21 fevereiro 2022

Honrar Maria, a mãe de Deus

 «No ano dedicado a Maria, deveríamos encontrar o melhor modo de honrar a Mãe de Deus.

Porém, existem várias maneiras de honrá-la.
Podemos honrar Nossa Senhora falando com Ela, louvando-a, rezando, visitando-a nas igrejas dedicadas a Ela, fazendo pinturas ou esculturas que a representam, elevando-lhe cânticos, adornando com flores suas imagens.
Existem muitas maneiras de honrar Maria.
Mas existe uma que supera todas: é a de imitá-la, de se comportar como outra Maria na terra. Creio que seja este o modo que mais lhe agrada, porque dá a Ela a possibilidade de retornar de alguma forma à terra.

Nós, sem excluir todas as outras possibilidades que temos para honrar Maria, devemos privilegiar esta: imitá-la.

Mas como imitá-la? Que aspectos dela devemos imitar?
Imitá-la naquilo que é essencial. Ela é Mãe, mãe de Jesus e, espiritualmente, nossa mãe. Jesus nos deu Maria como mãe quando estava na cruz, na pessoa de João.
Devemos ser outra Maria, como mãe.
Em prática, devemos formular este propósito: durante o Ano Mariano vou me comportar, para com os próximos que eu encontrar ou para os quais vou trabalhar, como se eu fosse sua mãe.
Se fizermos assim, constataremos em nós uma conversão, uma revolução. Não somente porque nos encontraremos às vezes sendo como mãe talvez da nossa mãe ou do nosso pai, mas porque assumiremos uma atitude determinada, específica.
Uma mãe acolhe sempre, ajuda sempre, espera sempre, cobre tudo. Uma mãe perdoa o filho em tudo, ainda que seja um delinquente, um terrorista.
Com efeito, o amor de uma mãe é muito semelhante à caridade de Cristo, de que fala Paulo.
Se tivermos o coração de mãe, ou mais precisamente, se nos propusermos ter o coração da Mãe por excelência, Maria, estaremos sempre prontos a amar os outros em todas as circunstâncias e, assim, a manter vivo o Ressuscitado em nós. Mas também faremos tudo aquilo que nos é solicitado para manter o Ressuscitado entre nós.

Se tivermos o coração desta Mãe, amaremos a todos e não somente os membros da nossa Igreja, mas também os das outras; não somente os cristãos, mas também os muçulmanos, os budistas, os hinduístas, etc. Também os homens de boa vontade. Amaremos também todos os homens que vivem na terra. Pois a maternidade de Maria é universal (cf. LG 79), assim como foi universal a Redenção.
Mesmo se, às vezes, o amor de Maria não é correspondido, Ela ama sempre, ama a todos.
É este, então, o nosso propósito: viver como Maria, como se fôssemos mãe de todos os seres humanos».

De CHIARA LUBICH – Buscar as coisas do alto – Cidade Nova 1993 pág. 36-37-38

03 fevereiro 2022

A imensidão de Deus

 «Num momento de repouso (…) contemplando a imensidão do universo, a extraordinária beleza da natureza, a sua potência, pensei espontaneamente no Criador de tudo e compreendi numa forma nova a imensidão de Deus. (…)

Eu o descobri tão grande, tão imenso, a ponto de me parecer impossível que Ele tivesse pensado em nós. Esta impressão da sua grandeza permaneceu em meu coração por alguns dias.

Dizer agora «santificado seja o vosso nome…» ou «Glória ao Pai, ao Filho, e ao Espírito Santo» é muito diferente para mim: é uma necessidade do coração. (…)

Nós estamos a caminho. E, quando alguém viaja, já pensa no ambiente que o receberá na chegada, na paisagem, na cidade… já se prepara. Assim devemos fazer.

No céu, louvaremos a Deus? Louvemo-lo desde este momento. Deixemos que o nosso coração proclame todo o nosso amor a Ele (…). Exprimamos o nosso louvor com a boca e com o coração.

Aproveitemos para reavivar nossas orações diárias que tem esta finalidade. E rendamos glória com todo o nosso ser.

Sabemos que quanto mais anulamos a nós mesmos (como Jesus abandonado, que se reduziu a nada) mais anunciamos, com a nossa vida que Deus é tudo, e assim Ele é louvado, glorificado, adorado (…).

Procuremos muitos momentos, durante o dia, para adorar a Deus, para louvá-lo. Façamos isso durante a meditação, ou numa visita a uma igreja, ou na Santa Missa. Louvemo-lo para além da natureza ou na profundidade do nosso coração. E, principalmente, vivamos mortos a nós mesmos e vivos à vontade de Deus, ao amor para com os irmãos.

Sejamos nós também, como dizia Isabel da Trindade, um “louvor da sua glória”. Anteciparemos assim um pouco de paraíso, e Deus será compensado pela indiferença de muitos corações que vivem hoje no mundo».

Chiara Lubich

(Chiara Lubich, Cercando le cose di lassù, Roma 1992, p. 15-17)

01 fevereiro 2022

27 de março de 1981

Diário de 27/03/1981

Tenho um porta-retratos com a imagem de Jesus Abandonado.

Ontem, olhando para aquele rosto, fiquei impressionada com a dor de Jesus abandonado e com a sua humanidade sofredora. Era o dia da encarnação e, justamente naquele dia, senti Jesus profundamente humano, a ponto de me comover: aqueles olhos voltados para o Céu à procura do Pai, aquele sangue… era tudo tão verossímil! E entendi de maneira nova como Ele realmente nos amou, me amou. Parecia-me impossível que fosse Deus, assim tão sofredor e perfeitamente homem, e entendi a kenosi, o duplo aniquilamento, se assim se pode dizer, da encarnação e do abandono.

Decidi colocar esta imagem de Jesus em todos os focolares, para que os focolarinos, vendo-a, possam repetir diariamente: “Porque és abandonado.”  
Hoje repetir o dia inteiro: “Porque és abandonado.” Repetir estas palavras abraçando sempre, logo, com alegria as cruzes que chegam, desapegando-me das coisas que a vontade de Deus de beneplácito exigem, por exemplo, diante das mortificações da Quaresma, do encontro com pessoas que mais se assemelham a Ele, dos problemas (Ele pergunta: “Por quê?”), das dúvidas, do “perder” a minha vontade no presente.  

#ChiaraLubich

24 janeiro 2022

Você sabe como nasceu a Palavra de Vida?

 Hoje traduzida em cerca de 90 línguas e idiomas, a Palavra de Vida comunica frases do evangelho a milhões de pessoas, em todo o mundo.

Foi nas fagulhas das palavras do Evangelho que a certeza de um amor que supera todas as coisas começou a se alastrar no coração daquele primeiro grupo cativado por Chiara Lubich, fundadora do Movimento dos Focolares e também da Editora Cidade Nova. Ainda no período da 2ª Guerra Mundial, onde a tristeza e as perdas eram inumeráveis, a novidade de Deus Amor impulsionou Chiara e suas amigas a viverem umas pelas outras e compartilhar com todos o pouco que tinham – mesmo que fosse uma pequena maçã ou um sapato de número 42.

Tudo começou com uma prática que Chiara – muito didática por ser professora – começou naquele período e logo se popularizou, ao longo dos anos, junto a toda a comunidade global dos Focolares: “Palavra de Vida”, uma frase do Evangelho e a partilha dos “frutos” que ela produzia em suas vidas. Uma verdadeira novidade para aquele tempo e que as encorajava a crescer juntas. 

“Leio para todos, por exemplo: ‘Ama o próximo como a ti mesmo’ (Mt 19,19). O vizinho. Onde estava o vizinho? Estava lá, ao nosso lado, em todas aquelas pessoas atingidas pela guerra, feridas, sem-teto, nuas, com fome e com sede. Nós imediatamente nos dedicamos a eles de várias maneiras.” (Chiara Lubic)

Um dia, Chiara contou que recebiam com frequência solicitações de roupas e sapatos, e certa vez pediram um sapato de número 42. E acreditando fielmente nas palavras do Evangelho de Mateus, “Pedi e recebereis” (Mt 7,7), foi até uma igreja e rezou “Dê-me um par de sapatos nº 42, para você nessa coitadinha.” Ao sair de lá, uma jovem a entregou o pacote com um par de sapatos de número 42.

“Lemos no Evangelho: ‘Dai e ser-vos-á dado’ (Lc 6,38). Damos, damos e sempre recebemos algo. Um dia, em nossa casa, temos apenas uma maçã. Nós o damos aos pobres que vêm pedir. E naquela mesma manhã vemos chegar uma dúzia, talvez de um parente. Também damos essa dúzia a quem nos peça e nessa mesma tarde chega uma mala. Foi assim, sempre assim ”.

Eram essas e outras muitas experiências que a vivência da Palavra levou aquele pequeno grupo a viver pela Unidade. E hoje a Palavra de Vida, a frase do Evangelho junto com a reflexão, é um convite a confiar em Deus, a viver e a partilhar sua vida, feito a milhões de pessoas e traduzida em mais de 90 línguas e idiomas.

Desde o início, a Palavra de Vida é publicada na Revista Cidade Nova. 

