21 maio 2021

Como crescer na união com Deus

2 de janeiro de 1982

Para realizar plenamente a nossa humanidade, Chiara nos indica dois caminhos que estão na base de qualquer crescimento

Chiara, sinto que, quando rezo, quando faço meditação ou quando amo os outros, não consigo fazê-lo tão profundamente como deveria. O que fazer para poder adquirir uma unidade verdadeiramente profunda com Deus?

No fundo o que você quer saber é como adquirir uma autêntica união com Deus.
Olhe: a estrada é dupla: eu encontrei dois caminhos para chegar a este resultado. O primeiro é abraçar a cruz e a cruz significa ir em profundidade.

Uma planta quanto mais enterra as suas raízes mais cresce em altura, quanto mais se abraça a dor mais se vai em direção a Deus. Fizeram-me muita impressão umas plantas que existem no Japão, muito pequeninas, assim, são plantas anãs, são muito engraçadas, mas não se pode negar que são anãs. Eu soube que, para que sejam assim, cortam-lhes as raízes.
Acontece o mesmo conosco: se cortarmos as raízes do sofrimento (da dor), se não abraçarmos a dor, permanecemos almas anãs, pequenas, sem a amplidão que dá a união com Deus. Se, pelo contrário, abraçarmos sempre a dor que chega no dia a dia, bem, por amor a Jesus abandonado, então a união com Deus aumenta. Outro modo que encontrei, é fazer momento por momento a vontade de Deus. Agora me explico. Você dirá: eu também faço o mesmo; os outros também dirão: eu também quero fazê-la. Mas é preciso fazê-la de uma certa maneira.
É preciso preferi-la acima de todas as outras coisas da terra, que fazemos na terra. Você diz: eu agora vou jogar, por isso faço a vontade de Deus; depois estudo, por isso, faço a vontade de Deus, depois almoço, portanto faço a vontade de Deus. Porém no fundo do coração você gosta mais de estudar ou ir jogar, u ir… e vive o dia inteiro à espera daquele instante. É normal… acontece também comigo.
Por exemplo, eu gosto de trabalhar; mas gosto menos de dormir, gosto menos de comer. Eu entendi que está errado. Se eu amo a Deus sobre todas as coisas, tenho que concentrar a minha atenção na vontade de Deus, tenho que gostar da vontade de Deus e basta. Portanto, lindíssimo aquele jogo, se é vontade de Deus; estupendo descansar, porque é vontade de Deus.
Concentrar ali, a vontade de Deus, colocar o nosso coração ali, na vontade de Deus. Encontro uma pessoa e não quero olhar para ela, mas é vontade de Deus… então você passa a gostar. Se você fizer assim, Deus se sente amado, porque vê que todos os seus prazeres desapareceram e gosta só dele, da sua vontade, seja qual for, gosta dela. Então, Ele se manifesta na oração e você sente a união com Deus.
É bom experimentar e depois verá…

Chiara Lubich

20 maio 2021

Maria

Maria, a Mãe de Deus, esteve presente na vida do Movimento desde os primórdios, e ainda antes, como testemunha o fato de Loreto, em 1939, quando Chiara foi visitar a casa da família de Nazaré. Inúmeras vezes Chiara recordou um episódio, durante um terrível bombardeio que poderia ser fatal para ela suas primeiras companheiras. Naquele instante recordava ter percebido, pessoalmente, algo que se referia a Maria: «Coberta de poeira, que invadia todo o abrigo – ela contava – levantando-me do chão, quase por milagre, no meio dos gritos das pessoas, eu disse às minhas companheiras: “senti uma grande aflição na alma, agora, enquanto estávamos em perigo, a dor de não poder mais recitar, aqui na terra, a Ave Maria”. Naquele momento eu não podia captar o sentido daquelas palavras e daquele sofrimento. Talvez inconscientemente exprimisse o pensamento que, permanecendo ainda vivas, com a graça de Deus, teríamos podido dar graças a Maria com a obra que estava para nascer».

Por isso não surpreende que Obra de Maria seja o nome oficial do Movimento dos Focolares. Nem que tenha chamado “Mariápolis” os seus principais encontros, e que as suas pequenas cidades sejam “Mariápolis permanentes”, e que todos os centros de formação sejam definidos como “Centro Mariápolis”, e que Mariápolis seja também o nome de uma publicação.

Em 2000 Chiara escreveu: «Maria tinha usado para o nosso Movimento o mesmo método que utilizara para a Igreja: manter-se na sombra para dar todo o relevo a quem o devia ter, isto é, o seu Filho que é Deus. Mas quando chegou o momento do seu ingresso – por assim dizer, oficial – no nosso Movimento, ela se mostrou, ou melhor, Deus a revelou grande em proporção de quanto tinha sabido desaparecer. Foi em 1949 que Maria disse ao nosso coração, verdadeiramente algo de si. Aquele foi um ano de graças especiais, talvez um “período iluminativo” da nossa história. Entendemos que Maria, incrustada como rara e única criatura na Santíssima Trindade, era inteiramente Palavra de Deus, era toda revestida da Palavra de Deus. E se o Verbo, a Palavra, é a beleza do Pai, Maria, substanciada de Palavra de Deus, era de uma beleza incomparável.

Foi tão forte a nossa impressão, diante desta compreensão, que até hoje não podemos esquecê-la. Aliás, compreendemos como então nos parecia que somente os anjos poderiam balbuciar algo sobre ela. Vê-la assim nos atraiu e fez nascer um amor novo por Ela. Amor ao qual ela respondeu evangelicamente, manifestando-se mais claramente à nossa alma na sua realidade de Mãe de Deus. Theotókos. Não apenas, portanto, a jovenzinha de Nazaré, a mais bela criatura do mundo, o coração que contém e supera todos os amores das mães do mundo, mas: a Mãe de Deus. E naquele momento – não sem uma graça de Deus – Maria nos revelou uma dimensão de si mesma que, até então, para nós havia permanecido totalmente ignorada. Sim, porque antes víamos Maria diante de Cristo e dos santos – para fazer uma comparação – como no céu se vê a lua (Maria), diante do sol (Cristo) e as estrelas (os santos). Agora não. A Mãe de Deus abraçava, como um enorme céu azul, o próprio sol (…).

Mas esta nova, luminosa compreensão de Maria, não permanecia pura contemplação (…). Tornou-se claro que Maria representava para nós um modelo, o nosso “dever ser”, enquanto víamos cada um de nós como um “poder ser” Maria».

Centro Santa Chiara

19 maio 2021

A Desolada: a Santa por excelência

Maria, aos pés da cruz, naquele dilacerante «stabat» que a torna um mar amargo de angústia, é a expressão mais alta, em uma criatura humana, da heroicidade de toda virtude. Ela é a mansa por excelência, a dócil, a pobre, a tal ponto que perdeu o seu Filho Deus; a justa que não se lamenta de ser despojada daquilo que lhe pertence por mera eleição; a pura no desapego afetivo a toda prova do seu Filho Deus… Em Maria Desolada encontra-se o triunfo das virtudes da fé e da esperança pela caridade que a acendeu durante toda a vida e a inflamou na participação tão viva na Redenção.
Maria, na sua desolação que a reveste de todas as virtudes, ensina-nos a cobrir-nos de humildade e paciência, de prudência e de perseverança, de simplicidade e de silêncio, para que na nossa própria noite, do humano que existe em nós, brilhe no mundo a luz de Deus que habita em nós. Maria no seu sofrimento é a Santa por excelência, um monumento de santidade, que todos os homens que existem e existirão podem contemplar, para aprender a se revestir da mortificação ensinada há séculos pela Igreja e que os santos, com notas diversas, ecoaram em todos os tempos.
Pensamos muito pouco na «paixão» de Maria, nas espadas que traspassaram o seu Coração, no terrível abandono que sentiu no Gólgota, quando Jesus a confiou a outros…
Talvez tudo isso dependa do fato de que Maria soube bem demais cobrir de doçura, e de luz, e de silêncio a sua angustiante e viva agonia.
No entanto: não há dor igual à sua…
Se, um dia, os sofrimentos chegarem a certos ápices em que tudo em nós dá impressão de rebelar-se, porque o fruto da nossa “paixão” parece ter sido tirado das nossas mãos e, mais ainda, do nosso coração, lembremo-nos de Maria.
Será com esse gelo que ficaremos um pouco parecidos com ela; que se delineará melhor em nossas almas a figura de Maria, a toda bela, a Mãe de todos, porque de todos, mormente de seu divino Filho, desapegada por vontade divina.
A Desolada é a Santa por excelência.
Quisera revivê-la na sua mortificação.
Quisera saber ficar sozinha com Deus como Maria ficou, no sentido de que, mesmo entre irmãos, possa sentir-me impelida a fazer de toda a vida um diálogo íntimo entre a alma e Deus.
Devo mortificar palavras, pensamentos e atos que estejam fora do momento de Deus, para engastá-los no instante a eles reservado.
A Desolada é certeza de santidade, fonte perene de união com Deus, vaso transbordante de alegria».
 
Chiara Lubich,

18 maio 2021

Entrevista com Chiara - José Maria Poirier

Rocca di Papa, 19 de fevereiro de 1998

Jornalista: […] A primeira pergunta toca o tema do diálogo inter-religioso. Diálogo que o Movimento propõe e abriu com pessoas de várias convicções religiosas e tradições. 

Chiara:
O fato é este: Jesus, vindo à Terra, redimiu toda a humanidade, todos os homens. Ele constituiu a Igreja. Porém, a sua redenção abraçou todos. Por isso, todos, se tiverem reta intenção, […]  teriam a possibilidade de se salvar. Estamos muito conscientes disso. Portanto, nos aproximamos dessas  pessoas de outras religiões, sabendo que amanhã poderão ir para o Paraíso e nós, talvez, não.
Portanto, a atitude que temos – e este é o ponto importante para nós -, é aquela de amá-los como Cristo os amou e amá-los sem discriminação alguma, dando-lhes tudo aquilo que o amor nos leva a doar. Justamente porque os amamos, fizemos uma grandíssima descoberta. Quase todas as grandes religiões: o budismo, o hinduísmo, o hebraísmo, o islamismo possuem uma fórmula que é tipicamente cristã, porque é uma frase do Evangelho: “Não faça aos outros aquilo que você não gostaria que fosse feito a você; faça aos outros o que gostaria que fosse feito a você”. Todos possuem esta frase que é chamada a “regra de ouro”, porque é de todas as escrituras e de todas essas religiões.

Então, o que fazemos? Nós vivemos o nosso amor sobrenatural, que é uma participação do mesmo amor de Deus, da vida trinitária… Eles nos encontram com o amor que possuem, que não é simplesmente, não sei, a não-violência, mas é uma atitude positiva de amor. […] Nestes encontros nós criamos uma fraternidade que não é a unidade em Cristo, como aquela que pode… existir na Igreja ou entre os cristãos, mas é a fraternidade universal instaurada pelo amor. […]

Jornalista: Na sua opinião, por que o carisma da unidade teve toda essa incidência no mundo, em muitos países e em pessoas de diversas condições sociais e culturais?

Chiara: Porque é Deus o Ideal e Ele tem a ver com todos. É pai de todos, de todas as culturas, de todas as religiões, de todas as nações, de todas as vocações, de ambos os sexos.

Jornalista: O que significou para a senhora, na sua vida pessoal, o carisma da unidade?

Chiara: Tenho que dizer assim, pois nasceu há 53 anos. É um caminho. Procurei assimilá-lo cada vez mais, mais, mais, assim como era capaz. Errando, recomeçando, recomeçando, errando, indo em frente, fazendo progressos. Significou o meu caminho para Deus.

Jornalista: Gostaria de perguntar, Chiara, sobre dois temas centrais da espiritualidade do Movimento dos Focolares: Jesus no meio, a presença de Jesus no meio da comunidade, e o mistério de Jesus abandonado, Cristo na cruz. 

Chiara: Jesus no meio é a realização de uma frase do Evangelho onde Jesus diz que, quando duas ou mais pessoas se unem no seu nome, que significa no seu amor. Ele está ali presente. Mas foi dito também de outro modo: “Onde existe a caridade e o amor ali está Deus”, diz um canto do… e esta é a realização. Portanto, é algo grande, isto é, ter entre nós, talvez na família, no escritório, até no parlamento a presença de Cristo entre nós. Ele nos ajuda, Ele nos guia, Ele nos ilumina. 
Jesus abandonado é a expressão da maior dor que Jesus sofreu na Terra, quando no vértice da cruz gritou: “Meu Deus, meu Deus, por que me abandonaste?” Pode-se explicar pelo fato de que Ele se cobriu de todos os pecados do mundo, os quais tinham separado os homens de Deus e entre eles. Ele assumiu toda a separação e por isso gritou: “Meu Deus, por que me abandonaste?” como se Ele fosse a voz da humanidade que está separada de Deus. Encontramos nele a solução para recompor a unidade nas diversas partes do mundo, em todas as situações.

Jornalista: O que a senhora entende dizer por uma espiritualidade coletiva?

Chiara: Entendo dizer que não se vai para Deus sozinho, mas junto com outros. A nossa espiritualidade se baseia no amor e de modo especial também no amor recíproco, que é o mandamento típico de Jesus. Ele disse que é seu, que é novo. Naturalmente, no amor recíproco somos pelo menos dois, porque é preciso… Existe a reciprocidade. Portanto, não é um caminho que percorremos sozinhos, mas um caminho percorrido juntos.

Jornalista: Como almejar, Chiara, a unidade, respeitando as várias culturas?

Chiara: É preciso saber respeitar, mas é o amor que ilumina, que faz compreender o outro, aliás, que faz com que cada um se torne rico do patrimônio do outro. Portanto, é um enriquecimento. Nós dizemos que é preciso se tornar homens mundo, no sentido de contatar todas as pessoas, procurando enriquecer-nos da riqueza do outro e, naturalmente, comunicando também a riqueza que temos dentro de nós, mas não existem obstáculos para quem ama. […]

Jornalista: Em que base se apoia o diálogo entre pessoas de diferentes culturas e diferentes crenças religiosas?

Chiara: Nós temos um diálogo com pessoas de diferentes religiões, inclusive sem fé, porque vemos que, embora não acreditem em Deus, no sobrenatural, acreditam em certos valores. Visto que Jesus é o homem Deus, existe uma parte humana e uma parte divina na única pessoa do Cristo, também todos os valores puramente humanos têm um significado no cristianismo e nós sentimos que, se podemos lhes oferecer o nosso espírito, a nossa espiritualidade, que se concentra ainda numa palavra que é amor, eles podem nos oferecer realmente a experiência de terem vivido, de terem apreciado, de terem trabalhado por muitos valores: a solidariedade, a paz, a unidade, a liberdade, certas vezes, assim.

Jornalista:  Gostaria de perguntar à senhora, que é uma personalidade da vida espiritual: qual é o sentido da dor na vida do homem?

Chiara: A dor tem um grande sentido, um grande sentido. A cruz é o equilíbrio da humanidade. Se não tivermos a cruz, esvoaçamos como as borboletas que não sabem onde pousar; ao passo que a dor dá sentido à nossa vida. Não só, mas é o caminho direto para ter a união com Deus. Quem sofre, ao se recolher, encontra, em geral, a união com Deus e a união com Deus é a base para poder viver como cristão, para poder viver também como ser humano.

Jornalista: Como almejar, Chiara, a unidade, respeitando as várias culturas?

Chiara: É exatamente o que eu disse antes: é preciso respeitar os outros; é preciso amar os outros. Deixar que o outro seja aquilo que é. Para isso, nós devemos viver o não-ser para conseguirmos entrar neles. Alguém disse que é preciso entrar na pele do outro. Um escritor diz que é preciso entrar na pele do outro para compreender as coisas como ele as compreende. Então… assim existe a unidade, porque nós nos fazemos um com o outro e ele se faz um conosco, mesmo na diversidade… De certo modo, é como entre as Pessoas da Santíssima Trindade que são muito diferentes: o Padre não é o Filho, o Filho não é o Pai, um e outro não são o Espírito Santo, mesmo assim são um, porque todas as Pessoas são amor. […]

Jornalista: A senhora é cristã e católica. Alguma vez e conduzida por Deus, encontrou no diálogo profundo com outras religiões certas riquezas que não conhecia ou todas evocavam algo que já havia na senhora?

Chiara: Não, não, encontrei coisas que não conhecia, mas simplesmente porque às vezes nós pensamos, […] também nos séculos passados, que já descobrimos [todo] o cristianismo. Na verdade, nós o descobrimos só até certo ponto; nos próximos séculos ele será descoberto num nível ainda mais profundo, ainda mais profundo, ainda mais profundo. Certas pessoas, em certas religiões chegaram… simplesmente com a religião delas, mas também com a ajuda do Espírito Santo, chegaram a profundidades, em certos particulares, que nós ainda não atingimos. Um dia descobriremos que são as ‘sementes do Verbo’, isto é, também ali existem princípios da verdade, presenças do Verbo de Deus que nós ainda não descobrimos. Não sei, para dar um exemplo. Estive na Tailândia. Encontrei lá uma tal sabedoria, uma tal ascética, um tal desapego de si mesmos, que é difícil encontrar aqui. Assim.

