18 dezembro 2017

A obra-prima do santo

Entrando no locutório ou nos longos corredores de um convento, de fundação recente ou antiga, frequentemente se vê nas paredes a figura do fundador, quase sempre santo, com a Regra na mão. Quem vive no mundo, entra, olha e nada entende ou pouco entende. Na maioria das pessoas, mesmo entre os ateus, um santo sempre desperta simpatia. As pessoas, porém, preferem imaginá-lo mergulhado no êxtase da contemplação, ou misturado entre o povo a quem faz o bem, ou, nos fatos que passam de boca em boca e que cercam quase sempre a figura de um santo. Fatos insignificantes, às vezes, eternizados no tempo por uma frase, um gesto, que homem algum teria dito ou feito a não ser aquele santo, porque guiado por Deus; gesto em que é patente o inconfundível encontro do divino com o humano, que dá uma conotação nova, e por vezes revolucionária, ao viver enfadonho e sempre igual do mundo. Mas, o santo fundador não é somente isto. O fundador é um homem que realizou o que Deus queria, que se esforçou para ser perfeito como o Pai, através de uma doação cada vez mais total e mais ampla de si mesmo a Deus. O santo é, na realidade, um pequeno pai e a santa é uma pequena mãe, porque Deus é Amor; e estar repleto de Deus significa tornar-se partícipe da divina fecundidade do Amor. Compreende-se bem um fundador quando se observa o que ele fez. O pequeno ou grande rebanho que o seguiu, que ele transformou em família, com as leis eternas do Evangelho que, pela ação do Espírito Santo ressoam em sua alma com força nova e atual, é a obra mais importante do santo; representa o que para a mãe é o filho, o seu filho. Quando o fundador julga concluída a obra de Deus, abandonando-se Nele como um instrumento nas mãos de um artista, traça as linhas essenciais de sua obra, e escreve uma regra. Deve fazê-lo e assim quer fazer com a força com que uma mãe diz: “Este é o meu filho e não outro”. No filho, a mãe é recompensada de todo o seu sofrer, e ele é a mais viva lembrança de suas alegrias e do amor que a uniu ao pai. Tem uma fisionomia determinada, um caráter seu, um sangue próprio. Um santo ama a Deus com um amor que dista do amor humano tanto quanto o céu dista da terra, e este amor lhe proporciona pequenas e imensas dores, pequenas e inefáveis alegrias no Deus das bem-aventuranças. Mas alegrias e dores não são fim em si mesmas; são meios de a Igreja possuir uma nova obra de Deus, onde o Senhor delineia uma fisionomia determinada, com características inconfundíveis; onde Ele injeta um sangue divino, que é o espírito específico que a permeia, com que parte da humanidade daquela época se deve beneficiar. Tudo is so a regra atesta, explica, estabelece, mantém e, porque assim faz, é a obra-prima do santo.

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