21 março 2020

As chagas do ressuscitado

      Quando Jesus aparece pela primeira vez aos discípulos, na noite da Páscoa, Tomé não está presente. Ele reage: “Se não vir e colocar meu dedo na marca dos pregos e no lado dele, não acreditarei” (Jo 20,25).
      Jesus aceita o desafio. Aparece com as chagas: reais. Todas.
      Nós, no lugar Dele, teríamos feito uma cirurgia plástica; as chagas eram repugnantes, lembravam um momento doloroso, um fracasso.
      Jesus, não. Por quê?
      Jesus vive a vida toda, não só alguns momentos selecionados, “positivos”. Vive também os momentos “negativos”.
      Qual a diferença, para Ele, entre positivo e negativo?
      “Ninguém tira a minha vida; eu a dou livremente” (Jo 10,18).
      Para Jesus, é positivo aquilo que é vivido por amor e no amor; negativo, aquilo que está fora do amor.
      Por isso, Ele fica com as chagas também após a ressurreição. As chagas não são morte, e sim vida, são positivas. O Jesus das chagas está vivo tanto quanto o Jesus da ressurreição. Elas não são um episódio superado e cancelado pela ressurreição, mas possuem em si a marca da eternidade, a marca do amor. Não passarão jamais.
      São a marca registrada de um Deus que quis (e quer) ser homem em tudo, não pairando acima da humanidade sofrida, mas identificando-se com ela. Para nos salvar, isto é, nos dar a possibilidade de estarmos vivos quando todos (e nós mesmos) cantam em coro que estamos mortos, que “isso não é vida”.
      Nós somos tentados a apagar as chagas, a fugir delas, em nós mesmos e ao nosso redor. Há pessoas que nunca entram num hospital, que nunca vão a um velório, que fogem de um mendigo, que não param ao lado de um sofredor… Nem querem olhar.
      Jesus sem chagas não existe, Deus sem chagas não existe.
      “Por que vocês estão procurando entre os mortos aquele que está vivo?” (Lc 24,5).
      Paradoxo cristão! O Cristo sem chagas está entre os mortos, entre aqueles que fogem da vida, aqueles sem coragem, aqueles que não sabem amar.
      “Estende aqui teu dedo… Estende tua mão e toca meu lado” (Jo 20,27).
      “Meu Senhor e meu Deus!” (20,28).
      Se você quer encontrar Deus, coloque o dedo e a mão nas chagas da humanidade.

Nenhum comentário: