30 junho 2021

A sua, a nossa missa

De um escrito

Este escrito brota na alma de Chiara em um período de provações dolorosas, inclusive físicas. “Recordo” – escreveria – “que só conseguíamos viver nunca desviando o olhar de Jesus Abandonado, da chaga do seu abandono”.

5 de novembro de 1957

Se sofres, e teu sofrer é tanto
que te impede qualquer atividade,
lembra-te da missa.
Na missa, Jesus,
hoje como outrora,
não trabalha, não prega:
Jesus sacrifica-se por amor.
Na vida,
podem-se fazer tantas coisas,
dizer tantas palavras,
mas a voz da dor,
talvez surda e desconhecida dos outros,
da dor oferecida por amor,
é a palavra mais forte,
aquela que toca o Céu.
Se sofres,
imerge a tua dor na sua:
dize a tua missa!
E, se o mundo não compreende,
não te perturbes;
basta que te entendam Jesus, Maria, os santos.
Vive com eles
e deixa correr o teu sangue
em benefício da humanidade,
como Ele!
A Missa!
Grande demais para ser entendida!
A sua, a nossa missa.


Chiara Lubich 

29 junho 2021

A bênção

San Martino [di Castrozza], 2 de agosto de 1950


Hoje foi um dia de vida unitiva em que Jesus realizou o meu desejo: o de que só Ele seja tudo para mim. Eu desejava tanto isso, e parecia-me distante o dia em que esse fato seria não um esforço de vontade, mas um fato de coração, uma paixão da alma.

Agora é assim e, sendo assim, tudo agora é fácil.

Só Jesus: eu e Ele; eu-Ele com Ele.

Vida Trinitária perfeita entre Céu e terra.

E eu o encontro em mim, no sacrário e nas outras pessoas com uma presença toda nova, toda aberta. Entre mim e Ele não existe mais nada que crie obstáculo. A esse ponto, é uma convivência perfeita, na qual vivo tudo sob o seu olhar, amo-o e sou amada, e na qual Ele me faz entender esse imenso amor. Por isso, encontrei o que dá paz perfeita ao meu coração, a caridade sem temor. Porque sou como serei na hora da morte e lá no Alto: Ele e eu, sem prestar contas a ninguém de nada, porque não há nada mais, e me comunico inteiramente com Ele em todos.[…]

Hoje, pela primeira vez, amei a bênção eucarística assim.

Sei quão doce é a bênção e que é expressão de amor sagrado e solene. Eu também abençoava os meus pequenos alunos quando descansavam e até hoje abençoo a quem amo.

Senti que ali é Jesus quem me abençoa e agora não perderei sequer uma bênção, que tem para mim quase o sabor da Comunhão.

Em San Martino, vi as Missionárias da Eucaristia. Mandei Graziella pedir a elas escritos sobre a Eucaristia. Só dispunham de um pobre boletim, que não li porque não era a esse respeito.

Mas Jesus agora tem o cuidado de me fazer sentir que Ele está ali dentro.


Chiara Lubich 

28 junho 2021

A gota de água no cálice

6 de setembro de 1949

A gota de água colocada no cálice e adicionada ao vinho tornar-se-á Sangue com o vinho. E somos nós: nós transformados em Sangue, nós oferecidos porque fomos transmudados, transubstanciados em Deus – no altar.

Se nós vivemos essa Unidade, esses Céus, se, por exemplo, somos agora Jesus Abandonado (ou a Desolada que forma em nós Jesus Abandonado), então realmente, misticamente, somos oferecidos em todos os altares da terra todos os dias!!

Podemos ver naquela Hóstia Santa e naquele Preciosíssimo Sangue: NÓS. EU oferecida ao Pai, eu que morro na Cruz no Calvário.

É uma visão totalmente nova da missa. Não estamos só aos pés da Cruz, com a Mãe e Madalena; estamos lá no alto, na Cruz, gritando o abandono. Naquele grito está a nossa voz! Nós realmente vivemos Jesus e Jesus nos vive. O “vive-me toda, meu Amor!”, que lhe dizíamos, é um fato. E nós a Ele: “Vivo-te todo”.

Chiara Lubich 

27 junho 2021

Com a tua força

 De uma palestra aos dirigentes do Movimento no mundo

Rocca di Papa, 12 de outubro de 1976


Jesus, quando me propus a dizer alguma coisa sobre ti Eucaristia, creio que o coração como que me queimava no meu peito. Tive logo a sensação profunda do que estava por fazer: dizer algo de ti em quatro pobres palestras. O desejo me teria induzido a construir para ti uma catedral.

Agora percebo que o resultado disso talvez tenha sido um mísero altarzinho de madeira. Não sou capaz de falar de ti; és grande demais.

Um dia li que, se a Igreja não tivesse a Eucaristia, não teria a força de elevar-se em direção a Deus; por isso a Eucaristia é considerada o coração da Igreja.

Perdoa, assim, o meu atrevimento. Mas, como é tua a arte de extrair da fraqueza grandes coisas, eis aqui estas páginas, quais minúsculo presente de amor, ao teu amor, imensurável. Usa-as para que outros saibam compreender-te um pouco mais e, com a tua força, desencadeiem a revolução cristã no mundo.

Chiara Lubich

26 junho 2021

A Eucaristia abre a unidade

 Rocca di Papa, 4 de outubro de 1976

Jesus Eucaristia, que presunção, que audácia falar de ti que, nas igrejas do mundo inteiro, acolhes as confidências secretas, os problemas escondidos, os suspiros de milhões de pessoas, as lágrimas de conversões alegres, somente por ti conhecidas, coração dos corações, coração da Igreja! Não o faríamos para não quebrar o recato devido a um amor tão elevado, vertiginoso, se não fosse justamente porque o nosso amor, que quer vencer todo temor, deseja ir um pouco mais além do véu da branca hóstia, do vinho do cálice dourado.

Perdoa a nossa ousadia! Mas o amor quer conhecer para amar mais, para que não nos aconteça terminar o nosso caminho na terra sem descobrir ao menos um pouco quem Tu és. Ademais, precisamos falar da Eucaristia. Porque somos cristãos e na Igreja, nossa mãe, vivemos e levamos o Ideal da Unidade.

Ora, nenhum mistério da fé tem tanto a ver com a unidade quanto a Eucaristia. A Eucaristia abre a unidade e disseca todo o seu conteúdo; de fato, é por ela que acontece a consumação da unidade dos homens com Deus e dos homens entre si, da unidade de todo o cosmo com o seu Criador.

Chiara Lubich 

25 junho 2021

Na primeira comunidade

De uma palestra às gen da Europa

Tendo a guerra como pano de fundo, bem como o imediato pós-guerra, quando as lacerações da sociedade apareciam mais evidentes, Chiara percebeu todo o valor de Jesus Eucaristia. Assim ela o transmitiu à “segunda geração” do Movimento dos Focolares, os gen.

Rocca di Papa, 12 de abril de 1968

A sociedade estava doente: havia divisões, havia ódio, havia o pobre, havia o rico. Mas o amor curava as feridas do Corpo Místico, e o remédio desse Corpo Místico era a Eucaristia. Indo todos comungar o mesmo Jesus, o Corpo Místico não estava mais dividido, lacerado, porque em Jesus Eucaristia somos todos um.


24 junho 2021

Tu és tudo, eu sou nada

De respostas a jovens que se preparavam para entrar no focolare

O primeiro grupo de jovens que Chiara atraiu ao redor do seu Ideal, dos quais surgiram pouco a pouco os membros do Movimento nascente, reunia-se todo sábado na sala Massaia, que os frades capuchinhos puseram à disposição da Ordem Terceira Franciscana de Trento. Lá, ela fazia as suas palestras, preparando-se de modo original.


Rocca di Papa, 30 de dezembro de 1976


Antes de falar às primeiras focolarinas, o Senhor havia posto dentro de mim o seguinte: que eu não me devia preparar. Por quê? Se me preparar – pensava – vou dizer uma coisa humana; se, no entanto, eu deixar o Espírito Santo falar, direi uma coisa divina. […]

Aos sábados, numa sala, eu me encontrava com aquelas que depois se tornariam as primeiras focolarinas; uma hora antes, eu ia diante da Eucaristia e dizia a Jesus: “Tu és tudo, eu sou nada. Tu és tudo, eu sou nada”, porque sabia que era assim. “Tu és tudo, eu sou nada. Tu és tudo…”, durante uma hora. Depois, saía a todo vapor e me via diante desse grupo de moças – eram somente moças, mas depois vieram também os rapazes – e, ali, abria a boca e falava.

23 junho 2021

Na casa de Loreto e no sacrário

De uma palestra na escola de formação dos focolarinos

Em outubro de 1939, às vésperas da Segunda Guerra Mundial, Chiara já estava com vinte e três anos de idade. Tinha acabado de se inscrever na Faculdade de Filosofia na Universidade de Veneza. Como estudante católica, foi convidada a participar de um congresso da Juventude Feminina da Ação Católica, realizado em Loreto. “Acompanho o programa com as outras jovens” – conta ela mesma –. “Mas, assim que posso, nos intervalos, corro para a Pequena Casa3. Não tenho tempo de verificar se historicamente foi aquele o ambiente que hospedou a Sagrada Família. Ajoelho-me ao lado da parede pretejada pela fumaça das velas. Não consigo pronunciar uma só palavra. Algo novo e divino me envolve, quase me esmaga.”

É lá que ela entende a sua vocação e, na Eucaristia, encontra a força para voltar a Trento.

Grottaferrata, 17 de setembro de 1961

Quando estive em Loreto, fui como que envolvida por uma graça particular de Deus e pela ideia de que estava na casa onde o Menino Jesus, Nossa Senhora e são José tinham estado. […] Lá, manifestou-se para mim essa nova estrada que Deus queria abrir no mundo; portanto, era uma graça bem especial. Não era o convento, não era a família, não era [permanecer] virgem no mundo; era outra coisa, era a casinha [de Nazaré], que era toda a Mariápolis5.

Ali, num determinado momento, estava tão tomada pelo divino […] que não queria mais voltar para casa, para Trento, porque ali era como se tivesse encontrado o Paraíso: o divino me havia envolvido toda para me sugerir as primeiras ideias sobre uma vocação nova que Deus iria preparar, uma multidão de virgens.

O que me fez resolver voltar foi: aqui existe uma casinha maravilhosa onde [Jesus] esteve, mas em Trento existe o sacrário com Jesus Eucaristia.

Em 7 de dezembro de 1943, Chiara pronunciou o voto perpétuo de castidade pelas mãos de frei Casimiro Bonetti, um frade capuchinho e seu confessor. A fim de prepará-la para dar esse passo, o sacerdote a pôs diante da seriedade da escolha que estava prestes a fazer e lhe mostrou, de modo duro, as consequências que poderia acarretar. O que ajudou Chiara a vencer qualquer hesitação foi o pensamento em Jesus Eucaristia.

Pode-se encontrar Deus na terra de muitas maneiras, a ponto de tocá-lo. Onde aparece mais evidente é na Eucaristia; ali Deus está realmente. Um pequeno fato diz que, se não tivesse havido Jesus Eucaristia, o Ideal não teria nascido.

Deus havia-me chamado para me consagrar a Ele. Eu não conhecia ninguém [dos meus primeiros companheiros ou primeiras companheiras], ninguém, nem sabia que viria alguém. Se me tivessem dito: Olhe, Chiara, você terá uma companheira, para mim teriam diminuído a beleza [do que estava fazendo], porque eu era chamada a dar-me a Deus, a doar-me a Ele, portanto, até a ideia de um Movimento teria parecido uma coisa pequena diante de Deus. Eu não sabia nada de nada, apenas que Deus me chamava, e eu respondi.
Escrevi ao padre que ia me consagrar a Deus. Vê-se que era uma carta meio ditada pelo Senhor, porque ele ficou tão convencido que foi aconselhar-se com outras pessoas e concluiu: é preciso consagrar essa alma a Deus, e logo para sempre. Fez-me proferir imediatamente o voto perpétuo de castidade, de modo que eu fosse logo afastada do mundo.
Mas [antes disso] ele me quis pôr à prova. […] “Na vida”, disse-me, “seus irmãos e irmãs vão se casar, ter muitos filhos, ter uma casa, e você não terá nada.” [Disse-me isso] para ver se eu resistia. “Depois” – continuou – “você não vai ficar assim sempre jovem, sabe? Ficará velha e vai acabar num asilo.” […] Eu não entendia que ele fazia aquilo justamente para me provar. Eu me vi tão sozinha, porque não sabia que nasceria o Movimento, não sabia de nada. Então disse àquele sacerdote: “Enquanto houver um sacrário na Terra, não vou ficar sozinha”.
Por isso, se não tivesse existido Jesus Eucaristia, o Movimento nunca teria nascido, porque [a perspectiva que o sacerdote abria à minha frente] era realmente inconcebível, ele me mostrava uma realidade dura. Quem me deu a solução naquele momento foi Jesus Eucaristia.

