17 agosto 2019

Uma carta de Chiara

Trento, 12 de abril de 1948

Grido caríssima de Jesus Abandonado


Sua vida está traçada.

As dúvidas, as incertezas de ontem serviram para purificar o seu pequeno coração e prepará-la melhor para receber o grande Sacramento.

Corra feliz, minha primazinha e irmãzinha, por este caminho que Jesus quer.

E torne-se santa.

Lembre que só um é o Amor: Jesus!

Faça com que Ele viva em seu novo lar, amando o seu esposo terreno e deixando-se amar por amor a Jesus.

“Onde dois ou mais estiverem unidos em meu nome, ali estou Eu.”

Estive presente no seu casamento espiritualmente, pois tinha acabado de chegar de Roma e cansadíssima.

Você me sentiu, não?

E sinta-me sempre perto de você. Lembre-se de que o Ideal que o Senhor lhe deu por meu intermédio, Ele agora quer vê-lo realizado em você.

Jesus e Maria a acompanhem sempre e em toda parte; façam seu coração virgem como o deles; lhe deem joias de pequenos inocentes que supliquem do Céu a dádiva que todos nós esperamos: “Que todos sejam Um!”

Fique conosco, agora, Irma querida, como antes, mais do que antes: espiritualmente muito unida conosco, decidida como nós a cumprir a vontade divina.

São Francisco e santa Clara abençoem você

16 agosto 2019

Encantados por Deus

Amsterdam (Holanda), 27 de março de 1982

Quando você começou a viver a vontade de Deus, pensou alguma vez que tanta gente a seguiria?

Realmente, quando comecei a viver procurando fazer a vontade de Deus a cada momento, não pensava mesmo em nada. Estava unicamente fascinada por Deus que me amava, e esse amor era de tal modo um idílio sobrenatural, que eu não via outra coisa senão esse meu relacionamento com Deus. Gostaria de que todos vocês, que receberam o Ideal, tivessem a mesma impressão, porque esse Ideal é um carisma que Deus nos deu, e quem o entende possui uma graça particular. Gostaria de que vocês também sentissem tanto que Deus os ama a ponto de ficarem encantados, porque Ele fez vocês entenderem essa sua graça. Aliás, digo a verdade a vocês, se, quando me consagrei a Deus, tivesse entendido que havia outras coisas além desse relacionamento, se, por exemplo, tivesse entendido que mais tarde nasceria um movimento, isso teria como que “perturbado” o meu relacionamento com Ele. Depois, tudo o mais veio como consequência. E assim deve ser também para vocês.

15 agosto 2019

Um novo horizonte

Caíram nossos projetos e limitações.

Sempre desconfiados de nós mesmos, estávamos perfeitamente abandonados a Deus. Conhecíamos apenas o momento presente e não hipotecávamos o futuro, porque não estava em nossas mãos.

Sabíamos que a vontade de Deus era a vontade de um Pai e podíamos entregar-nos a Ele sem medo. Sem dúvida, Ele teria querido o que quer que fosse para o nosso bem.

A vontade de Deus como Ele no-la manifestava era para nós a expressão do amor do Pai pelos filhos. Portanto – mesmo não enxergando no começo – entregávamo-nos de bom grado a Ele e aos seus desígnios para nós, com toda a confiança e abandono. Nós acreditávamos no amor. […]

Todos nos sentíamos entregues a uma aventura divina sobre a qual nada sabíamos, a não ser que Aquele que no-la propunha e preparava era Deus, um Pai, e que todas as circunstâncias à nossa volta e dentro de nós – tanto por Ele desejadas, quanto por Ele permitidas –, eram vozes do seu amor.

14 agosto 2019

A Vontade de Deus feita bem

9 de outubro de 1965

Hoje, causou-me grande impressão a frase: “Nem todo aquele que me diz: ‘Senhor, Senhor’” (Mt 7,21). Nem… E quantas vezes o nosso amor a Deus é feito de implorações, de palavras… de amor, não ressaltados com igual decisão e força pela vontade de fazer a sua vontade.

Essa sua vontade deve ser uma coisa muito importante, para que o Senhor a afirme nitidamente, sobre uma negação clara de outra atitude da alma.