Jornalista: Obrigado, Chiara.

17 maio 2021

Um instrumento indispensável para a fraternidade

No mundo moderno a obediência não é avaliada na sua justa medida. O sopro de liberdade, de fraternidade e de igualdade que dimanou da revolução francesa entrou nos nossos jornais, nos nossos pátios, nas nossas casas e, também, nas nossas paróquias e nos nossos conventos. (…) Não é raro, portanto, encon­trar no nosso inconsciente uma oculta desconfiança no que diz respeito àquela preciosa virtude, como se ela estivesse em contraposição com a descoberta evangélica de que todos somos irmãos em Cristo.
A obediência não implica uma abdicação da própria personalidade, uma humilhação desumana. Ela, ao con­trário, ajuda-nos a sermos verdadeiramente nós próprios, a desenvolver o nosso eu, porque nos insere num contexto social que é indispensável, humana e divina­mente, à verdadeira manifestação das nossas capaci­dades.
Quando a vontade daquele que é superior a mim, legitimamente investido no governo civil ou eclesiástico, me indica aquilo que devo querer, ou aquilo que devo abandonar, ainda que isto choque com os meus projetos, com o meu modo de pensar, eleva-me sempre a um plano mais vasto e geral, ao plano do bem comum.
Aquela limitação que experimento, aquele choque pelo contraste que se gera, é a contribuição neces­sária ao meu desenvolvimento. Naquele momento a minha humanidade cresce, torna-se mais plena. E quanto mais me encontro unido aos outros, mais redescubro a minha fraternidade com os outros. Ela, de fato, é fruto da comunhão. A obediência, longe de estar em oposição à frater­nidade humana, torna-se um meio indispensável para a sua realização.( …)
Muitas vezes, quando se fala desta virtude, são apresentados apenas os aspectos ascéticos: como pro­gride a alma que renuncia à própria vontade, quanto se livra das paixões, etc. É certamente verdadeiro, mas ela nos dá algo melhor: faz-nos participar misticamente da humanidade de Cristo; permite-nos experimentar no nosso coração os mesmos sentimentos de Jesus (Fil. 2, 5).
Maria Santíssima é o modelo por excelência desta obediência interior: quando responde ao anjo: “Eis a serva do Senhor”; quando, para obedecer ao decreto do imperador romano, se dirige a Belém; quando “apressadamente” segue a inspiração e vai assistir Isabel; quando nas bodas de Caná pede a Jesus o milagre; quando no Calvário dá o Filho de Deus ficando com João; quando no meio dos apóstolos reza na espera amorosa do Espí­rito Santo. A sua vida é um contínuo obedecer somente a Deus, justamente obedecendo aos homens e às circuns­tâncias.
Revivendo Maria em nós, participaremos da sua mesma intimidade, da sua mesma docilidade. Como o focolarino André Ferrari que, agonizante, com um sorriso nos lábios, dizia, a quem o preparava para aceitar a vontade de Deus, sorridente com uma serenidade que mani­festava a sua íntima união com Ele: “Aprendemos a reconhecê-la sempre, até mesmo no sinal vermelho de um semáforo.”

De: Pasquale Foresi – Palavras de Vida – Cidade Nova, Portugal 1963 – págs. 80-83

16 maio 2021

Trabalho a dois

Grande sabedoria é passar o tempo de que dispomos, vivendo com perfeição a vontade de Deus, no momento presente.
Mas, às vezes, somos assaltados por pensamentos tão obsessivos, relacionados ao passado, ao futuro, ou ao presente, mas ligados a lugares, circunstâncias ou pessoas, a quem não nos podemos dedicar diretamente, que custa um sacrifício enorme manejar o leme da barca de nossa vida, mantendo a rota no que Deus quer de nós, naquele momento presente.

Então, para viver perfeitamente bem, é necessária uma vontade, uma decisão, mas sobretudo uma confiança em Deus que pode alcançar o heroísmo.

“Não posso fazer nada naquele caso, nada por aquele ente querido, que corre risco ou está doente, nada naquela situação intrincada...
Pois bem, farei o que Deus quer de mim neste momento: estudar direito, varrer direito, rezar direito, cuidar direito dos meus filhos...
E Deus se ocupará de desemaranhar aquela meada, de confortar quem sofre e de resolver aquele imprevisto”.
É um trabalho feito a dois em perfeita comunhão, que exige de nós uma grande fé no amor de Deus por seus filhos e que, pelo nosso modo de agir, dá ao próprio Deus a possibilidade de confiar em nós.

Essa confiança recíproca opera milagres.
O que vai acontecer é que, aonde nós não conseguimos chegar, Outro realmente conseguiu, e fez muitíssimo melhor do que nós.
O ato de confiança heróico será premiado; nossa vida, limitada a um campo só, ganhará nova dimensão; sentir-nos-emos em contado com o infinito, pelo qual ansiamos, e a fé, revigorando-se, fortalecerá em nós a caridade, o amor.
Não lembraremos mais o que a solidão significa. Saltará mais evidente, mesmo porque a experimentamos, a realidade de que somos de fato filhos de um Deus Pai que tudo pode.

Chiara Lubich

15 maio 2021

Não mornos, mas ardorosos

O nosso amor precisa ser constantemente reavivado por atos de amor cada vez mais perfeitos e sinceros. Chiara Lubich compara o amor ao próximo a um fogo alimentado pela lenha, para demonstrar a Deus e ao próximo o nosso empenho.

Focalizar novamente […] com maior convicção o nosso ideal, que pode ser resumido no amor recíproco, reforçar a nossa unidade, propondo-nos ampliá-la o máximo possível.

[…] De fato, o fogo – e aqui se trata de fogo – não se mantém se não for continuamente alimentado com lenha, palha, etc. Também o nosso amor tem necessidade de ser constantemente reavivado por atos de amor cada vez mais perfeitos e sinceros.

E disso não tem necessidade apenas aqueles que estão no início da vida espiritual ou um pouco mais adiantados. Mesmo quem tentou praticar por muito tempo a caridade pode cair numa certa rotina da caridade, que deixa assim de ter o esplendor e o calor da chama, mas lentamente vai diminuindo e se escondendo por completo sob as cinzas. É quando, por exemplo, na nossa vida cotidiana, deixa de ser espontâneo declarar entre os irmãos a própria unidade. É quando constatamos que a nossa caridade não surte efeito, a sua irradiação diminui cada vez mais, somos pouco úteis para o Reino, os frutos diminuem; tornamo-nos mornos.

Por isso é necessário nos lembrarmos de reavivar continuamente o fogo, de estarmos sempre prontos a amar.

Sim, porque Deus detesta os mornos. Diz a Escritura: “Não és frio nem quente. Oxalá fosses frio ou quente! Assim, porque és morno, nem frio nem quente, estou para te vomitar de minha boca”*.

Isso é terrível. Mostra a urgência de voltarmos a ser sempre quentes, de possuirmos uma caridade de fato fervente.

[…] Então, vamos em frente! Examinemo-nos com frequência: colocamos lenha no fogo? O nosso amor é fraco ou ardente? Aproveitamos todas as ocasiões para demonstrar a Deus e ao próximo o nosso fervor?

Se assim for, também graças ao nosso esforço, Deus levará para a frente o seu e nosso projeto. […] Lembremo-nos somente destas palavras: não mornos, mas ardorosos.

Chiara Lubich

(em uma conexão telefônica, Rocca di Papa, 28 de fevereiro de 1991)
Tirado de: Chiara Lubich, Conversazioni in collegamento telefonico, Città Nuova Ed., 2019, pag. 422.
* Ap 3, 15-16.

14 maio 2021

Chiara Lubich aos jovens: almejem grandes coisas!

Alemanha 1998

«Caríssimos jovens, Deus chama para vocações variadas e muitos com missões particulares. Por exemplo, ele chama os jovens para a sublime vocação ao sacerdócio, para serem outros Cristo. Ele chama homens e mulheres para fazerem parte daquele canteiro multicor do jardim da Igreja, que são as Famílias Religiosas, e para perfumarem constantemente a Esposa de Cristo com as mais esplêndidas virtudes. Ele chama homens e mulheres nos modernos Movimentos eclesiais para uma doação completa a Deus, individual e comunitariamente, ou para compor famílias modelo, como muitas pequenas Igrejas.

Lembrem-se: ele chama a qualquer idade. Ele chama também jovens, até crianças. Ele chama em todos os pontos da terra.

Mas como podemos conhecer a nossa vocação?