14 janeiro 2022

Quando se conhece a dor

Quando se conheceu a dor em todos os seus matizes mais atrozes, nas mais variadas angústias, e se ergueram as mãos a Deus em mudas e lancinantes súplicas, em abafados gritos de ajuda; quando se bebeu o fundo do cálice e, durante dias e anos, se ofereceu a Deus a própria cruz, incorporada à sua, que a valoriza divinamente, então Deus tem piedade de nós e nos acolhe em sua união.
É o momento em que, após ter experimentado o valor sem par da dor, de ter acreditado na economia da cruz e de ter visto os seus efeitos benéficos, Deus mostra, de modo mais alto e novo, algo que vale mais ainda do que a dor.
É o amor aos outros, em forma de misericórdia, amor que faz abrir os braços e o coração aos infelizes, aos mendigos, aos martirizados da vida, aos pecadores arrependidos. 
Amor que sabe acolher o próximo desencaminhado, seja ele amigo, irmão ou desconhecido e o perdoa infinitas vezes. Amor que faz mais festa a um pecador que volta do que a mil justos, e empresta a Deus inteligência e bens para Ele poder demonstrar ao filho pródigo a felicidade pelo seu retorno. 
Amor que não mede e não será medido. 
É uma caridade que floresce mais abundante, mais universal, mais concreta do que aquela que a alma antes possuía. De fato, ela sente nascerem dentro de si sentimentos parecidos com os de Jesus, percebe aflorarem-lhe aos lábios, para todos os que encontra, as divinas palavras: “Tenho misericórdia da multidão” (cf. Mateus 15,32). E, com os muitos pecadores que dela se aproximam, pois, de certa forma são imagem de Cristo, entabula colóquios semelhantes aos que Jesus teve um dia com Madalena, com a samaritana, com a adúltera. A misericórdia é a última expressão da caridade, aquela que a remata. E a caridade supera a dor, porque a dor só existe nesta vida, enquanto o amor perdura na outra. Deus prefere a misericórdia ao sacrifício.

24 dezembro 2021

O que significa o Natal pra você

Em um artigo do dia 25 de dezembro de 1973, publicado na edição italiana da revista Cidade Nova, o jornalista Spartaco Lucarini pergunta a catorze personagens dos mais variados ambientes: O que significa o Natal para você? Eis a resposta de Chiara Lubich

O Natal – festa do nascimento de Jesus – é, para mim, a resposta de Deus e da Igreja a uma necessidade do coração: ouvir repetir todos os anos, mediante a recordação daquele acontecimento suavíssimo, simples e abissal, que Deus me ama.
Sim, se posso realizar na minha existência as aspirações mais profundas é somente porque Deus olhou também para mim, como para todos, e fez-se homem para me dar as leis da vida que, como luz no caminho, me fazem prosseguir com segurança em direção ao destino comum.

Mas o Natal, para mim, não é só uma festividade, embora cheia de significado. É um estímulo a trabalhar para pôr de novo na sociedade em que vivo a presença de Cristo, que está onde estiverem dois ou mais reunidos no Seu nome: quase Natal espiritual todos os dias, nas casas, nas fábricas, nas escolas, nas repartições públicas…

Este dia natalício, além disso, abre-me o coração sobre toda a humanidade. O seu calor ultrapassa o mundo cristão e parece penetrar em cada ângulo da terra, sinal de que aquele Menino veio para todos. De fato, é este o seu programa: que todos sejam um.

E depois, em cada Natal pergunto-me: quantos Natais terei ainda na vida? Esta interrogação, que não tem resposta, ajuda-me a viver cada ano come se fosse o último, numa espera mais consciente do meu dia de Natal: o “dies natalis”, isto é, o dia que assinalará para mim o início da vida que não tem fim.

Chiara Lubich

08 dezembro 2021

Escolher Deus significa escolher Jesus Abandonado

Rocca di Papa, 23 de dezembro de 1983
Jesus se revelou a Chiara como crucificado e abandonado: neste texto ela descreve a origem desta inspiração tão vital para ela e para a sua Obra

(…)
De fato, se nós – estimuladas por um legítimo desejo de saber como as coisas se passaram – mas também pelo conselho da Igreja que, para salvaguardar a genuína pureza das inspirações, convida famílias religiosas e movimentos a voltarem aos tempos em que o Espírito Santo os suscitou; veremos que, ainda antes de termos as primeiras ideias sobre a técnica da unidade e aprendermos a realizar a unidade, nos foi proposto um modelo, uma imagem, uma vida: a vida daquele que verdadeiramente soube “fazer-se um” com todos os homens que existiram, que existem e que existirão; aquele que realizou a unidade, pagando-a com a cruz, com o sangue e com o seu grito; aquele que proporcionou à Igreja a sua presença, como Ressuscitado, todos os dias, até o fim do mundo. Este modelo é Jesus crucificado e abandonado.

Esta realidade de Jesus Abandonado e a sua compreensão precederam, também no tempo, toda e qualquer consideração. De fato, se nós consideramos – e com razão – o dia 7 de dezembro de 1943 (data da minha consagração a Deus) como sendo o início da nossa história, devemos lembrar que no dia 24 de janeiro de 1944 Jesus Abandonado já se havia apresentado à nossa mente e ao nosso coração.
Mas vamos seguir a ordem dos acontecimentos.
Conforme fizemos, ao falar da “unidade”, também no caso de Jesus Abandonado, das primeiras ideias que tivemos sobre Ele, vamos relembrar episódios e circunstâncias e ler breves anotações que se conservaram. São acontecimentos, pensamentos já conhecidos, mas que é necessário rever também hoje para se fazer uma análise mais completa deste assunto.
Um primeiro acontecimento em que Jesus Abandonado se nos revelou, se deu na casa de Dori. Deixemos que ela mesma nos relate o fato:
«Fazíamos visitas aos pobres e, através deles, provavelmente, eu contraí uma infecção no rosto, que se encheu de feridas e os remédios não conseguiam deter a doença. Com o rosto cuidadosamente protegido, continuava a ir à missa e, aos sábados, às reuniões…
Fazia frio e era prejudicial sair naquele estado. Visto que os meus familiares me proibiam de sair, Chiara pediu a um padre Capuchinho que me trouxesse a Comunhão. Enquanto fazia a minha ação de graças, aquele o sacerdote perguntou a Chiara qual era, a seu ver, o momento em que Jesus mais sofrera durante a sua paixão. Ela respondeu ter sempre ouvido dizer que era a dor que sofreu no Horto das Oliveiras. Mas o sacerdote comentou: ‘Eu acho que foi no momento em que, pregado na cruz, Ele gritou: ‘Meu Deus, meu Deus, por que me abandonaste?’”1.
Logo que o padre saiu, tendo eu ouvido o comentário de Chiara, dirigi-me a ela, na certeza de que receberia uma explicação. Ela me disse: “Se a maior dor de Jesus foi o abandono por parte de seu Pai, nós vamos escolhê-lo como Ideal, nosso modelo, e segui-lo assim”.
Naquele momento – continua Dori – na minha mente, gravou-se a convicção de que o nosso ideal de vida era Jesus, com o rosto dilacerado que grita ao Pai. E as pobres chagas do meu rosto, que agora pareciam como que uma pequena sombra de suas dores, me davam alegria, porque me tornavam um pouco mais semelhante a Ele. Daquele dia em diante Chiara me falou muitas vezes, ou melhor, sempre, de Jesus Abandonado. Era o personagem vivo da nossa existência».

Uma escolha única e radical: “Jesus Abandonado”.

As cartas da época frisam esta atitude:
«Esquece tudo… também as coisas mais sublimes; deixa-te dominar por uma só ideia, por um só Deus, que deve penetrar em todas as fibras do teu ser: Jesus crucificado» (21.7.1945).
Outra: «Conheces a vida dos santos? Era uma só palavra: Jesus crucificado. As chagas de Cristo eram o repouso deles; o sangue de Cristo, o banho salutar de suas almas; o peito transpassado de Cristo, o precioso cofre onde eles depositavam o seu amor. Pede a Jesus crucificado, por amor do seu angustiante grito, a paixão de sua paixão. Ele deve ser tudo para ti» (21.7.1945).
Jesus Abandonado era o único livro em que se queria ler.
«Sim, é verdade, frequento a universidade, mas nenhum livro, por mais belo e profundo que seja, proporciona ao meu espírito tanta força e sobretudo tanto amor como Jesus crucificado…» (07.06.1944).
E ainda:
«Sobretudo, porém, procura instruir-te num único livro: Jesus crucificado – que todos abandonaram – que grita: “Meu Deus, meu Deus, por que me abandonaste?” Oh!, se aquele divino rosto contraído pelos espasmos, se aqueles olhos avermelhados, mas que te fitam com bondade, esquecendo os pecados meus e teus que o reduziram a esse estado, estivessem sempre diante dos teus olhos» (30.1.1944).

E, nos anos seguintes, de tempos em tempos, se renovava esta escolha radical.
Uma carta de 1948 diz:
«…Esquecer tudo na vida: escritório, trabalho, pessoas, responsabilidades, fome, sede, descanso, até mesmo a própria alma… para possuir somente a Ele: Jesus Abandonado. Eis tudo. Amar como Ele nos amou, a ponto de experimentar por nós até o abandono do seu Pai» (14.08.1948).
Em 1949: «Tenho um só Esposo na terra: Jesus abandonado. Não tenho outro Deus senão Ele».
Só se conhecia a Ele. Não se queria conhecer senão a Ele. O Espírito repetia dentro de nós: «Não conheço senão Cristo e Cristo crucificado». O amor por Ele era exclusivo, não permitia comprometimentos.
A escolha de Deus-Amor, que tinha caracterizado o primeiro passo da nossa nova vida, determinava-se com precisão; escolher Deus significava para nós: escolher Jesus Abandonado.

#ChiaraLubich 

06 dezembro 2021

Entrevista a Chiara de Josè Maria Poirier

Rocca di Papa, 19 de fevereiro de 1998

Jornalista: […] A primeira pergunta toca o tema do diálogo inter-religioso. Diálogo que o Movimento propõe e abriu com pessoas de várias convicções religiosas e tradições. 

Chiara: O fato é este: Jesus, vindo à Terra, redimiu toda a humanidade, todos os homens. Ele constituiu a Igreja. Porém, a sua redenção abraçou todos. Por isso, todos, se tiverem reta intenção, […] teriam a possibilidade de se salvar. Estamos muito conscientes disso. Portanto, nos aproximamos dessas pessoas de outras religiões, sabendo que amanhã poderão ir para o Paraíso e nós, talvez, não.
Portanto, a atitude que temos – e este é o ponto importante para nós -, é aquela de amá-los como Cristo os amou e amá-los sem discriminação alguma, dando-lhes tudo aquilo que o amor nos leva a doar. Justamente porque os amamos, fizemos uma grandíssima descoberta. Quase todas as grandes religiões: o budismo, o hinduísmo, o hebraísmo, o islamismo possuem uma fórmula que é tipicamente cristã, porque é uma frase do Evangelho: “Não faça aos outros aquilo que você não gostaria que fosse feito a você; faça aos outros o que gostaria que fosse feito a você”. Todos possuem esta frase que é chamada a “regra de ouro”, porque é de todas as escrituras e de todas essas religiões.

Então, o que fazemos? Nós vivemos o nosso amor sobrenatural, que é uma participação do mesmo amor de Deus, da vida trinitária… Eles nos encontram com o amor que possuem, que não é simplesmente, não sei, a não-violência, mas é uma atitude positiva de amor. […] Nestes encontros nós criamos uma fraternidade que não é a unidade em Cristo, como aquela que pode… existir na Igreja ou entre os cristãos, mas é a fraternidade universal instaurada pelo amor. […]

Jornalista: Na sua opinião, por que o carisma da unidade teve toda essa incidência no mundo, em muitos países e em pessoas de diversas condições sociais e culturais?
Chiara: Porque é Deus o Ideal e Ele tem a ver com todos. É pai de todos, de todas as culturas, de todas as religiões, de todas as nações, de todas as vocações, de ambos os sexos.

Jornalista: O que significou para a senhora, na sua vida pessoal, o carisma da unidade?
Chiara: Tenho que dizer assim, pois nasceu há 53 anos. É um caminho. Procurei assimilá-lo cada vez mais, mais, mais, assim como era capaz. Errando, recomeçando, recomeçando, errando, indo em frente, fazendo progressos. Significou o meu caminho para Deus.

Jornalista: Gostaria de perguntar, Chiara, sobre dois temas centrais da espiritualidade do Movimento dos Focolares: Jesus no meio, a presença de Jesus no meio da comunidade, e o mistério de Jesus abandonado, Cristo na cruz. 
Chiara: Jesus no meio é a realização de uma frase do Evangelho onde Jesus diz que, quando duas ou mais pessoas se unem no seu nome, que significa no seu amor. Ele está ali presente. Mas foi dito também de outro modo: “Onde existe a caridade e o amor ali está Deus”, diz um canto do… e esta é a realização. Portanto, é algo grande, isto é, ter entre nós, talvez na família, no escritório, até no parlamento a presença de Cristo entre nós. Ele nos ajuda, Ele nos guia, Ele nos ilumina. 
Jesus abandonado é a expressão da maior dor que Jesus sofreu na Terra, quando no vértice da cruz gritou: “Meu Deus, meu Deus, por que me abandonaste?” Pode-se explicar pelo fato de que Ele se cobriu de todos os pecados do mundo, os quais tinham separado os homens de Deus e entre eles. Ele assumiu toda a separação e por isso gritou: “Meu Deus, por que me abandonaste?” como se Ele fosse a voz da humanidade que está separada de Deus. Encontramos nele a solução para recompor a unidade nas diversas partes do mundo, em todas as situações.

Jornalista: O que a senhora entende dizer por uma espiritualidade coletiva?
Chiara: Entendo dizer que não se vai para Deus sozinho, mas junto com outros. A nossa espiritualidade se baseia no amor e de modo especial também no amor recíproco, que é o mandamento típico de Jesus. Ele disse que é seu, que é novo. Naturalmente, no amor recíproco somos pelo menos dois, porque é preciso… Existe a reciprocidade. Portanto, não é um caminho que percorremos sozinhos, mas um caminho percorrido juntos.

Jornalista: Como almejar, Chiara, a unidade, respeitando as várias culturas?

Chiara: É preciso saber respeitar, mas é o amor que ilumina, que faz compreender o outro, aliás, que faz com que cada um se torne rico do patrimônio do outro. Portanto, é um enriquecimento. Nós dizemos que é preciso se tornar homens mundo, no sentido de contatar todas as pessoas, procurando enriquecer-nos da riqueza do outro e, naturalmente, comunicando também a riqueza que temos dentro de nós, mas não existem obstáculos para quem ama. […]

Jornalista: Em que base se apoia o diálogo entre pessoas de diferentes culturas e diferentes crenças religiosas?
Chiara: Nós temos um diálogo com pessoas de diferentes religiões, inclusive sem fé, porque vemos que, embora não acreditem em Deus, no sobrenatural, acreditam em certos valores. Visto que Jesus é o homem Deus, existe uma parte humana e uma parte divina na única pessoa do Cristo, também todos os valores puramente humanos têm um significado no cristianismo e nós sentimos que, se podemos lhes oferecer o nosso espírito, a nossa espiritualidade, que se concentra ainda numa palavra que é amor, eles podem nos oferecer realmente a experiência de terem vivido, de terem apreciado, de terem trabalhado por muitos valores: a solidariedade, a paz, a unidade, a liberdade, certas vezes, assim.

Jornalista: Gostaria de perguntar à senhora, que é uma personalidade da vida espiritual: qual é o sentido da dor na vida do homem?Chiara: A dor tem um grande sentido, um grande sentido. A cruz é o equilíbrio da humanidade. Se não tivermos a cruz, esvoaçamos como as borboletas que não sabem onde pousar; ao passo que a dor dá sentido à nossa vida. Não só, mas é o caminho direto para ter a união com Deus. Quem sofre, ao se recolher, encontra, em geral, a união com Deus e a união com Deus é a base para poder viver como cristão, para poder viver também como ser humano.

Jornalista: Como almejar, Chiara, a unidade, respeitando as várias culturas?
Chiara: É exatamente o que eu disse antes: é preciso respeitar os outros; é preciso amar os outros. Deixar que o outro seja aquilo que é. Para isso, nós devemos viver o não-ser para conseguirmos entrar neles. Alguém disse que é preciso entrar na pele do outro. Um escritor diz que é preciso entrar na pele do outro para compreender as coisas como ele as compreende. Então… assim existe a unidade, porque nós nos fazemos um com o outro e ele se faz um conosco, mesmo na diversidade… De certo modo, é como entre as Pessoas da Santíssima Trindade que são muito diferentes: o Padre não é o Filho, o Filho não é o Pai, um e outro não são o Espírito Santo, mesmo assim são um, porque todas as Pessoas são amor. […]

Jornalista: A senhora é cristã e católica. Alguma vez e conduzida por Deus, encontrou no diálogo profundo com outras religiões certas riquezas que não conhecia ou todas evocavam algo que já havia na senhora?
Chiara: Não, não, encontrei coisas que não conhecia, mas simplesmente porque às vezes nós pensamos, […] também nos séculos passados, que já descobrimos [todo] o cristianismo. Na verdade, nós o descobrimos só até certo ponto; nos próximos séculos ele será descoberto num nível ainda mais profundo, ainda mais profundo, ainda mais profundo. Certas pessoas, em certas religiões chegaram… simplesmente com a religião delas, mas também com a ajuda do Espírito Santo, chegaram a profundidades, em certos particulares, que nós ainda não atingimos. Um dia descobriremos que são as ‘sementes do Verbo’, isto é, também ali existem princípios da verdade, presenças do Verbo de Deus que nós ainda não descobrimos. Não sei, para dar um exemplo. Estive na Tailândia. Encontrei lá uma tal sabedoria, uma tal ascética, um tal desapego de si mesmos, que é difícil encontrar aqui. Assim.

Jornalista: Obrigado, Chiara.  

05 dezembro 2021

A história dos balõezinhos

Geralmente, no dia da Epifania, as crianças recebem presentes. E quem se lembra do Menino Jesus? Um acontecimento verdadeiro, narrado por Chiara Lubich às crianças da Mariápolis permanente Internacional de Loppiano (Itália). 

(…) Vou lhes contar uma história verdadeira que aconteceu durante o Natal. Em uma cidade chamada Vicenza – é uma história verdadeira – (…) havia um pároco, um sacerdote que tinha chegado há pouco tempo naquela paróquia. Ele ensinou aos meninos e meninas a arte de amar. (…) 

(…) O Natal se aproximava e então o padre disse para essas crianças: “Olhem, o Natal está chegando. Seria bom que vocês fizessem muitos, muitos atos de amor para o Menino Jesus. As crianças responderam: “Está bem!” e começaram a fazer muitos atos de amor. Na véspera do Natal, antes que o Menino Jesus nascesse, o padre deixou a manjedoura vazia porque o Menino Jesus ainda não tinha nascido. Naquela noite, o padre viu os meninos trazerem um pacote grande, grande, deste tamanho, com muitos rolinhos amarelos dentro dele. Eram 277. 277 atos de amor. E o que o padre fez? Pegou todos esses rolinhos, colocou-os dentro de um saco – ele encheu um saco deste tamanho – e o colocou na manjedoura. Ele disse: “Quando o Menino Jesus nascer, os atos de amor de vocês vão servir de colchão e travesseiro para ele”. As crianças ficaram muito felizes! 