22 junho 2021

Na catedral de Trento, em busca da verdade

De respostas a jovens que se preparavam para entrar no focolare

Estudante do Instituto de Ensino Superior Rosmini de Trento, Chiara ficou fascinada principalmente pela filosofia. É daquele período um episódio que revela a sua relação profunda com Jesus Eucaristia.

Rocca di Papa (Roma), 30 de dezembro de 1976

Quando fazia filosofia, ia estudar na catedral. Havia um cantinho no fundo iluminado por uma fresta, como as de um presídio, e à luz daquela pequena abertura, eu estudava filosofia olhando para Jesus Eucaristia, a fim de que Ele me iluminasse sobre como entender a verdade. A passagem de uma verdade humana – como, por exemplo, o sistema kantiano – para uma verdade sobrenatural aconteceu em contato com Jesus Eucaristia. E já ali, Jesus Eucaristia agia.

21 junho 2021

Dá-me a tua luz e o teu calor

 De respostas a jovens que se preparavam para entrar no focolare


Em muitas circunstâncias, Chiara contou a primeira lembrança do seu encontro com Jesus Eucaristia, que aconteceu com a idade de seis anos aproximadamente. “Vê-se que eu já sentia a atração por Deus desde quando era criança”, afirmaria Chiara em 18 de abril de 2002, numa entrevista concedida a Sandra Hoggett. E aos jovens em Barcelona, em 30 de novembro daquele mesmo ano: “Luz e amor caracterizaram de certa forma a minha vida espiritual”. “Eu não sabia” – comentou com os jovens em Münster, em 15 de novembro de 1998 – “que depois, em minha vida, o Senhor me daria luz e amor para difundir em meu coração e também em muitos outros.”


Rocca di Papa (Roma), 30 de dezembro de 1976


Indo fazer adoração todas as sextas-feiras, com a irmã, eu olhava fixo, fixo, para Jesus Eucaristia durante uma hora inteira e lhe dizia: “Tu, que criaste o Sol, que dá luz e calor, coloca dentro de minha alma, através dos meus olhos” – assim eu acreditava – “a tua luz e o teu calor”. E eu repetia, repetia isso continuamente – uma coisa um tanto inusitada para uma menina! –: “Coloca toda a tua luz dentro de mim…” Tanto que, ao final daquela hora, eu não conseguia mais enxergar a hóstia branca […], porque, de tanto fixar aquele hóstia com as velas e as luzes em volta, a hóstia tornava-se preta, as luzes tornavam-se pretas, e todo o resto tornava-se branco. Uma ocasião, talvez por uma reação física, não sei, cheguei até a desmaiar. Lembro que, pequenina como eu era, me levaram para fora…

20 junho 2021

A “página”

A Eucaristia não produz apenas frutos bons e bonitos de santidade, de amor; tampouco tem como principal objetivo aumentar a unidade com Deus e entre nós (como normalmente se entende a unidade) e por isso serve para alimentar a presença de Jesus em nosso meio. Sim, também isso.

Mas o papel da Eucaristia é outro.

A Eucaristia tem como finalidade tornar-nos Deus (por participação). Ao misturar as carnes vivificadas pelo Espírito Santo e vivificantes do Cristo com as nossas, Ela nos diviniza na alma e no corpo. Portanto, torna-nos Deus.

Ora, Deus não pode estar senão em Deus. Eis por que a Eucaristia faz o homem, que Dela se alimentou dignamente, entrar no seio do Pai, coloca o homem na Trindade, em Jesus.

Ao mesmo tempo, a Eucaristia não faz isso com um homem apenas, mas com muitos, os quais, sendo todos Deus, não são mais muitos, mas são um. São Deus e todos juntos em Deus. São um com Ele, perdidos Nele.

Ora, esta realidade que a Eucaristia opera é a Igreja.

O que é a Igreja? É o “um” provocado pelo amor mútuo dos cristãos e pela Eucaristia. A Igreja é formada por homens divinizados, feitos Deus, unidos ao Cristo, que é Deus, e entre si. Se quisermos isso tudo visto de modo humano, ou seja, expresso em termos humanos – com um exemplo usado pelas Escrituras –, a Igreja é um corpo, cuja cabeça é Cristo glorioso.

Mas, assim como Cristo está no seio da Trindade, também a Igreja é chamada a estar no seio do Pai, e já está desde aqui na terra, nos membros nos quais a Eucaristia opera. E, se em parte não está ainda, encontra-se a caminho dele.

Além do mais, o homem arrebata consigo toda a Criação, pois é a síntese dela.

Tudo o que saiu de Deus volta, portanto, à Trindade pela Eucaristia.

Chiara Lubich

19 junho 2021

Revestir-nos de misericórdia

Havíamos dito que queríamos ver somente Jesus no irmão, que trataríamos com Jesus no irmão, que amaríamos a Jesus no irmão, mas agora vem à mente a lembrança de que aquele irmão tem este ou aquele defeito, tem esta ou aquela imperfeição.
O nosso olhar se complica e o nosso ser não está mais iluminado. Consequentemente, rompemos a unidade, errando.
Talvez aquele irmão, como todos nós, tenha cometido erros; mas como Deus o vê? Qual é, na realidade, a sua condição, a verdade do seu estado? Se está em ordem diante de Deus, Deus não se lembra de mais nada, já cancelou tudo com o seu sangue. E nós, por que lembrarmos?
Quem está errado naquele momento?
Eu, que julgo, ou o irmão ?
Eu.
Devo, pois, dispor-me a ver as coisas na perspectiva de Deus, na verdade, e tratar de igual modo com o irmão, pois, se por infelicidade, ele ainda não se tivesse congraçado com o Senhor, o calor de meu amor, que é Cristo em mim, induzi-lo-ia à compunção, assim como o sol absorve e cicatriza tantas chagas.
A caridade mantém-se com a verdade e a verdade é misericórdia pura com a qual devemos estar revestidos dos pés à cabeça, para podermos nos dizer cristãos.