Por experiência eu lhes digo que é necessária uma particular disposição geral. Dado que o chamado de Deus é um ato de amor seu, se ele encontrar o amor nas almas, será mais livre para chamar. Então, o que é preciso fazer para ouvir a voz de Deus? É preciso amar, mas com um amor verdadeiro. Fazendo assim, facilitamos esta missão de Deus. E se vocês já conhecem a própria vocação, o amor é a melhor maneira de realizá-la. Mas, é necessário o amor verdadeiro. É tão importante viver o amor verdadeiro que, vivendo-o, desencadeamos no mundo uma revolução, a revolução cristã.

O amor verdadeiro tem quatro qualidades: ama a todos, porque Jesus morreu por todos; Maria é mãe de todos. Portanto, um amor verdadeiro não considera se os homens são simpáticos ou antipáticos, jovens ou velhos, brancos ou negros, alemães ou italianos, de uma religião ou de outra, se é amigo ou inimigo. O amor verdadeiro ama a todos. Experimentem vivê-lo. Nós estamos acostumados a amar os amigos, os pais, os parentes. E isso é muito bom! Mas temos no coração um amor que sabe amar a todos? Experimentem, experimentem. É uma revolução. As pessoas não compreendem e depois de algum tempo dizem: «Mas por que você faz assim? Por que me ama? Por que me deu aquela caneta? Por que me ajudou a fazer o dever?»

«Por quê? Porque quero amar a todos», e assim começa o diálogo entre nós, católicos, e com pessoas de outras Igrejas ou de outras religiões. Esse diálogo começa porque o nosso amor suscitou um interesse nas pessoas. Portanto, lembrem-se de que a primeira qualidade do amor verdadeiro é que ama a todos.

Segundo ponto: ser os primeiros a amar. Quando Jesus se encarnou, éramos todos pecadores. Ele nos amou primeiro. Temos que nos aproximar de todos sem esperar ser amados. Amar porque somos amados, não! É preciso ser os primeiros a amar. Foi este amor que o Espírito Santo infundiu no nosso coração. É o mesmo amor presente na Santíssima Trindade, do qual nós participamos. Porém, ele deve ser colocado em prática.

Depois, é preciso ver Jesus em todos. Ele disse que no dia do Juízo Final o nosso exame será este: «A mim o fizeste»/ tudo aquilo que fazemos de bom e – infelizmente – de mau.

Três coisas: amar a todos, ser os primeiros a amar, ver Jesus no irmão. Esse amor não deve ser platônico, sentimental. É um amor concreto e para ser concreto é preciso, como disse São Paulo, «Fazer-se tudo para todos», fazer-se um com quem sofre, fazer-se um com quem está contente e partilhar suas alegrias, dores, necessidades. Partilhar.

Então: amar a todos, ser os primeiros a amar, ver Jesus e amar concretamente.  Isso é o que nós podemos fazer, inserindo no nosso coração o amor verdadeiro. O chamado é a parte de Deus, não é a nossa. O chamado é a parte de Deus.

Caríssimos jovens, Deus não cessa de chamar principalmente se amamos. Cabe a nós responder e compor com a nossa vida aquele divino, maravilhoso desígnio que Deus tem para cada um de nós para o bem de todos.

Sabem o que significa colocar Deus acima de tudo como pessoa consagrada a Ele ou que formará uma bela família? Colocar Deus acima de tudo na vida significa encontrar já aqui a felicidade. É isso que desejo a todos vocês!

Almejem grandes coisas, jovens! Temos uma única vida, que não se repete. Convém usá-la bem».

13 maio 2021

Quem Maria é para o Movimento dos Focolares

Castel Gandolfo, 8 de dezembro de 1996

Tirado de um discurso de Chiara Lubich sobre a espiritualidade coletiva

Acreditar na extraordinária graça de poder imitar Maria:  comunicando-nos a experiência de luz que o Espírito Santo lhe possibilitou fazer, Chiara nos transmite essa certeza, propondo-nos assim uma maneira de honrar Maria

[…]

Repassando, em breve síntese, a história do Movimento no que se refere a Maria, podemos compreender melhor quem Maria é para nós e por que ela é um ponto fundamental da nossa espiritualidade.

Desde os primeiros tempos, num período em que o Espírito Santo parecia focalizar quase que exclusivamente Jesus e seu Evangelho, Maria se apresentou, embora timidamente, para logo nos revelar a sua relação com a unidade.

Eis alguns exemplos:

Em 1947, escrevi:

“Estou convicta de que é Maria que quer a Unidade. Ela: Mãe da unidade!…

“Ela conhece Satanás, as suas bajulações, os seus enganos, as suas armadilhas, e chama os seus filhos a se unirem, a se darem a mão no percurso do Caminho do Amor!”

E ainda naquele ano:

“Nossa Senhora quer que caminhemos unidas! Ela sabe que ‘onde dois ou mais’ se unem no santo nome do seu Filho, Ele está no meio deles! E onde está Jesus, todos os perigos se dispersam e os obstáculos se dissipam… Vence tudo porque é Amor!”3

Que hoje, portanto, seja o dia… da nossa unidade. É Maria, que nos une, nos funde sempre mais na unidade, até consumarmo-nos em um”.

Em 1948:

“É Ela que desce para assumir tudo, a fim de atuar o desejo de Jesus: ‘que todos sejam um’.

Portanto, nunca se abata. Procure em Maria Santíssima a diretora espiritual da unidade”.

Mas ela se manifestou em todo o seu esplendor, no palco de nossa alma, mais tarde, alta na proporção de quanto se abaixara, grande na proporção de quanto se anulara.

Foi em 1949, quando, reunidas nas montanhas, pareceu que Deus esboçasse em nossas mentes a Obra que devia nascer.

Entendemos que, por meio dela e de algum modo, Maria queria voltar à terra.

E foi tão forte essa sensação que, admirando em Maria uma beleza única, pensando nela e vendo-a sozinha, pois ao lado dela não havia filhos dignos de tal Mãe, a não ser Jesus, sentimos o impulso a lhe sugerir que constituísse na terra uma família de filhos e filhas, todos outra Maria.

Antes, havíamos pedido a Jesus Eucaristia que fosse Ele a nos confiar, a nos “consagrar”, como Ele sabe fazer, a Maria.

Havíamos compreendido que esse ato não fora apenas uma expressão de devoção, sem um conteúdo verdadeiro, mas que aquela “consagração” havia surtido alguma coisa.

Tivemos a impressão de que Maria nos revestisse com sua qualidade de imaculada.

Parecia realizar-se para o nosso pequeno grupo, o que diz Montfort quando fala das maravilhas, sobretudo as interiores, que Maria realiza secretamente nas almas.

Ele escreve: “[…] O dom  principal que as almas adquirem é a atuação aqui na terra da vida de Maria na alma, de modo que não é mais a alma que vive, mas Maria nela”.

Na prática, pareceu que aquilo que um dia Paulo VI pediu: “….ensina-nos o que já sabemos; […] a ser imaculados como tu és”5, se tivesse tornado uma realidade.

Sentimo-nos filhos queridos de Maria e sentimos pela primeira vez – de uma maneira que jamais esqueceremos –  Maria nossa mãe.

Anos mais tarde, um episódio, também conhecido, confirmou tudo isso. E o descrevi assim:

“Entrei na igreja um dia e, com o coração cheio de confidência, perguntei-lhe: ‘Por que quiseste ficar na terra, em todos os pontos da Terra, na dulcíssima Eucaristia, e não encontraste um modo, Tu que és Deus, de trazer e deixar  também Maria, a Mãe de todos nós que peregrinamos?”

“No silêncio, parecia responder: ‘Não a deixei porque quero revê-la em ti’”.

Sermos outra Maria, uma pequena Maria, que encontra na Mãe o seu dever-ser e em si encontra o poder-ser Maria.

Mas ser Mãe como Maria significa ter a possibilidade de imitá-la na sua maternidade espiritual (que se torna paternidade espiritual para os homens); maternidade que plasma as pessoas confiadas a nós, não só para torná-las belas e santas, mas para uni-las entre si, além de uni-las a Deus

Maria é Mãe desse modo. É Mãe da unidade.

11 maio 2021

Como se fosse a sua mãe

“Quem dentre vós que não tem pecado seja o primeiro a lhe atirar uma pedra” (Jo 8,7). Jesus disse estas palavras àqueles que desejavam apedrejar a mulher adúltera.

O ponto central dos mandamentos de Jesus é, verdadeiramente, sempre o amor. É por este motivo que Ele não quer que nós, cristãos, condenemos. “Não julgueis”, foi o que de fato nos recomendou, e proclamou: “Bem-aventurados os misericordiosos”. Jesus deseja a misericórdia.