Chegou o Natal. Quando estava perto das 10:30, 11:00 horas, o padre disse: “E agora, o que vamos fazer com estes atos de amor? Sabem o que podemos fazer? Vamos amarrá-los como se fossem muitos pacotinhos e prender os pacotinhos em balões. Vamos fazer dois grupos de balões. Um grupo de balões aqui e outro grupo, ali. Amarramos os pacotinhos de atos de amor nos balões e, depois, vamos soltá-los. Eles vão subir para o céu, para Jesus.” Todas as crianças ajudaram. Precisava comprar os balões, amarrar os pacotinhos nos balões e depois soltá-los. O padre ajudou-os e soltaram esses balões, que voaram para o céu. As crianças estavam contentes. Ficaram olhando, olhando, e os balões iam ficando cada vez menores, cada vez menores até que desapareceram. Pensaram: “Será que estouraram?” Um deles disse: “Talvez!” Ao invés, não. Subiram bem alto, bem alto e chegou o vento. O que o vento fez? Jogou os balõezinhos pra lá, pra cá, depois para frente, para trás, pra cá e pra lá. Durante uma hora, duas, três, quatro, cinco horas, o vento, soprando, levou os balões sempre mais para cima. Seis, sete, oito, nove horas. Às nove da noite – vocês devem saber que o padre colocou, junto com os atos de amor, o seu número de telefone -, em outra cidade, chamada Reggio Emilia, que fica a 200 Km da outra cidade (200 Km é muito longe, é como daqui a Roma), nesta cidade chamada Reggio Emilia, havia uma casa rodeada por um lindo jardim. Neste jardim, estavam seis crianças que não conheciam a arte de amar. Eram seis crianças como as outras, que estavam brincando do lado de fora, no jardim. Elas estavam tristes.

Naquele local tinha tido uma festa das bruxas e elas não tinham gostado. Por isso estavam muito tristes. A um certo momento, mesmo sendo de noite, levantaram os olhos e viram cair no chão os balõezinhos junto com os pacotes. Quando essas crianças viram cair do céu esses pacotinhos, fizeram uma grande festa! Que festa das bruxas que nada! Foi uma festa. Foi o Menino Jesus que mandou esses balões! E olhem que chegaram por milagre porque, se passasse um avião, estourava todos eles. Ou então, se os barbantes dos balões fossem grossos e entrassem no motor do avião, dizem que seria perigoso para o avião. Mas não, não encontraram nenhum avião. Foi por isso que conseguiram chegar ali. As crianças chamaram logo os pais: “Papai, mamãe, vejam o que aconteceu! Esses balões choveram do céu e olhem o que têm dentro!”

Então o pai e a mãe saíram (talvez estivessem ali também os avós) e viram esses pacotinhos, esses rolinhos amarelos. Eles os abriram e começam a ler. Um deles abriu um dos rolinhos e leu: “Pedi desculpas à minha amiga por amor a Jesus”. Outro rolinho: “Eu te ofereço os esforços que fiz hoje de manhã para levantar-me para ser coroinha”. Um outro: “Fiz um favor mesmo se me custou muito”. E ainda outro: “Sempre peço perdão a Deus quando o meu avô diz coisas feias”. Depois, outro: “Nesta semana, ajudei os meus pais a prepararem a mesa, a carregarem a cesta de compras, a varrerem e limparem o chão”. Este fez muitas coisas. Escutem essa aqui: “Enxuguei os talheres sem que minha mãe pedisse e também a ajudei a fazer a limpeza”. É outro ato de amor. E um outro: “Quando o meu irmão Sebastião não quer dormir, eu o pego e o levo para a minha cama ou para a cama dos meus pais, eu o faço dormir cantando canções ou contando histórias”. Um outro: “Na piscina, emprestei a minha touca ao meu irmãozinho que estava sem.” Esperem que ainda tem um outro. Trouxe somente alguns porque eram 277, eram muitos. Escutem esse aqui: “Descasquei as tangerinas para o meu avô porque vi que ele estava com dor nas mãos e amarrei os sapatos da minha prima Alessia porque vovó estava com dor nas costas”. Esse aqui prestava atenção em tudo, não é? Um outro ainda, é o último: “Escutei o conselho do dado: ser os primeiros a amar. Fui me confessar mas tinha muitas crianças. Eu deixei que passassem na minha frente e a minha mãe nem ficou sabendo de nada.”

Aqui estão alguns exemplos dessas crianças.

Então, o que foi que elas fizeram com esses rolinhos? Levaram-nos – como eu disse – aos pais e os pais, viram que, no meio dos rolinhos, tinha o número de telefone da pessoa que os havia mandado, que era o padre. E daí, o que foi que eles fizeram? Eram nove horas da noite e telefonaram para o padre. O padre atendeu. Eles falaram: “O senhor é o padre fulano de tal?” “Sim, sim, sou eu.” “Chegaram até aqui esses atos de amor das suas crianças, o que devo fazer com eles?” E então combinaram que as crianças levassem para a escola os 277 atos de amor, falassem com a catequista e juntos escreveram para as crianças de Vicenza. Também estas crianças de Reggio Emilia quiseram aprender a fazer atos de amor. 


Fonte: Centro Chiara Lubich

03 dezembro 2021

NO TREM DO TEMPO

Nos primeiros tempos do Movimento, podíamos morrer a qualquer momento, porque não estávamos bem protegidas contra os bombardeios. Então, ao nos perguntarmos: quando é que devemos amar a Deus fazendo a sua vontade?, logo entendemos: agora, já, porque não sabemos se haverá um depois.
O único tempo que nos pertencia era o momento presente. O passado já era passado; o futuro, não sabíamos se chegaria a existir. Dizíamos então: o passado não existe mais; coloquemo-lo na misericórdia de Deus. O futuro não existe ainda. Vivendo o presente, viveremos bem também o futuro, quando este se tornar presente.
Como é insensato — dizíamos — viver pensando no passado, que não retorna, ou no futuro, que talvez nunca venha a existir e que é imprevisível!
Citávamos o exemplo do trem. Assim como um viajante, para chegar ao seu destino, não fica caminhando para frente e para trás no trem, mas permanece sentado no seu lugar, da mesma forma nós devemos permanecer fixos no presente. O trem do tempo vai por si.
E, presente após presente, chegaríamos ao momento do qual depende a eternidade. Amando a vontade de Deus no presente com todo o coração, toda a alma, todas as forças, poderíamos cumprir, por toda a nossa vida, o mandamento de amar a Deus com todo o coração, toda a alma, todas as forças.

01 dezembro 2021

Renovar a doação a Deus


Com a sua consagração a Deus no dia 7 de dezembro de 1943, Chiara Lubich que, na época, tinha 23 anos, deu origem ao Movimento dos Focolares. 60 anos depois, ela recordou este momento em uma conexão telefônica, convidando todas as pessoas que fazem parte do Movimento a renovar a própria doação a Deus.

[…] E hoje, com um olhar retrospectivo, conseguimos compreender qual significado podia nos revelar o Movimento, várias décadas atrás, naquele 7 de dezembro de 1943, ano em que nasceu. Essa retrospectiva afirma que um carisma do Espírito Santo, uma nova luz desceu naqueles dias à Terra, e ela, na mente de Deus, deveria saciar a aridez deste mundo com a água da Sabedoria, aquecê-lo com o amor divino e, assim, dar vida a um povo novo, alimentado pelo Evangelho. […] Ele decidiu chamar a mim, uma jovem qualquer. Por essa razão, consagrei-me a Ele, pronunciei o meu “sim” a Deus, seguido imediatamente por muitos outros “sim” de moças e rapazes.

Aquele dia fala de luz e de doação de criaturas a Deus, como instrumentos que se colocam em suas mãos para realizar os seus objetivos. Luz e doação da própria vida a Deus, duas palavras extremamente úteis naquele período de desorientação geral, de ódio recíproco, de guerra. Tempo de trevas, em que Deus parecia não estar presente no mundo com o seu amor, com a sua paz e a sua orientação, e parecia que ninguém se interessasse por Ele.

Luz e doação da própria vida a Deus, duas palavras que ainda hoje o Céu quer nos repetir; neste momento em que, no nosso planeta, prolongam-se muitas guerras e, principalmente (como realidade mais terrível de todas), em que surgiu o terrorismo.

Luz que significa Verbo, Palavra, Evangelho, ainda muito pouco conhecido e muito pouco vivido.

Essas doações a Deus, hoje, são mais do que nunca necessárias e oportunas, uma vez que, pelas causas que inspiram o terrorismo, homens e mulheres estão dispostos a dar a vida. Pois bem, qual deve ser a nossa atitude de cristãos, que seguimos um Deus que foi crucificado e abandonado, para que nasça um mundo novo, para nos doar a salvação e a Vida que não terá ocaso? […]

Retomemos a caminhada em direção ao mundo que espera, acima de tudo como Evangelhos vivos, para poder mergulhá-lo na Luz.

Podemos fazer isso continuando a viver a vontade de Deus no momento presente […],  sem esquecer de viver a “Palavra de Vida”, extraída da Escritura, que nos é proposta a cada mês. […]

E, como se nascêssemos outra vez, renovemos a nossa doação completa a Deus, na forma escolhida por Ele para cada um de nós. Assim, também o presente e o futuro que Deus nos doará, serão do seu agrado.

