31 dezembro 2017

Os Carismas: Evangelho encarnado

A IGREJA É UM JARDIM MAGNÍFICO onde floriram todas as Palavras de Deus, floresceu Jesus, Palavra de Deus, em todas as mais variadas manifestações. […] Assim como a água se cristaliza em estrelinhas de todas as formas ao cair na terra como neve, também o Amor assumiu em Jesus a Forma por excelência, a Beleza das Belezas (“o mais belo dos Filhos dos homens”, cf. Sl 45,3). O Amor assumiu na Igreja diversas formas, que são as Ordens e as Famílias religiosas. Na Igreja, floresceram, e florescem, todas as virtudes. Os fundadores das Ordens são determinada virtude transformada em vida e subiram ao Céu somente porque eram Palavra de Deus. Cumpriram o desígnio de Deus, que só pode ser Verbo, Palavra. […] Os fundadores são Palavras de Vida. Todas essas Palavras formam a Igreja, outro Cristo ou um Cristo continuado, a Esposa de Cristo. É a Nova Jerusalém revestida de todas as virtudes. CADA FUNDADOR organizou os próprios seguidores em família com as leis eternas do Evangelho, após ouvi-las ressoarem, com força nova e atual, pelo Espírito Santo em seu espírito. ESSAS ORDENS e espiritualidades se mantêm, se vão à Fonte de onde obtêm Vida: Deus, o Evangelho inteiro, Jesus na expressão mais completa de si. O QUE TODAS as Ordens religiosas, juntas, formam? Se tivéssemos todas elas, formariam um Evangelho; se tivéssemos todas elas, pensando na Palavra de Vida que foi o fundador delas, seriam a Palavra encarnada, e essas Palavras, reunidas, formam um Evangelho vivo. E AINDA HOJE vemos realizarem-se os milagres dos discípulos de Jesus que abandonam tudo e o seguem: sinal de que Ele está presente na história e nos povos, como vinte séculos atrás.

30 dezembro 2017

A "chave" do Evangelho

ABRINDO COM AMOR o Evangelho, ou, em todo caso, o Novo Testamento, durante as longas horas de permanência nos abrigos antiaéreos, vieram à tona aquelas Palavras que falam mais explicitamente de amor: “Uma só coisa é necessária” (Lc 10,42); “Amarás o teu próximo como a ti mesmo” (Mt 19,19); “Amai os vossos inimigos” (Mt 5,44); “Amai-vos uns aos outros” (Jo 15,17); “Acima de tudo cultivai, com todo o ardor, o amor mútuo” (1Pd 4,8). Pareceram-nos Palavras de uma potência revolucionária, de uma vitalidade desconhecida, as únicas capazes de mudar radicalmente a vida – inclusive a nossa, de cristãos dessa época. ACHAMOS que era luminosíssima a Palavra do Testamento de Jesus: “Como eu vos amei, amai-vos também uns aos outros” (Jo 13,34), que, aliás, corresponde – e amplia – àquela do Testamento feito ao Pai: “Para que sejam um. […] Eu neles e tu em mim para que sejam perfeitos na unidade” (Jo 17,21.23). Nós a atuamos do modo como a compreendemos e a vimos como síntese de todo o Evangelho, uma síntese tão completa a ponto de ter como resultado o que de melhor se pode esperar: a plenitude da vida da Igreja, do Corpo Místico, em que os membros vivem tanto a vida de Jesus a ponto de serem outros Jesus. QUEM NOS IMPELIU a escolher justamente o mandamento do amor mútuo e quem colocou em nosso coração uma fé tão grande no Evangelho? O Espírito Santo. Foi Ele. A Ele, nosso agradecimento para sempre. ENTENDÍAMOS o Testamento de Jesus com uma compreensão que só podia ser iluminada por uma graça especial. Tendo penetrado nele – como Deus quis e na medida que Ele quis –, foi-nos mais fácil depois entender o restante do Evangelho. De fato, muitas vezes dávamos este exemplo: imaginem o Evangelho como uma planície, um terreno onde estão escritas todas as Palavras; e lá no fim, o Testamento de Cristo, que sintetiza todas elas. O Senhor, ensinando-nos a unidade, à qual todas as verdades evangélicas se ligam, como que perfurou o terreno, para fazer-nos penetrar no Evangelho e entender o resto dele por dentro, captando-o na raiz de cada Palavra, no seu sentido mais verdadeiro. QUEM VIVE a unidade vê o Evangelho com o olho de Deus e nele penetra mais ou menos em profundidade, dependendo da experiência, ou seja, da santidade armazenada em sua vida de unidade, e da intensidade com que vive o momento presente.

