18 dezembro 2010

Maria Fumaça

Maria Fumaça
Fumava cachimbo, bebia cachaça...
Maria Fumaça
Fazia arruaça, quebrava vidraça
E só de pirraça
Mata as galinhas de suas vizinhas
Maria Fumaça
Só achava graça na própria desgraça
Dez vezes por dia a delegacia
Mandava um soldado prender a Maria
Mas quando se via na frente da praça
Maria sumia tal qual a fumaça
Maria Fumaça
Não diz mais chalaça, não faz mais trapaça...
Somente ameaça que acaba com a raça
Bebendo potassa
Perdeu o rompante
Foi presa em flagrante roubando um baralho
Não faz mais conflito
Está no distrito lavando o assoalho

16 dezembro 2010

Pequeno Perfil De Um Cidadão Comum

Era um cidadão comum
Como esses que se vê na rua.
Falava de negócios, ria,
Via show de mulher nua.
Vivia o dia e não o sol,
A noite e não a lua.
Acordava sempre cedo,
Era um passarinho urbano.
Embarcava no metrô,
O nosso metropolitano.
Era um homem de bons modos:
"Com licença", "Foi engano".
Era feito aquela gente
Honesta, boa e comovida.
Que caminha para a morte,
Pensando em vencer na vida
Era feito aquela gente
Honesta, boa e comovida.
Que tem no fim da tarde
A sensação da missão cumprida.
Acreditava em Deus
E em outras coisas invisíveis.
Dizia sempre "sim"
Aos seus senhores infalíveis.
Pois é, tendo dinheiro,
Não há coisas impossíveis.
Mas o anjo do Senhor,
Do qual nos fala o livro santo,
Desceu do céu pra uma cerveja
Junto dele no seu canto.
E a morte o carregou
Feito um pacote no seu manto.
Era feito aquela gente
Honesta, boa e comovida.
Que caminha para a morte,
Pensando em vencer na vida
Era feito aquela gente
Honesta, boa e comovida.
Que tem no fim da tarde
A sensação da missão cumprida.

Sabe você

Você é muito mais que eu sou
Está bem mais rico do que eu estou
Mas o que eu sei você não sabe
E antes que o seu poder acabe
Eu vou mostrar como e por que
Eu sei, eu sei mais que você 
Sabe você o que é o amor? Não sabe, eu sei
Sabe o que é um trovador? Não sabe, eu sei. 
Sabe andar de madrugada tendo a amada pela mão
Sabe gostar, qual sabe nada, sabe, não
Você sabe o que é uma flor? Não sabe, eu sei. 
Você já chorou de dor? Pois eu chorei.
Já chorei de mal de amor, já chorei de compaixão
Quanto à você meu camarada, qual o que, não sabe não 
E é por isso que eu lhe digo e com razão
Que mais vale ser mendigo que ladrão
Sei que um dia há de chegar e isso seja quando for
Em que você pra mendigar, só mesmo o amor
Você pode ser ladrão quando quiser
Mas não rouba o coração de uma mulher
Você não tem alegria, nunca fez uma canção
Por isso a minha poesia, ah, ah, você não rouba não 

Monólogo de Orfeu

Mulher mais adorada!
Agora que não estás,
deixa que rompa o meu peito em soluços
Te enrustiste em minha vida,
e cada hora que passa
É mais por que te amar
a hora derrama o seu óleo de amor em mim, amada.
E sabes de uma coisa?
Cada vez que o sofrimento vem,
essa vontade de estar perto, se longe
ou estar mais perto se perto
Que é que eu sei?
Este sentir-se fraco,
o peito extravasado
o mel correndo,
essa incapacidade de me sentir mais eu, Orfeu;
Tudo isso que é bem capaz
de confundir o espírito de um homem.
Nada disso tem importância
Quando tu chegas com essa charla antiga,
esse contentamento, esse corpo
E me dizes essas coisas
que me dão essa força, esse orgulho de rei.
Ah, minha Eurídice
Meu verso, meu silêncio, minha música.
Nunca fujas de mim.
Sem ti, sou nada.
Sou coisa sem razão, jogada, sou pedra rolada.
Orfeu menos Eurídice: coisa incompreensível!
A existência sem ti é como olhar para um relógio
Só com o ponteiro dos minutos.
Tu és a hora, és o que dá sentido
E direção ao tempo,
minha amiga mais querida!
Qual mãe, qual pai, qual nada!
A beleza da vida és tu, amada
Milhões amada! Ah! Criatura!
Quem poderia pensar que Orfeu,
Orfeu cujo violão é a vida da cidade
E cuja fala, como o vento à flor
Despetala as mulheres -
que ele, Orfeu,
Ficasse assim rendido aos teus encantos?
Mulata, pele escura, dente branco
Vai teu caminho
que eu vou te seguindo no pensamento
e aqui me deixo rente quando voltares,
pela lua cheia
Para os braços sem fim do teu amigo
Vai tua vida, pássaro contente
Vai tua vida que estarei contigo.

05 dezembro 2010

A NOITE DE NATAL

Em a noite de Natal
Alegram-se os pequenitos;
Pois sabem que o bom Jesus
Costuma dar-lhes bonitos.
Vão se deitar os lindinhos
Mas nem dormem de contentes
E somente às dez horas
Adormecem inocentes.
Perguntam logo à criada
Quando acorde de manhã
Se Jesus lhes não deu nada.
– Deu-lhes sim, muitos bonitos.
– Queremo-nos já levantar
Respondem os pequenitos.

03 dezembro 2010

Poema da Amizade

 A amizade consegue ser tão complexa...
Deixa uns desanimados, outros bem felizes...
É a alimentação dos fracos
É o reino dos fortes

Faz-nos cometer erros
Os fracos deixam se ir abaixo
Os fortes erguem sempre a cabeça
os assim assim assumem-os

Sem pensar conquistamos
O mundo geral
e construimos o nosso pequeno lugar
deixando brilhar cada estrelinha

Estrelinhas...
Doces, sensiveis, frias, ternurentas...
Mas sempre presentes em qualquer parte
Os donos da Amizade...

02 dezembro 2010

«NÃO CONHEÇO SENÃO CRISTO E CRISTO CRUCIFICADO»[1] (20.9.1949)


Tenho um só Esposo na terra: Jesus Abandonado. 
Não tenho outro Deus além d’Ele. 
N’Ele está todo o Paraíso com a Trindade e toda a terra com a Humanidade. 
Por isso, o seu é meu e nada mais.
Sua é a dor universal e, portanto, minha. 
Irei pelo mundo à sua procura em cada instante da minha vida.
O que me faz mal é meu.
Minha, a dor que me perpassa no presente. 
Minha, a dor de quem está ao meu lado (ela é o meu Jesus). 
Meu, tudo aquilo que não é paz, gáudio, belo, amável, sereno... 
Numa palavra: aquilo que não é Paraíso. 
Pois eu também tenho o meu Paraíso, mas ele esta no coração do meu Esposo. 
Outros paraísos não conheço. 
Assim será pelos anos que me restam: sedenta de dores, de angústias, de desesperos, de melancolias, de desapegos, de exílio, de abandonos, de dilacerações, de... tudo aquilo que é Ele, e Ele é o Pecado.
Assim, dessecarei a água da tribulação em muitos corações próximos e — pela comunhão com meu Esposo onipotente — distantes.
Passarei como fogo que devora tudo o que há de ruir e deixa em pé só a verdade.
Mas é preciso ser como Ele, ser Ele no momento presente da vida.
[1] 1Cor 2,2