05 abril 2019

A cruz de cada dia

Vivendo o presente, podemos notar que — se for bem vivido — é sempre possível pôr em prática as palavras de Cristo: “Tome a sua cruz” (cf. Mt 16,24). Cada momento, quase, tem a sua cruz: pequenas, insignificantes ou grandes dores espirituais ou físicas, que acompanham a nossa vida no presente. É preciso “tomar” estas cruzes, não procurar esquecê-las, refugiando-se em uma vida sem compromisso.

E, mesmo que tudo seja saúde e alegria, é aconselhável vivermos isso desapegados, embora sendo gratos a Deus, e não nos inclinarmos avidamente para o dom, em vez de para o Doador, ficando depois tristes, com um vazio na alma.


04 abril 2019

Reflexo

NÃO se esqueça de que somos o reflexo daquilo que pensamos.
0 pensamento plasma nossa vida de amanhã.
Aproveite, portanto, o momento que passa, a fim de construir um amanhã risonho.
Plante em torno de você as se mentes de otimismo e bondade, para que possa colher amanhã os frutos do amor e da felicidade.
Se somos escravos do ontem, somos donos de nosso amanhã.

03 abril 2019

A primeira qualidade do amor

A primeira qualidade do amor cristão é amar a todos.

Essa arte de amar pretende que amemos a todos, sem distinção, como Deus ama.

Não há que escolher entre simpático ou antipático, idoso ou jovem, compatriota ou estrangeiro, branco ou negro ou amarelo, europeu ou americano, africano ou asiático, cristão ou judeu, muçulmano ou hinduísta…

Valendo-nos de uma linguagem bastante conhecida hoje, podemos dizer que o amor não conhece “nenhuma forma de discriminação”.

02 abril 2019

A pérola


      Nos dias de hoje, “a santidade deve sair dos conventos, marcar presença nas casas, nas escolas, nas ruas, nos escritórios, nos Parlamentos…”2, porque hoje, mais do que outrora, tomamos consciência de que também os leigos são chamados à santidade.

      Então, sem estarem isolados, sem estarem protegidos por muros, sem disporem de todas aquelas precauções que a vida espiritual exigia antigamente, como poderão esses leigos encontrar a união com Deus estando no meio do mundo?

      Eles, que, além de não terem coisa alguma que os proteja, estão sempre rodeados por outros homens e mulheres que, no passado, preferia-se manter afastados.

      Mas eis que uma espécie de pérola começa a luzir.

      O Espírito Santo, iluminando-nos com um seu carisma, nos sugeriu: justamente o irmão, a irmã, precisamente eles, que outrora podiam ser vistos como empecilhos, podem se tornar até mesmo nosso caminho para chegar a Deus, podem ser uma abertura, uma porta, uma estrada, uma passagem que leva a Ele.

      Com uma condição, naturalmente: que não sejam eles a exercer influência sobre nós, com seu comportamento muitas vezes apenas humano, mas sejamos nós a influenciá-los com o nosso comportamento sobrenatural. Como? Já sabemos: amando-os. Amando-os um por um, durante o dia, o dia inteiro. Amando-os com aquela arte de amar, que é divina, por ser possível somente com o amor que o Espírito Santo infundiu em nosso coração.

      E todos bem sabemos as exigências desse amor.

      O que acontecerá se agirmos assim?

      Acontecerá que à noite, por exemplo, durante a oração, e também durante o dia, quando, por um instante, pudermos recolher-nos sozinhos com Deus, sentiremos a sua presença.

      Ele veio até nós, porque nós fomos até Ele nos irmãos.

      Concretiza-se, então, aquela união experimentada que muitos de nós conhecem, mas ainda não sabem definir, nem classificar, talvez por ser nova, sensível aos sentidos da alma, que inunda o coração de amor.

      E assim, com Ele presente, podemos rever cada afazer nosso.

      Daí resulta, entre outras coisas, que, se logramos isso por intermédio do irmão que foi amado, ele não é apenas um beneficiado nosso, mas um nosso benfeitor, pois nos proporcionou aquilo que esperávamos de melhor.

      Acontecerá, então, que, no contato com ele, sentiremos reconhecimento, o que nos porá em posição de humildade, virtude que, além do mais, muito serve ao amor.

31 março 2019

Cada relacionamento seja caridade

É preciso traduzir em caridade, transformar em caridade, os diversos contatos que mantemos com o próximo durante o dia. Do momento em que nos levantamos de manhã, até à noite quando vamos dormir, cada relacionamento com os outros deve ser caridade. Na igreja, em casa, no escritório, na escola, na rua, devemos encontrar as várias ocasiões para viver a caridade. É nossa tarefa ensinar, instruir, governar, dar de comer, vestir, acudir os familiares, servir os clientes, despachar? Devemos fazer tudo isso por Jesus nos irmãos, sem descuidar de ninguém, aliás, sendo os primeiros a amar a todos. É uma ginástica, ao longo do dia, mas vale a pena, porque, assim, progredimos no amor de Deus.

Terra

A terra espera pelo seu auxílio.

Ela lhe dá o ar para respirar, desde que nasceu, a água para saciar a sede, o alimento para sustentá-lo, a residência para protegê-lo, e você, que é que dá em retribuição?

Está contribuindo para a prosperidade da terra que o recebe de braços abertos permitindo-lhe a evolução e o aprendizado?

Não se esqueça de que a terra espera pelo seu auxílio!

30 março 2019

QUANDO ALGUÉM PASSA AO NOSSO LADO

Quando alguém passa ao nosso lado durante o dia, no trabalho ou na escola, nossa tarefa consiste sempre e unicamente em amar.

Mas devemos amar como Jesus.

Para tanto, é necessário ouvir sempre a sua voz que nos fala através da consciência, para que, ao amarmos, não erremos por excesso ou por falta. 0 Evangelho nos adverte, por exemplo, de que não se deve dar as coisas santas aos cães; e nós, mesmo podendo e devendo nos julgar inferiores a todos, porque só Deus sabe as graças que nos proporcionou e que não aproveitamos suficientemente, devemos estar vigilantes para não falarmos de "coisas santas , num ambiente não preparado para recebe-las.

Aconteceria, como diz o Evangelho, que seriam desprezadas, "calcadas", e nós, ridicularizados, "despedaçados".

Ao mesmo tempo, devemos lembrar que o próprio Evangelho ensina também a amar o próximo como a si mesmo e portanto, a comunicar os bens espirituais que possamos ter e a luz que Deus nos dá, a quem estiver disposto a recebe-los.

No primeiro caso, devemos testemunhar Jesus somente com a nossa vida, no segundo, também com a palavra. Um erro, por excesso, pode ser o que cometem certos cristãos que procuram apresentar a vida evangélica do lado aventuroso, poético, romântico, tentando atrair as pessoas com uma pseudo mensagem evangélica que estimula a fantasia e o amor próprio, fazendo sentir-se portadores de uma suposta missão.