29 dezembro 2017

Viver a palavra

NÓS, QUANDO MUITO, meditávamos a Palavra de Deus, nela penetrávamos com a mente, dela extraíamos uma ou outra consideração e, se fôssemos fervorosos, um ou outro propósito. Aqui [em nossa comunidade] era bem diferente. A Palavra era esmiuçada em suas mais diversas aplicações, no contato contínuo com a vida, e provocava uma transformação em cada um e no grupo. Quando a vivíamos, não era mais o eu, ou o nós, quem vivia, mas a Palavra em mim, a Palavra no grupo. E isso significava revolução cristã, com todas as suas consequências. TODO O NOSSO EMPENHO consistia em viver o Evangelho. A Palavra de Deus penetrava profundamente em nós a ponto de mudar a nossa mentalidade. O mesmo acontecia também com todos os que tinham algum contato conosco. Essa nova mentalidade, que se ia formando, manifestava-se como uma verdadeira contestação divina ao modo de pensar, de querer e de agir do mundo. E provocava em nós uma re-evangelização. NÃO NOS BASTAVA viver a Palavra quando tínhamos oportunidade, mas nutríamo-nos dela em todos os instantes da nossa vida. É assim: como o corpo respira para viver, a alma, para viver, vivia a Palavra. ENTENDEMOS que o mundo precisa de uma terapia de… Evangelho, porque só a Boa-Nova pode dar novamente a ele a vida que lhe falta. Por isso é que vivemos a Palavra de vida… Encarnamo-la em nós até sermos aquela Palavra viva. Bastaria uma Palavra para nos santificarmos, para sermos outro Jesus. Pelo tempo afora, vivemos muitas Palavras da Sagrada Escritura, de modo que elas continuam sendo patrimônio indelével de nossa alma. Nossa tarefa é viver a Palavra no momento presente da nossa vida. Todos podemos vivê-la, qualquer que seja a vocação, qualquer que seja a idade, o sexo, a condição em que estejamos, porque Jesus é Luz para todo homem que vem a este mundo. Com esse método simples, re-evangelizamos as nossas almas e, com elas, o mundo… AQUELE QUE OUVE a palavra de Deus e a põe em prática é como a casa sobre a rocha. Só os cristãos que põem em prática a Palavra de Deus saberão alcançar a vitória em tempos de perseguição. Poderão vir ventos e tempestades, mas eles não se abalarão.

28 dezembro 2017

Caminho de santidade

DEVEMOS TORNAR-NOS SANTOS, porque Jesus é santo. E nos tornaremos santos vivendo a Palavra. Aliás, sabemos que, quem vive a Palavra, pelo menos no momento em que a vive, já é santo. “Quem ouve a Palavra” – disse Jesus – (ou seja, quem a acolhe no próprio coração e a pratica) “já está puro” (cf. Jo 15,3). PARA CAMINHAR, temos a Palavra de Vida, que é “lâmpada para os meus passos” – diz um salmo – e “luz para o meu caminho” (Sl 119[118],105). É a Palavra que nos poderá levar à feliz conclusão de um bom caminho, que nos fará alcançar a santidade. CAMINHAMOS como aqueles que não sabem aonde ir, e temos nas mãos – basta querer – o código da vida, de cada vida, que é o Evangelho. VIVAMOS a Palavra de Deus tão radicalmente, a ponto de ela destruir nosso eu, anular nosso egoísmo, pregar-nos na cruz com Cristo, de modo que não sejamos mais nós a viver em nós, mas que em nós viva a Palavra, que é Ele. DEUS QUER os frutos, os efeitos. É por isso que o grão de trigo morre, para produzir fruto. É por isso que a Palavra deve fazer que morramos para o nosso eu, para o nosso modo de pensar, de amar, de querer, a fim de assumirmos o modo de Cristo. A PALAVRA DE DEUS é vida, mas esta é conquistada passando-se pela morte. É ganho, mas obtém-se perdendo. É crescimento, mas alcança-se diminuindo (cf. Mt 10,38-39). Encaremos o risco da sua Palavra. “POR VONTADE PRÓPRIA , Ele nos gerou por uma palavra de verdade, a fim de sermos como que as primícias dentre as suas criaturas” ( Tg 1,18). A Palavra de vida depura, e quem a vive, quem é a Palavra, já está mundificado, purificado. De fato, é transferido em Outro, está em Deus, Palavra. Está (a vida da Palavra em nós, nós, Palavra viva) regenerado, ou seja, filho de Deus. SENHOR, percebemos que há em nós muitos defeitos. Mas temos a alegria de saber com segurança que “ser a tua Palavra viva” tira de nós toda escória, faz-nos sair renovados, momento a momento, como uma noz, da casca. “Ser a tua Palavra” significa ser um outro, fazer a parte do Outro que vive em nós: encontrar nossa liberdade na libertação de nós mesmos, dos nossos defeitos, do nosso não-ser.

27 dezembro 2017

Falar, anunciar o Evangelho

A DESCOBERTA da Palavra de Deus, tão especial, diferente das palavras humanas, luminosa, universal, tão única, que se pode traduzir em vida, injetava em nossos corações tamanho fervor divino e entusiasmo, tamanha ânsia de logo encarná-la, que não queríamos viver senão como servas dela, seguidoras fidelíssimas da Palavra, seus cálices receptores. E, assim, impregnávamo-nos de Evangelho, daquele Evangelho que, se vivido como tal, não pode deixar de esmigalhar o modo de viver meramente humano, de romper com o mundo, mas também arrastar muitos para outra vida, que dava origem à comunidade cristã e desencadeava a revolução de Cristo. ERA O CORAÇÃO transbordante de amor por Deus das primeiras e dos primeiros focolarinos1 que fazia derramar sobre muitos o Evangelho redescoberto! Como fazer para que seja assim também hoje, em toda a parte? A quais próximos abrir nosso coração e de que modo, depois de tê-los amado? A todos, a todos. Embora nem sempre se possa falar com a boca, pode-se sempre falar com o coração, chamando-os pelo nome, por exemplo, cumprimentando-os de uma determinada forma, de modo que percebam que são importantes para nós, que certamente não nos são indiferentes, que já existe um vínculo com eles, feito talvez apenas de um respeitoso silêncio. Essas palavras sem rumor, como pode ser um sorriso, se acertadas, não podem deixar de abrir uma passagem nos corações. E, assim que a passagem se abrir em alguém, não se deve esperar, mas ocorre falar, dizer até mesmo poucas palavras… mas falar, anunciar o Evangelho. QUANDO OS DISCÍPULOS estavam reunidos com Maria, o Espírito Santo os investiu veemente, e eles falaram palavras de vida com uma força arrebatadora e convenceram milhares de pessoas a seguir Jesus. E eles batizaram e construíram a Igreja. Com Maria… era a presença do amor. De um amor novo. Se entre nós, cristãos, nos amássemos como se Maria, nossa Mãe, estivesse em nosso meio, creio que teríamos uma compreensão maior da Palavra de Deus, que os sucessores dos Apóstolos pregam. E ela penetraria tão fortemente em nós e nos outros que desencadearia a revolução cristã ao nosso redor… Porque, admitamos, cochilamos demais, e estacionamos, e perdemos tempo com mil vaidades, fazendo-nos passar por cristãos, enquanto a revolução do ódio invade o mundo.