Chiara LUBICH

29 novembro 2021

Jesus abandonado

Carta de Chiara à Jesus Abandonado

Caro Jesus,
Escolhi como minha herança o teu abandono, quando me sinto abandonada.
Reconheço, muitas vezes ao dia, que Tu morreste pelos meus pecados e pelas minhas infidelidades; mas quando cometo algum pecado, perco a paz, como se não pudesse ser mais perdoada.
Iludo-me dizendo que é delicadeza de consciência a obsessão que minhas infidelidades provocam em mim, mas na verdade, trata-se de orgulho refinado.
Ainda que tivesse cometido de olhos abertos, que importa, Jesus?
Seria a prova de que não te amo, mas não deve ser motivo para não te amar no futuro, pelo contrário!
Acreditar no teu amor, mesmo se sou mesquinha, quer dizer ser fiel à tua herança. O teu Amor seria menos divino se me amasses por eu ser virtuosa. Reconhecer-te, abraçar-te nas humilhações que seguem minhas infidelidades agrada-te pois, então, só o amor te pode reconhecer. A inteligência não chega a tanto.
“Aquele que não ama não conhece a Deus, porque Deus é Amor” (Jo 4,8).
O Ideal da santidade não consiste na alegria que experimento depois de uma vitória sobre mim mesma e tampouco no me sacrificar pelos irmãos até a morte com a certeza de Te agradar; seria demasiado.
O Ideal da santidade consiste em Te procurar quando não te sinto, quanto por ter seguido minha natureza, Te sinto distante.
A santidade não consiste em ser sem defeitos, mas em acreditar no teu Amor, não obstante, a precisamente, pelos meus defeitos.
Faz, Jesus Abandonado, que eu seja fiel à tua herança que, num arrebatamento de amor, escolhi para mim. 

Chiara LUBICH

28 novembro 2021

O amor recíproco

Já dissemos outras vezes que o núcleo fundamental da espiritualidade da unidade, característica do Movimento dos Focolares, é o amor, em especial, o amor recíproco.
Mas o amor recíproco é, antes de tudo, o mandamento de Jesus por excelência, como ele mesmo disse:
"Eis o meu Mandamento: amai-vos uns aos outros como eu vos amei ".
Assim Jesus propôs um modelo desse amor "como Eu vos amei ", o modelo que é ele mesmo.
Depois acrescentando "Ninguém tem maior amor do que aquele que dá a vida por seus amigos ", determinou a medida que deve ter nosso amor. A sua mesma medida: dar a vida.
É por isso que no Movimento se busca ter essa medida no amor, procurando estar sempre prontos a morrer uns pelos outros. Naturalmente não nos é pedida a vida em cada momento, mas esta prontidão deve constituir a base de cada  ato nosso de amor aos irmãos.

O que representa, portanto, o amor recíproco no Movimento?

É o seu distintivo, assim como era para os primeiros cristãos. Eles não se distinguiam das outras pessoas pelos grandes empreendimentos, pelas obras grandiosas, pelos profundos estudos, pela eloqüência brilhante, nem mesmo pelos milagres.
Eles se distinguiam pelo amor recíproco. Essa era a realidade. "Vede como se amam - diziam os pagãos - e como estão prontos a dar a vida uns pelos outros ".
É assim também que procuramos fazer - com a graça de Deus - no nosso Movimento; é este o nosso esforço.
Desde o início o Espírito Santo acentuou de tal forma a necessidade da recíproca caridade, para poder chamar-se cristãs, que as primeiras focolarinas fizeram um pacto. Olhando-se umas às outras, disseram: "Eu estou pronta a morrer por você... Eu por você..."E todas por cada uma. Esse foi como um alicerce para a construção desse Movimento.
O amor recíproco é tão importante que sempre tivemos em grande consideração a frase de São Pedro: "Antes de tudo mantenham entre vocês a mútua e contínua caridade ".
"Antes de tudo". Esta é a base que vem antes de qualquer atividade nossa: dos estudos, do trabalho, da oração... Não podemos fazer nada se não tivermos assegurada a mútua e contínua caridade; nem trabalhar, nem dormir, nem comer, nem mesmo rezar... Esta é a plataforma de tudo, o resto se constrói sobre isso.
Pode ser que vocês já tenham escutado uma oração que diz assim: "Tu nos deste o teu Espírito para fazer de todas as nações um só povo novo que tem por Estatuto o preceito do amor ".
Esta frase impressionou-nos profundamente pois constatamos, mais uma vez, como o "Estatuto do Povo de Deus " e, portanto, de toda a Igreja, é o Mandamento do Amor. E relacionamos este Estatuto com o da nossa Obra de Maria, no qual está escrito que a regra básica, a norma na qual todas as outras normas têm valor e sem a qual nada tem sentido (nem a oração, nem o apostolado, nem o dar os próprios bens) é Jesus no meio, efeito do amor recíproco.
E causou-nos grande alegria constatar como o Espírito Santo agiu em relação a nós. Como somos, por assim dizer, um "pequeno povo de Deus " - pois participam da Obra de Maria jovens, adultos, crianças, pessoas de todas as vocações - o Espírito Santo não podia deixar de nos dar por Estatuto, o mesmo Estatuto do "grande Povo de Deus ", isto é: o amor recíproco. Esta é a característica da nossa vida, o nosso típico modo de ser, válido para todos os membros do Movimento.
Então, a primeira conclusão a que chegamos é esta: a única coisa que temos para fazer é viver o mandamento do amor recíproco. O resto vem como conseqüência, porque o amor ilumina todos os outros nossos deveres. Experimentemos viver assim o dia inteiro! É uma experiência que merece ser feita.
Pois, fazendo a experiência constatamos que a atuação do Mandamento Novo de Jesus é que dá o " brilho ", o "esmalte" o "último retoque" à nossa vida cristã, à comunidade dos seguidores de Jesus. Porém, muitas vezes, falta este "brilho " nas comunidades cristãs, porque o amor recíproco não vem em evidência.
Sem dúvida, a freqüente falta de atuação do Mandamento Novo de Jesus por parte daqueles que deveriam vivê-lo, deve-se a muitos obstáculos que se apresentam. Um deles, por exemplo, é o amor próprio; muitas vezes olhamos somente para nós mesmos e não pensamos no próximo: a nossa preocupação não é "amar ".
Ou então, somos vaidosos, apegamo-nos às nossas idéias, queremos salvar as aparências, a fama, a boa reputação, procuramos satisfação humanas e espirituais... E nos esquecemos de colocar em prática o Mandamento do amor recíproco. O que devemos fazer; então, para deixar caminho livre ao amor, ao amor recíproco?
A segunda conclusão à qual podemos chegar é esta: 
Nós sabemos que o caminho pelo qual nos conduz a vivência da espiritualidade da unidade é eminentemente positivo. O nosso empenho, portanto, não é tanto "tirar" os nossos defeitos, mas "acrescentar" algo na nossa vida, acrescentar amor.
E para manter perfeito, íntegro e constante o nosso amor recíproco, é necessário de nossa parte um esforço constante em viver para o outro, ou como nós dizemos, "viver fora de nós mesmos ".
Por exemplo, surge dentro de mim um pensamento de orgulho? Digo a mim mesma: "deixo de lado este pensamento", e coloco-me à disposição para amar quem estiver mais próximo, ao meu lado. Tenho vontade de comprar algo, algum objeto que é desnecessário, supérfluo? Procuro vencer este desejo. Somos levados a assistir certos programas de televisão, ou ler certos livros, revistas, que nada constróem? Deixemos isso de lado e lancemo-nos a amar quem necessita de nós...
Fazendo assim, o dia inteiro, o amor ocupará cada vez mais espaço na nossa vida e quando estivermos diante de cada pessoa, será mais espontâneo interessar-me concretamente por eles... Se entre nós fizermos assim, o amor recíproco se tornará mais forte e será sempre mais a nossa característica, o nosso modo de viver...

O Mandamento Novo vivido dessa forma produz ainda efeitos extraordinários

Primeiramente, percebemos um salto de qualidade na nossa vida espiritual: experimentamos os dons do Espirito Santo, uma luz nova que nos ajuda a ver os acontecimentos em Deus, provamos uma alegria que nunca experimentamos antes. Sentimos a paz, a paciência para com todos, abrem-se novos horizontes e nos tornamos mais generosos.
Ao mesmo tempo, este amor recíproco, testemunha Cristo ao mundo. Muitas vezes, nós nos encontramos num mundo descristianizado, sem Deus, e a nossa maneira característica de testemunhá-lo é justamente o amor recíproco "Nisto reconhecerão que sois meus discípulos, se tiverdes amor uns para com os outros ".
O amor recíproco é também um amor que conquista o mundo para Cristo. Jesus disse: "Que todos sejam um (mediante o amor) para que o mundo creia ". E o mundo realmente crê quando vê o testemunho do amor recíproco.
Outra conseqüência muito importante da vivência do amor recíproco é que  nos leva a colocar em comum os bens materiais e espirituais.
Pratica-se a comunhão dos bens materiais desde o início do Movimento e recentemente, de forma mais explicita ainda.
Podemos dizer que a comunhão de bens já existente é como um sinal profético, pois mesmo se ainda acontece em pequena escala já pode mostrar ao mundo como ele seria se os homens fossem unidos.
Quando os bens, que atualmente são causa de divisões entre pessoas e países, puderem ser partilhados, muitos dos atuais problemas estarão resolvidos.
Para atuar o Mandamento Novo  coloca-se em comum não só os bens materiais, como também os bens espirituais. As belas experiências que a nova vida comporta, são comunicadas por amor, como as experiências da Palavra de Vida.
Colocando em comum os bens espirituais, para a edificação mútua, contribui-se para a santificação do outro como para a própria. E o amor leva a santificar-nos todos juntos.
Lembrando o que dissemos no início, a característica essencial dos primeiros cristãos, o modo como eram reconhecidos pelos pagãos era justamente: "Vede como se amam e estão prontos a morrer uns pelos outros ".
Isto talvez dependia também do fato de que, naqueles tempos de perseguição, não era raro o caso de alguém se oferecer para morrer no lugar do outro. Todavia, permanece o fato que esta medida de amor entre os primeiros cristãos era visível, eram reconhecidos justamente por isto.
Será que nós também podemos ser reconhecidos hoje por este mesmo amor recíproco, por este amor que se vê, e que existia entre os primeiros cristãos?
Vamos "elevar o termômetro " da nossa caridade recíproca de modo que mesmo um simples sorriso, um gesto, uma palavra, um conselho, um elogio e até uma correção, dirigidos aos irmãos,  revelem a nossa disposição de estar prontos a morrer por eles.         Que nosso amor seja visível.

