31 outubro 2021

O livro dos livros

E que o Crucificado se tenha manifestado bem cedo na vida das primeiras focolarinas com a necessidade de imitá-lo, para concretizar o nosso amor a Deus, no-lo atestam alguns conceitos de uma carta minha, datada talvez de 1944.

Mando para vocês um pensamento que sintetiza toda a nossa vida espiritual: Jesus crucificado!

Tudo está aqui.

É o livro dos livros.

É a síntese de todo saber.

É o amor mais ardente.

É o modelo perfeito.

Proponhamos que ele seja para nós o único ideal da vida.

Foi ele quem arrebatou são Paulo a tamanha santidade…

Nossa alma, carente de amar, ponha-o sempre diante de si em cada momento presente.

Não seja sentimentalismo o nosso amor.

Não seja compaixão exterior.

Seja conformidade (a ele).

#CHIARALUBICH 

29 outubro 2021

Quem é o amor?

Um precedente da nossa história.

Não havia ainda o primeiro focolare. Nem eu conhecia ainda a primeira de minhas companheiras. Eu era professora. Um dia, aproximou-se de mim uma pessoa muito atuante, uma dirigente de um grupo de jovens que ela conseguira atrair para a religião com encontros recreativos, músicas, histórias divertidas. Perguntou-me se eu podia fazer uma palestra para eles. Respondi afirmativamente.

“Sobre o que você vai falar?”, perguntou-me. “Sobre o amor”, disse. “E o que é o amor?”, prosseguiu, curiosa. “Jesus crucificado”, respondi.

Talvez tenha sido essa a primeira vez em que falei d’Ele, em minha vida de futura focolarina.

Naquela época, até em ambientes notoriamente fiéis à religião, como aquele de onde todas nós provínhamos, não era comum ouvir-se falar de amor. E muito menos acreditar que o Crucificado, que atrai todos a si, fosse uma arma válida para o apostolado, inclusive neste século.

Mas — confesso — até hoje não sei quem me pôs nos lábios aquela definição do amor.

Mais tarde entendi: Jesus crucificado — é o que também diz são Paulo — “se entregou por nós” (Ef 5,2), “se entregou a si mesmo por mim” (Gl 2,20).

#ChiaraLubich 

27 outubro 2021

Como a Igreja

Foi exatamente no abandono de Jesus na cruz que, desde o início do Movimento, Deus concentrou a nossa alma e foi nesta dor e por esta dor, ponto culminante da Paixão, que o nosso Movimento se desenvolveu.

Os fatos se desenrolaram como vou explicar; entretanto, é possível fazer uma constatação desde já: as linhas da grande história da fundação da Igreja, de certo modo, também se encontram na história do nosso Movimento, que é Igreja, feitas as devidas proporções. É uma obra, a nossa, que tem a fisionomia de sua Mãe, como afirmou João Paulo II em agosto de 1984: “Vejo que seguis de modo autêntico aquela visão da Igreja, aquela definição que a Igreja deu de si mesma no Concílio Vaticano II” (João Paulo II, 1984, p. 25).

Sabemos que o ponto de partida da salvação do gênero humano foi o amor de Jesus pelo Pai. Esse amor estimulou Jesus a cumprir o que o Pai desejava, isto é, a fazer a vontade do Pai. Mas a vontade do Pai se resumia praticamente em amar os irmãos e Jesus deu sua vida por amor a eles: “Ninguém tem maior amor do que aquele que dá a vida por seus amigos” (Jo 15,13), dissera Ele.

Ora, se observarmos o nosso Movimento, vemos que ele também parte de um desejo de amor: amar a Deus, redescoberto como Amor, como Pai, nos primeiros dias de nossa história.

Também para nós, esse amor se traduzia e se traduz em fazer a vontade de Deus, que se resume no Mandamento Novo: “Amai-vos uns aos outros como eu vos amei” (Jo 15,12).

De modo que, inclusive para nós, amar a Deus tem este significado: estarmos prontos a morrer uns pelos outros (cf. Jo 15,13).