26 dezembro 2017

Jesus Abandonado: Palavra totalmente explicada

JESUS ABANDONADO se revelara a nós como a Palavra por excelência, a Palavra totalmente explicada, a Palavra completamente aberta. JESUS jamais foi Palavra tão viva como quando gritou lá na cruz: “Deus meu, Deus meu, por que me abandonaste?” (Mt 27,46; Mc 15,34).Lá, falou o Amor, exprimiu o Amor, o Amor que é Deus. NAQUELA TERRÍVEL PROVAÇÃO, Jesus Abandonado viveu o Evangelho em sua completude e com a máxima profundidade. Se evidenciássemos cada exortação que Jesus fez no Evangelho, veríamos que Ele, naquele momento, viveu-as todas. O Evangelho pede que amemos a Deus com todo o coração, a mente, as forças? Jesus Abandonado é o modelo daqueles que assim o amam. De fato, Ele ama a Deus até quando se sente abandonado por Ele. Jesus Abandonado é o modelo perfeito de todo pobre de espírito: é tão pobre que, por modo de dizer, não tem nem Deus, não o sente mais. Jesus Abandonado pode repetir em si todas as bem-aventuranças. É sobretudo ali que se mostra sumamente misericordioso, que derrama toda a sua misericórdia; que se mostra faminto e sedento de justiça. É ali que aparece perseguido misteriosamente até pelo Céu, é onde o admiramos manso e pacífico, desapegado também daquilo que possui de mais sagrado e divino. NO ABANDONO, Jesus nos amou como a si mesmo. Reduzindo-se quase a apenas homem, fez de nós Deus. Ali era pobre, manso, misericordioso… O Evangelho diz: “Qualquer coisa que fizestes ao mais pequenino…” (cf. Mt 25,40). Jesus desceu até o fundo, para erguer o último pecador. Viveu o “Quem é fiel nas coisas mínimas…” (cf. Lc 16,10). Sempre foi fiel ao Pai, portanto, também ali, na grande provação. “Se alguém quiser vir após mim, negue-se a si mesmo, tome a sua cruz” (Mc 8,34). Jesus Abandonado é a renúncia a si de um homem-Deus. Além do mais, tomou realmente a sua cruz. “Não vim para os justos, mas para os pecadores” (cf. Mt 9,13). Ali se vê. Com Jesus Abandonado, vivemos todo o Evangelho. Ao mesmo tempo, vivendo as Palavras individualmente, compreendemos melhor Jesus Abandonado. QUEM DIRIGE OS OLHOS do coração para Ele, encontra… o Evangelho puro. JESUS ABANDONADO dá-nos a possibilidade de viver todo o Evangelho. NOSSO VIVER a Palavra é viver Jesus Abandonado.

25 dezembro 2017

Ser somente Palavra de Deus

SER somente Palavra de Deus. Guardar em si somente a Palavra de Deus. Ó, BENDITA SANTÍSSIMA TRINDADE que em mim habitas! Encontrei o “patamar”, o apoio para permanecer radicada em ti, radicada no Verbo de Deus, por meio de Jesus em sua Palavra. Dá-me a graça de não mais me afastar dele. Que minha preocupação não seja tanto a de ver continuamente se vivo essa Palavra, já que tenho de estar projetada na divina vontade, quer seja fora ou dentro de mim. De quando em vez, devo controlar, com um olhar da alma, se vivo naquela Palavra, se conduzo esses dias preciosíssimos. E, se estiver fazendo isso, continuar em paz a vida que me deste.

24 dezembro 2017

A única coisa suave

Só existe uma coisa bela, suave, atraente, útil, luminosa: o que Deus quer de ti no momento presente . Perder tudo, tudo, tudo para mergulhar nos abismos da vontade de Deus no momento pre sente. Assim, teremos apenas Deus e o amaremos com todo o coração. Sim, porque aqui na terra, tudo é uma questão de coração: é o coração que trai, é o coração que distrai, é o coração que salva, dependendo do que ele ama. Dá-nos de amar-te, ó Deus, não apenas cada dia mais, porque muito poucos podem ser os dias que nos restam; mas dá-nos de amar-te em cada momento presente com todo o coração, a alma e as forças naquela que é a tua vontade.

23 dezembro 2017

Construir para a outra vida

Por causa do cansaço, às vezes não vemos a hora de determinada coisa acabar. Mas, se nos lembramos de que é preciso viver o momento presente, chegamos ao fim totalmente aliviados. Porque, se nos concentramos no momento presente, somos como que transportados. E construímos, a cada momento, para a outra vida. 1 O caminho espiritual para a perfeição (cf. Sl 84[83],6: “Feliz quem encontra em ti sua força e decide no seu coração a santa viagem”). [N.d.E.]

22 dezembro 2017

Como num balanço

É preciso “render-se” à vontade de Deus. Porque, se a ela nos rendemos, sem resistência, a graça atual que temos para viver o momento presente funciona. E funciona sob a forma de inspiração, de estímulo para a vontade; ilumina-a e enche-a de entusiasmo. Vi que realmente é necessário “render-se”, no sentido de que é preciso soltar o último fio de nossa vontade e abandonar -se completamente, como acontece num balanço, quando alguém é largado de um lado e vai todo para o outro.