Em nossa Obra tudo é animado pelo amor recíproco.

Não podemos fazer nada se antes não existir esse amor, que traz a presença de Jesus no nosso meio. Todas as nossas atividades, também as Mariápolis, as Jornadas, os diversos encontros como este, apoiam-se sobre esses pilares.
O nosso Movimento quer levar ao mundo, antes de tudo com o seu exemplo, o amor recíproco de forma que se realize a unidade. Mesmo porque o seu primeiro objetivo é contribuir para a realização do "Que todos sejam um".
E foi através desse amor recíproco vivido, que esse ideal se estendeu sobre toda a terra, de irmão a irmão, de todas as nações, idades, condições sociais, crenças religiosas. E ainda hoje continua a difundir-se sempre mais intensamente, para chegar à nossa meta, que é a unidade.
Por isso, queremos partir daqui com um desafio dirigido a cada um e a todos: vamos fazer a experiência de viver entre nós o amor recíproco, este "amor que se vê " e que se irradia ao nosso redor.
Vamos viver assim, ser assim, amar assim, a cada dia. E à noite nos encontraremos transformados e com um novo entusiasmo pela maravilhosa e divina vida que Deus nos deu. E veremos, pouco a pouco, também o mundo ao nosso redor, se transformar.  


25 novembro 2021

Muitas vezes o amor não é amor

Porque muitas vezes o amor não é amor no mundo, vale para ele o ditado: «O amor é cego». Mas, se uma alma começa a amar, como Deus ensina — Deus que é Amor — vê logo, logo, que o amor é luz. De resto, Jesus o disse: «E quem me ama, será amado por meu Pai. Eu o amarei e a ele me manifestarei» (Jo 14,21).
Um turbilhão de vozes de procedências as mais variadas inunda com freqüência a nossa alma, sobretudo quando ela não sabe bem o que seja amar a Deus. São vozes insonoras, mas fortes: vozes do coração, vozes do intelecto, vozes de remorso, vozes de saudade, vozes das paixões... E nós seguimos ora uma, ora outra, preenchendo o nosso dia com atos que concretizam aquelas vozes ou ao menos são, de algum modo, determinados por elas.
Por isso, às vezes, a vida, ainda que vivida na graça de Deus, tem somente breves réstias de Sol; e tudo o mais fica imerso em um tédio, que uma voz, mais forte do que todas as outras, levanta-se amiúde para condenar, como a dizer que aquela não é a verdadeira vida, a vida plena.
Se, ao contrário, a alma se volta para Deus e começa a amá-lo, e seu amor é verdadeiro, é concreto, é de cada instante, de vez em quando percebe uma voz, entre as muitas que acompanham a vida.
Mais do que voz, é uma luz que se infiltra suavemente no intrincado concerto da alma. E um pensamento quase imperceptível que a ela se oferece, mais delicado talvez do que os outros, mais sutil.
Esta é, às vezes, voz de Deus.
Então, a alma que se decidiu pelo Senhor, que com Ele não regateia, mas a Ele tudo quer dar, extrai do pântano aquele repuxo límpido e sereno; é uma safira em meio a tantos seixos; é como o ouro em meio ao pó.
Toma-o, limpa-o, expõe-no e o traduz em vida.
Se, porventura, aquela alma decidiu caminhar para Deus com outras, a fim de que o Pai se rejubile com o amor fraterno entre os seus filhos, ela — depois de se aconselhar com quem lhe representa Deus na terra — comunica, com discrição, o seu tesouro aos outros, para que o bem seja comum, o divino circule e, como numa competição, um aprenda do outro a amar melhor o Senhor.
Agindo assim, a alma amou em dobro: amou ao fazer o que Deus queria, amou ao comunicar aos irmãos. E Deus, fiel a suas palavras eternas, continuará progressivamente a se revelar a ela.
Tudo isto é sumamente desejável, até que o nosso coração seja imerso o dia inteiro só em pensamentos de Céu, a ponto de transbordar; e a nossa vida, alimentada pelos Sacramentos, seja por eles identificada.
Damos Deus, se o temos; e o temos, se o amamos.
Então, poderão acender-se pequenos sóis, no mundo sombrio e monótono, que apontarão a muitos o caminho. Sóis que aquecerão, na humildade total de suas vidas completamente imoladas ao Senhor, em que eles já não falam, mas fala Ele; em que já não vivem, mas vive Ele.


Chiara LUBICH

Giordani e a família

«Principal função da família é crescer e multiplicar: aumentar a vida, cooperar na obra criativa do Criador. A sua unidade não se interrompe, mas aumenta e se prolonga na prole. Na prole o amor dos esposos encarna-se, a unidade torna-se pessoa: pai, mãe, filho, formam uma vida à imagem e semelhança – de alguma maneira – da divindade da qual foram criados e são vivificados. Três pontos pelos quais passa o circuito do único amor, que parte e se alimenta do amor de Deus». (Giordani, 1942).

Ao traçar o perfil divino da família, nesse texto Giordani antecipa o que em seguida será declarado nos textos do Vaticano II, seja salientando o privilégio dos esposos de «cooperar na obra criativa do Criador», seja ao ver a família como espelho da vida trinitária, da qual deriva o seu desígnio. Uma doutrina muito amada por João Paulo II, que a inserirá como tema de suas históricas catequeses sobre o amor humano, na década de 1980.

No dia 23 de junho passado, a Comissão preparatória do Sínodo divulgou o Instrumentum Laboris, objeto de reflexão para os padres sinodais no próximo mês de outubro, para depois propor ao Santo Padre possíveis soluções a serem atuadas em favor da família. O documento, centralizado na vocação e missão da família, inicia com um olhar sobre as múltiplas problemáticas que investem a família hoje e os graves desafio culturais e sociais que a comprometem. Mas tal situação crítica não foi percebida apenas nesses tempos. Em 1975, uma carta do episcopado do Quebec continha uma análise preocupante nesse sentido. A carta tocou profundamente Giordani, ao ponto que citou alguns trechos dela num seu escrito, para depois oferecer a sua mensagem, alta e luminosa, a todas as famílias:

«As dificuldades da vida não esmagam uma família ancorada em Deus; enquanto que, em casos demais, a destroem porque ancorada apenas no dinheiro. A união dos cônjuges é a força deles: mas a união é fruto do amor. Amarem-se, portanto, faz parte do interesse terreno e celeste deles, aproveitando as provações, os sofrimentos, os desenganos, para santificar-se.

O matrimônio não une somente os esposos um ao outro, enquanto esposos, pai e mãe: une-os a Deus. Essa unidade em Deus, do homem e da mulher, dos pais e dos filhos, é o sentido mais profundo do matrimônio e da família». (Giordani, 1975).

Do Centro Igino Giordani

Trechos retirados de: Igino Giordani, Família comunidade de amor, Città Nuova, Roma, 2001 e Igino Giordani, A sociedade cristã, Città Nuova, Roma, 2010


23 novembro 2021

Acima de tudo, revesti-vos do amor

«Mas, acima de tudo, revesti-vos do amor, que é o vínculo da perfeição.»

Estas palavras são decisivas para a nossa vida e o nosso testemunho no mundo. Para explicar a conduta do cristão, Paulo gosta muito de empregar a imagem das vestes que o seguidor de Cristo deve usar. E também aqui, na Carta aos Colossenses, ele compara as virtudes, que devem tomar lugar no nosso coração, a muitas peças de roupa. São elas: a misericórdia, a bondade, a humildade, a mansidão, a paciência, o suportar, o perdão.

Mas, "acima de tudo, revesti-vos do amor" - afirma Paulo, quase que imaginando o amor como uma cintura que une tudo e dá um perfeito caimento ao vestuário. Portanto, é necessário o amor porque para um cristão não basta ser bom, misericordioso, humilde, manso, paciente... Ele deve amar os irmãos e as irmãs.

Mas alguém poderá questionar: amar não é, por acaso, ser bons, misericordiosos, pacientes, saber perdoar? Sim, mas não é só isso.

O amor foi-nos ensinado por Jesus e amar consiste em dar a vida pelos outros. O ódio tira a vida dos outros ("quem odeia é homicida"), o amor lhes dá a vida. Somente morrendo a si mesmo pelos outros é que cada cristão possui o amor. E se ele tem o amor - diz Paulo -, será perfeito, e todas as suas demais virtudes alcançarão a perfeição.

«Mas, acima de tudo, revesti-vos do amor, que é o vínculo da perfeição.»

Certamente alguns de nós podem ter uma boa disposição para com os irmãos e as irmãs, perdoando e suportando. Mas, se observarmos bem, aquilo que frequentemente nos falta pode ser justamente o amor. Mesmo com as mais santas intenções, a natureza nos leva a nos fecharmos em nós mesmos e, conseqüentemente, quando amamos os outros, usamos meias medidas.

Porém não somos cristãos se agirmos unicamente assim. É preciso elevar o nosso coração à tensão máxima. Diante de cada próximo que encontramos durante o dia (na família, no trabalho, em toda parte), devemos dizer a nós mesmos: "Coragem, responda a Deus; é o momento de amar, com um amor tão grande que põe em jogo também a vida".

«Mas, acima de tudo, revesti-vos do amor, que é o vínculo de perfeição.»

Esta Palavra do Apóstolo convida-nos, portanto, a examinar até que ponto nossa vida cristã é animada pelo amor, o qual, como vínculo de perfeição, é a ligação que nos leva à mais alta unidade com Deus e entre nós.