Todavia, desta sua Palavra parece possível deduzir-se que alguém possa atirar a pedra: aquele que não tem pecado.

Certamente que não se trata de nenhum de nós, pois somos todos pecadores. Mas nós sabemos que há uma criatura sem pecado. É a Mãe de Deus.

Portanto, poderia Maria atirar uma pedra em alguém que tenha errado? Será que Ela fez isso alguma vez na sua vida? Nós conhecemos a nossa Mãe. Sabemos o que afirma a Escritura, o que nos foi comunicado pela Tradição, qual é o pensamento do Povo de Deus a seu respeito. Maria é amor para com todos os homens, é misericórdia, é advogada dos mais miseráveis.

É a Ela que inúmeros cristãos recorrem, e sempre recorreram quando tiveram a impressão de que a justiça de Deus recaía sobre eles.

Maria não atira pedras. Pelo contrário, ninguém, depois de Jesus, difunde o amor como Ela.

Difunde o amor. Por quê?

Porque é Mãe. Uma mãe só sabe amar.

E o amor de mãe é típico: ama os próprios filhos como ama a si mesma, porque nos seus filhos existe verdadeiramente algo dela mesma. (…)

(…) Também nós podemos encontrar alguma coisa de nós mesmos nos outros. De fato, devemos ver Jesus tanto em nós mesmos como nos nossos irmãos.

Então, como nos comportaremos?

Da seguinte maneira: com cada próximo em casa, no trabalho, pela rua, com aqueles de quem estivermos falando, com quem estivermos conversando por telefone, com aqueles em cujo benefício desenvolvemos o nosso trabalho, diante de cada um devemos simplesmente pensar: devo comportar-me como se eu fosse a sua mãe. E agir nesse sentido.

Uma mãe serve, serve sempre. Uma mãe desculpa, desculpa sempre. Uma mãe espera, espera sempre.

“Como se fosse a sua mãe”, é este o pensamento que deve prevalecer nos próximos dias.

Este deverá ser o nosso empenho para nos certificarmos de que não atiraremos pedras e de que poderemos ser para todos a presença de Maria na terra.

Chiara Lubich – Rocca di Papa, 3.3.1983


10 maio 2021

Tornar-se Jesus no nosso século

Se quisermos, nós também tínhamos uma “interpretação”, mas no sentido de que um ator, por exemplo, interpreta um trecho escrito por outro sob a direção de um terceiro.

Cabia a nós o dever de viver o Evangelho hoje, escrito por são Lucas, são Mateus etc., sob a orientação da Santa Madre Igreja, e, aos poucos, tornarmo-nos outros Jesus, no nosso século, no lugar onde Deus nos havia colocado.

E isso, não só pela graça, que existe em quem não comete pecado mortal, mas por uma reevangelização progressiva de nossa vida.

Um homem continua analfabeto até os noventa anos por não conhecer as vinte e seis letras do alfabeto e algumas regras gramaticais.

Um cristão não sabe expressar Jesus se não escuta as Palavras de Deus e as coloca em prática. Era necessário aprender a vivê-las uma a uma.

09 maio 2021

Uma nova visão dos irmãos

“Cada vez que o fizestes a um desses meus irmãos mais pequeninos, a mim o fizestes”6.

Portanto, Jesus queria ser amado na pele dos nossos irmãos e também nos mais pequeninos?

As diversas e, no entanto, sempre iguais considerações humanas sobre o “antipático” ou sobre o “simpático”, sobre o “bonito” ou sobre o “feio”, sobre o “irritante” ou sobre o “afável”, sobre o “idoso” ou sobre o “jovem”, dissolviam-se num único conceito: é Jesus que deve ser amado no irmão; a Ele devemos olhar e a Ele fazer aquilo que gostaríamos que lhe fosse realmente feito.

“Amarás a teu próximo como a ti mesmo” (cf. Mt 22,39).

E para onde iam o egoísmo, a consideração do próprio eu, os apegos às próprias vaidades, se o irmão devia ser amado como a si mesmo? Dissipavam-se na caridade de Deus.

08 maio 2021

O fascínio das palavras do Evangelho

No pequeno círculo entre as pedras dos abrigos e a umidade da rocha, à luz de uma vela, líamos com amor o livro divino, e aquelas palavras saltavam aos olhos da nossa alma com uma luminosidade insólita. Jamais, até então, ele nos parecera tão único e fascinante e jamais, como naquele tempo, nos havia falado de modo tão novo.

Escrito de maneira divinamente escultórica, oferecia ao nosso espírito “Palavras de Vida” reais, que se poderiam traduzir em vida; diante delas, até as melhores palavras lidas nos livros de devoção pareciam aguadas, enquanto as que enchiam os nossos livros de cultura e de filosofia dissipavam-se no vazio. A Palavra de Deus possuía um respiro amplo, com possibilidade de aplicação universal.

Eu, tu, os brancos, os negros, o homem do século I, o do século XXI, a mãe e o deputado, o agricultor e o prisioneiro, a criança e o avô: todo homem que veio ao mundo poderia viver a Palavra de Deus, toda Palavra de Deus. “Se a vossa justiça não for maior do que a dos escribas e dos fariseus não entrareis no reino dos céus” (Mt 5,20) “Perdoa setenta vezes sete…” (Mt 18,22) “Dá a quem te pede…” (Mt 5,42).

07 maio 2021

Testemunhas de uma nova Evangelização


“Graças a Deus vocês existem!” São as palavras que Chiara Lubich dirigiu de coração aberto aos jovens por ocasião da Jornada Mundial da Juventude de 2000. Uma mensagem, da qual propomos um trecho, que evidencia a coragem, a liberdade e a esperança que caracterizam os jovens e a contribuição específica desta geração para ajudar a realizar “um mundo novo, melhor, mais feliz, mais digno do ser humano, mais unido”.

[…] Os jovens (sei por experiência) têm algo especial, que representa no mundo uma grande esperança. Embora vivam, como todos, em meio aos males do nosso tempo, vocês, jovens, em geral têm em seus corações e em suas mentes antenas que sabem captar ondas particulares, que outros não são capazes de perceber. Vocês estão numa idade que os deixa livres para fomentar aspirações nobres como a paz, a justiça, a liberdade, a unidade. Isso lhes permite sonhar com realizações que a outros poderiam parecer utópicas. Também lhes permite prever no terceiro milênio a aurora de um mundo novo, melhor, mais feliz, mais digno do ser humano, mais unido. Graças a Deus vocês existem!

Porém, o que gostaria de dizer a vocês hoje?

Desejo evocar aquilo que Jesus disse e que o Papa recordou aos jovens na Jornada Mundial, em 1995: «Assim como o Pai me enviou, eu também vos envio». É o convite dirigido a vocês para levarem a luz da verdade à sociedade de hoje. É o desafio ao que o Papa chamou de “nova evangelização”.

“Nova evangelização”!!

Mas por que “nova”? E o que significa: “nova”? A palavra “nova” pode ter muitos significados. Eu lhes anuncio um.

Todos sabemos que hoje as palavras não são suficientes. Os jovens, de modo especial, não ouvem muito os mestres, mas quem dá testemunho; querem os fatos.

Portanto, a evangelização poderá ser “nova” se aqueles que a anunciam forem, em primeiro lugar, cristãos autênticos, que vivem seriamente o que o Evangelho ensina, de modo que as pessoas possam dizer deles, como dos primeiros cristãos: «Vejam como se amam e estão prontos a morrer uns pelos outros».

Será “nova” se eles amarem também cada pessoa sem fazer distinções. E será “nova” ainda se esses cristãos concretizarem o próprio amor, fazendo surgir obras que possam suprir as necessidades de alimentação, de vestuário, de casas, daqueles que não possuem. E será “nova” – agora estejam atentos – por fim, se falarem, anunciando o Evangelho, só depois de terem feito tudo isso.

E será “nova” ainda se esses cristãos concretizarem o próprio amor, fazendo surgir obras que possam suprir as necessidades de alimentação, de roupas, de casas, daqueles que não possuem.

Tais cristãos, eu posso garantir, propagam no mundo a beleza de Jesus e fazem com que Ele seja amado. Deste modo o Reino de Deus se expande acima de qualquer previsão e a Igreja se consolida e cresce.

Cresce de tal modo que eles conseguem enxergar longe, tal como Jesus quando chamou todos à fraternidade universal, rezando ao Pai assim: «Que todos sejam um».

É um sonho que pode parecer loucura, mas é possível, porque é o sonho de um Deus. E eles acreditam nisso. Conheço milhares, aliás, milhões desses jovens, em todos os países, que estão se encaminhando para essa meta.