21 dezembro 2017

Obras que perduram

Se vives o presente, mas o vives bem, realizas obras que perduram, mesmo que fales só para uma pessoa, mesmo que prepares um discurso destinado a um público de uma só categoria. Pois bem, a humanidade inteira está em uma pessoa, e também em um grupo restrito, como toda a vontade de Deus está em apenas uma vontade sua. Experimentando isto, estás saciado porque abraças o infinito. Fazer bem o que Deus quer no presente e fazer como Deus quer, segundo o seu método, a sua dialética, é, por exemplo, preparar o que deves dizer com toda a ajuda do Espírito Santo que está em ti, e depois colocá-lo à prova no fogo do amor mútuo com os irmãos, para que morra, e se decomponha, e renasça da unidade (e isto requer tanto saber “perder”, quanto humildade); é, enfim, submetê-lo à apreciação da autoridade para que seja podado. Então, aquele discurso permanece e se multiplica, e aquilo que poderia causar algum bem só a uma pessoa e depois se perder, causa e continuará causando o bem a muitos. Essa atividade no presente traz um senso de plenitude, porque é vida de Jesus que vive em nós. E se Jesus vive em nós, realiza obras que perduram. Se, por outro lado, não fizeste infelizmente as coisas bem, ou as fizeste pela metade, “perde-as” no Coração de Jesus com a máxima confiança, com a consciência de quem sabe que todo momento da vida é bom para morrermos (e talvez morramos com as coisas feitas de modo imperfeito), mas também com a confiança de quem sabe que o Coração de Cristo só te quer amar com fatos e, por isso, quer preencher as lacunas, esconder dos outros os teus disparates e perdoá-los, pois se assim faria uma mãe, muito mais, portanto, faria aquele Coração! Então, também aqui a saciedade: tudo está feito, tudo está consumado.

20 dezembro 2017

Fazer da terra um céu

Uma experiência que ajuda muitíssimo é “calar fundo” na vontade de Deus do momento presente para fazer apenas essa vontade. Em tempos tão frenéticos nos quais só existem barulhos, só máquinas, só tecnologia, o importante, para estar realmente em Deus, embora em meio a tantas coisas, é calar fundo em sua vontade. Veríamos o mundo mudar. Todos tenderiam à santidade. Os problemas se resolveriam um atrás do outro, em todos os campos humanos. Reinariam a paz, a felicidade, a saúde, inclusive física. A terra seria um Céu.

19 dezembro 2017

Dá-me todos os que estão sós

Senhor, dá-me todos os que estão sós… Senti em meu coração a paixão que invade o teu, por todo o abandono em que nada o mundo inteiro. Amo todo ser doente e só: até as plantas sem viço me causam dó…, até os animais solitários. Quem consola o seu pranto? Quem tem pena de sua morte lenta? E quem estreita ao próprio coração o coração desesperado? Meu Deus, faze que eu seja no mundo o sacramento tangível do teu Amor, do teu ser Amor: que eu seja os braços teus que estreitam a si e consomem no amor toda a solidão do mundo.

18 dezembro 2017

A obra-prima do santo

Entrando no locutório ou nos longos corredores de um convento, de fundação recente ou antiga, frequentemente se vê nas paredes a figura do fundador, quase sempre santo, com a Regra na mão. Quem vive no mundo, entra, olha e nada entende ou pouco entende. Na maioria das pessoas, mesmo entre os ateus, um santo sempre desperta simpatia. As pessoas, porém, preferem imaginá-lo mergulhado no êxtase da contemplação, ou misturado entre o povo a quem faz o bem, ou, nos fatos que passam de boca em boca e que cercam quase sempre a figura de um santo. Fatos insignificantes, às vezes, eternizados no tempo por uma frase, um gesto, que homem algum teria dito ou feito a não ser aquele santo, porque guiado por Deus; gesto em que é patente o inconfundível encontro do divino com o humano, que dá uma conotação nova, e por vezes revolucionária, ao viver enfadonho e sempre igual do mundo. Mas, o santo fundador não é somente isto. O fundador é um homem que realizou o que Deus queria, que se esforçou para ser perfeito como o Pai, através de uma doação cada vez mais total e mais ampla de si mesmo a Deus. O santo é, na realidade, um pequeno pai e a santa é uma pequena mãe, porque Deus é Amor; e estar repleto de Deus significa tornar-se partícipe da divina fecundidade do Amor. Compreende-se bem um fundador quando se observa o que ele fez. O pequeno ou grande rebanho que o seguiu, que ele transformou em família, com as leis eternas do Evangelho que, pela ação do Espírito Santo ressoam em sua alma com força nova e atual, é a obra mais importante do santo; representa o que para a mãe é o filho, o seu filho. Quando o fundador julga concluída a obra de Deus, abandonando-se Nele como um instrumento nas mãos de um artista, traça as linhas essenciais de sua obra, e escreve uma regra. Deve fazê-lo e assim quer fazer com a força com que uma mãe diz: “Este é o meu filho e não outro”. No filho, a mãe é recompensada de todo o seu sofrer, e ele é a mais viva lembrança de suas alegrias e do amor que a uniu ao pai. Tem uma fisionomia determinada, um caráter seu, um sangue próprio. Um santo ama a Deus com um amor que dista do amor humano tanto quanto o céu dista da terra, e este amor lhe proporciona pequenas e imensas dores, pequenas e inefáveis alegrias no Deus das bem-aventuranças. Mas alegrias e dores não são fim em si mesmas; são meios de a Igreja possuir uma nova obra de Deus, onde o Senhor delineia uma fisionomia determinada, com características inconfundíveis; onde Ele injeta um sangue divino, que é o espírito específico que a permeia, com que parte da humanidade daquela época se deve beneficiar. Tudo is so a regra atesta, explica, estabelece, mantém e, porque assim faz, é a obra-prima do santo.