Não se pode excluir da vida evangélica o que ela possui de mais esplêndido: a normalidade de uma vida sobrenatural límpida, harmoniosa, nem artificial, nem excessiva, mas simples como a natureza.

Maria, mãe do Criador e mãe de todas as criaturas, viveu entre seus contemporâneos que eram também filhos seus; no entanto, nada se conhece do seu apostolado entre eles. Ela fez só a vontade de Deus: amava a Jesus e assistia aos apóstolos.

E creio que ninguém melhor do que ela viveu o Evangelho.

Um erro de omissão pode ser notado nos cristãos exageradamente ligados a seus deveres e que veem unicamente nestes a vontade de Deus, fechando-se então, à manifestação da vontade de Deus através das circunstâncias. Terminam, por isso, não amando quem lhes passa ao lado. Estas pessoas vivem em pouca intimidade com Deus, porque não ouvem a sua voz em cada momento presente do dia. Não obstante pensem estar cumprindo justamente seus melhores deveres, na verdade estão apegados também a si mesmas. Não conhecem a poesia do Evangelho, a divina aventura que ele encerra, porque não sabem ver a linha traçada pela providencial mão de Deus que ilumina a vida de cada homem, mesmo o mais simples e desconhecido.

Enquanto os que pecam por excesso podem parecer exaltados, estes são sombrios e enfadonhos. A presença deles é inexpressiva e afasta os outros.

0 verdadeiro cristão é uma pessoa em quem vive sempre Cristo e dele todos se aproximam com amor e temor, porque irradia, como Jesus, o amor e a verdade: o verdadeiro cristão é luz no mundo.

 

29 março 2019

A pátria

Coopere com sua pátria, para engrandecer-se a si mesmo.

A pátria é a reunião de todos nós.

No entanto, evite buscar apenas vantagens pessoais, pois aquilo que você retirar a mais para você estará prejudicando a outrem, que receberá  menos.

Qualquer função é útil à comunidade, e o bem da coletividade se distribui a todos os cidadãos.

Não abuse de seus privilégios.

27 março 2019

O encontro de Igino Giordani com Chiara

Quando encontrei Chiara, o seu único Focolare era composto por apenas sete ou oito moças. Dois rapazes formavam um Focolare masculino. De início, aquilo que me impressionou mais do que qualquer outra coisa, foi constatar que entre as focolarinas não se falava senão de Deus, da Virgem, da Igreja: eram pessoas de casa. Eu via nelas, estreitamente unidas em Cristo, o Corpo místico em ação, o qual se exprimia propagando a alegria de ser Jesus.

(Igino Giordani, Memórias de um cristão ingênuo, Cidade Nova, 2018, p.147)

26 março 2019

Também sofrer

Amamos o próximo vivendo em nós a sua vida, portanto, providenciando aquilo que lhe falta. Pois é, amar o próximo quer dizer isso. Mas não apenas isso. Se olhamos para Jesus, podemos observar que Ele amou o próximo dando-lhe de comer, curando-o, perdoando-o etc. Entretanto, não se limitou a isso. Para amá-lo de modo perfeito e completo, Jesus sofreu e ofereceu sua vida por ele. O comportamento de Jesus nos deve iluminar. Dele devemos deduzir que também para nós o amor ao irmão não se pode limitar a “nos fazermos um” com ele. Devemos acrescentar algo mais. Esse algo mais tem um nome: sofrer! A vida que levamos nesta terra é, sem dúvida, marcada pelas alegrias, por aquelas satisfações profundas que, por exemplo, a propagação do Reino de Deus nos propicia. Mas não podemos negar que nossa vida é também marcada pela dor: doenças, tentações, angústias, tormentos, misérias, incompreensões, imprevistos dolorosos… Que significado têm todas essas manifestações de sofrimento? Por qual motivo Deus-Amor as permite? São feições de Jesus Abandonado a ser abraçado, e o abraçamos 3 , mas muitas vezes não nos perguntamos o porquê de tais sofrimentos. Na realidade, para Deus, que faz tudo cooperar para o bem, cada vez que ficamos aflitos, existe sempre um motivo preciso. Esses sofrimentos são dispostos por sua vontade ou por sua permissão para purificação nossa ou para o bem dos outros, bem como para o renascimento espiritual deles ou para o progresso de sua caminhada para Deus. Sim, tudo tem sempre um porquê!

A palavra gera Cristo


E agora podemos nos perguntar: como conseguimos penetrar na palavra de Deus e compreendê‑la a ponto de apresentá‑la nova e portadora de uma força vital e revolucionária?

Sem dúvida ‑ agora podemos dizê‑lo ‑ foi em virtude de uma graça especial, graça que ensinava a colocar e a viver em profundidade a presença de Cristo entre as almas.

            O Senhor agiu da seguinte maneira: com a sua pedagogia, de início nos indicou algumas palavras que podem parecer mais fáceis. Todavia, ele tinha um motivo bem determinado para escolher tais palavras. Em geral eram as que diziam respeito ao amor: “Ama ao próximo como a ti mesmo”, “amai‑vos uns aos outros”, “amai o inimigo”, “amai...”; sempre o amor.

Só mais tarde compreendemos o motivo desta escolha: quem ama, adquire a luz, porque o fruto do amor é a iluminação interior.

E tem mais: o amor que Deus coloca dentro da nossa alma é sobrenatural, faz participar o nosso amor do próprio amor de Deus; portanto, é recíproco por sua própria natureza. Na reciprocidade do amor, acontecia que o Senhor, aos poucos, nos acostumava a acolher a sua presença entre nós. E esta presença influía na compreensão da sua palavra. Era ele o nosso Mestre, que nos ensinava como deviam ser entendidas as suas palavras. Era uma espécie de exegese, feita não por um mestre de teologia, mas pelo próprio Cristo.

De fato, diz Santo Anselmo, Doutor da Igreja: “Uma coisa é possuir facilidade de eloquência e esplendor de palavra, e outra é entrar nas veias e na medula das palavras celestes e contemplar com límpido olhar do coração os mistérios profundos e escondidos. Isto não pode ser dado, de maneira alguma, nem pela doutrina, nem pela erudição do mundo, mas somente pela pureza da mente através da erudição do Espírito Santo. E a presença de Jesus entre nós traz o seu Espírito.

            Por outro lado, lembramos que uma das primeiras páginas do Evangelho que lemos foi o Testamento de Jesus. O acontecimento de grande importância. Está ainda presente em nossas mentes o fato de que, na medida em que passávamos de uma palavra a outra, cada um parecia iluminar‑se; e era ‑ agora percebemos ‑ como se alguém nos dissesse: ‑Olha, na escola, vocês têm de aprender muitas coisas, mas o resumo é isto, isto, isto: consagra‑os na verdade... que todos sejam um... tereis a plenitude da alegria... sereis todos um, como eu e o Pai... etc. O Testamento se nos revelava como a síntese do Evangelho. E entendíamos esta realidade com uma compreensão que só podia ser fruto de uma graça especial. Tendo penetrado o "seu" Testamento ‑ como Deus quis e na medida em que quis ‑ depois nos foi mais fácil entender o resto do Evangelho.