Foi a eles que João Paulo II disse: «Os homens que sabem olhar para o futuro são aqueles que fazem a história; e todos os outros serão envolvidos…».

Caríssimos jovens, certamente o Papa dirige hoje essas palavras a todos vocês. Não o decepcionem, não nos decepcionem.

É o que desejo com todo o coração.

Chiara Lubich


Chiara Lubich, Palestra proferida na  XVª Jornada Mundial d Juventude, Tor Vergata (Roma Itália), 19 de agosto de  2000.

Fonte: Centro Chiara Lubich (https://centrochiaralubich.org/it/xv-giornata-mondiale-della-gioventu)

06 maio 2021

A unidade na família

A unidade na família. É possível? Sobre Jesus abandonado e a bússola*
Publicado em 30/08/2017

A unidade na família. É possível? Esse foi o tema de uma série de artigos, chegamos ao último. Para melhor compreensão sugiro que leiam os anteriores (A unidade na família. É possível? Sobre unidade*  e A unidade na família. É possível? Sobre família*). 

No caminho refletimos sobre unidade e família, mas agora nos deparamos com a pior de todas as compreensões que é entendermos o motivo e o meio para vivermos a unidade na família dentro da perspectiva cristã. 2017 o Movimento dos Focolares trás o tema do Jesus abandonado em toda a sua perspectiva de formação. Nossa recém Mariápolis em Santa Isabel nos clareou sobre o Jesus abandonado. A unidade só é possível para quem entende o Jesus abandonado. Primeiro no morrer para a própria vontade, de vivermos para um projeto e não por nós e nem pelos filhos. O projeto é Cristo! e Este, o qual seguimos tem seu marco referencial, seu rito de passagem na cruz, no abandono. Só existe ressurreição na perspectiva da Cruz. Querer viver o Cristianismo sem a dor do abandono é viver uma religião das nuvens, da prosperidade e da glória. Mas a unidade é uma opção de vida que exige de cada um no seio familiar uma perda. A cada dia é preciso morrer na minha vontade. Lógico que precisamos respeitar as diferentes etapas de cada indivíduo e também as maturidades e a faixa etária. Não se pode esperar de uma criança que só dá se primeiro receber a mesma reposta e entendimento do adulto que só recebe se primeiro dá. Cabe aos pais a arte de vivenciar no cotidiano o abandono de nossas vontades para fazer acontecer a unidade. Neste processo poderemos ter mais chance de que o ambiente familiar exista sempre na dinâmica da unidade. Sabemos que nessa sociedade liquefeita, conforme nos aponta Bauman, em que o indivíduo vale mais do que o coletivo, os relacionamentos são descartáveis e os valores são substituídos pelo consumo. Onde ter, vale muito e o ser é apenas um discurso publicitário para acentuar o vigor individual do cidadão capaz, de sucesso e feliz. Neste ambiente fica muito estranho e às vezes soa muito louco a ideia de um Jesus abandonado, aquele que se faz pobre, aquele que é morto em uma cruz. Eu mesmo vivi isto por ocasião da Mariápolis 2017 quando tentei convencer uma doutora da universidade, solteira, a ir viver uns dias de unidade muito interessante. Ela me pediu o link para se inscrever mas no momento que viu o tema Jesus abandonado retornou para mim dizendo que preferia ir para o forró das Dunas de Itaúnas, e disse: “ Nossa, você me disse que seria um lugar de alegria, de trocas mútuas e achei interessante. Mas me parece que vocês estão indo lá para sofrer.” 

Bauman faz uma percepção da evolução dos tempos lembrando que no passado os Judeus trouxeram a imagem dos mártires (morte na cruz), depois o ocidente a noção dos ídolos (vencedores nas guerras) e agora temos as celebridades (Neymar na França). E para as famílias liquefeitas (de liquidificador), Bauman lembra que no passado, dava-se a vida pela religião, depois dava-se a vida pelas nações e agora os pais dão a vida pelos filhos. Tudo de bom para eles e morte aos pais e morte à família. 

Mas como podemos ter elementos de luz e força para nos superarmos e conseguirmos usar o Jesus abandonado como meio de promovermos a unidade na família? 
Chiara Lubich nos lembra: “Portanto, a primeira coisa, entender que sem morrer não há nada de divino, vocês nunca construirão nada, nem cidades novas, nada. Segundo, saber que aquilo que Deus nos manda, nos manda porque é necessário.” (22/06/81)

Enfim, Igino Giordani, um dos homens que Chiara Lubich nomeou co-fundador da obra Movimento dos Focolares, em seu lindo livro “Diálogo de fogo” nos lembra: “eu sozinho não me movo. Mas eu e tu iremos até o fim do mundo”. Aqui é a certeza que pela unidade vamos chegar aos nossos objetivos. A minha família com a sua família nos faz mais fortes, pois estamos engrenados nesta missão evangelizadora: “Até os confins da terra”, um confim sem fim. Para que não nos percamos no caminho, precisamos de uma bússola, um norte. Sabendo que o caminho se faz caminhando dia após dia, ano após ano.  A cada dia como os lírios no campo. A cada dia sem deixar de olhar para a bússola e percebermos como estamos no caminho, se de fato continuamos na direção correta, conforme a escolha que fazemos que é nosso Jesus abandonado . E para isso Chiara Lubich nos deixou uma palavra de referência: 

Atentos à bússola 
"Portanto, apontemos fixamente a bússola para Jesus abandonado e permaneçamos fieis a Ele. De modo que, pela manhã, ao despertarmos, apontamos nossa agulha para Jesus abandonado com nosso “eis-me aqui”, do qual lhes falei anteriormente. Depois durante o dia, de vez em quando, vamos dar uma olhada; observarmos se estamos sempre na rota certa para Jesus abandonado. Se não estivermos, corrijamos a rota com uma nova “eis-me aqui” e o sucesso da viagem não ficará comprometido." (Chiara – 05/01/1984)


*Texto apresentado em 20/08/2017 no encontro das Famílias Novas – Nova Venécia/ES

Autor:
Gerson Abarca Psicólogo Psicoterapeuta - CRP: 16-598 Psicólogo graduado pela Universidade Estadual Paulista (UNESP – Assis – 1990); Especialista em: Psicologia Clínica e Psicologia Educacional, ambas pelo CFP (Conselho Federal de Psicologia); Especialista em Desenvolvimento Humano e Gestão de Pessoas (MBA – Fundação Getúlio Vargas). Escritor e assessor da TV Canção Nova para temas da psicologia.

05 maio 2021

O Amor é um só

De uma carta a Lilliana, irmã de Chiara

Lilliana era noiva de Paolo Berlanda, casando-se mais tarde com ele. A unicidade do amor a que Chiara se refere é bem surpreendente, sobretudo por se tratar do amor ao próprio noivo.

30 de janeiro de 1944

Ouça, Lilliana, o grito do meu coração: “Não divida seu coração na terra, não divida o seu Amor!” O Amor é um só, Lillianazinha minha, um só: o Amor por Deus. Mas não me entenda mal: ouça. Há um Ideal na vida que supera todos. Resume-se em três palavras: Amar, fazer amar, reparar! É o meu. Deve ser o seu, se quiser vir comigo! Amar a quem? A Deus. Ele mora no coração de todas as criaturas. Mas, por ser essa a Vontade Dele, você deve vê-lo especialmente em um coração: no coração de Paolo! Lilliana minha: você deve amar Paolo mais do que o ama. […]

Para você, o amor a Deus se manifeste assim: amando Paolo o mais que puder; por ele, renegue o seu egoísmo, a sua vontade de ficar trancada em si mesma, as suas comodidades, todos os seus defeitos. Por ele, aumente a sua paciência, aperfeiçoe as suas capacidades de mãezinha, saiba calar quando alguém errar! […]

Oh! Lillianazinha! Guarde essas palavras, leia-as muitas vezes, até achar que as entendeu totalmente. Oh! Se você as entendesse! Imensamente feliz ficaria meu coração, que a segue com apreensão por temer que você sofra ao pensar que seu amor fique dividido! Não! Não! O Amor é um só! Para você é amar a Deus no Paolo seu. Torne-se digna dele, como se você tivesse de se tornar digna de Deus!

04 maio 2021

Um espirito sobrenatural

De uma carta de abril de 1948 às jovens que entraram para as comunidades dos focolares

A data e a circunstância desta carta foram deduzidas a partir de um texto de Igino Giordani, segundo o qual ela tinha sido escrita para promover um espírito plenamente evangélico na colaboração com outras forças católicas, durante as primeiras eleições livres do Parlamento, na Itália.

Minhas ordens são as seguintes: […]

Que reine francamente em tudo e entre todas: um espírito nitidamente sobrenatural que nos faça reconhecer Jesus em todos, respeitar a todos, não julgar ninguém, não criticar ninguém (é perda de tempo), tornarem-se as últimas para serem as primeiras no Reino dos Céus, servir Jesus em todos.

03 maio 2021

«Não existe pedaço de vida indigno de ser vivido»

«(…) Se colocarmos como base das leis ou iniciativas sociais uma mentalidade que não respeita a pessoa que sofre, o deficiente, o idoso, criamos pouco a pouco uma falsa sociedade, porque damos importância apenas a alguns valores, como a saúde física, a força, a extrema produtividade, o poder e desvirtuamos a finalidade pela qual existe todo o Estado, que é o bem do homem e da sociedade.

A saúde, como sabemos, é um dom precioso, que é necessário proteger. Por isso é preciso fazer de maneira que o nosso corpo e o dos nossos irmãos seja nutrido, repouse, não se exponha a doenças, a acidentes, a um esporte exagerado.

Também o corpo, com efeito, é importante para o cristão.

Mas, se a integridade do corpo estivesse comprometida, devemos recordar que há uma Vida que não é condicionada pelo nosso estado de saúde, mas pelo amor sobrenatural que arde no nosso coração.

E é esta Vida superior que dá valor à vida física, também em casos de doença. Na verdade, se considerarmos as doenças segundo uma perspectiva humana, não poderemos senão afirmar que são desgraças.

Mas numa perspectiva cristã vemos que são provações, como um treino para a grande prova que todos devemos passar, quando tivermos que enfrentar a passagem para a Outra vida.

Não afirmou recentemente o Papa que as doenças são exercícios espirituais que o próprio Deus faz conosco?

Os doentes têm uma riqueza a mais em relação às outras pessoas, de outro tipo!

A Igreja, no campo da ascese e da mística, fala das doenças não só como de coisas que competem à medicina, mas como purificações que Deus envia; portanto, como degraus para alcançar a união com Deus.

A fé nos diz, ainda, que o homem na doença participa dos sofrimentos de Cristo. Portanto, é outro Cristo crucificado que pode oferecer o seu sofrimento por aquilo que vale: a salvação eterna da humanidade.

Nós, no turbilhão do trabalho e da vida cotidiana, por vezes somos tentados a ver nas pessoas que sofrem puros casos marginais, que devemos ajudar para superar depressa a doença e voltar à atividade; e nos esquecemos que elas são, desde já, as que mais podem fazer e atuar.

Mas os doentes são capazes de desempenhar bem a sua função em favor da humanidade só se forem compreendidos e amados. É com o amor que poderão ser ajudados a dar um sentido ao próprio estado, a tomar consciência do que representam.

E o que se aplica aos doentes, vale para os deficientes motores ou mentais. Também quem tem deficiências psíquicas ou motoras precisa de amor.

Sente a exigência de ser reconhecido pelo valor que tem a sua vida: sagrada como qualquer outra vida, com toda a dignidade que daí deriva. Precisa ser considerada uma pessoa, que deve viver o mais possível uma convivência normal entre os outros seres humanos.

E o que dizer das pessoas idosas?

Toda vida pede amor; também os anciãos precisam de amor. Hoje em dia as pessoas idosas chegam a representar um problema, porque se nota um forte aumento dessa faixa etária, devido ao prolongamento do nível médio de vida.

Adverte-se assim a tendência da sociedade a marginalizar as pessoas idosas, a considerá-las, já que não são produtivas, um peso social. Fala-se de “velhos” como de outra categoria, quase como se já não fossem pessoas.

Nos próprios anciãos, ainda, ao lado do declínio físico, verifica-se geralmente um grave mal-estar psicológico: sentem-se inúteis.

Este período não é mais do que a terceira fase da existência. A vida que nasce, a vida que cresce, a vida que declina, são apenas três aspetos do mesmo mistério da existência, que parte de Deus-Amor.

Em certos países da Ásia e da África a pessoa idosa é valorizada, porque é considerada um mestre de vida, pois possui a sabedoria.

O ancião é, de fato, uma pessoa que coloca em evidência o que é essencial, o que é mais importante. Recordemos o que está escrito de São João evangelista: já com cerca de oitenta anos, quando visitava as comunidades cristãs e lhe perguntavam qual fora a mensagem de Jesus, respondia sempre: «Amai-vos uns aos outros», como se não tivesse mais nada a acrescentar. Todavia com esta frase focava realmente o pensamento de Cristo.

Privar-se das pessoas idosas é privar-se de um patrimônio.

É necessário valorizá-lo, amando-as. E valorizá-las também quando estão doentes ou gravemente doentes, quando se anulam as esperanças humanas e a exigência de assistência aumenta.

Para Deus não há vida, não há etapa da vida, indigna de ser vivida.

#ChiaraLubich 

02 maio 2021

A presença de Deus na Eucaristia

 Rocca di Papa, 9 de julho de 1974

Chiara tem diante de si os jovens (Gen1) do Movimento e deseja transmitir-lhes plenamente, todo o patrimônio de luz e de sabedoria que Deus lhe doou. O assunto deste trecho é a Eucaristia.

(…)

Deus Amor: que riqueza infinita de significado estas palavras contêm! Deus Amor: não um Deus distante, imóvel e inacessível aos homens! Deus Amor que vem ao encontro de cada homem de mil maneiras, basta que ele queira.

Olhemos um pouco ao nosso redor, gen, e observemos juntos a que loucuras de amor chegou o nosso Deus, por amor a nós.

Observemos se no mundo existe algum sinal deste seu amor, se existem vestígios da sua presença.


Busquemo-lo, não somente para constatar uma verdade, não por curiosidade, ainda que boa, mas para nos aproximarmos da sua presença, para nos expormos ao seu sol, para nos deixarmos iluminar pela sua sabedoria e inflamar pelo seu espírito.

Se assim fizermos, o possuiremos cada vez mais e Deus penetrará de tal modo na nossa vida que poderemos transbordá-lo sobre os outros.

Onde Ele aparece de modo mais evidente, tão perto de nós que quase podemos tocá-lo, é na Eucaristia.

Caríssimos gen, vocês não podem imaginar o que foi Jesus Eucaristia para a geração que os precedeu! Gostaria de lhes contar isto em todos os detalhes. O Ideal que estava nascendo era muito novo e tinha que passar por um estudo minucioso da Igreja. Viver na expectativa para nós era o nosso pão de cada dia. “Será que estamos no caminho certo?”. O coração respondia que sim, mas somente a Igreja podia nos confirmar.

A primeira geração tinha que plantar as raízes desta esplêndida árvore (que é todo o Movimento, incluindo a segunda geração) com aquelas provações que são necessárias para uma Obra de Deus.

Quem nos deu a coragem para seguir adiante? Quem nos amparou? Jesus Eucaristia.

Pensávamos: ainda não conseguimos ter uma audiência com o Papa, com o vigário de Cristo; no entanto todos os dias, a todas as horas podemos ter uma audiência com o próprio Cristo. E indo visitar Jesus dizíamos: “Pensando bem, o Papa é o seu vigário, diga-lhe que somos seus filhos, que a nossa Obra quer somente servir a Igreja”.

E Jesus atendeu o nosso pedido de maneira admirável. As aprovações que chegaram depois, escritas e orais, foram inúmeras.

Vocês compreendem, gen, que com Ele somos onipotentes?

Os gen devem ter a noção certa dos valores e assumir esta idéia: nós temos a possibilidade de falar todos os dias com Ele, o Onipotente, sobre as nossas dificuldades; podemos contar-lhe as nossas alegrias; podemos confiar-lhe o Movimento Gen, a Igreja, a unidade dos cristãos, a unidade dos povos…

E acho que de vez em quando também os gen podem pensar: “Como teria sido bom ter vivido no tempo de Jesus”! Pois bem, é preciso acreditar no amor de Deus também neste caso. E fazendo assim, eu diria que de certo modo é melhor viver neste tempo. De fato, a presença de Jesus naquela época era limitada à Palestina; agora ela se estendeu a todos os pontos da terra.

E há mais um motivo que nos faz preferir viver neste tempo. Deus se fez homem para nos salvar, mas tendo-se feito homem, quis até mesmo fazer-se alimento, para que, nutrindo-nos dele nos tornássemos outros Cristo. Ora, uma coisa é ver Jesus, outra coisa é ser de algum modo outro Jesus na terra.

Eucaristia, portanto, Eucaristia. Dizer gen e dizer Eucaristia é afirmar duas coisas que se atraem.


