28 fevereiro 2019

A EVANGELIZAÇÃO DOS FILHOS


A evangelização dos filhos é, mais do que nunca, importante para os nossos filhos, para as famílias, para a comunidade eclesial e para a sociedade civil. De fato, conseguir transmitir os valores do Evangelho às novas gerações significa estabelecer hoje uma convivência mais solidária e de elevado perfil ético, e, sobretudo, criar as bases para que assim continue também no futuro.
Existem várias maneiras de transmitir o Evangelho.
Aqui, eu me limito a falar daquela que conheço, isto é, da experiência de educação evangélica das crianças que participam do Movimento dos Focolares, o qual tenho a honra de presidir.
Os Evangelhos nos revelam o quanto Jesus ama as crianças.
Lemos no Evangelho de São Marcos: «Então lhe traziam algumas crianças para que Jesus as tocasse; mas os discípulos os repreendiam» (Mc 10,13-16). E no evangelista Mateus: «Os chefes dos sacerdotes e doutores da Lei ficaram indignados, quando viram (...) as crianças gritando no templo: "Hosana ao Filho de Davi". Então eles disseram a Jesus: "Estás ouvindo o que dizem?"» (Mt 21,15-16).
Diante da agitação dos discípulos e da indignação dos sumos sacerdotes, Jesus assume outra atitude. De fato, existe uma total divergência entre o modo de Jesus de avaliar pessoas e acontecimentos e o deles. Para Jesus a "criança" é inclusive o modelo do discípulo que Ele tem em mente. Com efeito, Jesus diz: «Eu lhes garanto: se vocês não se converterem e não se tornarem como crianças, vocês nunca entrarão no Reino do Céu» (Mt 18,3).
E o amor de Jesus pelas crianças é prontamente retribuído. Elas ficam fascinadas por Ele. A presença das crianças ao seu redor é constante na sua vida pública e, justamente porque Jesus as ama e é amado por elas, Ele torna-se o amigo e o verdadeiro "mestre" das crianças. E isso não se verificou somente há dois mil anos pelas ruas da Palestina, mas continua e continuará a se verificar ao longo dos séculos com todas as crianças do mundo.
Uma mãe recentemente me escreveu que sua filha, de cinco anos, não sabia se participava ou não de um encontro de formação sobre o Evangelho, pois esse encontro (de quatro dias) seria feito longe de Bari, a sua cidade. Teria que dormir pela primeira vez fora de casa, sem a mamãe e o papai. Sua mãe me contou: «Um dia Ângela chegou em casa decidida. Ela tinha ouvido como as crianças viviam o Evangelho "Quero fazer como elas. Me dê a mala – disse-me –, colocarei os sapatos sem laços, vestidos sem botões, porque você não irá comigo, mamãe, e não poderá me vestir..."». São experiências que podem nos fazer rir, mas a mãe dessa menina quase chorou, «porque – me escreveu – senti que Jesus tinha conquistado o coração de minha filha».
A "educação", entendida como «promover o desenvolvimento integral dos filhos no campo religioso, moral, comportamental, cultural e social», provém de diversos agentes, que muitas vezes interagem entre si. Eles são, em primeiro lugar, os pais e a família; depois, o Jardim de Infância, a Escola Fundamental, a comunidade eclesial, com os seus campos de atuação e especialistas em formação, as agremiações espontâneas, os meios de comunicação social.
Porém, gostaria de limitar esta nossa reflexão à família.
Como os pais e as famílias poderão desempenhar da melhor maneira possível a sua missão de educadores?
Em primeiro lugar, empregando ao máximo aqueles recursos pedagógicos próprios que derivam do fato de serem pais; recursos potencializados pela experiência pessoal e pelo eventual patrimônio cultural, oferecido pelo contexto social em que vivem. Trata-se do primeiro e insubstituível instrumento educativo, que todos os pais por natureza possuem.
Porém, existe também uma perspectiva mais ampla e mais elevada. Os pais cristãos acreditam que seus filhos entram na dimensão existencial como um "projeto de imortalidade". O projeto de Deus para o homem é uma vida que começa fraca e indefesa, cresce e se afirma na interação com as criaturas e a criação, supera a morte e entra na perene novidade da condição divina, para se tornar e viver como "filho de Deus"[i]. Trata-se da aventura humana de Cristo, o qual, para viver essa aventura, teve que ser "acolhido e ajudado no seu crescimento"[ii] por uma simples e pobre família, como disse João Paulo II; essa família podia ser "simples e pobre", mas certamente era possuidora daqueles recursos espirituais e humanos que faziam com que ela tivesse o ambiente adequado para a formação daquele Homem.