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25 outubro 2021

O apostolado como culto

Mas, pensando ainda nos primeiros cristãos, vemos que para eles o apostolado era, e de um modo especial, um culto.

Paulo diz: “Deus, a quem sirvo em meu espírito, anunciando o Evangelho do seu Filho, é testemunha…” (Rm 1,9).

Anunciando o Evangelho, o apóstolo faz a vontade de Deus e se oferece como vítima.

Anunciando o Evangelho, o apóstolo faz ainda um verdadeiro sacrifício, oferecendo a Deus os convertidos por ele, que aparecem como vítimas transformadas pelo Espírito Santo de “carnais” em “espirituais” (cf. Rm 15,16).

Muitas vezes, eles eram chamados “primícias” (termo usado geralmente para o culto): “Nós, porém, sempre agradecemos a Deus por vós, irmãos queridos do Senhor, porque Deus vos escolheu como primícias” (2Ts 2,13).

Não é talvez este o culto característico, que também o nosso Movimento eleva a Deus?

No fundo, a ação da nossa Obra não é senão converter-nos e reconverter-nos a Deus, e converter e reconverter muitas e muitas pessoas.

Também nós temos, em nós e em muitos, vítimas espirituais e primícias a oferecer a Deus no mundo inteiro.

Portanto, sintamo-nos felizes porque a nossa vida, toda a nossa existência, vivida segundo as linhas que nos foram dadas por Deus e são abençoadas pela Igreja — vontade de Deus para nós — é um culto contínuo, que oferecemos a Deus, é expressão genuína do sacerdócio real que nos investe a todos.

1 “(E) naquele momento tudo se inverte. Em Jesus, a vontade humana, como no Getsêmani, consente. “Pai, em tuas mãos entrego o meu espírito.” Desaparece o abismo do desespero como uma gota de ódio irrisória no abismo infinito do amor. A distância entre o Pai e o Filho não é mais o lugar do inferno, mas do Espírito” (Bartolomeu I, 1994, p. 7).

2 “Tudo está consumado”. [N.d.T.]

3 Remetendo “explicitamente nas mãos do Pai divino o eterno vínculo de união que a Ele o unia, o Espírito Santo”, Jesus experimenta “até o fim o abandono completo também po r parte do Pai”, morre “nas trevas extremas abandonadas pelo Espírito” (Balthasar, 1969, pp. 30-48).

4 “Não sabeis que todos os que fomos batizados em Cristo Jesus, é na sua morte que fomos batizados? Portanto, pelo Batismo nós fomos sepultados com Ele na morte para que, como Cristo foi ressuscitado dentre os mortos pela glória do Pai, assim também nós vivamos vida nova” (Rm 6,3-4).

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23 outubro 2021

Sacerdotes também nós

Mas o fato de o Apóstolo falar de sacrifício vivo e de culto espiritual significa que também nós somos sacerdotes, daquele sacerdócio “real” conferido a todos os cristãos no Batismo.

De fato, Pedro exorta:

Também vós, como pedras vivas, constituí-vos em um edifício espiritual, dedicai-vos a um sacerdócio santo, a fim de oferecerdes sacrifícios espirituais aceitáveis a Deus por Jesus Cristo. (1Pd 2,5).

E o Apocalipse diz dos cristãos: “serão sacerdotes de Deus e de Cristo” (20, 6).

Na verdade, cada cristão é sacerdote em Jesus, porque a unidade já foi restabelecida, o acesso a Deus não se reserva mais ao sumo sacerdote uma vez por ano, como no Antigo Testamento, mas a todos os batizados, que se tornaram “uma raça eleita, um sacerdócio real” (1Pd 2,9).

O culto que o Pai quer de nós é um culto espiritual (“sacrifícios espirituais”, diz Pedro), como Ele quis do próprio Jesus.

A oferenda consiste — segundo Paulo — em se transformar e se renovar na mente, “a fim de poderdes discernir qual é a vontade de Deus” (Rm 12,2).

Discernir qual é a vontade de Deus para fazê-la.

Fazer aquela vontade de Deus, a que também o nosso Movimento dá tanto relevo, como expressão do nosso amor a Deus.

E a vontade de Deus, que seguimos, faz-nos ao mesmo tempo sacerdotes e vítimas. Talvez Deus tenha suscitado nosso Movimento visando também a esta finalidade: contribuir para reavivar o sentido sacerdotal no povo cristão, como almeja o Concílio Vaticano II (cf. LG 10 e 34), consoante o estilo dos primeiros cristãos.

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21 outubro 2021

A parte que nos cabe

Mas, para usufruir de tanta graça, o homem também deve fazer uma pequena parte. Antes de mais nada, deve aceitar na fé este dom de Deus, que lhe é transmitido no Batismo. Nele, fomos mortos e sepultados com Cristo. E, por ele, ressuscitaremos4.

Além disso, Deus nos deu também um corpo para que, por meio dele, lhe obedeçamos.

Uma obediência que significa cumprir a sua vontade, já que fomos santificados e transformados em irmãos de Jesus.

Daqui provém a nossa possibilidade de fazer também da nossa vida um sacrifício.

Paulo assim se expressava:

Eu vos exorto, pois, irmãos,  em nome da misericórdia de Deus, a vos oferecerdes vós mesmos em sacrifício vivo, santo e agradável a Deus: este será o vosso culto espiritual. (cf. Rm 12,1)

#ChiaraLubich 

19 outubro 2021

Jesus Abandonado, mestre da unidade

No abandono, Jesus é mestre de unidade, da unidade divina.

O Estatuto do Movimento dos Focolares, documentando uma longa experiência de vida, diz que os membros da Obra,

… em seu empenho para atuar a unidade, amam com predileção — e procuram viver em si mesmos — Jesus crucificado que, no auge de sua paixão, ao gritar: “Deus meu, Deus meu, por que me abandonaste?” (Mc 15,34; Mt 27,46), fez-se artífice e caminho da unidade dos homens com Deus e dos homens entre si.

O amor a Jesus crucificado e abandonado — divino modelo para todos aqueles que desejam trabalhar pela unidade dos homens com Deus e dos homens entre si — leva os membros da Obra àquele desapego exterior e sobretudo interior, que é necessário para realizar toda e qualquer unidade sobrenatural. (Art. 8)

#ChiaraLubich 

17 outubro 2021

Jesus Abandonado, nosso irmão

No abandono, reduzindo-se Jesus, por assim dizer, a um simples homem, torna-se nosso irmão. Mas, sendo Deus, elevou a nossa convivência a uma fraternidade sobrenatural, fez-nos um com Ele: “Eu neles e Tu em mim, para que sejam perfeitos na unidade” (Jo 17,23).

Pois, tanto o Santificador quanto os santificados, todos, descendem de um só; razão porque não se envergonha de os chamar irmãos. (Hb 2,11)

Também nós notamos muitas vezes que Jesus, após a ressurreição, chamava os seus discípulos de irmãos.

“Não temais! Ide anunciar a meus irmãos que se dirijam para a Galiléia” (Mt 28,10).


#ChiaraLubich 

15 outubro 2021

Jesus Abandonado, o Redentor

No abandono, Jesus é a figura mais autêntica, mais genuína, mais plena, mais expressa do Redentor. Aqui a redenção tem o seu ápice.

Diz Pasquale Foresi:

Jesus Abandonado é o símbolo, é o sinal, é a indicação precisa dessa redenção. Mesmo que a redenção se tenha processado em todas as dores espirituais e físicas de Jesus, a dor maior, a que simboliza toda a redenção, teve lugar no momento em que Ele sentiu a separação do Pai. Naquele instante Ele reuniu a humanidade ao Pai.

Portanto, pode-se ver em Jesus Abandonado a dor típica com a qual se consumou a redenção do gênero humano. (Foresi, 1988, pp. 56-57)

No Horto, Jesus se preparava para cumprir a redenção. A sua ressurreição é fruto de sua morte física, mas sobretudo espiritual.

No abandono Jesus é, em ato, o Redentor; é o Mediador: tendo-se feito nada, une os filhos ao Pai.

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13 outubro 2021

Assim nasce a Igreja

Tendo-nos gerado naquele grito, aqui nasce a Igreja, o povo novo.

Aqui é dado o Espírito Santo.

O Espírito Santo que, como Deus, unia Jesus ao Pai.

E, no abandono, se obscurece em Jesus o vínculo com o Pai.

Diz Chardon:

Sendo o Espírito Santo o verdadeiro Paráclito, isto é, o perfeito Consolador […], produz internamente na alma [de Jesus] uma cruz mais desastrosa [… do que aquela exterior] com a suspensão de suas maravilhosas consolações. (Chardon, 1895, pp. 262.264)

É o preço do dom que o Espírito Santo nos faz, como vínculo que une todos os homens com Jesus e entre eles, formando o Corpo Místico de Cristo, o Cristo total.

É no abandono que o sacrifício de Jesus manifesta todo o seu caráter interior, espiritual, divino.

Dissera Ele à samaritana que se aproximava a hora, e era aquela, em que os verdadeiros adoradores adorariam o Pai em espírito e verdade (cf. Jo 4,23).

Aqui está em Jesus o Adorador por excelência.

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11 outubro 2021

Jesus crucificado: o sacrifício

 Mas, não seja Jesus visto na vida do cristão apenas como modelo a ser imitado.

Jesus crucificado é o sacrifício.

Como todos sabemos, no Antigo Testamento costumavam-se oferecer sacrifícios a Deus com o derramamento do sangue de animais. Eles tanto serviam para purificar os homens de seus pecados, como para uni-los à vontade de Deus.

No Antigo Testamento, o sangue era sinal de vida e a vida é sempre do agrado de Deus. Portanto, imolando-a — e o sangue era a expressão exterior desse ato — prestava-se culto a Deus.

Contudo, esses sacrifícios não passavam de uma sombra do que deveria ser o sacrifício no Novo Testamento (cf. Hb 10,1).

Eis, de fato, Jesus, o Cordeiro de Deus, que derrama o seu sangue, sim, uma vez para sempre, dando com isso a sua vida, porém segundo o que está escrito na Carta aos Hebreus:

Ao entrar no mundo, Ele afirmou: Tu não quiseste sacrifício e oferenda. Tu, porém, formaste-me um corpo. Holocaustos e sacrifícios pelo pecado não foram do teu agrado. Por isso eu digo: Eis-me aqui, […] eu vim, ó Deus, para fazer a tua vontade. (Hb 10,5-7)


O sacrifício daquele corpo, do Homem-Deus, é fazer a vontade de Deus.

O sacrifício de Jesus, portanto, realiza e leva à perfeição o sentido mais profundo e interior dos sacrifícios do Antigo Testamento.

Na verdade, doando o seu sangue, apesar de divino, não faria ainda tudo o que estava na vontade do Pai.

Ele, que era Deus, era a Vida.

Portanto, devia morrer, de certo modo, também como Deus: derramar um sangue espiritual, divino, dar de si Deus em si 4

1 Cf. Is 53,7, segundo a Vulgata latina.

2 “Mas o mundo saberá que amo o Pai e faço como o Pai me ordenou. Levantai-vos, partamos daqui!” (Jo 14,31).

3 “Tendo dito que Cristo é o caminho, e que para segui-lo é preciso morrer à mesma natureza tanto nas coisas sensíveis como nas espirituais, quero explicar agora como se realiza isto a exemplo de Cristo; porque é Ele nosso modelo e luz” (João da Cruz, 1996, p. 206).

4 “Deus não tem para si a sua divindade como um presa, como o ladrão agarra a bolsa, mas Ele se dá. A glória da sua divindade está no fato de que Ele pode ser ‘altruísta’” (Barth, 1969, pp. 174-175).

 

09 outubro 2021

Os santos e a cruz

Por estar muito próximo ainda da passagem de Jesus pela terra, Inácio, bispo de Antioquia, interpreta ao pé da letra as palavras “toma a tua cruz” no caminho para o martírio, e escreve aos Romanos:

Pedi para mim apenas a força interior e exterior, para que eu não só diga, mas queira ser cristão; não só seja chamado, mas de fato o seja. […] Então, quando o mundo não puder mais ver o meu corpo, serei verdadeiramente discípulo de Jesus Cristo. […] É agora que começo a ser um verdadeiro discípulo. Que nenhuma coisa visível ou invisível me impeça de obter a posse de Jesus Cristo! Fogo, cruz, encontro com as feras, dilaceramentos, esquartejamentos, deslocamentos de ossos, mutilações dos membros, trituração de todo o corpo, os mais perversos suplícios do diabo caiam sobre mim, contanto que alcance a posse de Jesus Cristo. […] Ouvi, antes, o que agora vos escrevo, pois é na plenitude da vida que exprimo meu desejo ardente de morrer. Minhas paixões humanas foram crucificadas, não há em mim fogo para amar a matéria. Não há senão a “água viva” que murmura dentro de mim e me diz: “Vem para o Pai”. (Aos Romanos, 1985, pp. 22-23)

Os santos, que são os cristãos realizados, apreenderam o segredo, o valor da cruz.

A propósito, assim diz Grignion de Montfort:

A Sabedoria, enquanto espera o grande dia do seu triunfo no Juízo Final, quer a cruz como distintivo e arma de todos os eleitos. Com efeito, não acolhe filho algum que não a tenha como distintivo, nem recebe discípulo algum que não a traga na fronte, sem enrubescer; no coração, sem desgosto; e nos ombros, sem arrastá-la ou rejeitá-la […]. Não aceita soldado algum que não a empunhe como uma arma para defender-se e atacar, para desbaratar e esmagar todos os seus inimigos. Grita para eles: “Tende coragem: eu venci o mundo!” (Jo 16,33) […]. Eu, o vosso chefe, venci o meus inimigos com a cruz, e vós também o fareis por meio deste sinal! (Grignion de Montfort, 1990, pp. 204-205)


#ChiaraLubich 

07 outubro 2021

Jesus, modelo para os cristãos

Desde aquele tempo feliz em que Cristo viveu, morreu e ressuscitou, Ele tornou-se o Caminho, o modelo para cada um de nós.

Como Jesus, o cristão deve amar o Pai e, por isso, fazer a sua vontade, a Ele submeter-se. E a vontade de Deus para o cristão é que ele também chegue à glória, à felicidade, pelo caminho da cruz, como Jesus.

Ele mesmo é quem nos ensina como segui-lo. De fato, diz a todos: “Se alguém quer vir após mim, renuncie a si mesmo, tome a sua cruz cada dia e siga-me” (Lc 9,23).

Seguir Jesus é, antes de mais nada, uma renúncia. É o renunciar a si mesmo, que não queremos entender no mundo de hoje, na ilusão de existir um cristianismo sem dificuldades. Mas a doutrina de Jesus é clara e forte: não é de modo algum a falta de freios morais! Paulo diz:

“Mortificai, pois, os vossos membros terrenos: fornicação, impureza, paixão, desejos maus e a cupidez, que é idolatria” (Cl 3,5), porque aspirar às coisas ter-renas é conduzir-se como “inimigos da cruz de Cristo” (Fl 3,18).

Seguir Jesus quer dizer também tomar a própria cruz cada dia.

Jesus alude a cada dor de cada dia: que sejam aceitos todos os pequenos sofrimentos diários. Mas ao nos exortar a tomar a nossa cruz, deu sentido e valor também ao nosso padecer.

Lembro quão grande foi a minha impressão em Jerusalém, ao nos mostrarem no Calvário o furo onde foi plantada a cruz de Jesus. Joelhos por terra, aniquilada quase em adorador reconhecimento, só uma idéia me veio à mente: se não tivesse havido esta cruz, todas as nossas dores, as dores de todos os homens não teriam tido um nome.

Mas, “Cristo não mostra apenas a dignidade da dor”, diz Paulo VI. “Ele lança a vocação para a dor… convoca a dor (inclusive a nossa) para sair da sua desesperada inutilidade e, se unida à sua, tornar-se fonte positiva de bem” (Paulo VI, 1964, p. 212).

#ChiaraLubich 

05 outubro 2021

JESUS CRUCIFICADO

Jesus crucificado!

O que dizer? Como falar d’Ele de modo apropriado?

É homem como nós, e sabemos disso. Mas é também Deus. E é amor. Veio entre nós por uma obra que a todos nós diz respeito, que toca cada um pessoalmente. Ele nos criou, no entanto arruinamos o dom que nos deu e que deturpamos continuamente. Com a vida, herdamos as lágrimas, o sofrimento e, ao final dela, a morte, a anulação aparente de tanta experiência feita.

Mas eis que Ele entende a situação dos homens, conhece as lamentáveis vicissitudes de sua história, tem compaixão deles e desce à terra, carregando sobre si tudo o que o homem devia suportar. “Deus não quer que o homem se perca” (cf. Jo 6,39) e o salva. Portanto, Jesus sofre e morre pelo homem.

Com o homem, conosco, e como nós morre e depois… ressurge.

“Era necessário” (cf. Mc 8,31), diz Jesus quando se aproxima a hora do padecimento. Mas era necessário o quê? E para quem?

Ele assumira ser necessário encarnar-se, sofrer e morrer por nós, porque é amor!

Eis a vocação extraordinária do Homem-Deus, totalmente diferente, o oposto daquela a que os homens em geral aspiram.

Veio para “dar a sua vida em resgate por muitos” (Mt 20,28).

Tudo fora predisposto pelo Pai. Jesus se sujeita. Mas, como diz Isaías sobre o Servo do Senhor que se ofereceu porque quis1, Jesus quer a vontade do Pai. Ele a quer porque antes de tudo ama o Pai 2.

E a este amor o Pai corresponde com o seu poder e realiza um ato, que jamais realizara depois da Criação, isto é, a “Nova Criação”: a ressurreição.

Por meio dela, também o corpo de Jesus, “fraco” e passível de dor e de morte, transfigura-se, glorifica-se (cf. 2Cor 13,4), pronto para subir à direita do Pai.

Assim, o Homem-Deus abre a porta da Trindade para os homens redimidos.

#ChiaraLubich 

03 outubro 2021

Palavra de Vida - Outubro de 2021

Nós sabemos que tudo concorre para o bem daqueles que amam a Deus». (Rm 8, 28)

A Palavra que queremos viver este mês é tirada da carta do apóstolo Paulo aos Romanos. É um texto longo e cheio de reflexões e ensinamentos. Foi escrito antes da sua viagem para Roma, em preparação da visita àquela comunidade que Paulo ainda não conhecia pessoalmente.

O capítulo oitavo, de modo particular, põe em evidência a vida nova segundo o Espírito e a promessa da vida eterna para os indivíduos, os povos e todo o universo.

Nós sabemos que tudo concorre para o bem daqueles que amam a Deus.

Cada palavra desta frase é densa de significado.

Paulo proclama, acima de tudo, que, como cristãos, conhecemos o amor de Deus e estamos conscientes que cada experiência humana faz parte do grande projeto de salvação que Deus tem para nós.

Tudo – diz Paulo – concorre para a realização desse projeto: os sofrimentos, as perseguições, os fracassos e fragilidades pessoais, mas sobretudo a ação do Espírito de Deus no coração das pessoas que o acolhem.

O Espírito recolhe e faz seus os gemidos da humanidade e da Criação (1), e esta é a garantia da realização do projeto de Deus. 

Da nossa parte, é preciso responder ativamente a este amor com o nosso amor, confiando-nos ao Pai em todas as necessidades e dando testemunho da esperança nos novos Céus e na nova Terra (2) que Ele prepara para aqueles que colocam n’Ele a sua confiança.

Nós sabemos que tudo concorre para o bem daqueles que amam a Deus.

Como acolher, então, na nossa vida pessoal, quotidiana, esta proposta tão forte?

Chiara Lubich sugere-nos: “Antes de tudo, nunca nos devemos deter na aparência puramente exterior, material, profana das coisas, mas acreditar que cada acontecimento é uma mensagem de Deus para nos exprimir o seu amor. Veremos, então, como a vida – que nos pode parecer semelhante a um tecido visto à lupa, do qual vemos apenas uns nós e fios confusamente entrelaçados – é uma realidade bem diferente: é o desígnio maravilhoso que o amor de Deus vai tecendo, com base na nossa fé. Em segundo lugar, devemos, em cada momento, entregar-nos de forma total e confiante a este amor, tanto nas pequenas como nas grandes coisas. Melhor ainda: se soubermos entregar-nos ao amor de Deus nas circunstâncias comuns da vida, Ele dar-nos-á as forças necessárias para confiarmos n’Ele também nos momentos mais difíceis, como podem ser uma grande provação, uma doença ou o próprio momento da nossa morte. Experimentemos, então, viver desta forma. Não por interesse – isto é, para que Deus nos manifeste os seus planos e nos console – mas unicamente por amor. Vivendo assim, veremos como esta entrega confiante é fonte de luz e de paz infinita, para nós e para muitos outros” (3).

Confiar-se a Deus nas escolhas difíceis, como no caso que nos contou a O. L. da Guatemala: «Trabalhava como cozinheira num lar. Passando pelo corredor, ouvi uma velhinha a pedir água. Arriscando infringir as normas que me proibiam de sair da cozinha, levei-lhe com afeto um copo de água. Os olhos daquela idosa iluminaram-se. Depois de ter bebido metade do copo, apertou-me a mão: “Fica comigo dez minutos”. Expliquei-lhe que não devia, que arriscava ser despedida. Mas aquele olhar… Fiquei. Ela pediu-me para rezar com ela: “Pai nosso…”. E, por fim: “Canta alguma coisa, por favor”. Veio-me ao pensamento: “Não levaremos nada connosco, somente o amor…”. Os outros utentes olhavam para nós. A senhora estava feliz e disse-me: “Deus te abençoe, minha filha”. Pouco depois apagou-se. De qualquer forma, fui despedida por ter saído da cozinha. A minha família está longe e até precisa do meu apoio, mas eu estou em paz e feliz: respondi a Deus e aquela senhora não fez sozinha a passagem mais importante da sua vida».

Letizia Magri

1) Cf. Rm 8, 22-27.
2) Cf. Ap 21,1.
3) C. Lubich, Palavra de Vida de agosto de 1984, in Parole di Vita, a/c Fabio Ciardi (Opere di Chiara Lubich 5), Città Nuova, Roma 2017, p. 299.

01 outubro 2021

Servir

Amar quer dizer servir. Jesus nos deu o exemplo. Primeiro, com a morte de cruz favoreceu a humanidade inteira que foi, que é e que será. Mas depois, deu-nos também o exemplo quando lavou os pés. Era Deus, e nos lavou os pés, a homens. Portanto, também nós podemos lavar os pés dos nossos irmãos.

Podemos, não. Devemos. Isso é o cristianismo: servir, servir a todos, reconhecer patrões em todos. Se nós somos servos, os outros são patrões.

Servir, servir. Procurar alcançar a primazia evangélica, sim, mas pondo-nos a serviço de todos.

A serviço… Eis uma ideia que pode revolucionar o mundo. O cristianismo não é uma brincadeira, o cristianismo é uma coisa séria, não é uma mão de verniz, um pouco de compaixão, um pouco de amor, um pouco de esmola.

O cristianismo é exigente, é plenitude de vida.


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