17 dezembro 2017

Não há espinhos sem rosa


      Que dor pensar que a vida de muitíssimos homens não é vivida! Não vivem porque não veem. E não veem porque olham o mundo, as coisas, os familiares, as pessoas, com seus próprios olhos. Ao passo que, para ver, bastaria seguir cada acontecimento, cada coisa, cada homem, com os olhos de Deus. Vê quem se insere em Deus, quem, sabendo ser Ele “Amor”, crê em seu amor e raciocina como os santos: “Tudo o que Deus quer e permite é para minha santificação”.

      Por isso, alegrias e dores, nascimentos e mortes, angústias e júbilos, fracassos e vitórias, encontros, amizades, trabalho, doenças e desempregos, guerras e flagelos, sorrisos de crianças, carinhos de mães, tudo, tudo é matéria-prima de nossa santificação.

      Em torno do nosso ser, gira um mundo de valores de toda espécie, mundo divino, mundo angélico, mundo fraterno, mundo amável e também mundo adverso, dispostos por Deus para nossa divinização, que é o nosso verdadeiro fim.

      Neste mundo, cada um é centro, porque lei de tudo é o amor.

      E se, para o equilíbrio divino e humano da nossa vida, devemos, por vontade do Altíssimo, amar, amar sempre o Senhor e os irmãos, a vontade e a permissão de Deus, os demais seres — quer saibam, quer não — servem, movem-se em sua existência, por nosso amor. De fato, para aqueles que amam, tudo concorre para o bem.

      Com os olhos toldados e incrédulos, não vemos, com muita frequência, que cada um e todos foram criados como um dom para nós e nós como um dom para os outros.

      Mas, assim é. E um misterioso vínculo de amor liga homens e coisas, conduz a história, dispõe o desígnio dos povos e dos indivíduos, no respeito pela mais alta liberdade.

      Depois de algum tempo, porém, em que a alma, abandonada em Deus, tomou como lei “acreditar no amor” (cf. 1Jo 4,16), Deus se manifesta e ela, abrindo novos olhos, vê que colhe novos frutos de cada provação, que se segue uma vitória a cada batalha, que brota um sorriso novo, sempre novo, de cada lágrima, porque Deus é a Vida que permite o tormento, o mal, por um bem maior.

      Entende que o caminho de Jesus não culmina na Via Crucis e na morte, mas na Ressurreição e na Ascensão ao Céu.

      Então, o modo de observar as coisas com jeito humano descora e perde sentido, e o amargor não envenena mais as alegrias fugazes de sua vida terrena. Para ela, nada diz o provérbio cheio de melancolia: “Não há rosa sem espinho”, mas, pela onda da revolução de amor em que Deus a envolveu, vale precisamente o contrário: “Não há espinho sem rosa”.

16 dezembro 2017

Lançados no infinito

Os santos são portentos que, vista no Senhor a grandeza deles, por Deus jogam, quais filhos seus, tudo de seu. Dão sem pedir em troca. Dão a vida, a alma, a alegria, todo liame terreno, toda riqueza. Livres e sós, lançados no infinito, anseiam que o Amor os introduza nos Reinos eternos. Mas já nesta vida sentem encher-se-lhes o coração de amor, do verdadeiro amor, do único amor, que sacia, que consola, daquele amor que fere as pálpebras da alma e doa lágrimas novas. Ah! Homem algum sabe o que é um santo. Deu e ora recebe; e um fluxo incessante passa entre Céu e terra, liga a terra ao Céu, e verte dos abismos enlevo raro, linfa celeste, que não para no santo, mas passa sobre os cansados, sobre os mortais, sobre os cegos e paralíticos na alma, e irrompe, e orvalha, e soleva, e seduz, e salva. Se queres saber do amor, indaga ao santo.

15 dezembro 2017

Uma miríade de pérolas esplêndidas

Imagino uma cidade de ouro, onde o divino está em relevo, rutilante de luz, e o humano serve de fundo, pondo-se na sombra para dar maior realce ao esplendor. Cada igreja, cada sacrário reluz mais do que o Sol, porque lá ficou o Amor dos amores. Na alma de quem representa a Igreja, na Hierarquia, que estrutura a divina sociedade, descida do Céu à terra, encontro uma miríade de pérolas esplêndidas: são as graças derramadas por Deus, pelas mãos da Virgem, naquele canal, que outro escopo não tem senão inundar-me de luz, nutrir-me do mel celeste, mais do que mãe celestial que nutre seu filho. E se, recolhida em Deus, abro o livro da vida e leio as Palavras eternas, sinto cantar em minh’alma uma harmonia luminosa e o Espírito de Deus irradiar em mim os seus dons. Ao contato com um qualquer, nobre ou maltrapilho, vislumbro cada semblante transfigurado no Rosto belíssimo do Verbo encarnado, Luz da Luz. Entrando na casa de irmãos que se amam, de famílias unidas em Cristo, vejo um reflexo divino da Trindade, ouço, expressa pela comunidade, a Palavra que é Vida: Deus. Deus é o ouro da minha cidade, diante do qual o Sol se adumbra, o céu se encolhe, toda a beleza e a majestade da natureza se retiram felizes para formar coroa, para servir, qual moldura. Essa cidade existe em cada cidade e todos podem vê-la, contanto que se apague em Deus, olvidando, nossa alma, e nela se acenda o fogo do amor divino.