Chiara LUBICH

18 junho 2021

À imagem de Deus Uno e Trino

      Da palestra “Quem é o irmão”
      Rocca di Papa, 5 de outubro de 1978

      “Deus disse: ‘Façamos o ser humano à nossa imagem e segundo a nossa semelhança…’ ” (Gn 1,26).
      Irineu, bispo de Lyon, escreve: “[…] os anjos não poderiam ter feito a imagem de Deus, nem ninguém mais […]. Deus não precisava deles para fazer o que deliberara fazer […]. De fato, estão sempre à sua disposição o Filho e o Espírito […]. A eles fala, quando diz: ‘Façamos o homem à nossa imagem e semelhança’ (Gn 1,26)” (Adv. Hær., IV,20,1 – PG 7,1 032).
      Quão verdadeira me parece essa interpretação! De fato, Deus criou no homem a humanidade em seu conjunto, como alguém que está diante Dele. E a humanidade só pode ser à imagem de Deus Uno e Trino, se quiser ser como Ele a quer. Os homens devem estar em relação de amor uns com os outros como estão as pessoas da Trindade, a cuja imagem eles foram criados.

Chiara Lubich

16 junho 2021

No inverno do homem

 29 de junho de 1948

O destino da árvore frutífera dá um pouco a imagem do homem que frutifica na sua estação fecunda. Até quando floresce, ao redor da árvore há cantos e trinos, zéfiro e sol; e quando amadurece suas maças, a natureza inteira, orgiástica, envolve-a de calor. Depois, os agricultores retiram-se aos refeitórios, aos tinelos e aos celeiros e, após algumas palpitações de vida e cores no outono, penetra o frio silêncio, sob o céu cinzento, donde as folhas, como últimas lágrimas, caem na terra seca. E assim acontece ao homem quando superou a idade de maior rendimento. Desilusões e amizades caem, como as folhas, e o silêncio sobem de todos os lados, a paisagem se entristece e ele permanece sempre a contemplar, mudo espectador, o avanço de sua própria ruína.
Da mesma forma, como naquele frio e naquela solidão, a árvore prepara a nova primavera, concentra calor e seiva, assim o homem pode fazer daquele afastamento invernal de amigos e de forças a concentração de um vigor pleno de uma nova existência: utilizar aquele abandono dos homens para aderir a Deus, preencher aquela perda de humanidade com a graça divina. E então, dentro do silêncio agigantado pela ingratidão e avareza, sobre a velhice descamada e fria, pode encher-se do calor de Deus, ascender interiormente enquanto declina externamente: dar aos homens um fruto que não se conta na economia, mas se calcula na teologia. No inverno do homem começa a primavera de Deus.

Igino Giordani

15 junho 2021

Escolhas e compromisso

Um povo com uma história, uma organização, uma composição. E um coração, que constitui o órgão central do corpo inteiro, assim como acontece nos organismos humanos,

No coração do Movimento dos Focolares estão aqueles que o fizeram nascer, os focolarinos e as focolarinas, que em várias ocasiões foram definidos pela própria fundadora «guardiães da chama do amor de Deus e do próximo». Vivem em pequenas comunidades, masculinas ou femininas, os chamados «focolares», deixaram «pai, mãe, filhos e campos» para seguir Deus e colocar-se completamente à disposição do Movimento, no mundo inteiro. Segundo as próprias possibilidades, mas em igual dignidade, fazem parte do focolare também pessoas casadas, chamadas a uma doação total a Deus, embora conservando todos os empenhos e deveres do próprio estado.

Num Movimento de natureza leiga não podiam faltar vocações que exprimem essa característica. Leigos são os focolarinos, pessoas consagradas que também trabalham e vivem imersas no mundo, enquanto que os voluntários e as voluntárias são homens e mulheres que assumiram o chamado à santidade e se empenham em animar e renovar evangelicamente o tecido social, com o próprio testemunho no mundo familiar, profissional, político.

Parte ativa do Movimento dos Focolares são os gen, jovens, adolescentes e crianças, aos quais Chiara Lubich jamais hesitou em apresentar o ideal da unidade integralmente, solicitando e suscitando uma resposta totalitária.

Presentes desde os primórdios, em Trento, religiosos e religiosas das mais diferentes ordens, contemplativas e de vida ativa, dos mais antigos aos mais recentes carismas, acolheram e fizeram própria a espiritualidade da unidade, recebendo dela uma nova compreensão do próprio fundador e tornando-se instrumentos de unidade e, amiúde, de renovação, dentro das comunidades às quais pertencem.

Também sacerdotes, diáconos e seminaristas diocesanos assumiram a espiritualidade que anima o Movimento dos Focolares e tornaram-se promotores dela, das mais variadas formas. Homens a serviço de todos – foram definidos por Chiara Lubich – indicando o lava-pés como modelo de seus ministérios.

Desde 1977, bispos tocados pela espiritualidade de comunhão empreenderam um caminho espiritual, concorrendo na realização da «colegialidade efetiva e afetiva», com o Papa, entre eles e com outros bispos, auspiciada pelo Concílio Vaticano II e solicitada pelos pontífices.

14 junho 2021

Reconstruir em Cristo

2 de junho de 1945


Hoje, fala-se de reconstrução em toda parte.
Mas, somente quem constrói sobre a Pedra angular, CRISTO, pode proporcionar A RECONSTRUÇÃO que perdura.
Viver a Vida de Jesus: eis aí cada aspiração nossa.
Se vivemos Cristo, seremos filhos do Pai Celeste. Mas o Pai Celeste não nos reconhece como tais, se não vê em nós o seu Filho Dileto.
Em Jesus, toda atividade era dirigida pelo Espírito Santo, que é Espírito de Amor. 
Para viver como Jesus e realizar o Ideal, é necessário viver sob a direção do Espírito Santo.
Peçamos ao Pai que, em nome da promessa explícita de Jesus, nos faça essa dádiva imensa.
Só assim poderemos AMAR imensamente e IMENSAMENTE FAZER AMAR o Amor. 
Mas Jesus quer antes, e sobretudo, o meu Amor. 
E eu poderei chegar a amá-lo assim, contemplando-o ABANDONADO: Ele doou-se copiosamente a mim; eu devo também fazer o mesmo, doando-me totalmente a Ele. 
Não posso mais ter vontade minha. A minha vontade é a Dele. 
Viverei, fazendo, fidelíssima, a Vontade Dele, inclusive nas pequenas coisas, pois se faltam essas, nada fiz por Ele. 
Ou TUDO OU NADA. Se não dei tudo, é como se não tivesse dado nada, pois que o tudo compreende também as pequenas coisas.


Chiara Lubich 

12 junho 2021

Encantados por Deus

Amsterdam (Holanda), 27 de março de 1982

Quando você começou a viver a vontade de Deus, pensou alguma vez que tanta gente a seguiria?

Realmente, quando comecei a viver procurando fazer a vontade de Deus a cada momento, não pensava mesmo em nada. Estava unicamente fascinada por Deus que me amava, e esse amor era de tal modo um idílio sobrenatural, que eu não via outra coisa senão esse meu relacionamento com Deus. Gostaria de que todos vocês, que receberam o Ideal, tivessem a mesma impressão, porque esse Ideal é um carisma que Deus nos deu, e quem o entende possui uma graça particular. Gostaria de que vocês também sentissem tanto que Deus os ama a ponto de ficarem encantados, porque Ele fez vocês entenderem essa sua graça. Aliás, digo a verdade a vocês, se, quando me consagrei a Deus, tivesse entendido que havia outras coisas além desse relacionamento, se, por exemplo, tivesse entendido que mais tarde nasceria um movimento, isso teria como que “perturbado” o meu relacionamento com Ele. Depois, tudo o mais veio como consequência. E assim deve ser também para vocês.

Chiara Lubich 

11 junho 2021

A sua vontade feita bem

Do Diário 
9 de outubro de 1965

Hoje, causou-me grande impressão a frase: “Nem todo aquele que me diz: ‘Senhor, Senhor’” (Mt 7,21). Nem… E quantas vezes o nosso amor a Deus é feito de implorações, de palavras… de amor, não ressaltados com igual decisão e força pela vontade de fazer a sua vontade.

Essa sua vontade deve ser uma coisa muito importante, para que o Senhor a afirme nitidamente, sobre uma negação clara de outra atitude da alma.

É que, para Ele, a sua vontade para cada um de nós, em cada momento, é coisa divina, acho; parte, pedrinha necessária de um mosaico, que só contemplaremos em toda a sua completude no “lado de lá”, enquanto que, do lado de cá, por graça sua, é-nos dado vê-lo, de vez em quando, em fragmentos.

Jamais entenderemos o suficiente o que significa estar no momento presente, plenamente, na sua vontade… […]

A ideia para hoje: a sua vontade feita bem, como uma ideia que não me deve abandonar jamais, que impregna até as fibras do meu ser.

Chiara Lubich 


09 junho 2021

O valor de Maria

Um entrevista com Chiara Lubich 

P. A senhora poderia explicar melhor o significado do título do Congresso: “Contemplar Cristo com o olhar de Maria”?

R. Nenhuma outra criatura conheceu e jamais conhecerá Jesus como Maria, porque era imaculada, porque era sua Mãe, porque era Evangelho vivido e, portanto, era outro Jesus. Para ver, conhecer e contemplar Jesus, através do olhar dela, será preciso procurar imitá-la – como nos for possível – no seu contínuo “sim” à vontade de Deus, e assim, fazer com que ela, de certo modo, reviva em nós.

P. Qual é o valor de Maria, do Terço e da oração no mundo de hoje?

R. Maria e a oração têm, hoje em dia, um valor enorme. Com a presença atual de um novo terrorismo, mais terrível, efeito, talvez, como muitos pensam, do Mal com M maiúsculo, não bastam meios normais para combatê-lo, mas é preciso recorrer ao Bem com B maiúsculo, e isto é, a Deus e ao que diz respeito a Ele. Disto decorre a importância da oração, como foi feito em Assis, e portanto, também a do terço.

E neste mundo, pois, dividido entre países ricos e países pobres, que é a causa mais profunda do terrorismo, chamados, como somos, a nos comprometer, a suscitar como nunca a solidariedade, a partilha, a fraternidade, para fazer da humanidade sempre mais uma família, ninguém como Maria, porque mãe universal, pode nos dar uma mão.

P. O que responder a quem não acredita na oração e sobretudo na sua eficácia nos fatos da vida?

R. Quando alguém não acredita na oração, em geral, é porque tem pouca fé em Deus. É preciso, portanto, ajudá-lo a reavivá-la. E existem muitas possibilidades a nossa disposição. Entre essas, uma muito eficaz, é o testemunho que nós, cristãos, damos, quando nos amamos reciprocamente. De fato, está prometida a esta unidade no amor, a conversão do mundo. Disse Jesus: “Que todos sejam um, para que o mundo creia” (cf Jo 17,21).

P. Como conciliar Maria com a vida espiritual e estética dos artistas?

R. Os artistas tendem ao belo. Constatei como para eles – se creem – o melhor atributo de Deus é a beleza. Vai bem para eles ‘Deus verdadeiro’, ‘Deus amor’, mas melhor ainda, ‘Deus belo’. E Maria, a “toda bela”, é, por assim dizer, a encarnação do belo. Este é o motivo do seu relacionamento com os artistas e dos artistas com ela. São realmente atraídos por Ela, se a pintaram, esculpiram, cantaram em todos os tempos e em todas as maneiras.

P. Qual foi o gênesis do Congresso mariano?

R. Tudo começou no dia 16 de outubro de 2002, no final da audiência do Santo Padre da quarta-feira, depois que ele tinha assinado a sua carta apostólica: Rosarium Virginis Mariae. Entre cerca de 600 pessoas do nosso Movimento, presentes na Praça de S. Pedro, estava também eu. Foi naquela ocasião que o Papa me entregou uma sua longa mensagem, na qual, entre outras coisas, se lia: “Nesta recorrência, quero confiar idealmente aos focolarinos a oração do Rosário. (…) Estou certo de que a devoção de vocês à Virgem Santa, lhes ajudará a dar o relevo necessário à iniciativa de um ano dedicado ao Rosário”.

Desde aquele momento, no mundo inteiro, floresceram as mais variadas realizações para propor novamente a muitos a importante recitação do terço. O Congresso mariano é uma delas.

P. Poderia nos dizer duas palavras sobre o programa e sobre os pronunciamnetos durante os três dias do Congresso?

R. Haverá reflexões sobre a carta apostólica do Santo Padre sobre o Rosário e os novos “Mistérios da luz”, com testemunhos de famílias, políticos, religiosos, sacerdotes e jovens. Serão realizadas duas mesas redondas: uma, reservada aos responsáveis de diversos Movimentos eclesiais sobre o tema; outra, com cristãos de outras Igrejas, que comentam a carta do Papa. O discursos serão intercalados por momentos artísticos, bem selecionados, para honrar Maria, a toda bela. As liturgias eucarísticas serão presididas por cardeais ou arcebispos, entre os quais o cardeal Angelo Sodano, o cardeal Miloslav Vlk, arcebispo de Praga, mons. Rylko, secretário do Pontifício Conselho para os Leigos, e outros

08 junho 2021

Uma vida pela unidade

Os focolarinos deram o nome ao Movimento dos Focolares. Vivem em pequenas comunidades de leigos, os focolares, coração de todas as realidades que compõem o Movimento, e empenham-se em manter vivo o “fogo”, do qual deriva o nome focolare.

São homens e mulheres que trabalham e colocam em comum os próprios bens. Foram atraídos por Deus e a Ele deram as suas vidas, firmemente convictos do Seu amor. Deixaram pai, mãe, família, pátria, para contribuir para a realização da oração de Jesus: “Que todos sejam um”(Jo 17,21).

Eles podem ser encontrados na ONU e junto aos doentes e aos pobres nas periferias das metrópoles, numa fábrica ou em territórios de “fronteira”, nos arranha-céus e nas favelas, nos vilarejos e nas capitais. Desejam tornar Jesus presente, segundo as palavras da Escritura: “Onde dois ou mais estão unidos em meio nome eu estou no meio deles”(Mt 18:20). Esta experiência de unidade com Deus é a força que os leva a lançar pontes de paz, a acender luzes de esperança na escuridão, a responder com o amor à violência. Cada ruptura, cada divisão os atrai como um ímã, porque lá a unidade é mais urgente e necessária, e por ela é preciso consumar-se.

No mundo inteiro os focolarinos e as focolarinas, de diversas nacionalidades, raças e também credos religiosos, são, no total, 7160, em 742 focolares, presentes em 83 países.

Poderia remeter a eles o escrito de Chiara Lubich: “A grande atração do tempo moderno: atingir a mais alta contemplação e permanecer misturado com todos… Diria mais, perder-se na multidão para impregná-la de divino… Partícipes dos desígnios de Deus sobre a humanidade, traçar sobre a multidão recamos de luz, e, ao mesmo tempo, dividir com o próximo a vergonha, a fome, os ultrajes, as alegrias fugazes”.

Alguns focolarinos são ordenados sacerdotes à serviço do Movimento.

Este fogo contagiou também pessoas casadas, fiéis ao próprio estado de vida e, ao mesmo tempo, membros do focolare, pela escolha radical de viver o Evangelho. O primeiro focolarino casado foi Igino Giordani. Quando ambos os esposos compartilham desta vida têm-se as famílias focolare: cônjuges disponíveis, segundo a situação familiar, a deslocar-se para outras partes do mundo, onde a presença deles pode ser uma contribuição fundamental para a unidade.

A dos focolarinos é uma vida exigente, não isenta de dificuldades ou fracassos, que consideram como matéria prima para declarar a Deus que, neste compromisso pela unidade, Ele é tudo e eles nada, mas com Ele tudo é possível.

Tudo começou com Chiara Lubich, a fundadora do Movimento dos Focolares, que define o focolare “… imagem da família de Nazaré: uma convivência, no meio do mundo, de pessoas virgens e casadas totalmente doadas a Deus, ainda que de formas diferentes”

07 junho 2021

O segredo do verdadeiro amor

«O segredo do verdadeiro amor, do amor do qual falamos, emerge do Evangelho. O Evangelho é a Boa Nova que Cristo trouxe à terra. Portanto, é um amor que tem a sua origem em Deus, não é de origem humana. É um amor vivido pelas Pessoas da Santíssima Trindade. O Pai, por exemplo, ama a todos e manda sol e chuva sobre bons e maus. Ama a todos. Esse amor nos dispõe a amar todos os irmãos, não apenas os parentes, os amigos ou aqueles de quem gostamos, mas a amar a todos. Durante o dia o nosso amor deve se orientar a todas as pessoas que encontramos.

ìUma segunda exigência desse amor, que não é de origem humana porque vem do Céu, é que ama primeiro, não espera ser amado. Geralmente amamos porque somos amados. Ao invés, é preciso amar primeiro e Jesus, a segunda Pessoa divina que se fez homem, nos demonstrou isso. Ele morreu por nós quando ainda éramos pecadores, o que significa que não amávamos.

É um amor concreto como o de Jesus, que deu a própria vida. Não é um amor sentimental, platônico; é um amor concreto, que se faz um com todos, com aqueles que sofrem e que se alegram; que participa da alegria e do sofrimento dos outros, aliviando-o.

 Este amor, quando praticado, […] geralmente é retribuído porque as pessoas se sentem amadas, estão bem conosco, e nos perguntam: “Por quê?” E nós explicamos o motivo pelo qual as amamos. Desta maneira, abre-se um diálogo entre nós e as pessoas, que nem sempre são cristãs, católicas. Muitas vezes são de outras religiões ou não creem. Todavia, também aquelas que não creem possuem uma lei de amor impressa no coração, a força de amar porque foram criadas por Deus, que é amor.  O amor é isso.”

Chiara Lubich

Transcrição de uma entrevista de Erik de Hendriks para a televisão belga, de maio de 2004.
UMA SANTA SEMANA PARA VC.

06 junho 2021

Eis que estarei convosco todos os dias

Roma, 25 de maio de 1982
Comentário sobre a Palavra de Vida:

Eis que estarei convosco todos os dias, até o final dos tempos (Mt 28, 20).

Jesus ressuscitou. Desejando falar com seus discípulos, chama-os a um monte onde dá a eles uma série de diretivas para o futuro, até o fim dos tempos. Ele está cercado pelos onze apóstolos, que se prostraram diante dele, plenamente conscientes de que aquele que está entre eles é o seu Senhor, e também o Senhor do mundo.