            Amiúde, dávamos este exemplo: imaginem o Evangelho como uma planície, um terreno onde estão todas as palavras: lá no fim, encontra‑se o Testamento de Cristo, que sintetiza todas as outras palavras. 0 Senhor, ensinando‑nos a unidade à qual todas as verdades evangélicas se ligam, fez como que uma perfuração no terreno, para fazer‑nos penetrar e entender o resto do Evangelho por dentro, colhendo‑o na raiz de cada palavra, no seu sentido mais verdadeiro.

            Após viver durante cinco ou seis anos as palavras do Evangelho, percebemos claramente que elas se assemelhavam: havia algo de comum entre todas; cada uma ‑diria ‑ valia tanto quanto qualquer outra, porque os efeitos produzidos nas almas que as viviam eram idênticos, não importando qual fosse a palavra vivida. Por exemplo, para viver a palavra: “Quem vos ouve a mim ouve...”, não ficávamos esperando encontrar algum bispo ou superior para colocá‑la em prá­tica, mas a nossa vida toda, cada segundo da nossa existência, se transformava em obediência àquilo que os sacerdotes nos haviam ensinado através do catecismo, ou àquilo que havíamos aprendido de Deus e depois submetido à Igreja. De modo que, viver esta palavra equivalia a viver todas as outras, como as palavras que pedem para fazer a vontade de Deus, ou amar a Deus ou ao próximo. Por isso, tudo ia se tornando mais simples.

            A esta altura, poderia parecer supérfluo continuar este costume de focalizar em cada semana uma palavra; todavia ‑ e esta pode ser uma experiência de todos, se correspondermos à graça ‑ Deus trabalha as almas ‑ e às vezes manda tão sublimes dons de luz que se tem a impressão de receber uma compreensão mais profunda do Evangelho.

            Sob a influência destas graças, descobre‑se no Evangelho, por exemplo, que toda a vida de Jesus está orientada ao Pai. E então se lê o Evangelho com um novo interesse e se orienta a nossa vida também naquela direção.

            Podem ainda sobrevir graças de trevas escuras como o inferno, onde se duvida de tudo. E a maior dúvida é contra a lógica do Evangelho. Dizemos a nós mesmos - ou melhor, alguém com uma luz diabólica nos insinua: ‑ Se voltar a amar, você verá novamente, E então entrará outra vez no sistema, na vida sobrenatural, que por sua vez será um perigo para a sua liberdade; portanto: Detenha‑se. Não ame e você será você mesmo... O demônio faz de tudo para que não amemos. Mas, se resistirmos e fizermos exatamente o contrário daquilo que a tentação sugere, eis que se abrirá diante dos olhos da alma uma visão ainda mais profunda do Evangelho, Então descobri‑lo‑emos como o único Livro da Vida, entendendo que jamais conseguiremos compreender – “qual é a largura e o comprimento, a altura e a profundidade...” da palavra... Deste modo, o Evangelho permanece o livro eterno do nosso alimento espiritual.

Passemos a outro aspecto.

            A palavra de Deus! A palavra de Deus não é como as outras. Ela não só pode ser ouvida, como também tem o poder de atuar aquilo que ela exprime.

            E, já que a palavra é Cristo, gera Cristo na nossa alma e nas almas dos outros.

            Mesmo antes de viver a palavra, se somos cristãos, a graça habita em nós, a vida de Cristo habita em nós e com ela temos, sem dúvida, a luz de Deus, e o amor, mas um tanto fechados, como numa crisálida. Vivendo o Evangelho, o amor irradia a luz e a luz aumenta o amor. A crisálida começa a se mover até que dela sai a borboleta. A borboleta é o pequeno Cristo que começa a tomar lugar em nós e depois vai crescendo cada vez mais, cada vez mais... de tal modo que nos plenificamos sempre mais dele.

E isto que nos ensina o nosso Ideal. É isto o que pretende fazer a palavra de Deus em nós: formar o Cristo desde agora, de maneira que a preparação para a outra vida nada mais seja que o ponto culminante de uma vida vivida em função daqueles dias, daquela hora, da Vida verdadeira.

Que a palavra gera Cristo em nós, muitos o dizem: os Papas, os Santos, os Padres da Igreja.

Existe uma esplêndida descrição do papa Paulo VI sobre os efeitos da palavra e a maneira como deve ser acolhida. Ele chega até a sugerir um método, que é o mesmo do nosso Movimento. Diz o papa: “...Como Jesus se faz presente nas almas? Através do veículo que é a comunicação da palavra, passa o pensamento divino, passa o Verbo, o Filho de Deus feito Homem. Poder‑se‑ia dizer que o Senhor se encarna dentro de nós quando aceitamos que a sua palavra venha viver dentro de nós. Ouvindo as explicações do Evangelho, seja assíduo o de cada cristão o de apropriar‑se pelo menos de uma preciosa noção; e, voltando para casa, durante toda a semana, nutrir‑se de tão substancioso alimento espiritual: a palavra do Senhor...

            Portanto, antes de tudo, ouvir; depois, conservar. É necessário não apenas um ato passivo de aceitação, mas também uma reação ativa, um ato reflexo. Deve-se meditar.

            Existe um terceiro momento. A palavra deve se transformar em ação e guiar a vida. Ela deve ser aplicada ao nosso estilo, ao nosso modo de viver, de julgar e de falar... De tal maneira, a vida cristã se revela sobremodo atraente...”

E é esplêndido o conceito que Santo Inácio de Antioquia tem da palavra.  Ele sente que nós ‑ tendo saído da mente de Deus ‑ estamos destinados a voltar como Palavra de Deus. Escrevendo aos seus, para que não lhe impedissem o martírio, dizia: “Não quero que vocês procurem o que agrada ao homem, mas aquilo que agrada a Deus, por quem vocês são recebidos com prazer. E eu não terei mais uma ocasião como esta para alcançar a Deus... Se vocês se calarem (se me deixarem ir ao martírio) eu me tornarei palavra de Deus”.

            E São Tiago apóstolo afirma: “Por vontade própria Deus nos gerou pela Palavra da verdade, a fim de sermos como que primícias dentre as suas criaturas”.

Há também uma frase de Jesus no Evangelho que faz pensar. Quando os apóstolos se aproximam dele e lhe dizem que sua mãe e seus irmãos estão à sua espera, ele responde: “Minha mãe e meus irmãos são todos aqueles que ouvem a palavra de Deus e a põem em prática”. Portanto, existe uma possibilidade admitida por Jesus de sermos, de algum modo, sua mãe. Sim, ele mesmo o disse.

