOS INIMIGOS

Lucas 6,27-38

Naquele tempo disse Jesus a seus discípulos: A vós que me escutais, eu digo: amai os vossos inimigos e fazei o bem aos que vos odeiam, bendizei os que vos amaldiçoam e rezai por aqueles que vos caluniam.

Se alguém te der uma bofetada numa face, oferece também a outra. Se alguém te tomar o manto, deixa-o levar também a túnica. Dá a quem te pedir e, se alguém tirar o que é teu, não peças que o devolva.

O que vós desejais que os outros vos façam, fazei-o também vós a eles. Se amais somente aqueles que vos amam, que recompensa tereis? Até os pecadores amam aqueles que os amam. E, se fazeis o bem somente aos que vos fazem o bem, que recompensa tereis? Até os pecadores fazem assim. E, se emprestais somente àqueles de quem esperais receber, que recompensa tereis? Até os pecadores emprestam aos pecadores, para receber de volta a mesma quantia.

Ao contrário, amai os vossos inimigos, fazei o bem e emprestai sem esperar coisa alguma em troca. Então a vossa recompensa será grande e sereis filhos do Altíssimo, porque Deus é bondoso também para os ingratos e os maus. Sede misericordiosos como também o vosso Pai é misericordioso. Não julgueis e não sereis julgados; não condeneis e não sereis condenados; perdoai e sereis perdoados. Daí e vos será dado. Uma boa medida, calcada, sacudida, transbordante será colocada no vosso colo; porque, com a mesma medida com que medirdes os outros, vós também sereis medidos.

16 fevereiro 2021

Se estamos unidos, Jesus está entre nós

Se estamos unidos, Jesus está entre nós. E isso vale! Vale mais do que qualquer outro tesouro que nosso coração possa ter: mais do que a mãe, o pai, os irmãos, os filhos. Vale mais do que a casa, o trabalho, os bens; mais do que as obras de arte de uma grande cidade como Roma; mais do que os nossos afazeres, mais do que a natureza que nos circunda, com as flores e os campos, o mar e as estrelas; vale mais do que a nossa própria alma.

Foi Ele que, inspirando os seus santos com suas verdades eternas, marcou época em cada época.

Essa é também a sua hora: não a de um santo, mas Dele, Dele entre nós, Dele vivendo em nós, que edificamos — em unidade de amor — o seu Corpo Místico.

Mas, é preciso dilatar o Cristo, fazê-lo crescer em outros membros; tornarmo-nos, como Ele, portadores de fogo, que dissolva todo o humano no divino, que é a caridade em ato. Fazer de todos  um e em todos o Um!

Vivamos, então, a vida que Ele nos dá momento por momento.

É mandamento fundamental a caridade fraterna. Ante omnia…1 (cf. 1Pd 4,8). Por isso, tem valor tudo o que é expressão de sincero e fraterno amor. Nada do que fazemos tem valor, se nisso não há sentimento de amor pelos irmãos; pois Deus é Pai e tem no coração, sempre e unicamente, os filhos.

15 fevereiro 2021

“Nisso reconhecerão…”

Sempre fiquei impressionada: “Nisso reconhecerão todos que sois meus discípulos, se tiverdes amor uns pelos outros” (Jo 13,35). “Se tiverdes amor…” Portanto,  se faltar esse elemento no coração, na alma… não conhecerão. Quantas vezes nos deixamos levar por tantas coisas, coisas até boas, mas fazemos tudo isso sem ter amor por quem vive ao nosso lado!

No entanto, isso, e somente isso, é o cristianismo. Acentuar isso é a revolução que nós, cristãos, devemos trazer.

14 fevereiro 2021

O hábito dos cristãos

Às vezes, Senhor, em meio às vaidades que circulam pelas ruas da cidade, entre a frivolidade e a superficialidade, a tristeza e a pressa do homem, de cada homem que passa, a silenciosa e angélica passagem de uma irmãzinha de Foucauld5 em seu aspecto decididamente modesto fala ainda às nossas almas do ideal do seu fundador que “gritou” o Evangelho com a sua vida. E renasce então em nós, mais veemente, o desejo de “falar de ti” também nós, de “gritar de ti”, também nós…

Mas como podemos, com a nossa simples passagem, “dar-te” ao mundo, “falar de ti” ao mundo, testemunhar-te, pregar-te, nós que nos vestimos como todos, que nos confundimos agora com todos, como Maria no seu tempo, como Jesus? Em que poderão reconhecer-te?