 Os Gen são os jovens do Movimento dos Focolare

01 maio 2021

O perdão como base da unidade

O início do ano é uma boa ocasião para recomeçar nos nossos relacionamentos interpessoais. No texto seguinte Chiara Lubich propõe uma estratégia radical: uma anistia completa no nosso coração para deixar que Jesus viva nele e criar células de unidade no mundo.

É isso que quero enfatizar hoje para todos vocês: a unidade. A unidade deve triunfar: a unidade com Deus, a unidade entre todos os homens.

De que forma? Amando a todos com aquele amor de misericórdia que era característico nos primeiros tempos do Movimento, quando decidimos, a cada manhã, e durante o dia inteiro, ver o próximo que encontrávamos na família, na escola, no trabalho, em qualquer lugar; de modo novo, novíssimo, sem recordar, de nenhuma maneira, das suas pequenas imperfeições, dos seus defeitos, cobrindo tudo, tudo com o amor. Amar exatamente como nos sugere a Palavra de Vida deste mês: perdoar setenta vezes sete (cf Mt 18, 22). Aproximarmo-nos de todos com esta anistia completa no nosso coração, com este perdão universal.

Em seguida, fazermo-nos um com eles em tudo, menos no pecado, menos no mal. Por quê? Para obter o resultado maravilhoso a que Paulo, o Apóstolo, aspirava. Ele dizia: “fiz-me servo de todos – fazer-se um com todos – para ganhar a Cristo o maior número possível” (Cf 1 Cor 9, 19). Se nós “nos fizermos um” com o próximo, facilitados por este perdão, poderemos comunicar o nosso Ideal a todos os outros. E quando já tivermos conseguido isso, poderemos estabelecer a presença de Jesus entre nós e eles, a presença de Jesus Ressuscitado, de Jesus, que prometeu estar sempre conosco na sua Igreja e que, de um certo modo, faz-se ver, ouvir, quando está entre nós.

Esta deve ser a nossa principal obra: viver de tal modo que Jesus viva entre nós; Ele que é o conquistador do mundo. Se nós formos um, realmente, muitos serão um e o mundo poderá um dia ver a unidade.

Chiara Lubich

30 abril 2021

Para que reines em meu íntimo

Muitas vezes, por hábito, aflora espontaneamente em nossos lábios: “Meu Deus e meu Tudo”, ou alguma outra oração como esta: “Amo-te com todo o coração”. Mas depois, durante o dia, analisando a nossa alma para ver se o que lhe importa é sobretudo Deus e a sua vontade, notamos que nem sempre é assim.

Frequentemente, gostamos de arrastar um trabalho, ao menos por um pouco, além do tempo devido, em vez de começar o novo; disso fica evidente que amamos aquele encargo, aqueles papéis, aquelas pessoas, aquelas notícias… infelizmente mais do que a Deus!

E aqui constatamos os fracassos de nossa vida consagrada a Deus, medidos exatamente pelo termômetro da “vontade de Deus”. Se ela flutua qual rainha de todas as outras coisas, que também posso e devo amar, então Deus é o rei do meu coração.

Se ela afunda para deixar reinar outra coisa qualquer, ou pessoa ou ideia, Deus permanece em meu coração como um rei destronado pelo meu eu.

Do Diário
9 de outubro de 1965

Hoje, causou-me grande impressão a frase: “Nem todo aquele que me diz: ‘Senhor, Senhor’” (Mt 7,21). Nem… E quantas vezes o nosso amor a Deus é feito de implorações, de palavras… de amor, não ressaltados com igual decisão e força pela vontade de fazer a sua vontade.

Essa sua vontade deve ser uma coisa muito importante, para que o Senhor a afirme nitidamente, sobre uma negação clara de outra atitude da alma.

É que, para Ele, a sua vontade para cada um de nós, em cada momento, é coisa divina, acho; parte, pedrinha necessária de um mosaico, que só contemplaremos em toda a sua completude no “lado de lá”, enquanto que, do lado de cá, por graça sua, é-nos dado vê-lo, de vez em quando, em fragmentos.

Jamais entenderemos o suficiente o que significa estar no momento presente, plenamente, na sua vontade… […]

A ideia para hoje: a sua vontade feita bem, como uma ideia que não me deve abandonar jamais, que impregna até as fibras do meu ser.

29 abril 2021

Harmonia e ambiente

«Cada objeto, para nós, deve ter um porquê», dizia sempre Marilen Holzhauser, uma das primeiras focolarinas. Para as primeiras companheiras de aventura de Chiara, a sobriedade, a essencialidade, eram um estilo de vida, uma forma de decorar, de vestir. A beleza revela o mistério de uma flor que consome apenas o que precisa e desse modo mostra a sua real beleza. E o belo torna-se esplendor da verdade. A harmonia da essencialidade faz descobrir «a beleza que salvará o mundo» e qual mundo salvará a beleza.

Na carta a Diogneto, a propósito dos primeiros cristãos, lê-se: «Vivendo em cidades gregas ou bárbaras, como coube a cada um, e adequando-se aos costumes do lugar nas roupas, nos alimentos, e em tudo, testemunham um método de vida social admirável e, sem sombra de dúvida, paradoxal».

Tudo isso tem reflexos na vida concreta de quem adere ao “espírito da unidade”. Por exemplo, os “Centros Mariápolis”, onde se fazem congressos e cursos de formação, e as Mariápolis permanentes, 22 em todo o mundo, são concretizações que miram restaurar as relações sociais, em sua integridade humana. Da mesma forma as produções dos Centros Ave e Azur, e os encontros de “Art’è”, e assim também as obras de arte de pintores, musicistas, pianistas, bailarinos… querem exprimir a contínua novidade de Deus, fonte de beleza e harmonia

Chiara Lubich escreveu: «O verdadeiro artista é um grande. O artista assemelha-se de certo modo ao Criador. O verdadeiro artista possui a sua técnica quase inconscientemente, e se serve das cores, das notas, das pedras, como nós nos servimos das pernas para caminhar. O ponto de concentração do artista está em sua alma, onde contempla uma sensação, uma ideia, que ele quer exprimir fora de si. Por isso, nos limites infinitos de sua pequenez de homem em comparação com Deus, e, portanto, na infinita diversidade das duas coisas “criadas”, digamos assim, o artista é de certo modo alguém que “recria”, cria novamente. E as obras-primas de arte que outros homens produziram poderiam ser uma verdadeira “recriação” para o homem. Infelizmente, por falta de verdadeiros artistas, o homem recreia-se quando muito em extravagâncias vazias de cinemas, teatros, variedades, onde a arte frequentemente tem pouco lugar.

O verdadeiro artista, com suas obras-primas, que são brinquedos diante da natureza, obra-prima de Deus, de certa maneira nos faz sentir quem Deus é e nos faz relevar na natureza a marca trinitária do Criador: a matéria, a lei que a conforma, como que um “evangelho da natureza”, a vida, como que consequência da unidade das duas primeiras. O conjunto, depois, é algo que continuando a “viver”, oferece a imagem da unidade de Deus, do Deus dos vivos. As obras dos grandes artistas não morrem, e nisso está o termômetro da sua grandeza, porque a ideia do artista, de certo modo, se exprimiu perfeitamente na tela ou na pedra, compondo algo vivo».

28 abril 2021

A Santa viagem

A partir de uma frase da Escritura, Chiara Lubich reflete sobre a Santa Viagem da vida, convidando-nos a verificar periodicamente diante de Deus em que momento estamos na nossa caminhada.

O motivo que me leva a dirigir-me a vocês é o desejo de avaliarmos juntos a que ponto estamos em relação à nossa santificação. Um destes dias uma focolarina mostrou-me uma lindíssima frase dos Salmos, que anuncia uma bem-aventurança que eu não conhecia: “Bem-aventurado o homem que põe a sua confiança em ti e decide no seu coração a Santa Viagem”.*

“A Santa Viagem”. De que viagem fala a Escritura? Certamente da caminhada do homem em direção a Deus, em direção ao Céu. A viagem, portanto, da própria santificação, que nos abre o Paraíso. […]

E agora? Será que também nestes momentos, estamos verdadeiramente encaminhados na Santa Viagem?

[…] Paremos um pouco e façamos um breve exame, sozinhos diante de Deus, apenas para dar-lhe glória. Quais foram os resultados? Será que melhoramos, por exemplo, no fazer a vontade de Deus? No amor, no amor recíproco? […] Se a resposta é sim, agradeçamos a Deus e sigamos adiante. Se for não, agradeçamos-lhe por ainda termos a vida para recomeçar. E então, avante! Queremos muito saborear, juntos, a bem-aventurança da Santa Viagem!

Chiara Lubich