14 dezembro 2017

A vida dos santos

A vida dos santos é única, embora muito variada. Tendo-se doado a Deus, são cumulados de cuidados especiais por Ele, que, sumo artista e Amor supremo, neles realiza obras-primas divinas. Espíritos angélicos e olhos de santos sabem compreendê-los, ou a inteligência iluminada por uma graça singular de quem, na Igreja, deve julgá-los. Geralmente, são invisíveis aos outros em seu íntimo ser; incompreendidos porque, no santo, vive mais Deus que o homem, e só os puros de coração veem a Deus. A vida do santo é feita de abismos e de vértices: abismos abismais, noites negras como o inferno, túneis escuros, onde a alma, invadida por uma luz absolutamente superior, é encandeada numa obscura contemplação e submergida num mar de angústia, ou quase de desespero, pela constatação manifesta do próprio nada e da própria miséria. O santo passa meses, anos, tendo como único anelo morrer no seio de Deus, de quem se sente, às vezes, irremediavelmente separado. A vida é uma morte atroz e o sono, um alívio, uma trégua, como que uma carícia para a alma coberta de chagas. Passa um longo tempo em que o santo grita, invocando o perdão, a salvação, ele, que nada mais tem no coração senão Deus, o seu Deus… Mais tarde, depois de longa tribulação num crisol que se assemelha ao purgatório, a alma do santo é lentamente conduzida por seu divino Artífice a uma vida serena, plena, luminosa, produtiva e resistente a qualquer impacto. Mas, agora, não é mais ela quem vive; nela vive glorioso e forte, louvado e escutado, o Criador e o Senhor de todo coração humano. É quando floresce no santo um vigor divino, desconhecido e inaudito, que sintetiza em seu espírito as virtudes mais contrastantes: a mansidão e a força, a misericórdia e a justiça, a simplicidade e a prudência. Goza da vida em Deus e oferece ao seu Senhor “sacrifícios de aclamação” (Sl 27[26],6), com uma alegria que o mundo desconhece, e se vê forçado a dizer que sonho algum se compara à divina e fantástica — porque amorosa — harmoniosíssima e frutuosíssima Vida que ele possui. E Deus dele se serve para suas grandes obras, que adornam e compõem a Cidade celeste, a Igreja, destinada a ir para Deus, como bela e digna Esposa de Cristo, seu fundador. Ao homem é dada uma vida só; seria conveniente cada um recolocá-la nas mãos Daquele que lha deu. Este seria — no homem racional e livre — o maior ato de inteligência e o modo de manter e dilatar, no plano divino, a própria liberdade. Seria a deificação de seu mísero ser, em nome Daquele que disse: “Vós sois deuses, todos vós sois filhos do Altíssimo” (Sl 82[81],6).

13 dezembro 2017

Se numa cidade se ateasse fogo

Se numa cidade se ateasse fogo em vários pontos, ainda que um fogo brando, mas que resistisse a todas as intempéries, em pouco tempo a cidade ficaria incendiada. Se numa cidade, nos mais diferentes pontos, se acendesse o fogo que Jesus trouxe à terra, e esse fogo, graças à boa vontade dos habitantes, resistisse ao gelo do mundo, teríamos em breve a cidade acesa de amor de Deus. O fogo que Jesus trouxe à terra é Ele mesmo, é caridade, aquele amor que não só une a alma a Deus, mas as pessoas entre si. De fato, um fogo sobrenatural aceso significa o triunfo contínuo de Deus em almas a Ele doadas e, porque unidas a Ele, unidas entre si. Duas ou mais almas, fundidas no nome de Cristo, que não só não têm medo nem vergonha de se comunicarem recíproca e explicitamente o seu desejo de amor a Deus, mas que fazem da unidade entre si em Cristo o seu ideal, são uma potência divina no mundo. E, em cada cidade, essas pessoas podem surgir nas famílias: pai e mãe, filho e pai, nora e sogra; podem se achar nas paróquias, nas associações, nas agremiações humanas, nas escolas, nos escritórios, em toda parte. Não é necessário que já sejam santas, porque Jesus o teria dito; basta que estejam unidas em nome de Cristo e jamais venham a faltar a essa unidade. Naturalmente, estão destinadas a ficar por pouco tempo duas ou três, porque a caridade é difusiva por si mesma e aumenta em proporções desmedidas. Cada pequena célula, acesa por Deus num ponto qualquer da Terra, espalhar-se-á necessariamente e a Providência distribuirá essas chamas, essas almas-chamas, onde lhe aprouver, a fim de que o mundo seja restaurado em muitos lugares ao calor do amor de Deus, e recupere a esperança. Mas há um segredo para que es sa célula abrasada se espalhe até se tornar tecido e vivifique as partes do Corpo Místico: é que aqueles que compõem essa célula se lancem na aventura cristã, que significa: fazer de cada obstáculo um trampolim; não “suportar” a cruz, não importa que faceta tenha, mas aguardá-la e abraçá-la, minuto por minuto, como fazem os santos. Quando ela chegar, dizer: “Era esta, Senhor, a que eu queria! Sei que estou na Igreja militante, onde é preciso lutar. Sei que me espera a Igreja triunfante, onde te verei por toda a eternidade. Aqui na terra, prefiro a dor a qualquer outra coisa, porque, com tua vida, Tu me disseste que ali está o verdadeiro valor”. E, tendo dito sim ao Senhor, a alma deve viver plenamente o momento que segue, não pensando em si, em seu sofrer, mas no dos outros; ou nas alegrias dos outros, das quais deve partilhar; ou nos fardos dos outros, que deve ajudar a carregar; ou no cumprimento dos seus deveres, aos quais — por vontade de Deus, para que sejam elevados como contínua oração — deve ser dirigida a atenção de toda a mente, o afeto de todo o coração, todo o vigor da própria força. É esse o pequeno segredo com que se constrói, pedra sobre pedra, a cidade de Deus em nós e entre nós. E nos insere, ainda na terra, na vontade divina que é Deus, eterno presente.