E do coração brota nova a resposta evangélica, a tua solução ao nosso quesito: “Nisso reconhecerão todos que sois meus discípulos, se tiverdes amor uns pelos outros” (Jo 13,35). Eis o hábito dos cristãos comuns, que, velhos e jovens, homens ou mulheres, casados ou não, adultos e crianças, doentes ou sadios, podem vestir para gritar, em toda parte e sempre, com a própria vida, Aquele em quem creem, Aquele a quem querem amar.

13 fevereiro 2021

A perfeição do amor

São João traz em sua primeira carta esta frase belíssima e encorajadora: “Se nos amarmos uns aos outros, Deus permanece em nós, e o seu Amor é levado à perfeição” (1Jo 4,12).

Mas, se o seu amor em nós for perfeito e enquanto seu amor em nós for perfeito, somos perfeitos.

Portanto, tem-se a perfeição do amor ao se colocar em prática o amor mútuo.

12 fevereiro 2021

Dar a vida

Para um cristão, não basta ser bom, misericordioso, humilde, manso, paciente… Ele deve ter a caridade pelos irmãos.

Mas — alguém poderia objetar — ter a caridade não significa ser bom, misericordioso, paciente, saber perdoar?

Não. A caridade foi Jesus quem nos ensinou. Ela nos faz morrer pelos outros.

Morrer. Não apenas estar prontos a morrer. Mas, justamente isso, morrer. Morrer espiritualmente, renegando a nós mesmos para “viver os outros”. Ou, se necessário, morrer também fisicamente.

De fato, a caridade não é só disposição de dar a vida. É dar a vida

11 fevereiro 2021

Um amor heroico

Como deve ser nosso amor para que seja conforme àquilo que Jesus exige de nós?

Nós o sabemos. É um amor que tem como medida a morte: estarmos prontos a morrer pelos outros, pelo próximo, cada um deles.

Portanto, um amor heroico, nada menos! Essa é a caridade: “… como eu vos amei”. E é justamente em um amor desse porte, concebido e vivido desse modo, que encontramos o caminho para nos santificarmos na vida.


10 fevereiro 2021

O primeiro a vivê-la

A vontade de Deus dos “novos tempos”3 , Jesus não a anunciou apenas. Ele a viveu até o fim.

O amor total a Deus e aos homens, que Ele pede aos outros, viveu-o antes de todos. Sua conduta, seu fazer a vontade de Deus, foi dar a vida pelos outros.

“Ninguém tem maior amor do que aquele que dá a vida por seus amigos” (Jo 15,13) é a nova Lei, que todos nós devemos palmilhar.

09 fevereiro 2021

A unidade: efeito da Eucaristia

O amor verdadeiro, a arte de amar, em seu ponto culminante, é amarmo-nos mutuamente.

Amarmo-nos mutuamente de tal modo que mereçamos o dom da unidade. Porque nós não sabemos fazer a unidade. Jesus rogou ao Pai pela unidade, mas não a preceituou.

Podemos fazer nossa parte, que é a parte ascética, amar-nos, mas a parte mística da unidade, a presença de Cristo em nosso meio, deve vir do Céu.

Nós, em nossa experiência, vimos que a unidade é efeito da Eucaristia. É lá que somos realmente deificados, que todos nos transformamos em Deus (por participação), que nos tornamos um, Nele.

08 fevereiro 2021

Desde a manhã

Podemos amar Jesus também nos familiares que cumprimentamos com um bom-dia, com os quais rezamos, quem sabe, a oração da manhã e tomamos café.

Podemos amar Jesus no próximo durante o dia, inclusive atrás da mesa de professor onde ensinamos, ou do balcão da loja ou do guichê do Banco onde trabalhamos… Podemos amar o próximo reconhecendo Jesus nele até em casa, quando passamos o pano de chão ou a vassoura, quando lavamos a louça ou saímos para as compras.

Podemos amar Jesus quando escrevemos uma carta, damos um telefonema, participamos de um congresso ou escrevemos um artigo. Podemos amar Jesus no próximo quando rezamos.

Sempre dispomos dessa maravilhosa possibilidade e podemos ter certeza de que Ele nos diz a todo momento: “A mim o fizeste”.