É que, para Ele, a sua vontade para cada um de nós, em cada momento, é coisa divina, acho; parte, pedrinha necessária de um mosaico, que só contemplaremos em toda a sua completude no “lado de lá”, enquanto que, do lado de cá, por graça sua, é-nos dado vê-lo, de vez em quando, em fragmentos.

Jamais entenderemos o suficiente o que significa estar no momento presente, plenamente, na sua vontade… […]

A ideia para hoje: a sua vontade feita bem, como uma ideia que não me deve abandonar jamais, que impregna até as fibras do meu ser.

13 agosto 2019

Se tiverdes fé

De um escrito de 10 de dezembro de 1949

Se tiverdes fé como um grão de mostarda, direis a esta montanha: transporta-te daqui para lá, e ela se transportará, e nada vos será impossível (Mt 17,20).

Para viver essa Palavra no momento presente, para ser essa Palavra no momento presente, vivo acreditando e agindo de modo que, em mim e à minha volta, seja removida cada montanha e, em seu lugar, viva o Espírito Santo.

Quero ser este milagre vivo: o Espírito Santo encarnado.

Por isso, desapego-me de tudo, momento por momento, inclusive de Deus por Deus, vivendo Jesus Abandonado como objetivo do momento presente.

Jesus Abandonado é a palavra; cada Palavra é Ele.

A fé é o amor. Quem crê ama. Como quem conhece ama.

Ter fé em transportar as montanhas é amar transportá-las. E eu amo transportar, momento por momento, a montanha em mim, para que viva Deus, o Espírito Santo.

Mas – durante o meu dia – quero transportar cada montanha que encontro na alma do irmão ou dos irmãos.

Incinero-as com o amor.

Ou seja, quero aquele peso, aquele abandono, aquela montanha, e acredito (e amo) transportá-la.

É preciso supor que ela não exista, pois quem ama não vê obstáculo.

E a transportarei.

Devo ter no coração apenas uma coisa: amar.

E colocar esse amor na base.

Então, viverei o meu dia inteiro transportando todas as montanhas, incendiando todas as pessoas.

12 agosto 2019

O aspecto nupcial da palavra

De um escrito de 19 de julho de 1949

Do sacrário, Jesus me ensinava que eu devia atraí-lo a mim com o amor, como que aspirando-o em mim, e que se Ele fosse a Palavra de vida, e que, vivendo a Palavra, eu o amaria como Esposa e Ele seria eu… Vivendo cada instante a Palavra.

De um escrito de 24 de julho de 1949

Para viver a realidade das núpcias da minha Alma com o Verbo: “Amor” […], devo ser somente Palavra de Deus.

Cada momento que vivo, a Palavra é um beijo na Boca de Jesus, aquela Boca que só disse Palavras de Vida.

11 agosto 2019

Jesus Abandonado e a Palavra

De um escrito de 19 de abril de 1950

Foi Jesus Abandonado quem nos restituiu a possibilidade de compreender que o Evangelho inteiro estava em uma Palavra evangélica. Esse fato simplificou muito nossa vida e generalizou a evangelização das pessoas. […]

Nosso viver a Palavra é viver Jesus Abandonado.

De um escrito não datado de 1950

Quem Nele fixa a atenção do coração encontra […] o Evangelho puro.

10 agosto 2019

Cada Palavra é amor

Tão forte foi a experiência que, depois de nos termos nutrido longamente da Palavra de Deus, tivemos a impressão de que cada Palavra pronunciada pela boca de Cristo era amor, de modo que uma valia a outra e cada uma valia o seu Testamento.

E concluímos: como na hóstia santa está Jesus inteiro, mas também em cada pedacinho dela está o Cristo inteiro, do mesmo modo Jesus está no Evangelho bem como em cada Palavra sua (cf. santo Agostinho).

09 agosto 2019

Um modo de falar essencial

A quem “se faz um” perfeitamente, Jesus confere uma autenticidade extraordinária ao que diz, um modo de falar essencial, sem coisas supérfluas, sem fanfreluches, que penetra no coração do irmão como uma espada, que queima de verdade o que tem de cair e deixa em pé somente a verdade. E o irmão pode nela crescer, na verdade, que é sinônimo de crescer em Jesus.

08 agosto 2019

Possuir um coração de carne

Devemos ser uma coisa só com o irmão, não de modo ideal, mas real. Não em um tempo futuro, mas no presente.

Ser uma coisa só, ou seja, sentir em nós os sentimentos dos irmãos. Assumi-los como coisa nossa, que a caridade transformou em nossa. Ser eles. E isso por amor de… Jesus no irmão.