Nós podemos gerar Cristo nas almas, como uma mãe gera, justamente através da palavra .

            Também São Gregório Magno afirma que podemos ser mãe de Jesus: .”Devemos saber que, quem é irmão e irmã de Jesus pela fé, toma‑se mãe por obra da palavra. Se alguém, com sua palavra, faz nascer o amor, do Senhor na alma de um próximo, ele como que gera o Senhor, porque o faz nascer no coração de quem ouve a sua palavra, e se toma mãe do Senhor”.

            Do mesmo modo, São Paulo, em virtude da palavra semeada no coração dos ateus, sente fortemente que se tomou pai deles: “Ainda que tivésseis dez mil pedagogos em Cristo, não teríeis muitos pais, pois fui eu quem pelo Evangelho vos gerou em Jesus Cristo”.

            Santo Agostinho vê as Igrejas geradas pela palavra de Deus: “Os próprios apóstolos, sobre os quais a Igreja foi fundada, seguindo o exemplo de Cristo pregaram a palavra da verdade e geraram as Igrejas”.

A Igreja, pois, é gerada precisamente mediante o anúncio da palavra. E, por sua vez, a Igreja é mãe e gera as almas através da palavra que doa e pelo batismo.

0 mesmo podemos afirmar com relação à nossa Obra. Ela foi gerada pela palavra que Jesus semeou em nosso coração, e é por sua vez mãe de muitas almas, porque as gera, depositando no coração dos homens a palavra, que não é um simples conceito, mas, espírito e vida

A palavra de Deus, portanto, gera Cristo nas pessoas, nas comunidades, nas Igrejas. Por isto, Clemente Alexandrino podia dizer: “....quem obedece ao Senhor e por meio dele segue a Escritura que nos foi dada, se transforma plenamente conforme a imagem do Mestre. Chega a viver como Deus encarnado. Mas, esta altura não podem atingir aqueles que não seguem a Deus que conduz. E ele conduz pelas Escrituras divinamente inspiradas”.

Colocar‑se em contato com a palavra de Deus é, portanto, colocar‑se em contato vital com Cristo, é observar a sua vida. Por isso, fazendo eco ao Cântico dos Cânticos: “Beija‑me com um beijo da sua boca”, podemos afirmar: toda vez em que vivo a palavra é como se desse um beijo na boca de Jesus, aquela boca que diz somente palavras de vida. Ele, que é Palavra, comunica‑se à nossa alma. E nós somos um com Ele! E nasce Cristo em nós.

E também esta a opinião de São Gregório Niceno: “Ora, a fonte é a boca do Esposo, de onde, emanando as palavras de vida eterna, enchem a boca de quem as atrai ... É preciso, pois, que aproxime a boca da água quem deseja conseguir a sua bebida na fonte. Ora, a fonte é o Senhor que disse: “Se alguém tem sede, venha a mim e beba” e é  por isso que a alma quer aproximar a boca da boca de onde brota a vida, dizendo: “Beija-me com o beijo da tua boca”, e aquele que tem esta fonte para todos, e quer que todos sejam salvos, não deixa que nenhum daqueles que se torna purificação de qualquer mancha.

Depois de tudo o que foi dito sobre a palavra de vida, só nos resta tirar uma única conclusão: Quanto tempo de vida ainda teremos? No momento presente vivamos a palavra com aceleração crescente, a fim de que também nós sejamos, para o mundo e para a glória de Cristo, um Deus encarnado.


24 março 2019

Martírio branco

O amor mútuo, como Jesus o pede, implica um verdadeiro martírio. De fato, Ele pede que nos amemos a ponto de estarmos prontos a morrer um pelo outro. Isso é martírio, um martírio branco, se assim preferirmos, mas verdadeiro, porque pede a vida. É um martírio diário, ou melhor, um martírio de momento por momento. Talvez, apesar de toda a nossa boa vontade, não o tenhamos vivido exatamente assim. Mas somente desse modo somos verdadeiros cristãos, alcançamos a perfeição, justamente como os mártires. E, com ela, alcançamos a união com Deus, a presença plena de Cristo em nós.

Deus é amor

Chiara Lubich aos GEN, 1976



(...) Onde Ele aparece de modo mais evidente, tão próximo de nós que quase podemos tocá-lo é na Eucaristia.

Caríssimos Gen, vocês não sabem o que significou Jesus Eucaristia para a geração que lhes precedeu. Gostaria de lhes contar o que aconteceu de modo amplo e completo. Desta vez digo apenas que, ao contrário da 2a. geração, nascida e logo abençoada pela Igreja, a primeira geração teve que percorrer outros caminhos. O Ideal que surgia era muito novo e tinha que passar por um estudo aprofundado por parte da Igreja.

Viver na expectativa, para nós, era coisa de todos os dias. “Estaremos no caminho certo?” O coração nos dizia que sim, mas somente a Igreja poderia confirmar o que sentíamos.

A primeira geração devia fazer penetrar mais profundamente as raízes desta árvore (que é todo o Movimento, incluindo a segunda geração) com aquelas provas que são necessárias para um Obra de Deus.

Quem nos deu coragem para ir adiante? Jesus Eucaristia. Nós pensávamos: ainda não conseguimos ter uma audiência com o Papa, com o vigário de Cristo, mas todos os dias, a todas as horas, podemos ter uma audiência com o próprio Cristo. E indo visitar Jesus, dizíamos:

pensando bem, o Papa é seu vigário, diga-lhe que somos filhos dele, que a nossa Obra quer servir somente a Igreja.

E Jesus atendeu o nosso pedido de maneira impressionante: as aprovações que vieram em seguida, escritas e orais, foram inumeráveis.

Vocês entendem que com Ele somos onipotentes?

Os Gen devem ter o verdadeiro sentido dos valores e devem se apropriar desta ideia: nós temos a possibilidade de tratar de nossas dificuldades todos os dias com Ele, o Onipotente, comunicar-lhe as nossas alegrias, podemos confiar-lhes o Movimento Gen, a Igreja, a unidade dos cristãos, dos povos, os pagãos...

E imagino que também os Gen já pensaram alguma vez: como seria bom ter vivido no tempo de Jesus!

Pois bem, é necessário acreditar no Amor de Deus também aqui e fazendo assim penso que, de certo modo é melhor viver nestes tempos. De fato, a presença de Jesus naquela época era limitada à Palestina, agora se estendeu a todos os pontos da terra.

E depois existe ainda um outro fato que nos faz preferir viver nestes tempos. Deus se fez homem para salvar-nos, mas fazendo-se homem quis até mesmo tomar-se alimento, para que, nutrindo-nos d’Ele, nos tomássemos outros Cristo. Ora, uma coisa é ver Jesus, outra coisa é ser de um certo modo um outro Jesus sobre a terra. E não é isto, como dissemos no início que pretendemos realizar? Não queremos nos realizar como seres divinos?

Eucaristia, portanto, Eucaristia. Dizer Gen e dizer Eucaristia é afirmar duas coisas que se atraem reciprocamente.




23 março 2019

Ajude

AJUDE a todos, como deseja ser ajudado.
Se tem empregados, saiba compreender suas dificuldades, quanto você deseja que eles compreendam as suas.
Coloque-se no lugar deles, e trate-os como você gostaria de ser tratado se ocupasse a posição deles.
Seu empregado é um irmão seu, que está iniciando a sua carreira.
Ajude-o o mais que puder e não se arrependerá.

22 março 2019

Viver dentro

Queremos converter‑nos Senhor. Até hoje, vivemos "fora", doravante, devemos viver "dentro", como Maria.
Porque, mesmo o viver "fora", voltado para o próximo ou para as obras ‑ ainda que seja por amor a Deus se não for corrigido por uma força espiritual que atrai a alma continuamente para o seu íntimo, pode tornar-se motivo de divagação, com muito tagarelar inútil, com "coisas santas" dadas aos "cães".
Viver "dentro", crescer interiormente, desapegar‑se de tudo, não para permanecer suspenso entre o céu e a terra, mas "enraizado" no Céu, fixo no coração de Cristo, através do Coração de Maria, numa vivência trinitária, prenúncio da vida que virá.
Viver "dentro" e oferecer ao próximo unicamente a seiva que jorra do Céu dentro de nós, a fim de o servirmos realmente e não o escandalizarmos com a nossa tão pouca santidade.
Viver "dentro", como Maria, a inigualável, a Mãe amada, a Rainha, a Guia que vence Satanás ancorada em Deus e não através de atitudes exteriores tão distantes dela como a terra do céu.
Viver "'dentro", pregados na cruz por nossas próprias mãos, para que Cristo continue, também através de nós, a obra de reunificação de um mundo volúvel que sofre, que espera, que quer esquecer, que tem medo, e do qual se compadece hoje o nosso coração como ontem se compadeceu das multidões o de Jesus.
Viver "dentro", para arrastar o mundo que vive apenas "fora", aos abismos dos mistérios do espírito, onde nos elevamos, repousamos, recebemos conforto, ganhamos novas forças e reencontramos alento para voltar à terra e continuar a batalha cristã até a morte.
Às vezes, levamos muito tempo para nos desprendermos dos negócios, do mundo e das coisas, para
nos recolhermos e nos concentrarmos em Deus; contudo, logo que o fazemos, não mais desejamos voltar atrás, tão suave é para a alma a união com Deus.
Deus está dentro de nós em solidão e não é possível encontrá‑lo sem que enfrentemos corajosamente, tam­bém nós, a solidão.                               
            Se Deus mostrasse a uma alma todas as dores que lhe reservou durante a vida, ela morreria no impacto. 0 mesmo aconteceria, se Deus mostrasse todas as ale­grias que a alma experimentará na vida.              Deus sabe e dosa. A alma não sabe, mas abandona‑se nas mãos de Deus, que a ama.
Se o silêncio do cimo das montanhas, se a imensa e solitária amplidão do mar, se uma excursão entre o céu azul e a branca rocha, se uma viagem de avião a dez mil metros, exercem uma real atração nas pessoas espirituais porque as levam ao recolhimento espontâ­neo e à oração, como se sentirão envolvidos pela oni­presença de Deus aqueles que, com a fé no coração, puderem afastar‑se desta terra e correr entre os espa­ços!                    
Deus!  Primeiramente 0 escolhes como o Tudo da tua vida, excluindo todo o resto que descobres fátuo e vão. Depois, contemplas com os Seus olhos os homens e as coisas, o mundo e a história, os acontecimentos grandes e pequenos... e 0 amas, presente na natureza e nos séculos.
Finalmente 0 "sentes" no fundo do teu coração. E Aquele, cuja existência aceitavas pela fé, manifestar-se‑á de um modo real, por mística e tangível demonstração. E acreditas que Ele existe, porque Ele está realmente no fundo da tua alma.
Caminhemos pelo mundo, encouraçados em nossa interioridade onde vive Deus. Saiamos somente para servi‑Lo no irmão ou no trabalho, tendo nas atitudes e no olhar a paz -  haurida no silêncio amoroso e infini­to da Santíssima Trindade que habita em nós ‑ e a luz ‑ que jorra como água inesgotável da Sabedoria eterna ‑ densa de alegria puríssima. Testemunhemos assim a
futilidade do mundo que nos circunda, para afirmar­mos, com os fatos, a existência de um outro mundo de maior valor, de maior importância e que há de rei­nar.
É necessário que a nossa alma se recolha e se encontre com Deus. Se não estiver fixada neste único centro é como um pião que corre desgovernado, batendo de um lado e de outro. Centrada em Deus, cada uma das suas ações adquire significado, cada uma de suas atitudes para com os homens e as coisas se situa num plano sobrenatural. Caso contrário, tudo se esvai e não se percebe mais o motivo da existência.
Não é verdade Senhor, que toda a nossa vida seja dor.
Não é verdade, Senhor, que a sombra da cruz amargure todos os dias de nossa existência. É muito mais verdadeiro dizer que, para os que te amam, a dor representa uma grande parte, insubstituível; mas não é a única coisa que encontramos ao seguir‑te, pois vemos sobretudo a Ti, que és Amor, e transformas cada dor em encantamento. Assim a vida é vivida com centuplicado ardor.
Quando o homem se inclina, adorando a Deus presente no seu coração, não tem a sensação de estar se retraindo sobre si mesmo ou diminuindo‑se, mas abre‑se para horizontes mais vastos do que os contemplados pelos que voam pelo céu, mais amplos do que aqueles entre as miríades de estrelas.
É a dimensão do espírito que supera qualquer limite e mergulha a alma em abismos de amor, onde frequentemente se desfaz em lágrimas porque o contato com Deus, a quem inadequadamente serve, lhe é mais íntimo do que ela própria.
Se amares a Deus por longo tempo, e Ele te escavar a alma com abismos como só Ele é capaz, sentirás que não é mais possível perdê‑Lo. Se por acaso, a fim de servi‑Lo, tu deixas este colóquio direto, no primeiro instante em que te encontrares só, Ele voltará e Tu lhe falarás e saberás que Ele está presente, pois todo o teu ser clama por Ele só e, sem Ele, és como um nada sem sentido.
Sem dúvida, Senhor, deves dominar o mais íntimo da alma dos teus servos, pois que muitas vezes, quando eles se recolhem para trabalhar, Tu os atrai para o mais íntimo do seu ser a fim de que retifiquem a intenção, segundo a tua vontade e te ofereçam, qual incenso, tudo o que fizerem.
Quando reencontramos na solidão o contato contigo, reencontramos o contato com os homens e com as coisas, não como escravos mas como filhos de Deus.
Alegrias e dores, consolações e angústias, arrependimentos e ressurreições, permissões de Deus e luminosas vontades suas, conquistas e perdas dolorosas, aprovação dos homens e difamações, lenta edificação de obras para a glória de Deus e florescer de conversões, tudo, ainda que no meio do joio de Satanás, semeado por toda parte, tem sempre, se amamos a Deus, um só destino, um único motivo: levar‑nos à união com Deus.
Que sempre resplandeça no íntimo de nosso coração e tudo viva em função de Ti, em torno de Ti. Depois, não importa onde, como, se ou mas...
Senhor, faze com que vivamos e voltemos com frequência, durante o dia escuro desta vida, ao outro Reino que está acima de nós, dentro de nós e que existirá depois de nós: o Reino onde o teu Nome é santificado, o Reino cujo advento, não será mais necessário pedir, após a chegada de todos.
Ali vivem os Santos, os Bem‑aventurados, com a Virgem e o teu divino Filho na Trindade. E lá podemos de vez em quando nos retirar, a fim de trazermos para este mundo fátuo e vazio, órfão e solitário, triste e cheio de melancolia, aquele amor indefinível e suavíssimo que tudo anima, tudo penetra.
Senhor, toma a nossa vida de tal forma imbuída de sobrenatural que, quando estivermos sós, caminhando, trabalhando ou estudando, quem passar ao nosso lado sinta o teu perfume. E quando juntos, quem nos encontrar sinta‑se fortemente atraído, a mergulhar no Reino de Deus, presente no meio de nós.
Quando a hélice de um avião gira vertiginosamente, não se consegue mais vê‑Ia. Quando uma alma
ama com intensidade, perde o seu peso humano e toma‑se transparente.
Se, todavia, a hélice em movimento é tocada pelo sol, reluz em todo o seu esplendor. Do mesmo modo a alma que "vive". Em cada encontro com Deus transborda de Luz e canta com Maria: “A minha alma glorifica o Senhor"'.
Às vezes, Senhor, existe algo no íntimo dos corações dos teus filhos, que atrai mais fortemente que inúmeras preferências naturais ou espirituais; algo mais puro que o ar do alto das montanhas algo mais vivo que qualquer outra vida, mesmo plena, pois ela parece loucura ou distração, diante da voz imperiosa que se ouve interiormente com grande ressonância.
"Jamais colherei uma flor," diz S. João da Cruz, para nos ensinar a não pararmos nas consolações terrenas... Sim, "jamais colherei uma flor" Te repetem estas almas, porque a flor das flores nasceu no fundo do pântano dos seus corações, como um milagre divino.
Aqueles que Te amam com sinceridade, não raro Te sentem, Senhor, no silêncio do seu quarto, no profundo do seu coração, e esta sensação comove a alma como se cada vez atingisse o seu íntimo.
E Te agradecem por estares tão próximos deles, por seres tão plenamente o seu Tudo: aquele que dá sentido ao viver e ao morrer.
Agradecem‑Te, mas muitas vezes não sabem fazê‑lo nem dizê‑lo. Sabem apenas que Tu os amas e que eles Te amam e que não existe algo mais suave aqui na terra que de longe ao menos lhe possa ser comparável. 0 que sentem na alma, quando Tu apareces, é Paraíso e "se o Paraíso é assim ‑dizem ‑ oh! como é esplêndido!”
Agradecem‑Te, Senhor, pela vida inteira, por conduzi­-los até aqui. E se exteriormente ainda existem nuvens que poderiam ofuscar o seu paraíso antecipado, quan­do Tu Te manifestas, tudo se toma remoto e distante: nada existe. Tu existes. Assim é.
Se não fecharmos as janelas da nossa alma com o recolhimento, Tu não poderás, Senhor, entreter‑Te conosco, como o teu amor, às vezes, desejaria.
Nós somos tão mesquinhos que, muitas vezes, para não fazermos o menor esforço, reduzimos a nossa alma a uma praça, onde todas as coisas do mundo surgem, entram e conversam. Deste modo, Tu, que nos ensinaste que não é bom dar as coisas santas aos cães, Tu que és o Santo, não Te podes dar a nós, embora muitas vezes o queiras, embora o nosso esforço, por pouco que seja, fosse imensamente recompensado pelo teu amor. Pois ele nos confortaria e sustentaria, dando‑nos a força para viver uma vida mais real no meio do permanente outono do mundo.
Pode‑se chegar a um ponto em que uma palavra diz à alma todo um conteúdo divino, tão pleno, tão novo, que basta a própria palavra para exprimi‑lo, embora se perceba que ela não é suficiente para comunicá‑lo aos outros. Por exemplo: "Jesus", "Maria".
O grão de trigo desenvolve a sua vida debaixo da terra, coberto por uma camada de neve. De maneira análoga, a alma amadurece a sua união com Deus, isolada por uma camada de abandono.
 

21 março 2019

A terra

A terra espera pelo seu auxílio.
Ela lhe dá o ar para respirar, desde que nasceu, a água para dessedentá-lo, o alimento para sustentá-lo, a residência para protegê-lo, e você, que é que dá em retribuição?
Está contribuindo para a prosperidade da terra que o recebe de braços abertos permitindo-lhe a evolução e o aprendizado?
Não se esqueça de que a terra espera pelo seu auxílio!

20 março 2019

Desde a manhã

Podemos amar Jesus também nos familiares que cumprimentamos com um bom-dia, com os quais rezamos, quem sabe, a oração da manhã e tomamos café. Podemos amar Jesus no próximo durante o dia, inclusive atrás da mesa de professor onde ensinamos, ou do balcão da loja ou do guichê do Banco onde trabalhamos… Podemos amar o próximo reconhecendo Jesus nele até em casa, quando passamos o pano de chão ou a vassoura, quando lavamos a louça ou saímos para as compras. Podemos amar Jesus quando escrevemos uma carta, damos um telefonema, participamos de um congresso ou escrevemos um artigo. Podemos amar Jesus no próximo quando rezamos. Sempre dispomos dessa maravilhosa possibilidade e podemos ter certeza de que Ele nos diz a todo momento: “A mim o fizeste”.

19 março 2019

A cruz de cada dia



      Vivendo o presente, podemos notar que — se for bem vivido — é sempre possível pôr em prática as palavras de Cristo: “Tome a sua cruz” (cf. Mt 16,24). Cada momento, quase, tem a sua cruz: pequenas, insignificantes ou grandes dores espirituais ou físicas, que acompanham a nossa vida no presente. É preciso “tomar” estas cruzes, não procurar esquecê-las, refugiando-se em uma vida sem compromisso.