07 fevereiro 2021

Cada relacionamento seja caridade

É preciso traduzir em caridade, transformar em caridade, os diversos contatos que mantemos com o próximo durante o dia.

Do momento em que nos levantamos de manhã, até à noite quando vamos dormir, cada relacionamento com os outros deve ser caridade. Na igreja, em casa, no escritório, na escola, na rua, devemos encontrar as várias ocasiões para viver a caridade.

É nossa tarefa ensinar, instruir, governar, dar de comer, vestir, acudir os familiares, servir os clientes, despachar? Devemos fazer tudo isso por Jesus nos irmãos, sem descuidar de ninguém, aliás, sendo os primeiros a amar a todos.

É uma ginástica, ao longo do dia, mas vale a pena, porque, assim, progredimos no amor de Deus

06 fevereiro 2021

“Outro Cristo”

“A mim o fizestes.”

Se, de algum modo,  Cristo está presente em todos, não podemos fazer discriminações nem ter preferências.

Vão pelos ares os conceitos humanos que classificam os homens por país, idade, condição social, dotes pessoais, bens ou outros critérios. Cristo está por trás de cada um, Cristo está em cada um.

E cada irmão é realmente “outro Cristo”,  se a graça enriquece sua alma, ou é “outro Cristo” em potencial, se nele falta a graça.

05 fevereiro 2021

O risco da palavra

Para amar, é necessário antes “fazer-se um” com o próximo, em tudo, mas não no pecado. Até aqui, tudo bem. Mas isso não se deve tornar um pretexto para não enfrentarmos o risco da palavra. Devemos estar atentos para não confundir a verdadeira prudência com a falsa, a ponto de ficarmos bloquados num silêncio reprovável.

Jesus “fazia-se um” com todos, certamente, transformando a água em vinho, multiplicando os pães, acalmando a tempestade, curando os doentes, ressuscitando os mortos. Mas, ao mesmo tempo, falava. E como falava! Sua Palavra atraía sobre si o amor e também o ódio.

Será assim também para nós, mas nem por isso devemos nos calar.

Escutemos bem a voz interior que nos guia: teremos possibilidades sempre novas de comunicar nossa dádiva, oportuna e inoportunamente, como são Paulo exorta (cf. 2Tm 4,2).

04 fevereiro 2021

Perder Deus por Deus

A prática de “fazer-se um” com os outros não é simples. Ela exige o vazio total de nós: que tiremos de nossa cabeça as ideias, que tiremos do coração os afetos, que tiremos da vontade toda coisa, que façamos até as inspirações se calarem, que percamos Deus em nós pelo Deus presente no irmão para nos identificarmos com os outros.

Nos primeiros tempos do Movimento, quando eu conversava com uma pessoa que vinha confidenciar comigo, eu me exercitava demoradamente — pois me vinha a vontade de dar logo determinada resposta — em pôr de lado minhas ideias, até que ela esvaziasse em mim aquilo que preenchia seu coração. Agindo assim, eu estava convencida de que, no final, o Espírito Santo haveria de me sugerir exatamente aquilo que eu deveria dizer.

Por quê? Porque, “criando o vazio”, eu amava, então Ele se manifestava. Tive confirmação milhares de vezes de que, se tivesse interrompido a conversa na metade, teria dito alguma coisa que não era correta, não era iluminada, mas era simplesmente “humana”. Ao passo que, deixando por amor que o interlocutor fizesse entrar em mim os seus anseios, os seus sofrimentos, e permitindo que ele descarregasse em mim o seu fardo, eu encontrava a resposta que resolvia tudo, ou me surgiam as ideias para ajudá-lo.

03 fevereiro 2021

Quem é o próximo?

Amar a todos. E, para chegar a isso, amar o próximo.

 Mas, quem é o próximo? Já sabemos. Não devemos procurá-lo longe: o próximo é o irmão que passa ao nosso lado, no momento presente da vida.

Para ser cristão, é necessário amar esse próximo agora. Portanto, não um amor platônico, não um amor ideal, mas um amor operoso.

É preciso amar, não de maneira abstrata e futura, mas de modo concreto e presente, agora.

02 fevereiro 2021

A misericórdia na espiritualidade de Chiara Lubich

"Misericordiosos como o Pai” é o programa de vida proposto pelo papa Francisco para o Ano Santo. “De fato, na misericórdia – se lê na Bula de proclamação –, temos a prova de como Deus ama. Ele dá tudo de Si mesmo, para sempre, gratuitamente e sem pedir nada em troca. Vem em nosso auxílio, quando O invocamos. (…). E a ajuda d’Ele consiste em fazer-nos sentir a sua presença e proximidade” (MV 14). E é este rosto de Amor – Misericórdia que revela plenamente a Paternidade de Deus. Deus é Amor: é a centelha inspiradora na origem do carisma da unidade, que o Espírito Santo na nossa época doou a Chiara Lubich. (…) Então, Chiara descobre não um Deus distante, inacessível, estranho à sua vida, mas o rosto paterno d’Ele (…). Portanto, tudo o que acontece é visto como realização do seu plano de amor sobre cada um, como prova tangível do seu olhar vigilante, da sua presença e proximidade. “Quanto a vós, até os cabelos da cabeça estão todos contados” (Mt 10,30). É um amor paterno que provê a todas as necessidades, inclusive as mais insignificantes, até preencher também os vazios deixados pelas nossas imperfeições, pelas nossas faltas, pelos nossos pecados. É o rosto do Pai misericordioso que – mediante o Filho encarnado – se manifesta, que revela plenamente o seu amor de misericórdia.

Episódios evangélicos sobre a misericórdia

Nos vários documentos magisteriais dedicados ao tema da misericórdia, se faz sempre referência àquelas passagens evangélicas que melhor o ilustram. Um exemplo clássico é a parábola do filho pródigo (Lc 15,11-32). (…) Uma vez, Chiara se encontrou ilustrando esta parábola a um numeroso grupo de jovens reunidos na Catedral de Paderborn, na Alemanha. Foi no dia 12 de junho de 1999. Eis as suas palavras:

“O pai do filho pródigo devia ter muito trabalho: administrar a fazenda, seguir os empregados, a família, mas a sua atitude principal era a da espera, da espera do filho que tinha ido embora. Todos os dias ele subia à torre de sua casa e olhava ao horizonte. O Pai Celeste faz o mesmo conosco. Imaginem, jovens, se puderem, a divina, altíssima e dinâmica vida trinitária de Deus, a sua atividade contínua para sustentar a criação, para dar o lugar a quem sobe ao Paraíso.

E no entanto, ele faz sobretudo uma coisa: ele espera. Quem? Nós, eu, vocês, especialmente se nos encontrássemos afastados dele. Um belo dia aquele filho, que o pai terreno tanto amava, tendo esbanjado todos os seus bens, volta para casa. O pai o abraça, o veste com uma roupa fina, coloca um anel em seu dedo, pede que se prepare um novilho gordo para a festa.

O que isso nos faz pensar? Que Ele deseja ver o seu filho todo renovado. Não quer mais lembrar como ele era antes. E não só quer perdoá-lo, mas chega até mesmo a esquecer o seu passado. Este é o seu amor por ele na parábola. Assim é o amor de Deus Pai por nós na vida: nos perdoa e esquece”.

01 fevereiro 2021

Um clarão de luz

“Lembrai-vos, contudo, dos vossos primórdios: apenas havíeis sido iluminados…” (Hb 10,32). Essa frase da Escritura encontra um grande eco na alma de Chiara Lubich que, para ser fiel ao dom de Deus, sente o dever de voltar continuamente às primeiras inspirações que o Espírito lhe doara. Assim é também em 1977, quando, como registra no diário de 10 de maio, lê “as cartinhas dos primórdios para esquadrinhar o carisma”.

Do Diário

24 de maio de 1977

“O tempo é um relâmpago, e em nossas mãos está apenas o instante fugidio. Enraízem o tempo em Deus e realizem, transcorrendo, obras para o Céu!”

Portanto, com a aspiração à santidade, com o “pacote bem confeccionado”, estamos em pleno carisma. Isso dá segurança de estarmos na vontade de Deus.

[…]

Em uma cartinha dos primórdios, há um pensamento que nos é útil:

“Cada vez mais logo”.

A propósito, lá se diz de dar o que é nosso a Jesus, tudo aquilo que nos pertence. Diríamos, hoje, “perder o que não é vontade de Deus”.

Pois bem, na época, o Amor-Deus nos exortava a fazer isso “cada vez mais logo”.

“Somente assim O verei em ti” – escrevo na cartinha.

Cada vez mais logo.