14 janeiro 2022

Quando se conhece a dor

Quando se conheceu a dor em todos os seus matizes mais atrozes, nas mais variadas angústias, e se ergueram as mãos a Deus em mudas e lancinantes súplicas, em abafados gritos de ajuda; quando se bebeu o fundo do cálice e, durante dias e anos, se ofereceu a Deus a própria cruz, incorporada à sua, que a valoriza divinamente, então Deus tem piedade de nós e nos acolhe em sua união.
É o momento em que, após ter experimentado o valor sem par da dor, de ter acreditado na economia da cruz e de ter visto os seus efeitos benéficos, Deus mostra, de modo mais alto e novo, algo que vale mais ainda do que a dor.
É o amor aos outros, em forma de misericórdia, amor que faz abrir os braços e o coração aos infelizes, aos mendigos, aos martirizados da vida, aos pecadores arrependidos. 
Amor que sabe acolher o próximo desencaminhado, seja ele amigo, irmão ou desconhecido e o perdoa infinitas vezes. Amor que faz mais festa a um pecador que volta do que a mil justos, e empresta a Deus inteligência e bens para Ele poder demonstrar ao filho pródigo a felicidade pelo seu retorno. 
Amor que não mede e não será medido. 
É uma caridade que floresce mais abundante, mais universal, mais concreta do que aquela que a alma antes possuía. De fato, ela sente nascerem dentro de si sentimentos parecidos com os de Jesus, percebe aflorarem-lhe aos lábios, para todos os que encontra, as divinas palavras: “Tenho misericórdia da multidão” (cf. Mateus 15,32). E, com os muitos pecadores que dela se aproximam, pois, de certa forma são imagem de Cristo, entabula colóquios semelhantes aos que Jesus teve um dia com Madalena, com a samaritana, com a adúltera. A misericórdia é a última expressão da caridade, aquela que a remata. E a caridade supera a dor, porque a dor só existe nesta vida, enquanto o amor perdura na outra. Deus prefere a misericórdia ao sacrifício.

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