      E, mesmo que tudo seja saúde e alegria, é aconselhável vivermos isso desapegados, embora sendo gratos a Deus, e não nos inclinarmos avidamente para o dom, em vez de para o Doador, ficando depois tristes, com um vazio na alma.

18 março 2019

A vaidade

Percorrendo as ruas das nossas cidades, temos a impressão dolorosa de que a vaidade nelas caminha encarnada. Encarnada em algo que cobre as paredes e descobre as pessoas, numa imodéstia que asfixia e numa falta de estética que faz sofrer.

Então, como que atraídos pelo calor de um fogo num rigoroso inverno, nos refugiamos numa Igreja, onde a chama vermelha indica que Ele ali habita.

E nos apercebemos de que, se na rua parecia que a vaidade tomava corpo, a real presença de Deus, evocando anjos e santos que com Ele já vivem, e nossos entes queridos que passaram para a outra vida, no abraço do Senhor, são as verdadeiras realidades na Realidade.

De modo que o mundo se tomou ainda uma vez escabelo para o Único que “é”, do mesmo modo como o inferno faz resplandecer o Paraíso.

17 março 2019

É Jesus!

Cedo ou tarde, “fazer-se um” “conquista”. O que sucede é que também o outro começa a amar, quer “fazer-se um”, tenta e procura “fazer-se um” com todos, também conosco. Acontece, então, que somos dois a “nos fazermos um”, a nos amarmos realmente como Jesus quer. E Ele quer que nos amemos até morrer um pelo outro. Não significa que nos amemos esperando morrer amanhã, depois de amanhã ou no ano que vem. Quer que morramos agora, quer que vivamos mortos, mortos para nós mesmos, porque vivos para o amor. Então, quando duas pessoas se encontram e se amam assim, eis que acontece um fato extraordinário, realmente extraordinário. É como quando dois elementos se combinam e dali surge um terceiro, que não é o somatório de dois elementos, mas é outra coisa. Do mesmo modo, quando duas pessoas se amam dessa maneira, ou seja, tendo a morte como medida do amor, surge um terceiro elemento. Não são mais uma e outra, não é uma mescla de duas pessoas, nem um grupo de duas ou mais pessoas: é Jesus! Jesus! Uma coisa fantástica! “Onde dois ou mais estiverem reunidos em meu nome (que quer dizer nesse amor, em mim)” — diz Jesus —, “Eu estou ali, no meio deles” o que significa: neles. Dois ou mais que se amam desse modo levam ao mundo, geram no mundo, uma chama: o próprio Jesus.

15 março 2019

O caminho que Deus percorreu

“Para os fracos fiz-me fraco […]. Tornei-me tudo para todos […] a fim de ganhar o maior número possível” (cf. 1Cor 9,22.19). Essa é uma palavra da Escritura que deve ser amada de um modo todo especial. De fato, ela nos lembra o método de quem quer dar a sua contribuição para pôr em prática a prece de Jesus ao Pai: “Que todos sejam um”, ou seja: “fazer-se um” com cada próximo. Sim, esse é o caminho, porque é o mesmo que Deus percorreu para manifestar-nos o seu amor: Ele se fez homem como nós e foi crucificado e abandonado, para colocar-se ao mesmo nível de todos. Fez-se verdadeiramente “fraco com os fracos”.

A manifestação de uma doença pode ser um momento salutar?

Castelgandolfo, 1º de setembro de 1999


A manifestação de uma doença pode ser um momento salutar?[...]


Quando se manifesta uma doença qualquer, somos convidados a acreditar e a dizer que tudo é
amor, amor de Deus, lembrando Santa Teresa do Menino Jesus que, no momento em que teve a primeira
golfada de sangue, não falou de doença, mas disse: «Chegou o Esposo!» […]
Quem sofre está na linha de frente.
No Movimento, temos uma ideia própria do doente, dos doentes.
Em outro diário de abril de 1968, escrevi:
«No trabalho, nos triunfos […] que esta Obra exuberante e florescente exibe, nós, às vezes, somos
tentados a ver, nas pessoas que sofrem, casos marginais que devem ser cuidados, visitados, e,
possivelmente, ajudados para que retornem logo à atividade, como se essa fosse a nossa primeira
obrigação, o centro da nossa vida. No entanto, não é assim. Aquelas pessoas que, entre nós, sofrem, que
jazem doentes, que estão morrendo são as eleitas. Elas estão no centro da hierarquia de amor do
Movimento. São aquelas que mais fazem, que mais realizam».1
Em outro momento, escrevi:
«Devemos considerar os doentes como hóstias vivas que unem seu sofrimento ao de Cristo, dando
assim a melhor contribuição para o desenvolvimento da Obra e da Igreja» (Estatutos Gerais da Obra de
Maria, art. 52).
Também o Papa João XXIII partilhava essa ideia. Ele escreveu a um bispo emérito: «Agora a sua
tarefa mudou (com relação à Igreja): você deve rezar por ela. E isso não é menos importante do que a
ação».
A doença na visão de alguns santos
É bonito e interessante, a esta altura, estabelecer uma relação com alguma regra de vida de
famílias religiosas, para ver como o Espírito Santo é constante ao sugerir aos diversos fundadores normas
semelhantes às nossas.
Na Regra de são Bento, por exemplo, lemos no capítulo 36:
«Antes de tudo e acima de tudo se deve tratar dos enfermos [...]».
Numa das primeiras Regras de São Francisco está escrito:
«E peço ao irmão enfermo que por tudo dê graças ao Criador, e seu próprio desejo seja de ser
assim como Deus quiser, são ou doente; pois todos os que Deus predestinou para a vida eterna, disciplinaos
por estímulos [...], conforme diz o Senhor: "Eu repreendo e corrijo todos os que amo"» (Cap. X).
Portanto, a doença é amor, é tudo amor aquilo que faz sofrer, tanto para são Francisco como para
nós.
As doenças: provações para a provação final
Além disso, no Movimento vemos as doenças, com sia carga de sofrimento, como provações de
Deus para a provação final: a passagem para a Outra vida.
Nos anos sessenta, escrevi:
1 Diário, 11.04.1968

14 março 2019

A "Regra de ouro"

Outra característica do amor — conhecida, reproduzida em todos os livros sagrados e que, se vivida, bastaria ela sozinha para transformar o mundo inteiro numa família — é: amar como a si mesmo, fazer aos outros aquilo que se gostaria fosse feito a si, não fazer aos outros aquilo que não se gostaria fosse feito a si. É a chamada “Regra de Ouro”, tão bem expressa por Gandhi quando afirmou: “Tu e eu somos uma coisa só. Não posso te maltratar, sem me ferir” 1 . O Evangelho a anuncia nestes termos: “Como quereis que os outros vos façam, fazei também a eles” (Lc 6,31). Na tradição muçulmana é conhecida assim: “Nenhum de vós é verdadeiro fiel, se não deseja para o irmão o que deseja para si mesmo” 2 . Desse princípio emana uma norma que, se fosse aplicada, seria, sozinha, o maior propulsor da harmonia entre indivíduos e grupos, no coração das famílias e nos Estado s. Pensar como seria o mundo se a “Regra de Ouro” fosse posta em prática, não apenas entre as pessoas isoladamente, mas também entre os povos, as etnias, os Estados, exprimindo-a , por exemplo, assim: “Amar a pátria dos outros como a sua”…