O Pai premiou o Filho dando-lhe “todo o poder”, inclusive o de julgar o mundo no final dos tempos.
Jesus, encontrando-se com os apóstolos, confia a eles a missão de fazer com que todos os povos tornem-se seus discípulos. Isto se realizará por meio do batismo e do fato de “ensinar e observar” tudo o que Ele mandou. O batismo, de fato, não basta por si só, mas deve ser vivido, transformado em vida.
No entanto esta grandiosa tarefa de levar a luz a todos os povos não será uma obra humana, pois, diz Jesus:

Eis que estarei convosco todos os dias, até o final dos tempos.

Antes de voltar como juiz, Jesus continuará a estar próximo dos discípulos e a sustentá-los. Estará presente entre eles, não somente quando se reunirem ao redor do altar para celebrar a Sua morte e nutrirem-se da Eucaristia, mas sempre e em todos os lugares.
Iniciou-se deste modo uma nova era para a humanidade, caracterizada por uma presença – Jesus ressuscitado. Esta presença é a realidade unificadora do mundo, que reúne continuamente “todos os povos” de todas as épocas e de todos os cantos do globo para introduzi-los no Reino de amor do Pai. Esta presença constitui a Igreja na sua essência mais profunda.

Eis que estarei convosco todos os dias, até o final dos tempos.

Jesus é chamado de Emanuel, o que significa “Deus Conosco”. Com a sua ressurreição ele está realmente conosco, junto de todos nós.
E, já que Jesus está vivo entre nós, as Palavras que ele disse há dois mil anos não são somente a maravilhosa lembrança de uma personalidade do passado; são Palavras que ele – agora – dirige a mim, a você, a cada um de nós pessoalmente.
É para nós que Ele traz conforto e salvação; é a nós que continua servindo, especialmente se somos pobres, solitários, se estamos sendo provados; é a nós que ele ajuda nos fracassos, que encoraja nas dificuldades.

Eis que estarei convosco todos os dias, até o final dos tempos.

Ele vive na sua Igreja.
Portanto, onde podemos encontrá-lo? Como melhor aproximar-nos dele?
Ele está logo ali; está do meu lado, está junto de você.
Jesus esconde-se no pobre, no desprezado, no pequeno, no doente, em quem necessita de um conselho ou em quem foi tolhido de sua liberdade. Está naquele que é menos bonito, no que foi marginalizado… E ele mesmo o disse: “Eu tive fome e me deste de comer…”.
 Está presente na comunidade que atua o seu ensinamento – mesmo tratando-se de uma minúscula comunidade, como pode ser uma família, um grupo de amigos, os companheiros de trabalho; de fato, bastam duas ou três pessoas unidas no Seu nome.
Ele se encontra presente quando rezamos, estando concordes e unidos nele; e a Sua presença torna eficaz a nossa oração.
A Sua presença manifesta-se também como assistência e ajuda àqueles que O anunciam ao povo – a nós, portanto, se somos chamados a testemunhá-lo.
Ele se torna ainda “visível” naqueles que escolheu como seus ministros.
E, finalmente, todos sabemos que Ele está lá, em todos os pontos da Terra, presente na Eucaristia.
O que mais poderíamos desejar?
Procuremos, pois, começando a descobri-lo lá onde Ele está. Deixemos que nos dirija as suas divinas Palavras.
Deixemos que Ele nos dê a sua mão potente.

Chiara Lubich



(Este comentário à Palavra de Vida foi publicado originalmente, na sua versão integral, em maio de 1982.)

04 junho 2021

Dois grandes amores

Para ser como Maria, temos de moldar o nosso espírito e todo o nosso ser ao Crucificado, sobretudo às suas dores espirituais, sem análises excessivas que nos levam ao puramente “humano”, ao passo que abraçá-las, querendo e aceitando com satisfação, dentro do possível, leva-no ao divino.

Não existe cristão sem cruz. Ela, no dizer de são Luiz Grignon de Monfort, nos precederá no Céu e por ela teremos a glória. Por ela, somos “membros legítimos de Cristo”.
A cruz é a raiz da caridade. Não podemos ser filhos de Deus se não formos como filho de Deus, que é o Salvador pela cruz.
Como ela temos uma vida sólida, bem fincada, protegida contra as tempestades, não sujeita a variações. Com ela caminhamos seguros.
Ela nos fará sábios entre os homens, mesmo se por eles julgados estultos.
Ela nos purificará e nos tornará capazes de levar o Reino de Deus às almas, coisa que deve ser paga, como pago deve ser o “gerar”Cristo entre nós.

Dois grandes amores há de possuir o nosso coração: Maria, meta de chegada, e a cruz, meio para ser outra Maria no mundo e cumprir os desígnios de Deus.
Deus quer que sejamos pequenos salvadores, que encaram os males do mundo e lhes dão solução, e sabem que vieram não para os sãos mas para os doentes, não para os justos, mas para os pecadores e os afastados.


Chiara Lubich

03 junho 2021

Estar bem firmes na barca

Chiara Lubich explica o papel do Movimento dos Focolares no diálogo rumo à unidade. Como uma barca, que navega impulsionada pelo sopro do Espírito Santo.

Caríssimo, certa vez, ao encontrar-me com o Santo Padre, eu lhe fiz a seguinte pergunta: “Como Vossa Santidade vê o nosso Movimento?”. “Como um Movimento ecumênico”, respondeu ele.

[…] É realmente assim. O nosso Movimento é ecumênico. De fato, o seu objetivo é a atuação do Testamento de Jesus: “Que todos sejam um”*.

O carisma que o suscitou e que o anima é o carisma da unidade.

Portanto, um Movimento que não nasceu da vontade de um homem ou de uma mulher, mas da vontade do Espírito Santo, distribuidor de carismas.

[…] Também nós estamos incluídos no grande fenômeno do ecumenismo, que se desenvolveu nestes últimos tempos no âmbito do cristianismo.

Para fazer o quê?

Para dar uma contribuição. De que tipo? Grande, pequena, determinante, fundamental, secundária?

Nós não sabemos. Mas uma coisa é certa: Deus sabe.

[…] Muitas vezes, entre as perguntas que me fazem, há algumas sobre o ecumenismo. Perguntam-me sobre o desenvolvimento do ecumenismo no mundo e entre nós; o que podemos prever, quanto tempo devemos esperar, o que fazer para  apressar os tempos…

Querem saber o que fazer.