Agradeçamos, então, ao Senhor por ter derramado em nossos corações o seu amor, que nos torna sempre mais capazes de escutar, de identificar-nos com os problemas e com as preocupações dos nossos próximos; de partilhar com eles o pão, as alegrias e as dores; de derrubar certas barreiras, que ainda nos dividem; de deixar de lado certas atitudes de orgulho, de rivalidade, de inveja, de ressentimento por eventuais ofensas recebidas; de superar a terrível tendência à crítica negativa; de sair do nosso isolamento egoísta para colocar-nos à disposição de quem está em necessidade ou na solidão; de construir, por toda parte, a unidade que Jesus deseja.

É esta a contribuição que nós, cristãos, podemos dar à paz mundial e à fraternidade entre os povos, especialmente nos momentos mais trágicos da história.


Chiara Lubich
Fundadora dos Focolares
Palavra de vida, Dez de 2001

22 novembro 2021

Uma contradição

O homem foi criado para ser feliz e buscar a felicidade: ele a deseja, suspira por ela, mas dificilmente a encontra. Toda manhã eu me consagro a Jesus Abandonado, e é só através dele que eu encontro a paz, a luz, ou, numa palavra, a felicidade. Poderia dizer algo a respeito desse fato, que parece uma contradição?

Parece uma contradição, mas não é.
Sabemos que em cada dor devemos ver o semblante de Jesus Abandonado. Isso porque se somos, por exemplo, incompreendidos, vemos nele “o incompreendido”; se caímos numa “armadilha” podemos ver naquilo que lhe aconteceu uma “armadilha”; se nos sentimos fracassados, vemos nele alguém que também se sentiu “fracassado”...
Jesus Abandonado está presente em cada dor; por isso, é preciso abraça-lo dizendo-lhe do fundo do coração: “Es tu, e eu te quero; a ti eu me doei”.
Depois, no momento seguinte, deve-se passar a amar o próximo ou qualquer outra vontade de Deus.
E então você perceberá que aquela dor desaparece. Às vezes, você se surpreende ao sentir que a dor realmente se foi, não existe mais, e se sente em paz e livre para caminhar, viver e amar.
O fato é que, numa espiritualidade cristã como a nossa – que tem como referencia a paixão de Jesus –, o crucifixo, Jesus Abandonado, está intimamente ligado ao Espírito Santo. E quando, como Jesus, também nós dizemos que é chegada a nossa hora de sofrer, que por isso a queremos porque é um aspecto de Jesus Abandonado, e a aceitamos como Jesus aceitou a dor, também nós experimentamos o Espírito Santo. O que sentimos de belo, de livre, de amor, em nosso coração, é efeito do Espírito Santo.
Não se trata, pois, de uma contradição encontrar em Jesus Abandonado a paz e a alegria. É, ao contrário, uma coisa lógica, segundo a paixão de Jesus, segundo o mistério da salvação.

Chiara Lubich


11 novembro 2021

Qual a escolha certa?

Castel Gandolfo, 12 de janeiro de 1988

Aproxima-se para nós a idade da escolha para a nossa vida. Como podemos fazer para entender qual é a escolha certa? Como distinguir a vontade de Deus das nossas fantasias e dos nossos desejos?

Diria que vocês devem ser iluminadas pelo íntimo de vocês. É preciso que seja Jesus que lhes diga qual será o caminho de vocês: casarem-se, entrarem para o convento ou para o focolare1, dedicarem-se à arte ou à política. E não vocês. E, para serem iluminadas, devem amar. Portanto, continuem a viver o Ideal, viver o Ideal, viver o Ideal. Foi assim que fiz: procurava amar, amar, e Jesus me chamou; senti fortemente que Ele queria isso. Portanto, amem, amem, amem, sigam em frente, vivam o Ideal, e Ele iluminará vocês e as fará entender seus caminhos. E depois, aconselhem-se também com alguém que possui mais experiência, porque pode ser que vocês tenham receio de confundir as fantasias com o chamado de Deus. […]

Então, duas coisas: viver o Ideal e pedir conselhos a pessoas um pouco mais maduras que já fizeram as próprias escolhas, para que ajudem vocês a diferenciar bem se o que têm no íntimo vem da fantasia ou se é justamente a vontade de Deus.

Chiara Lubich 

04 novembro 2021

A sua escolha

Além disso, aquela circunstância guardava uma mensagem para nós: Jesus Abandonado apresentava-se pela primeira vez, para que o escolhêssemos, ou melhor, para que Ele nos escolhesse, para que nos convidasse a ser suas discípulas: “Não fostes vós que me escolhestes, mas fui eu que vos escolhi” (Jo 15,16).

Portanto, Ele se colocava à frente de uma multidão de gente que, conosco, o seguiram, o seguem e o seguirão.

E não tivemos dúvidas.

Foi um chamado forte e decisivo, o seu.

Dessa forma, Jesus Abandonado logo se tornou o nosso tudo.

#ChiaraLubich 

02 novembro 2021

A maior dor

Mas, quase simultaneamente, vemos que, ao adjetivo “crucificado”, vem juntar-se um outro: “abandonado”.

O que significa isto? Como se deu a manifestação de Jesus Abandonado como vocação específica nossa?

Em 24 de janeiro de 1944, um sacerdote nos dissera que a maior dor de Jesus foi quando gritou na cruz: “Deus meu, Deus meu, por que me abandonaste?” (Mt 27,46; Mc 15,34).

Na época, ao contrário, o pensamento corrente entre os cristãos era que fora a dor sentida no Getsêmani. Mas nós, tendo uma grande fé nas palavras do sacerdote porque ministro de Cristo, acreditamos que a dor do abandono fora a dor máxima.

Por outro lado, sabemos hoje que essa convicção está-se tornando patrimônio comum da teologia e da espiritualidade.

O encontro com aquele sacerdote foi uma circunstância extrínseca, mas — constatamos isso agora — era a resposta que Deus dava a uma prece nossa, quando, fascinadas pela beleza do seu Testamento, nós, primeiras focolarinas, todas unidas, havíamos pedido a Jesus, em seu nome, que nos ensinasse a realizar a unidade, que Ele rogara ao Pai antes de morrer.

E até hoje, nestes cinquenta e seis anos de vida do Movimento, sempre experimentamos que é justamente o amor a Jesus crucificado e abandonado aquilo que possibilita colocar em prática a unidade.


#ChiaraLubich

31 outubro 2021

O livro dos livros

E que o Crucificado se tenha manifestado bem cedo na vida das primeiras focolarinas com a necessidade de imitá-lo, para concretizar o nosso amor a Deus, no-lo atestam alguns conceitos de uma carta minha, datada talvez de 1944.

Mando para vocês um pensamento que sintetiza toda a nossa vida espiritual: Jesus crucificado!

Tudo está aqui.

É o livro dos livros.

É a síntese de todo saber.

É o amor mais ardente.

É o modelo perfeito.

Proponhamos que ele seja para nós o único ideal da vida.

Foi ele quem arrebatou são Paulo a tamanha santidade…

Nossa alma, carente de amar, ponha-o sempre diante de si em cada momento presente.

Não seja sentimentalismo o nosso amor.

Não seja compaixão exterior.

Seja conformidade (a ele).

#CHIARALUBICH 

29 outubro 2021

Quem é o amor?

Um precedente da nossa história.

Não havia ainda o primeiro focolare. Nem eu conhecia ainda a primeira de minhas companheiras. Eu era professora. Um dia, aproximou-se de mim uma pessoa muito atuante, uma dirigente de um grupo de jovens que ela conseguira atrair para a religião com encontros recreativos, músicas, histórias divertidas. Perguntou-me se eu podia fazer uma palestra para eles. Respondi afirmativamente.

“Sobre o que você vai falar?”, perguntou-me. “Sobre o amor”, disse. “E o que é o amor?”, prosseguiu, curiosa. “Jesus crucificado”, respondi.

Talvez tenha sido essa a primeira vez em que falei d’Ele, em minha vida de futura focolarina.

Naquela época, até em ambientes notoriamente fiéis à religião, como aquele de onde todas nós provínhamos, não era comum ouvir-se falar de amor. E muito menos acreditar que o Crucificado, que atrai todos a si, fosse uma arma válida para o apostolado, inclusive neste século.

Mas — confesso — até hoje não sei quem me pôs nos lábios aquela definição do amor.

Mais tarde entendi: Jesus crucificado — é o que também diz são Paulo — “se entregou por nós” (Ef 5,2), “se entregou a si mesmo por mim” (Gl 2,20).

#ChiaraLubich 

27 outubro 2021

Como a Igreja

Foi exatamente no abandono de Jesus na cruz que, desde o início do Movimento, Deus concentrou a nossa alma e foi nesta dor e por esta dor, ponto culminante da Paixão, que o nosso Movimento se desenvolveu.

Os fatos se desenrolaram como vou explicar; entretanto, é possível fazer uma constatação desde já: as linhas da grande história da fundação da Igreja, de certo modo, também se encontram na história do nosso Movimento, que é Igreja, feitas as devidas proporções. É uma obra, a nossa, que tem a fisionomia de sua Mãe, como afirmou João Paulo II em agosto de 1984: “Vejo que seguis de modo autêntico aquela visão da Igreja, aquela definição que a Igreja deu de si mesma no Concílio Vaticano II” (João Paulo II, 1984, p. 25).

Sabemos que o ponto de partida da salvação do gênero humano foi o amor de Jesus pelo Pai. Esse amor estimulou Jesus a cumprir o que o Pai desejava, isto é, a fazer a vontade do Pai. Mas a vontade do Pai se resumia praticamente em amar os irmãos e Jesus deu sua vida por amor a eles: “Ninguém tem maior amor do que aquele que dá a vida por seus amigos” (Jo 15,13), dissera Ele.

Ora, se observarmos o nosso Movimento, vemos que ele também parte de um desejo de amor: amar a Deus, redescoberto como Amor, como Pai, nos primeiros dias de nossa história.

Também para nós, esse amor se traduzia e se traduz em fazer a vontade de Deus, que se resume no Mandamento Novo: “Amai-vos uns aos outros como eu vos amei” (Jo 15,12).

De modo que, inclusive para nós, amar a Deus tem este significado: estarmos prontos a morrer uns pelos outros (cf. Jo 15,13).

#ChiaraLubich 

25 outubro 2021

O apostolado como culto

Mas, pensando ainda nos primeiros cristãos, vemos que para eles o apostolado era, e de um modo especial, um culto.

Paulo diz: “Deus, a quem sirvo em meu espírito, anunciando o Evangelho do seu Filho, é testemunha…” (Rm 1,9).

Anunciando o Evangelho, o apóstolo faz a vontade de Deus e se oferece como vítima.

Anunciando o Evangelho, o apóstolo faz ainda um verdadeiro sacrifício, oferecendo a Deus os convertidos por ele, que aparecem como vítimas transformadas pelo Espírito Santo de “carnais” em “espirituais” (cf. Rm 15,16).

Muitas vezes, eles eram chamados “primícias” (termo usado geralmente para o culto): “Nós, porém, sempre agradecemos a Deus por vós, irmãos queridos do Senhor, porque Deus vos escolheu como primícias” (2Ts 2,13).

Não é talvez este o culto característico, que também o nosso Movimento eleva a Deus?

No fundo, a ação da nossa Obra não é senão converter-nos e reconverter-nos a Deus, e converter e reconverter muitas e muitas pessoas.

Também nós temos, em nós e em muitos, vítimas espirituais e primícias a oferecer a Deus no mundo inteiro.

Portanto, sintamo-nos felizes porque a nossa vida, toda a nossa existência, vivida segundo as linhas que nos foram dadas por Deus e são abençoadas pela Igreja — vontade de Deus para nós — é um culto contínuo, que oferecemos a Deus, é expressão genuína do sacerdócio real que nos investe a todos.

1 “(E) naquele momento tudo se inverte. Em Jesus, a vontade humana, como no Getsêmani, consente. “Pai, em tuas mãos entrego o meu espírito.” Desaparece o abismo do desespero como uma gota de ódio irrisória no abismo infinito do amor. A distância entre o Pai e o Filho não é mais o lugar do inferno, mas do Espírito” (Bartolomeu I, 1994, p. 7).

2 “Tudo está consumado”. [N.d.T.]

3 Remetendo “explicitamente nas mãos do Pai divino o eterno vínculo de união que a Ele o unia, o Espírito Santo”, Jesus experimenta “até o fim o abandono completo também po r parte do Pai”, morre “nas trevas extremas abandonadas pelo Espírito” (Balthasar, 1969, pp. 30-48).

4 “Não sabeis que todos os que fomos batizados em Cristo Jesus, é na sua morte que fomos batizados? Portanto, pelo Batismo nós fomos sepultados com Ele na morte para que, como Cristo foi ressuscitado dentre os mortos pela glória do Pai, assim também nós vivamos vida nova” (Rm 6,3-4).

#ChiaraLubich 

23 outubro 2021

Sacerdotes também nós

Mas o fato de o Apóstolo falar de sacrifício vivo e de culto espiritual significa que também nós somos sacerdotes, daquele sacerdócio “real” conferido a todos os cristãos no Batismo.

De fato, Pedro exorta:

Também vós, como pedras vivas, constituí-vos em um edifício espiritual, dedicai-vos a um sacerdócio santo, a fim de oferecerdes sacrifícios espirituais aceitáveis a Deus por Jesus Cristo. (1Pd 2,5).

E o Apocalipse diz dos cristãos: “serão sacerdotes de Deus e de Cristo” (20, 6).

Na verdade, cada cristão é sacerdote em Jesus, porque a unidade já foi restabelecida, o acesso a Deus não se reserva mais ao sumo sacerdote uma vez por ano, como no Antigo Testamento, mas a todos os batizados, que se tornaram “uma raça eleita, um sacerdócio real” (1Pd 2,9).

O culto que o Pai quer de nós é um culto espiritual (“sacrifícios espirituais”, diz Pedro), como Ele quis do próprio Jesus.

A oferenda consiste — segundo Paulo — em se transformar e se renovar na mente, “a fim de poderdes discernir qual é a vontade de Deus” (Rm 12,2).

Discernir qual é a vontade de Deus para fazê-la.

Fazer aquela vontade de Deus, a que também o nosso Movimento dá tanto relevo, como expressão do nosso amor a Deus.

E a vontade de Deus, que seguimos, faz-nos ao mesmo tempo sacerdotes e vítimas. Talvez Deus tenha suscitado nosso Movimento visando também a esta finalidade: contribuir para reavivar o sentido sacerdotal no povo cristão, como almeja o Concílio Vaticano II (cf. LG 10 e 34), consoante o estilo dos primeiros cristãos.

#ChiaraLubich 

21 outubro 2021

A parte que nos cabe

Mas, para usufruir de tanta graça, o homem também deve fazer uma pequena parte. Antes de mais nada, deve aceitar na fé este dom de Deus, que lhe é transmitido no Batismo. Nele, fomos mortos e sepultados com Cristo. E, por ele, ressuscitaremos4.

Além disso, Deus nos deu também um corpo para que, por meio dele, lhe obedeçamos.

Uma obediência que significa cumprir a sua vontade, já que fomos santificados e transformados em irmãos de Jesus.

Daqui provém a nossa possibilidade de fazer também da nossa vida um sacrifício.

Paulo assim se expressava:

Eu vos exorto, pois, irmãos,  em nome da misericórdia de Deus, a vos oferecerdes vós mesmos em sacrifício vivo, santo e agradável a Deus: este será o vosso culto espiritual. (cf. Rm 12,1)

#ChiaraLubich 

19 outubro 2021

Jesus Abandonado, mestre da unidade

No abandono, Jesus é mestre de unidade, da unidade divina.

O Estatuto do Movimento dos Focolares, documentando uma longa experiência de vida, diz que os membros da Obra,

… em seu empenho para atuar a unidade, amam com predileção — e procuram viver em si mesmos — Jesus crucificado que, no auge de sua paixão, ao gritar: “Deus meu, Deus meu, por que me abandonaste?” (Mc 15,34; Mt 27,46), fez-se artífice e caminho da unidade dos homens com Deus e dos homens entre si.

O amor a Jesus crucificado e abandonado — divino modelo para todos aqueles que desejam trabalhar pela unidade dos homens com Deus e dos homens entre si — leva os membros da Obra àquele desapego exterior e sobretudo interior, que é necessário para realizar toda e qualquer unidade sobrenatural. (Art. 8)

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17 outubro 2021

Jesus Abandonado, nosso irmão

No abandono, reduzindo-se Jesus, por assim dizer, a um simples homem, torna-se nosso irmão. Mas, sendo Deus, elevou a nossa convivência a uma fraternidade sobrenatural, fez-nos um com Ele: “Eu neles e Tu em mim, para que sejam perfeitos na unidade” (Jo 17,23).

Pois, tanto o Santificador quanto os santificados, todos, descendem de um só; razão porque não se envergonha de os chamar irmãos. (Hb 2,11)

Também nós notamos muitas vezes que Jesus, após a ressurreição, chamava os seus discípulos de irmãos.

“Não temais! Ide anunciar a meus irmãos que se dirijam para a Galiléia” (Mt 28,10).


#ChiaraLubich 

15 outubro 2021

Jesus Abandonado, o Redentor

No abandono, Jesus é a figura mais autêntica, mais genuína, mais plena, mais expressa do Redentor. Aqui a redenção tem o seu ápice.

Diz Pasquale Foresi:

Jesus Abandonado é o símbolo, é o sinal, é a indicação precisa dessa redenção. Mesmo que a redenção se tenha processado em todas as dores espirituais e físicas de Jesus, a dor maior, a que simboliza toda a redenção, teve lugar no momento em que Ele sentiu a separação do Pai. Naquele instante Ele reuniu a humanidade ao Pai.

Portanto, pode-se ver em Jesus Abandonado a dor típica com a qual se consumou a redenção do gênero humano. (Foresi, 1988, pp. 56-57)

No Horto, Jesus se preparava para cumprir a redenção. A sua ressurreição é fruto de sua morte física, mas sobretudo espiritual.

No abandono Jesus é, em ato, o Redentor; é o Mediador: tendo-se feito nada, une os filhos ao Pai.

#ChiaraLubich 

13 outubro 2021

Assim nasce a Igreja

Tendo-nos gerado naquele grito, aqui nasce a Igreja, o povo novo.

Aqui é dado o Espírito Santo.

O Espírito Santo que, como Deus, unia Jesus ao Pai.

E, no abandono, se obscurece em Jesus o vínculo com o Pai.

Diz Chardon:

Sendo o Espírito Santo o verdadeiro Paráclito, isto é, o perfeito Consolador […], produz internamente na alma [de Jesus] uma cruz mais desastrosa [… do que aquela exterior] com a suspensão de suas maravilhosas consolações. (Chardon, 1895, pp. 262.264)

É o preço do dom que o Espírito Santo nos faz, como vínculo que une todos os homens com Jesus e entre eles, formando o Corpo Místico de Cristo, o Cristo total.

É no abandono que o sacrifício de Jesus manifesta todo o seu caráter interior, espiritual, divino.

Dissera Ele à samaritana que se aproximava a hora, e era aquela, em que os verdadeiros adoradores adorariam o Pai em espírito e verdade (cf. Jo 4,23).

Aqui está em Jesus o Adorador por excelência.

#CHIARALUBICH