12 dezembro 2017

Quando se conheceu a dor

Quando se conheceu a dor em todos os seus matizes mais atrozes, nas mais variadas angústias, e se ergueram as mãos a Deus em mudas e lancinantes súplicas, em abafados gritos de ajuda; quando se bebeu o fundo do cálice e, durante dias e anos, se ofereceu a Deus a própria cruz, incorporada à sua, que a valoriza divinamente, então Deus tem piedade de nós e nos acolhe em sua união. É o momento em que, depois de ter experimentado o valor sem par da dor, de ter acreditado na economia da cruz e de ter visto os seus efeitos benéficos, Deus mostra, de modo mais alto e novo, algo que vale mais ainda do que a dor. É o amor aos outros, em forma de misericórdia, amor que faz abrir os braços e o coração aos infelizes, aos mendigos, aos martirizados da vida, aos pecadores arrependidos. Amor que sabe acolher o próximo desencaminhado, seja ele amigo, irmão ou desconhecido, e o perdoa infinitas vezes. Amor que faz mais festa a um pecador que volta do que a mil justos, e empresta a Deus inteligência e bens para que Ele possa demonstrar ao filho pródigo a felicidade pelo seu retorno. Amor que não mede e não será medido. É uma caridade que floresce mais abundante, mais universal, mais concreta do que aquela que a alma antes possuía. De fato, ela sente nascerem dentro de si sentimentos parecidos com os de Jesus, percebe aflorarem-lhe aos lábios, para todos os que encontra, as divinas palavras: “Tenho compaixão da multidão” (cf. Mt 15,32). E, com os muitos pecadores que dela se aproximam, pois é um pouco imagem de Cristo, entabula colóquios semelhantes aos que Jesus teve um dia com Madalena, com a samaritana, com a adúltera. A misericórdia é a última expressão da caridade, aquela que a remata. E a caridade supera a dor, porque a dor só existe nesta vida, enquanto o amor perdura na outra. Deus prefere a misericórdia ao sacrifício.

08 dezembro 2017

A falsa prudência

O que estraga certas almas é uma falsa “prudência” — como é chamada. É uma prudência humana, que vem à tona toda vez que o divino aflora. Parece uma virtude, mas é mais antipática do que o vício. Não quer incomodar ninguém. Deixa os ricos irem para o inferno (“já tendes a vossa consolação”) (Lc 6,24) porque não os esclarece. Sabe-se lá o que poderia acontecer! Deixa que na família, ao lado, se espanquem ou até se matem, porque poderiam dizer que se está intrometendo na vida alheia, ou que se poderia acabar como testemunha no tribunal. E são só aborrecimentos! Aconselha moderação aos santos porque poderia acontecer alguma coisa com eles. Esta prudência, como uma mordaça, isola e se isola, porque nasce do medo. Sobretudo, implica com Deus, porque se Ele interferisse demais no mundo, através de seus filhos fiéis, poderia provocar uma revolução, e aqueles filhos, tanto quanto Cristo, poderiam perder a vida, odiados como Ele pelo mundo. É uma falsa virtude, que creio seja alimentada ou apoiada pelo demônio, que muito pode operar em semelhante clima. Houve alguém que jamais a teve: Jesus Cristo. Quando saiu para pregar, queriam matá-lo já na primeira fala. “Ele porém, passando pelo meio deles, prosseguia seu caminho” (Lc 4,30). Olhando a sua vida com os olhos desses prudentes, dir-se-ia toda ela uma imprudência. Não só! Se esses prudentes fossem lógicos em seu raciocínio, chegariam a concluir que a morte, a cruz, foi Ele mesmo quem procurou… com sua imprudência. Creio não haver palavra de Jesus que não esbarre nesta gente. É porque Deus e o mundo estão em antítese perfeita, e só aqueles que sabem desvencilhar-se do mundo, para seguir as pegadas de Cristo, podem dar alguma esperança à humanidade.

07 dezembro 2017

Deus é poderoso

Deus é poderoso, é o Todo-Poderoso. Maria foi definida “a toda-poderosa por graça”. Ela também é poderosa: pode e obtém. Nós somos miseráveis. E aqueles dentre nós que se julgassem diferentes estariam enfileirados conosco só por esse fato. Mas a nossa impotência, a nossa pobreza — se amamos a Deus —, talvez nos possam ser úteis. Elas nos podem fazer obter alguma coisa. Se o Pai dos Céus quis que Jesus fosse nosso irmão, se preparou na humanidade uma Imaculada para sua vinda, é porque estávamos em más condições, chagados na alma, pecadores. O pecado deve ser odiado. Mas, a vinda de Jesus à terra por Maria, se bem entendida, pode matar-nos de alegria, se Deus não amparar. Jesus na terra… irmanado conosco… diz: “Se pedirdes alguma coisa a meu Pai em meu nome, Ele vo-la dará” (Jo 14,13-14), como o bom filho di ria ao irmão rebelde de quem tem dó: “Vai lá e pede a papai em meu nome”, é certo que ele conseguirá mais facilmente. Jesus na terra… Jesus nosso irmão… Jesus que morre por nós entre ladrões; Ele, o Filho de Deus, nivelado aos outros. Quem sabe seremos também um pouco poderosos junto ao Coração do Pai, se nos mostrarmos como somos: seres miseráveis que talvez tenham feito poucas e boas, mas que dizem, arrependidos e reconciliados em seu amor: “Afinal, se vieste para nosso meio, foi porque nossa fraqueza te atraiu, nossa miséria te feriu até à compaixão”. O certo é que não há na terra nem mãe, nem pai que espere um filho perdido e tudo faça para que ele volte, tanto quanto o Pai celeste.