Deus nos colocou nesta Obra como se estivéssemos dentro de uma barca, que navega nas águas do tempo, rumo a um porto desconhecido.

Quem a mantém à gala não somos nós, mas o Espírito Santo que, com o seu sopro divino, nos indica as várias etapas da viagem a ser realizada.

Antes de tudo ele nos manifestou o espírito que devemos ter […]  e os horizontes que deveríamos olhar e para os quais trabalhar: a unidade mais estreita na Igreja Católica, com os outros cristãos, e assim por diante.

[…] O nosso dever é ficar lá, dentro da barca, no lugar que a Providência reservou para nós, ocupando bem a nossa posição, para que as ondas do mar e do mundo não nos arrebatem.

Estar lá, parados, mas totalmente ativos na vontade de Deus, naquilo que desde sempre ele planejou para nós, para que a barca não balance, mas avance segura rumo a um destino que nós não conhecemos, mas no qual acreditamos, infinitamente belo e útil à difusão do Reino da unidade sobre a terra.

Ficar lá, ainda que não chegássemos a ver “aquela hora” […] porque, depois de nós, outros tomarão o nosso lugar e nós, com eles, poderemos um dia agradecer a Deus por ter-nos feito participar da construção de uma Obra sua nesta terra, extremamente útil (porque sua) ao ecumenismo universal.

E então? […] seguir Deus: segui-lo rapidamente: e a barca avança. Estar bem firmes, fixos no momento presente. […]

Chiara Lubich

(em uma conexão telefônica, Rocca di Papa 28 de setembro de 1995)


 

02 junho 2021

A oração de Jesus (Jo 17,1-26)

1Assim falou Jesus, e, erguendo os olhos ao céu, disse: “Pai, chegou a hora: glorifica teu Filho, para que teu Filho te glorifique, 2e que, pelo poder que lhe deste sobre toda carne, ele dê a vida eterna a todos os que lhe deste! 3Ora, a vida eterna é esta: que eles te conheçam a ti, o único Deus verdadeiro, e aquele que enviaste, Jesus Cristo. 4Eu te glorifiquei na terra, concluí a obra que me encarregaste de realizar. 5E agora, glorifica-me, Pai, junto de ti, com a glória que eu tinha junto de ti antes que o mundo existisse.

6Manifestei o teu nome aos homens que do mundo me deste. Eram teus e os deste a mim e eles guardaram a tua palavra. 7Agora reconheceram que tudo quanto me deste vem de ti, 8porque as palavras que me deste eu as dei a eles, e eles as acolheram e reconheceram verdadeiramente que saí de junto de ti e creram que me enviaste. 9Por eles eu rogo; não rogo pelo mundo, mas pelos que me deste, porque são teus, 10e tudo o que é meu é teu, e tudo o que é teu é meu, e neles sou glorificado. 11Já não estou no mundo; mas eles permanecem no mundo e eu volto a ti. Pai santo, guarda-os em teu nome que me deste, para que sejam um como nós. 12Quando eu estava com eles, eu os guardava em teu nome que me deste; guardei-os e nenhum deles se perdeu, exceto o filho da perdição, para cumprir-se a Escritura. 13Agora, porém, vou para junto de ti e digo isso no mundo, a fim de que tenham em si minha plena alegria. 14Eu lhes dei a tua palavra, mas o mundo os odiou, porque não são do mundo, como eu não sou do mundo. 15Não peço que os tires do mundo, mas que os guardes do Maligno. 16Eles não são do mundo como eu não sou do mundo. 17Santifica-os na verdade; a tua palavra é verdade. 18Como tu me enviaste ao mundo, também eu os enviei ao mundo. 19E, por eles, a mim mesmo me santifico, para que sejam santificados na verdade.

20Não rogo somente por eles, mas pelos que, por meio de sua palavra, crerão em mim: 21a fim de que todos sejam um. Como tu, Pai, estás em mim e eu em ti, que eles estejam em nós, para que o mundo creia que tu me enviaste. 22Eu lhes dei a glória que me deste para que sejam um, como nós somos um: 23eu neles e tu em mim, para que sejam perfeitos na unidade e para que o mundo reconheça que me enviaste e os amaste como amaste a mim. 24Pai, aqueles que me deste quero que, onde eu estiver, também eles estejam comigo, para que contemplem minha glória, que me deste, porque me amaste antes da fundação do mundo. 25Pai justo, o mundo não te conheceu, mas eu te conheci e estes reconheceram que tu me enviaste. 26Eu lhes dei a conhecer o teu nome e lhes darei a conhecê-lo, a fim de que o amor com que me amaste esteja neles e eu neles”.

Do livro: A UNIDADE - Ed. Cidade Nova


 

01 junho 2021

O testamento de Jesus

15 de dezembro de 1959

Se tiveres a sorte de ir à Terra Santa durante a primavera, dentre as mil coisas que Jerusalém oferece à tua contemplação e à tua meditação, uma delas toca de modo particular pelo que evoca em sua extrema simplicidade. Resistindo ao tempo e lavada pelas intempéries de dois mil anos, uma longa escada de pedra, pontilhada aqui e ali por papoulas vermelhas como o sangue da Paixão, estende-se qual fita encrespada, descendo límpida e solene para o vale do Cedron.

Ficou nua ao relento, bordejada por uma moldura de relva, como se nenhuma abóbada de templo pudesse substituir o céu que a coroa. Dali – conta a tradição – Jesus desceu naquela última noite, após a ceia, quando, “levantando os olhos ao céu” repleto de estrelas, rezou: “Pai, chegou a hora...”.

Causa impressão pôr os nossos pés onde os pés de um Deus tocaram, e a alma transborda dos olhos ao contemplar a arcada celeste que os olhos de um Deus olharam. A impressão ali pode ser tão forte, que a meditação nos fixa em adoração.

Foi uma oração única, a Dele, antes de morrer. E quanto mais esse “Filho do homem”, que tu adoras, resplandece Deus, mais o sentes como homem e te enamoras. O discurso Dele foi entendido plenamente somente pelo Pai. No entanto, Ele o fez com voz clara, talvez para que um eco de tão grande melodia chegasse até nós.

CHIARA LUBICH