E cada família deve acreditar no amor de Deus, o qual junto com o dom da vida, prepara para cada filho o ambiente onde crescer e o caminho a percorrer.
Mas qual é o caminho? Nós o conhecemos: «Eu sou o caminho – disse Jesus –. Ninguém vai ao Pai a não ser por mim» (Jo 14,6).
Educar um filho significa, em última análise, fazê-lo encontrar Jesus.
A frase «deixai vir a mim as criancinhas...» (Mc 10,14) é uma sublime síntese de método educativo evangélico para uma formação não só religiosa, mas integralmente humana.
Será que há dois mil anos encontrar Jesus era mais fácil? Não sei... A história da salvação caminha e Cristo continua a estar conosco, como havia prometido. E os vários modos de Ele estar presente, como prometeu, são o ponto de contato entre a família e Ele.
Gostaria de examinar brevemente dois desses modos, muito apropriados ao núcleo familiar.
Um primeiro modo de Jesus estar presente é quando vivemos aquela sua famosa e explícita declaração: «Onde dois ou mais estiverem reunidos no meu nome, ali estou eu no meio deles» (Mt 18,20). Portanto, Jesus está presente onde estivermos unidos. Segundo muitos Padres da Igreja e a tradicional interpretação do magistério, isso significa estar unidos n'Ele, na sua vontade, na prática, no amor recíproco, que é o seu mandamento[iii].
Pois bem, uma família ou um casal pode estabelecer aquela condição com a qual, segundo Orígenes, Cristo é «atraído e desafiado»[iv] a estar presente entre seus membros?
Todos constatamos que a família já é uma rede de amor, de amor humano que liga o pai à mãe; os dois aos filhos; os filhos aos pais; os filhos entre eles e ainda aos tios e avós; aos sobrinhos e netos. Se a família usufruir também do amor divino, que a vida cristã lhe oferece, daquele amor divino que foi infundido nos corações pelo Espírito Santo, então Cristo poderá estabelecer-se realmente nessa família, potencializando o amor humano, que já existe, e a graça do sacramento do matrimônio.
Os pais que se amam assim levam Jesus para casa.
E como é esse amor humano-divino, o amor evangélico? Praticamente, como se ama segundo Jesus?
Aqui é mesmo necessário fixar a nossa atenção para compreender aquela que, de certo modo, pode se chamar a arte de amar de Cristo. Ela é exigente.
É um amor que ama a todos.
É um amor que é o primeiro a amar.
É um amor que ama sempre, que nunca se acaba.
É um amor que entra na realidade do outro, que sabe fazer-se um com o outro.
Enfim, é um amor que no outro, em quem quer que seja, vê e ama Jesus, segundo as suas palavras... «A mim o fizeste» (Mt 25,40).
Se numa família os esposos se amam e amam desse modo, recomeçando sempre, sabendo morrer a si mesmos por amor ao outro, esse amor recíproco, que estabelece o Mestre em casa, atrai os filhos.
De fato, faz parte da ordem natural das coisas que os filhos tenham a tendência a imitar o comportamento dos pais.
E, se é mesmo assim, levando em consideração somente o lado humano da família, o que poderá acontecer quando os pais forem imbuídos pela graça do sacramento e pela presença mística de Jesus entre eles?
Eu tenho a grande sorte de receber cartas de muitas crianças, porque a parte juvenil do nosso Movimento, compreende também as crianças pequenas; e posso constatar a ação educadora espontânea, por assim dizer, de uma família que procura viver o amor evangélico.
«Ontem, papai me pediu para ir pegar vinho na adega – me escreveu Betty, de seis anos, de Milão –. Descendo as escadas, era escuro e tive medo. Depois, rezei para Jesus e senti que Ele estava perto de mim. Às vezes falo com Jesus. Outro dia eu estava no meu quarto fazendo o dever de casa e comecei a conversar com Ele; eu lhe disse muitas coisas e não queria mais parar de falar. Sabe, quando faço um ato de amor, sinto uma coisa bela dentro de mim, como se alguém me fizesse elogios e me agradecesse. Nesse momento, penso que esse alguém é Jesus».
Uma mãe francesa me escreveu: «Antes de colocá-los para deitar, rezo de joelhos sobre o tapete com as duas filhas maiores. Ontem à noite, Ruth – uma delas – me fez notar que Davi, o menor, continuava a brincar. "Deixe estar", eu lhe disse, "é assim que ele reza". Assim, nos recolhemos e rezamos as orações da noite. Quando abrimos de novo os olhos, Davi estava ao meu lado com as mãos postas. "Você viu, mamãe – me disse Catarina, a outra –, se nós amamos, Jesus lhe ensina as coisas"».
Outra presença de Jesus, significativa para o tema que estamos abordando, é aquela presença na sua Palavra.
Naquilo que diz respeito à nossa experiência espiritual, podemos dizer, e é o que repetimos, que «nascemos com o Evangelho nas mãos» e continuamos assim. Escolhemos uma frase para colocar em prática durante um mês na nossa vida do dia a dia. Assim, a nossa existência é "evangelizada" e imersa em Deus, presente totalmente em cada fragmento da sua Palavra.
Com essa simples técnica pedagógica da gradação e da plenitude, Deus nos fez viver uma experiência espiritual e educativa forte e em contínua expansão. É uma experiência que envolve também as nossas famílias e as famílias das comunidades que se agregam ao redor dos Focolares e que partilham a nossa mesma aventura espiritual.
E nessas famílias, assim como para os filhos pequenos parte-se em pequenos pedaços o pão cotidiano, também é preciso explicar por partes o Evangelho. De que modo? Exatamente como nós, adultos, fazemos. Escolhemos – como eu disse –, a cada mês, uma frase com o sentido completo, com um comentário aprovado pela Igreja, compreensível a todos, e procuramos vivê-la nas pequenas e grandes ocasiões do dia, quase competindo com os filhos em um santo e alegre espírito de competição. Assim, se o papai e a mamãe contarem à noite como conseguiram viver como cristãos os acontecimentos do dia, será espontâneo para os filhos fazer o mesmo, contando as suas experiências. São momentos em que responsabilidade e reciprocidade tecem de modo admirável o relacionamento familiar[v].
Nas crianças, que crescem em famílias assim, essa formação diária, com uma mentalidade segundo o Evangelho, é espontânea, e isso as levará a avaliar pessoas e situações como Jesus, com o seu modo de pensar. Aprenderão a ver na humanidade a grande família dos filhos de Deus, e a usar das coisas deste mundo com espírito puro e solidário, possuindo uma reta hierarquia de valores que as guiará sempre na vida.
É claro, chegarão também as provações para os filhos e os períodos de crise e busca; sobretudo na adolescência e no início da juventude conheceremos a sua rebeldia e contestação, mas nenhuma atitude deles, por mais grave que seja, deverá paralisar ou apagar a nossa caridade em relação a eles. A arte de amar, que Jesus nos ensinou, nos indicará como "nos fazer um" até o fim, nas várias etapas do seu crescimento; colocará nos nossos lábios as palavras justas de advertência, nos manterá sempre abertos ao diálogo e à partilha dos seus interesses. Saberemos "perder tempo" com os filhos. Saberemos criar amizade com eles e ser seus confidentes. Porém, se a rebeldia perdurar, manteremos sempre a porta de casa aberta e reconheceremos na nossa dor uma sombra da dor de Cristo crucificado, que também viveu o abandono da parte de todos, inclusive do Pai. Nós a aceitaremos, como Jesus fez, permanecendo serenos.
Nós acreditamos, porém (e muitas experiências nos confirmam isso), que todos os valores depositados neles permanecerão gravados para sempre, porque, no momento mais importante de sua vida, quando se plantam as bases da personalidade e do caráter, tiveram a grande sorte de encontrar Jesus, presente entre os pais, presente com a sua Palavra na vida deles.
É realmente verdade que as crianças sabem viver, melhor do que nós, com generosidade e totalitariedade, a Palavra de Deus.
No ano passado, tive a idéia de propor-lhes um jogo: escrever nos lados de um dado as regras da arte de amar, de que falei ainda há pouco, convidando-os a lançá-lo de manhã, quando se levantam, para escolher de que modo amar a todos aqueles que encontrariam durante o dia. Foi incrível a resposta entusiasmada e os ecos que recebi de todas as partes do mundo.
Um pai, de Gênova, me escreveu: «Eu estava lavando os pratos quando Lucas entrou na cozinha. Pegou o pano de prato e começou a enxugar. "Esteja atento em não quebrar nada", eu lhe disse meio maravilhado com a sua generosidade. E ele, todo satisfeito, me respondeu: "Quando mamãe voltar, encontrará tudo limpo. Sabe, papai, quando eu for para o Paraíso Jesus me dirá: 'Naquela vez que você ajudou seu pai, foi a mim que você ajudou'"».
Irene, Ilária e Laura, três irmãzinhas de Florença, estavam indo com a mãe fazer as compras de carro. Passam na frente da casa do avô e perguntaram se podiam ir dar-lhe um abraço. A mãe disse: «Vão vocês. Eu espero no carro!» Quando voltaram, perguntaram: «Mãezinha, por que não veio?» A mãe respondeu: «O vovô não se comportou bem comigo; assim, ele compreende que...» Ilária a interrompeu: «Mas mamãe, estamos vivendo a Palavra: amar a todos, também aos inimigos...» A mãe ficou sem palavras. Olhou para elas e sorriu: «Vocês têm razão! Esperem, que volto já». E foi saudar o vovô também.
E agora, para concluir, desejo ler ainda dois episódios sobre estas crianças educadas segundo o Evangelho. São episódios significativos, que por vezes são até engraçados.
Temos milhares de pobres no Movimento que ajudamos de um modo especial e as crianças contribuem. Eis o que Marcos me escreveu: «Querida Chiara, sou Marcos, de Cosenza. Mamãe e papai me disseram que você está fazendo algumas contas (eu estava vendo quantos pobres poderíamos ajudar) e entendi como é a situação, por isso lhe mando...». Agora ele explica uma coisa que na Itália se costuma fazer. Os pais dizem aos filhos, quando estão na idade em que caem os dentes, para colocá-los num buraquinho da parece e, durante a noite, passa um ratinho que, no lugar do dente coloca uma moedinha.
Então, Marcos me escreve: «Querida Chiara, sou Marcos, de Cosenza. Mamãe e papai me disseram que você está fazendo algumas contas para ajudar os nossos pobres e entendi como é a situação, por isso lhe mando o dinheirinho que o "ratinho" me deixou no lugar do meu primeiro dentinho que caiu. Sabe, Chiara, eu também fiz os meus cálculos: devem cair ainda 11 dentinhos... Chiara, tenho certeza de que conseguiremos a soma necessária e não teremos mais pobres no mundo!».
 A última.
Kanna é uma criança de Nagasaki, no Japão. Ela vai ao Jardim de Infância. Muitos dos seus amigos são de outras religiões, também a professora não é cristã. No final do ano, a professora saúda, uma por uma, todas as crianças da classe. Quando chega a vez de Kanna, ela lhe diz: «Eu lhe agradeço porque você nos fez conhecer Jesus. Quando você nos falava sobre Ele, sentia-se que Ele estava perto de você. Você nos ensinou as orações que aprendeu em sua casa: são belas! Hoje de manhã, vi que você deu a uma amiguinha o prêmio que você recebeu. Isso me comoveu! Eu estou para me casar, mas antes quero receber o batismo e estou me preparando, porque também eu quero acreditar em Jesus como você».
Essa é a conclusão. Peçamos a Maria, que educou o Mestre por excelência, que nos transmita um pouco da sua materna pedagogia.



[i].   Cf L.Macario, L'educazione religiosa, in N.Galli (aos cuidados de), Vogliamo educare i nostri figli, Vita e Pensiero, Milão 1985, p. 272;
[ii].  João Paulo II, Angelus 26.12.1999, L'Osservatore Romano, ed. italiana, 27-28 de dezembro de 1999, p. 9;
[iii].  Cf Chiara Lubich, Scritti Spirituali/3, Tutti uno, Città Nuova 1989, p. 173;
[iv]. Commento al Cantico, 41, p.13, 94 B;
[v].  Cf. G.Milan, Disagio adolescenziale e strategie educative, Cleup Pádua 1999, pp. 56 e segs.

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