06 dezembro 2017

Seria de enlouquecer

Seria de enlouquecer se não fixássemos os olhos em ti, que transmudas, como por encanto, toda amargura em doçura; em ti, suspenso na cruz, no teu grito, na mais alta suspensão, na inatividade absoluta, na morte viva, quando, tornando-te frio, lançaste todo o teu fogo sobre a terra e, tornando-te estase infinita, lançaste sobre nós tua vida infinita, aquela que agora vivemos, inebriados. Basta-nos que nos vejamos semelhantes a ti, ao menos um pouco, e que unamos nossa dor à tua e a ofereçamos ao Pai. Para que tivéssemos a Luz, veio-te a faltar a vista. Para que tivéssemos a união, sentiste a separação do Pai. Para que possuíssemos a Sabedoria, fizeste-te “ignorância”. Para que nos revestíssemos da inocência, fizeste-te “pecado”. Para que Deus estivesse em nós, sentiste-o longe de ti.

04 dezembro 2017

Não passa


“É mais fácil um camelo entrar pelo buraco de uma agulha do que um rico entrar no Reino de Deus” (Mt 19,24). O rico que não procede como Jesus quer põe em jogo a eternidade. Mas, somos todos ricos enquanto Jesus não viver em nós em toda a sua plenitude. Até o mendigo que carrega na mochila um naco de pão e pragueja se alguém tocar nela não é menos rico do que os outros. O seu coração está apegado a alguma coisa que não é Deus e se não se fizer pobre, pobre segundo o Evangelho, não passará no Reino dos Céus. O caminho lá para cima é estreito, e por ele só passa o nada. Há quem seja rico de ciência, e essa empáfia impede que ele passe para o Reino e que o Reino passe para ele; por isso, o Espírito da Sabedoria de Deus não tem lugar em sua alma. Há quem seja rico de presunção, de vanglória, de afetos humanos e, enquanto não larga tudo, não é conforme Deus. Tudo se deve extirpar do coração, para nele se colocar Deus e a Criação segundo a ordem de Deus. Há quem seja rico de preocupações e não sabe pô-las no Coração de Deus, vivendo atormentado. Não tem a alegria, a paz, a caridade, que são do Reino dos Céus. Não passa. Há quem seja rico dos próprios pecados, e por eles chora e se tortura, ao invés de deixá-los arder na misericórdia de Deus e olhar para a frente, amando Deus e o próximo, pelo tempo em que não amou.

03 dezembro 2017

É inconcebível

É inconcebível, é extraordinário, é algo que se grava sempre mais profundamente em minha alma o teu ficar ali em silêncio no sacrário. Vou à igreja de manhã, e lá te encontro. Corro para a igreja ao sentir que te amo, e lá te encontro. Passo ali por acaso, ou por hábito, ou por respeito, e lá te encontro. E toda vez, Tu me dizes uma palavra, me retificas um sentimento, vais, na realidade, compondo com notas diversas um único canto, que o meu coração sabe de cor, e me repete uma palavra só: eterno amor. Ó Deus! Melhor não podias inventar. Aquele teu silêncio em que o bulício de nossa vida amortece, aquele palpitar silencioso que toda lágrima enxuga; aquele silêncio… aquele silêncio, mais sonoro que uma angélica harmonia; aquele silêncio que à mente traz o Verbo, ao coração doa o bálsamo divino; aquele silêncio em que toda voz se reconhece canalizada, toda prece ressoa transformada; aquela tua presença arcana… Ali está a vida; ali, a espera; ali, o nosso pequeno coração repousa, para retomar sem trégua o seu caminho.

Porque quero revê-la em ti

Entrei na igreja um dia e, com o coração cheio de confidência, perguntei a Ele: “Por que quiseste ficar na Terra, em todos os pontos da Terra, na dulcíssima Eucaristia, e não encontraste um modo, Tu, que és Deus, de trazer e deixar também Maria, a Mãe de todos nós, que peregrinamos?” No silêncio, parecia responder: “Não a trouxe porque quero revê-la em ti. Mesmo que não sejais imaculados, o meu amor vos virginizará, e tu, vós, abrireis braços e corações de mães à humanidade, que, como outrora, tem sede de seu Deus e da Mãe Dele. A vós, ora, lenir as dores, as chagas, enxugar as lágrimas. Canta as ladainhas e procura espelhar-te nelas!”

02 dezembro 2017

Seja feita a Tua vontade

Quem ama pouco a Deus, mas de certo modo o teme, dá à frase “Seja feita a vontade de Deus” só o tom da resignação. Quem, ao contrário, ama a Deus verdadeira e sinceramente, compreende que não poderia fazer nada de melhor e mais excelso. De fato, o que pode haver de mais grandioso do que seguir um Pai assim, que nos conduz momento por momento, falando por meio de mil vozes, como as circunstâncias, as lições, os deveres, as inspirações, as dores, os acontecimentos e os preceitos, notas todas de uma melodia composta no Céu e executada na harpa suave da alma amante de Deus?

Deus, que ama a cada um e a todos com amor infinito, preparou para cada pessoa uma aventura divina, variada e alternada de sagrado e profano, de trágico e nostálgico, de festa e de luto: quadro fantástico que conheceremos melhor do lado de lá, quando os nossos olhos se abrirem na “luz da glória”.

01 dezembro 2017

Cumprido seu dever

Logo que o sol despontar no horizonte, saúda-o com um pensamento de louvor ao Pai e Criador, levantando-se também e iniciando seu trabalho.

Mantenha firme em sua mente o desejo de ajudar a todos e de cumprir com perfeição todas as suas obrigações.

E, assim, poderá deitar-se, ao finalizar o dia, com a consciência feliz, por haver cumprido seu dever.