Desatar as amarras desse duro coração de pedra e possuir um coração de carne, para amar os irmãos…

07 agosto 2019

Vai além da natureza

“Amarás o teu próximo como a ti mesmo” (Mt 19,19). É uma tensão contínua porque a nossa natureza ama a si mesma.

Não raro, a imprensa noticia desastres, terremotos, ciclones que fazem vítimas, feridos, desabrigados.

Entretanto, uma coisa é estar entre eles, outra é não estar.

E, mesmo podendo oferecer algo para socorrer os outros, nós não somos eles.

Amanhã, poderá acontecer o contrário: eu, num leito de morte (se me for dado um leito!), e os outros lá fora, ao sol, gozando a vida como podem.

“Ama o teu próximo como a ti mesmo”: tudo o que Cristo nos mandou fazer vai além da natureza.

Mas também o dom que Ele nos fez, o dom de que falou à Samaritana, não é de natureza humana.

Por isso, é possível o vínculo com a dor do irmão, com a alegria e com as preocupações do outro, porque temos em nós a caridade, que é de natureza divina.

Com esse amor, ou seja, com o amor cristão, o irmão pode ser realmente confortado e, amanhã, eu posso ser confortado por ele. Assim é possível viver, pois, do contrário, a vida seria bem dura, difícil, e às vezes poderia parecer impossível.

06 agosto 2019

Nos pecadores

Amamos Jesus Abandonado especialmente nos pecadores. Ele, que, por todos nós, se fez maldição, se fez pecado embora não pecador, era o ponto de contato com quem quer que se chamasse homem. Ele é o plano inclinado para todos os homens, inclusive para os mais desventurados. E pensávamos assim: como foi abandonado por todos, cada um no mundo pode dizer: é meu. É meu porque ninguém o quer: refugo do mundo e do Céu. E Jesus Abandonado revelava-se realmente a pérola preciosa para todos os homens que, no fundo, são todos pecadores.

04 agosto 2019

A oração de Jesus (Jo 17,1-26)


1Assim falou Jesus, e, erguendo os olhos ao céu, disse: “Pai, chegou a hora: glorifica teu Filho, para que teu Filho te glorifique, 2e que, pelo poder que lhe deste sobre toda carne, ele dê a vida eterna a todos os que lhe deste! 3Ora, a vida eterna é esta: que eles te conheçam a ti, o único Deus verdadeiro, e aquele que enviaste, Jesus Cristo. 4Eu te glorifiquei na terra, concluí a obra que me encarregaste de realizar. 5E agora, glorifica-me, Pai, junto de ti, com a glória que eu tinha junto de ti antes que o mundo existisse.

6Manifestei o teu nome aos homens que do mundo me deste. Eram teus e os deste a mim e eles guardaram a tua palavra. 7Agora reconheceram que tudo quanto me deste vem de ti, 8porque as palavras que me deste eu as dei a eles, e eles as acolheram e reconheceram verdadeiramente que saí de junto de ti e creram que me enviaste. 9Por eles eu rogo; não rogo pelo mundo, mas pelos que me deste, porque são teus, 10e tudo o que é meu é teu, e tudo o que é teu é meu, e neles sou glorificado. 11Já não estou no mundo; mas eles permanecem no mundo e eu volto a ti. Pai santo, guarda-os em teu nome que me deste, para que sejam um como nós. 12Quando eu estava com eles, eu os guardava em teu nome que me deste; guardei-os e nenhum deles se perdeu, exceto o filho da perdição, para cumprir-se a Escritura. 13Agora, porém, vou para junto de ti e digo isso no mundo, a fim de que tenham em si minha plena alegria. 14Eu lhes dei a tua palavra, mas o mundo os odiou, porque não são do mundo, como eu não sou do mundo. 15Não peço que os tires do mundo, mas que os guardes do Maligno. 16Eles não são do mundo como eu não sou do mundo. 17Santifica-os na verdade; a tua palavra é verdade. 18Como tu me enviaste ao mundo, também eu os enviei ao mundo. 19E, por eles, a mim mesmo me santifico, para que sejam santificados na verdade.

20Não rogo somente por eles, mas pelos que, por meio de sua palavra, crerão em mim: 21a fim de que todos sejam um. Como tu, Pai, estás em mim e eu em ti, que eles estejam em nós, para que o mundo creia que tu me enviaste. 22Eu lhes dei a glória que me deste para que sejam um, como nós somos um: 23eu neles e tu em mim, para que sejam perfeitos na unidade e para que o mundo reconheça que me enviaste e os amaste como amaste a mim. 24Pai, aqueles que me deste quero que, onde eu estiver, também eles estejam comigo, para que contemplem minha glória, que me deste, porque me amaste antes da fundação do mundo. 25Pai justo, o mundo não te conheceu, mas eu te conheci e estes reconheceram que tu me enviaste. 26Eu lhes dei a conhecer o teu nome e lhes darei a conhecê-lo, a fim de que o amor com que me amaste esteja neles e eu neles”.




Nos irmãos

Víamos ainda Jesus Abandonado em cada irmão que sofria. Então, aproximando-nos dos que se assemelhavam a Ele, nós lhes falávamos de Jesus Abandonado. E para todos os que se achavam semelhantes a Ele e aceitavam dividir com Ele a sua sorte, eis que Ele se tornava: para o mudo, a palavra; para quem não sabia, a resposta; para o cego, a luz; para o surdo, o som da voz; para o cansado, o descanso; para o desesperado, a esperança; para o faminto, a saciedade; para o sonhador, a realidade; para o traído, a fidelidade; para o fracassado, a vitória; para o medroso, a ousadia; para o triste, a alegria; para o indeciso, a certeza; para o excêntrico, a normalidade; para o solitário, o encontro; para o separado, a unidade; para o inútil, o que é somente útil. O marginalizado se sentia eleito. Jesus Abandonado era a paz para o inquieto, a casa para o sem-teto, o reencontro para o excluído . Assim, com Ele as pessoas se transformavam e o absurdo da dor adquiria sentido. Como dizem os Padres da Igreja: “Tudo o que foi assumido, foi redimido”. E o teólogo Karl Rahner comenta:

Tudo aquilo que Ele assumiu está redimido, pois assim isso se tornou vida e destino de Deus mesmo. Ele assumiu a morte; portanto, a morte deve ser algo mais do que um ocaso no vazio absurdo. Ele assumiu ser abandonado; portanto, a tétrica solidão deve encerrar também a promessa de uma feliz proximidade divina. Ele assumiu a falta de sucesso. Portanto, a derrota pode ser uma vitória. Ele assumiu ser abandonado por Deus. Portanto, Deus está próximo, mesmo quando pensamos que Ele nos abandonou. Ele assumiu tudo, portanto, tudo está redimido. (Rahner, 1968, pp. 173-174)

03 agosto 2019

Em nós

Cada dor nossa nos parecia um semblante de Jesus Abandonado a ser amado e querido para estar com Ele, ser como Ele, a fim de, em união com Ele, darmos também nós a vida a nós e a muita gente, com o nosso sofrimento amado. Entrando neste caminho da unidade, escolhêramos só a Ele: em um ímpeto de amor, decidíramos sofrer com Ele, como Ele. Pois bem, a experiência que todos fizemos é que Deus, somente amor, não se deixa vencer em generosidade e muda, por uma alquimia divina , a dor em amor. Isso equivale a dizer que nos transformava em Jesus, experimentado em nós pelos dons do seu Espírito, dons que o amor sintetiza. Constatávamos que, tão logo desfrutávamos de uma dor qualquer, para ser como Ele abandonado que se abandona novamente ao Pai, e continuávamos depois a amá-lo, fazendo a vontade de Deus do momento seguinte, a dor, se era espiritual, geralmente, desaparecia; se era física, mudava-se em jugo suave. Em contato com a dor, o nosso amor puro, isto é, o nosso desfrutar da dor, convertia essa dor em amor. De certo modo, divinizava-a; era como se a divinização que Jesus fizera da dor prosseguisse em nós, se assim podemos dizer 3 . E, depois de cada encontro com Jesus Abandonado, amado, encontrávamos Deus de um modo novo, mais face a face, em uma unidade mais plena . A luz e a alegria e, com elas, a paz, que são frutos do Espírito, voltavam. Aquela paz especial que Jesus prometeu, para cuja obtenção — assim sentíamos — era necessário fazer do tormento, da angústia, das agonias da alma, das perturbações, das tentações uma ocasião para amar a Deus.