13 março 2019

O que vale é amar

No amor, o que vale é amar. Assim é nesta terra. O amor — falo do amor sobrenatural, que não exclui o natural — é uma coisa muito simples e muito complexa. Exige a tua parte e conta com a parte do outro. Se tentares viver de amor, verás que, nesta terra, convém que faças a tua parte. A outra, nunca sabes se virá, nem é necessário que venha. Às vezes, ficarás decepcionado, porém jamais perderás a coragem, se te convenceres de que, no amor, o que vale é amar. E amar a Jesus no irmão, a Jesus que sempre a ti retorna , talvez por outros caminhos. Ele deixa a tua alma como aço contra as intempéries do mundo, e a liq uefaz no amor por todos os que te rodeiam, contanto que tenhas presente que, no amor, o que vale é amar.

11 março 2019

Aquilo que plantou

LEMBRE-SE de que colheremos, infalivelmente, aquilo que houvermos semeado.

Se estamos sofrendo, é por que estamos colhendo os frutos amargos das sementeiras errôneas do passado.

Fique alerta quanto ao momento presente! Plante apenas sementes de otimismo e de amor, para colher amanhã os frutos doces da alegria e da felicidade.

Cada um colhe, exatamente, aquilo que plantou.

Por aqueles menos dignos de serem amados


      O amor de Deus tomou a iniciativa e nos amou quando éramos tudo, menos dignos de sermos amados (“mortos pelo pecado”).

      Essa consideração me faz lembrar o início do nosso Movimento, quando Deus acendeu em nossos corações a “centelha” (conforme expressão de João Paulo II2) do nosso grande Ideal.

      Será que, naquela época, na devastação da guerra e no deserto que nos envolvia, teríamos encontrado alguém mais que tomasse a iniciativa de nos amar?

      Não. Portanto, éramos nós que, por uma dádiva particular de Deus, acendíamos a chama do amor em muitos corações, com o anseio de fazer que ela se alastrasse em todos. Tampouco olhávamos se os próximos eram dignos de nosso amor, para poder amá-los; mas atraíam-nos, antes, os mais pobres, em quem melhor vislumbrávamos o semblante de Cristo, e os que mais precisavam de sua misericórdia.

10 março 2019

Exemplo

VOCÊ que tem a felicidade de ver seus netinhos, tão lindos, repare que eles têm os olhos fixos em você, tomando-o como exemplo e modelo do que diz e faz. Conte a eles histórias bonitas, de fundo moral, e desperte em suas alminhas o amor à virtude e ao trabalho. Mas, sobretudo, saiba dar lhes a maior lição que terão em sua vida: seu próprio exemplo de trabalho e honradez.

09 março 2019

Gratuidade

No amor humano, geralmente, amamos porque somos amados. Também quando o amor é bonito, amamos no outro algo de nós mesmos. Existe sempre um quê de egoísta no amor humano, ou então, esperamos amar quando o interesse nos leva a amar. Por sua vez, o amor divino, sobrenatural é gratuito, ama primeiro. Portanto, se quisermos deixar viver o “homem novo” 5 em nós, se quisermos deixar acesa em nós a chama do amor sobrenatural, devemos também nós ser os primeiros a amar.

08 março 2019

A felicidade

Talvez nunca como nestes últimos tempos sentimos a alegria de viver. E uma alegria pura jamais experimentada e nasce do fato de que: conseguimos encontrar!

Podemos até repetir uma frase que é a aspiração mais sincera de toda a humanidade: encontramos a felicidade.

É preciso, porém, experimentar esta felicidade, para compreender o que ela é.

Esta alegria puríssima só pode ser Deus. Aquele Deus que encontramos a cada instante, perdendo tudo no momento presente para sermos só a Sua vontade viva.

Creio que é um estado da alma, talvez um pequeno degrau alcançado, do qual, invocando o Senhor, com a esperança exclusivamente n’Ele, pedimos para não descer mais.

Não, porque esta felicidade em nós, coincide com a glória de Deus, com a extrínseca glória que a nossa alma pobre, porém tão amada por Deus, pode oferecer-lhe.

Encontramos verdadeiramente a pérola preciosa pela qual vale a pena vender tudo, perder tudo.

É Deus, o único que nos restará, daqui a pouco, ao passarmos para a eternidade, onde a nossa Mãe nos espera, sem dúvida contente de nos ter servido de “caminho” com a sua “desolação”.

07 março 2019

A velhice


Existe um escrito muito antigo num dos nossos livros de espiritualidade que explica também o conceito que no Movimento se tem da velhice.

Mas, aos olhos de Deus, o que será mais bonito? A criança que te fita com
olhinhos inocentes, tão semelhantes à límpida natureza e tão vivos, ou a jovem que resplandece como o viço de uma flor recém-desabrochada, ou o ancião (...) quase inapto a tudo, talvez tão-somente à espera da morte? O grão de trigo, tênue mais do que um fio de erva, agarrado aos grãos irmãos que compõem a espiga, à espera de amadurecer e de desvíncular-se, só e independente (...), é belo e cheio de esperança!
Mas é igualmente belo quando, já maduro, é escolhido entre os outros por ser melhor, para, enterrado, dar vida a outras espigas. (..) É belo, é o eleito para as futuras gerações das messes. Mas, quando enterrado, emurchecendo,  reduz o seu ser a pouca coisa, mais concentrada, e lentamente morre apodrecendo, para dar vida a uma pIantinha, diferente dele. mas que a ele deve a vida, talvez seja ainda mais belo.
Belezas diversas. Contudo, uma mais bela do que a outra.

E a última, a mais bela.
Deus verá assim as coisas?
Aquelas rugas que sulcam a fronte da velhinha; aquele caminhar recurvo e tremulante, aquelas palavras curtas, densas de experiência e sabedoria; aquele olhar doce de menina e mulher ao mesmo tempo, porém mais bondoso que de uma e de outra, é uma beleza que nós não conhecemos. (...)
Penso que Deus veja assim as coisas, e que o avizinhar-se do Céu seja de longe mais atraente do que as várias etapas do longo caminho da vida que, no fundo, só serve para abrir aquela porta.[1]

Sobre a velhice nós pensamos assim e ponto final.




[1] Chiara Lubich. «Talvez ainda mais belo”. Em: op. cit. p. 115-116: